Quinta-feira, 2 Maio

Entrevista a François Ozon, realizador de «Dentro de Casa»

O mago do storytelling

Uma entrevista após a emoção de ver crescer no ecrã aquela narrativa entre um aluno e o seu mentor. Seguramente, uma forma bem mais interessante de espreitar pela fechadura. Percebe-se que Ozon está em plena forma – se é que alguma vez esteve em má… -, ele que alguns meses mais tarde nos iria revelar o conteúdo do seu projeto seguinte que aflorou na derradeira pergunta da nossa entrevista. E que já sabemos ser Jeune et Jolie, apresentado este ano em Cannes. Venha o próximo.

Alterou muito o seu guião a partir do original do Juan Mayorga?

Quando fazemos uma nova versão, acho que deveremos ser corajosos. Usei o que gostava na peça, guardei o essencial. Acho que o Juan Mayorga ficou agradado com as minhas escolhas.

Quais foram as alterações principais?

Por exemplo, o final é diferente e as relações com o protagonista não eram exatamente as mesmas.

Porquê a alteração do final?

Eu acho que tanto o professor como o aluno precisavam um do outro. Acaba por ser um ‘happy end‘ para a história.

Com quem se identifica mais, o rapaz esperto ou o mentor?

Eu ainda não sou um professor velho…

Não foi o que eu disse (risos)…

Ainda me sinto como um estudante. Tenho a sensação de que estou sempre a aprender. Há pessoas que admiro e isso é importante para quem cria.

Algum realizador em particular?

Sim, na descoberta do cinema. Um dos meus professores na universidade foi o Eric Rohmer. Foi muito importante para mim, mas é claro que o Bergman e Fassbinder foi quase uma a mesma aprendizagem, apesar de nunca os ter conhecido. Mas quando se vê cinema também se aprende.

É interessante a forma como vai crescendo uma história dentro da narrativa…

Sim, interessou-me isso, esse processo criativo dentro da narrativa. Acaba por ser um vício sobre a narrativa, tal como sucede nas séries ou nos reality shows.

Interessava-lhe trabalhar numa série?

Uma série? Porque não? No entanto, há sempre algum momento numa série em que fico enfadado. No cinema, acho que a experiência para o espectador é mais forte. Pelo menos, é essa a minha opinião.

Dá a sensação nos seus filmes que se serve dos géneros para se rir deles próprios. É verdade?

Sim. Há um momento em que posso seguir caminhos diferentes: comédia, thriller, melodrama e brincar com os géneros. Isso é algo que gosto de fazer.

Sente então que este poderá ser um processo de criação que se vai desenvolvendo à medida que cresce como cineasta?

Claro. Há diversas questões que nos colocamos. E quando trabalhamos como um produtor e um argumentista temos de colocar a história no papel e perguntar para onde vamos.

Mas haverá sempre os clássicos, como diz neste filme, em que nos iremos apropriar. Acontece também assim consigo, com os realizadores que admira?

Às vezes, pode ser interessante para uma cena perceber o que um mestre fez antes. Neste filme, via apenas o Woody Allen para a cena entre o Fabrice Luchini e a Kristin Scott Thomas. Queria que tivesse o mesmo ritmo que  o Woody Allen e a Diane Keaton, esse tipo de casal inteletual, como em O Misterioso Assassínio em Manhattan.

Vindo de uma família de dois professores, como era a sua relação com eles?

O meu pai era biólogo, um cientista, a minha mãe era professora de francês. Acho quer tive uma relação normal, com o realce de não ter nada a ver com a ciência. Por isso era mais próximo da minha mãe.

Poderá então induzir-se que o interesse pelo cinema veio pela parte da sua mãe, é isso?

Ambos os meus pais eram cinéfilos, mas não tinham nada a ver com o cinema. Mas o meu pai tinha uma Super 8 e fazíamos os filmes de férias. Um dia pequei na câmara dele e decidi começar a fazer os meus filmes.

Mencionou o Eric Rohmer, será por aí que chegou ao Fabrice Luchini?

É um ponto comum. É algo que temos em comum. O Rohmer foi muito importante para mim como para ele. É claro que ele mal me conhecia, mas quando comecei a ficar mais famoso ficou sensibilizado com os meus filmes, porque usava os atores dele, como o Melville Poupaud. Diz-se até que uma vez que se começa a trabalhar com o Rohmer, a carreira acabou para os outros realizadores. Isto porque se fica com o estilo e o tom do Eric Rohmer. O Fabrice é uma exceção.

Tinha algum desejo especial de trabalhar com a Kristin? Ela parece fazer bem a que quer que seja…

Sim, queria trabalhar com ela há já algum tempo. Gosto muito das atrizes inglesas. Mas tinha receio da química entre ela e o Fabrice, pois são bem diferentes.

É claro que tem dois excelente atores em Fabrice e Kristin, mas tem também ótimas revelações nos jovens. Como foi feito esse trabalho entre todos?

Para o jovem Ernst Umhauer foi quase uma relação entre mestre e discípulo, mas ao mesmo tempo pode ser perturbador para o outro experiente. Mas fiz um casting enorme para chegar a ele.

O que se segue agora?

É um pequeno filme sobre uma jovem, uma rapariga agora, que descobre a sexualidade. To be continued… (risos)

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