Aprecio bastante o gênero romance e confesso que sou uma inveterada por histórias de amor. Além disso, acredito que por mais que a lógica seja a mesma – garoto conhece garota e se apaixona –, o enredo pode ser contado de mais de quinhentas formas fascinantes e totalmente distintas. Pois são as escolhas narrativas deste argumento que fazem alguns projetos darem certos e outros não.
Dirigido pela carioca Julia Rezende (Meu Passado Me Condena), Ponte Aérea já carrega a pretensão de ser inspirado na obra Amor Líquido, do sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Se você, pelo menos, leu a sinopse do livro sabe que se trata de uma reflexão sobre como os relacionamentos amorosos e sociais estão se dissolvendo na contemporaneidade e sendo sufocados pela tecnologia.
Portanto, o romance seria uma grande metáfora para discutir os relacionamentos entre os jovens brasileiros. Nas primeiras cenas, a gente até percebe uma tentativa de embalar esta filosofia sobre o imediatismo e o descomprometimento por meio do desapego e as redes sociais. A incumbência para retratar o assunto é dos personagens Bruno (Caio Blat) e Amanda (Leticia Colin), que se conhecem durante um pouso de emergência em Belo Horizonte e passam uma noite juntos.
Letícia Colin está extremamente segura com uma jovem independente e autoconfiante, assim como Caio Blat consegue ser sensível e sedutor. O casal foi muito bem selecionado e o envolvimento entre os dois bem construído. O pecado começa quando o namoro entre a paulista metódica workaholic e o carioca maconheiro despojado apresenta seus clichês mais óbvios entre os moradores de cada cidade.
As personalidades são bem trabalhadas e gosto muito da imagem da mulher moderna e determina transmitida por Amanda, mas esqueceram do seu background. Ela apenas se torna uma publicitária bem sucedida, enquanto Bruno vive numa confusão de sentimentos com a morte do pai e a descoberta de um irmão menor, que acaba se tornando sua responsabilidade, e tenta transformar sua arte em mais do que um modo de expressão. O romance inicialmente sem importância se torna um pontapé na vida de Bruno, mas não fica claro o impacto na de Amanda.
A distância geográfica pondera como a tecnologia pode auxiliar a relação, mas ela está longe de ser um meio para sua sobrevivência. A ideia de discutir esta questão me agrada, mas ela fica muito superficial e durante muito tempo as diferenças entre Rio de Janeiro e São Paulo se intrometem em um enredo que seria ótimo sem a lengalenga do senso comum.
É muito bom ver o cinema nacional sair da linguagem televisiva e ir além das comédias para públicos medianos, no entanto, não posso ignorar que a produção deixa furos de continuidade e possui diálogos razoáveis para tentar explicar seus conflitos. Ás vezes, vale recorrer a máxima “uma imagem vale mais do que mil palavras”. Apesar dos deslizes, a direção é segura e ressalta ótimos planos, como uma importantíssima cena de sexo.
Ponte Aérea perde muito tempo no campo das analogias rasas, portanto, quando tenta explorar um nível mais acima, como colapsos, distúrbios e obsessões, ou mostrar como as nossas emoções e sentimentos são sustentados por um fio ténue, o espectador sente um desconforto. Por um lado, é um bom resultado, pois, representa a sensação da personagem Amanda, por outro, não a mostra lidando com isso, o que se transforma em um engano para o público.
Como o filme todo trabalha para a construção de um relacionamento líquido e seu desfalecimento era de se esperar um questionamento sobre o caso. A não ser que o objetivo fosse outro, como, por exemplo, criar uma dicotomia frívola entre paulistas e cariocas, que não valeria um longa-metragem. Ou ainda, sobre namoro à distância, mas seria uma curta abordagem em universo muito mais complexo.
Simpatizo com o final, entretanto, parece um atalho para não aprofundar uma discussão e deixar questionamentos velados. O casal é bom, se você gosta do gênero romance, vale a pena acompanhar a performance deles e se perguntar qual o ingrediente que faltou para comida ser apetitosa. Mas veja também os nacionais Malu de Bicicleta (2011) e Apenas o Fim (2008).