Cultura

Nos cem anos de Bollywood, o Brasil ganha distribuidora que lança seu primeiro filme no país

Segunda maior indústria de cinema do mundo entra para o mercado brasileiro

Aamir Kahn, o “Tom Hanks da Índia”, e Kajol Mukherjee no drama romântico “Fanaa” (2006)
Foto: Divulgação
Aamir Kahn, o “Tom Hanks da Índia”, e Kajol Mukherjee no drama romântico “Fanaa” (2006) Foto: Divulgação

RIO - Colorido com as tintas do folhetim e da cantoria, Bollywood, a indústria indiana de cinema-pipoca que vende até quatro bilhões de ingressos ao ano em seu país, comemora este ano um século de existência buscando uma expansão comercial pelo mundo.

Sua máquina de fazer entretenimento começou em 1912, quando o fotógrafo e dono de gráfica Dadasaheb Phalke (1870-1944) resolveu investir seu dinheiro no que viria a ser o primeiro filme feito em Mumbai (ex-Bombaim, daí o “B” na palavra Bollywood): “Raja Harishchandra”, lançado em abril de 1913. Ali nasceu um formato de melodrama falando em hindi (idioma oficial, derivado do sânscrito) que combinava diferentes gêneros (ação, épico, romance) para fazer a crônica dos valores culturais e das mitologias de uma nação. E, a partir do advento do som na telona, esse formato passou a ser realizado sempre em forma de musical, com números de canto e dança.

Sua exuberância visual vai ser tema de debates numa retrospectiva-tributo do Festival Internacional de Marrakech (30 de novembro a 8 de dezembro), no Marrocos, que reúne clássicos feitos em Mumbai para celebrar os cem anos de Bollywood, no momento em que produtores locais firmam parcerias com estúdios americanos como a Disney e a Sony, para garantir maior entrada no continente americano.

Esse plano de expansão também chega ao Brasil, com a criação de uma nova distribuidora especializada no setor, a Bollywood Filmes. No dia 24 deste mês, a empresa fundada por André Ricardo Nascimento e Dinesh Sinha lança seu primeiro título: o drama romântico “Fanaa” (2006), de Kunal Kohli, um dos raros exemplares da produção bollywoodiana a ter arrecadado fortuna em salas de exibição fora da Índia: seu faturamento internacional em venda de ingressos foi de US$ 7 milhões, fora os US$ 21 milhões que contabilizou em casa. Seu protagonista, Aamir Kahn, é chamado de “o Tom Hanks da Índia” por sua popularidade local. Na trama, Khan vive um guia turístico que se apaixona por uma jovem cega (Kajol Mukherjee).

- Bollywood é pouco conhecida no Brasil ainda, mas acreditamos que há potencial para seus filmes irem além do circuito de arte. Ela é a segunda mais lucrativa indústria de cinema do mundo. Não haver um mercado estabelecido não é um problema, é uma oportunidade - diz André Ricardo Nascimento, que aposta na proximidade entre a narrativa folhetinesca bollywoodiana e a estrutura das telenovelas nacionais como um chamariz.

Mais do que exibir as superproduções da Índia, sua Bollywood Filmes que fomentar coproduções.

- Bollywood tem uma característica marcante: a maioria esmagadora dos filmes tem locações fora da Índia. Nova York, Londres, Caribe, Austrália, Polônia, Oriente Médio, Cuba são só exemplos de locais onde Bollywood filmou. Nosso objetivo principal é fazer do Brasil mais uma opção de locações, o que pode ajudar o cinema brasileiro a aprender com o indiano sobre alcance internacional - diz Nascimento.

Considerado um dos maiores pesquisadores de Bollywood, o jornalista e produtor indiano Ram Devineni, autor da revista eletrônica “Rattapallax”, lembra que o audiovisual da Índia vai além da estética cantada da produção de Mumbai. Nas regiões da Índia onde se fala telegu e não hindi, a produção, mais autoral, se chama Tollywood. Cada região tem um cinema com características próprias, mas nenhum tem o apelo comercial da filmografia bollywoodiana. Ele lembra que o maior mito cinematográfico do país, Satyajit Ray (1921-1992), diretor de “A canção da estrada”, investia em análises sociais realistas, filmando em Calcutá.

- A partir de 1947, quando a Índia ganhou sua independência, o cinema foi fundamental para unificar nosso povo. Daí nasceu uma tradição que chega a levar até 14 milhões de indianos ao cinema por dia, já que o ingresso gravita em torno de US$ 1 - explica Devineni.

- Um dos mais bem-sucedidos diretores dos anos 1970, Manmohan Desai, uma vez disse que realizava filmes nesse formato para fazer nosso povo se esquecer de sua miséria, indo a um universo de sonho. Vem daí o sucesso.

Ainda para 2013, o produtor brasileiro Ibirá Machado prepara uma mostra de clássicos de Bollywood para correr o país, via CCBB, comemorando o centenário de um cinema temperado ao curry da invenção.