Fale com ela (2002)

Título original: Hable con ela

Título em inglês: Talk to her

País: Espanha

Duração: 1 h e 52 min

Gêneros: Drama, mistério, romance

Diretor: Pedro Almodóvar

IMDB: http://www.imdb.com/title/tt0287467/


Amor ou obsessão? Piedade ou merecimento? Justiça ou injustiça?

Essas são as possibilidades que são jogadas sem a mínima vergonha ou pudor pelo diretor na cara dos espectadores ao final do filme. O interessante é que todas as provas são mostradas ao longo da narrativa para que cada um tome a sua decisão –  algumas explícitas, algumas subentendidas e/ou dedutíveis, mas todas fazendo parte de um grande microcosmo emocional que norteia o principal protagonista da história. “Fale com ela” é um filme que mexe com o psicológico não só dos personagens, mas também dos espectadores, ao retratar situações complexas e oferecer saídas nem sempre salutares. Isso é obra de um tal Pedro Almodóvar! Muitos não gostam de seus exageros e ousadias, mas não tem como negativar “Fale com ela”, pois há elementos que agradam a todos os tipos de críticos. Em minha humilde opinião, essa é a obra-prima desse gênio do cinema espanhol e mundial.

O filme trata do amor e da amizade, a partir da historia de dois homens cujas vidas se cruzam em um hospital onde estão internadas as mulheres que eles amam. O primeiro é Benigno, o enfermeiro de Alícia, em coma há quatro anos. O outro é Marco, um jornalista que vela por sua amada, Lydia – atingida na cabeça por um touro, durante uma tourada. Diante desse cenário, muita coisa acontece, e, dentre elas, um crime bárbaro. A maneira como a história é contada abre até a possibilidade de o espectador absolver o criminoso, mas há muita subjetividade envolvida nisso, que é automaticamente passada para as pessoas que assistem ao filme.

O indicativo de que o roteiro do filme em tela é espetacular é a conquista do Oscar de melhor roteiro original. É literalmente um feito, pois raramente filmes não americanos ganham prêmios diferentes do Oscar de melhor filme estrangeiro. O roteiro “planta” dúvidas em relação aos personagens principais para, depois de muitas idas e vindas, colher respostas muitas vezes não esperadas. Isso torna o filme deveras misterioso e imprevisível. Benigno, o enfermeiro, suscita dúvidas quanto a sua sexualidade, sua sanidade mental e, posteriormente, seu caráter. Marco, o escritor, suscita dúvidas quanto a seu passado e suas expectativas. O destino entrelaça as vidas desses dois homens, através de uma mesma situação potencialmente desesperadora – o coma de suas amadas -, porém, um amor é platônico e verdadeiro, com um viés obsessivo, e o outro é no mínimo duvidoso, apesar de apresentar um quê de sinceridade. A troca de experiências entre os dois e o desenvolvimento de uma bela amizade são alguns dos poucos acontecimentos dotados de alguma leveza na narrativa. A grande maioria dos fatos são controversos e/ou polêmicos. É a tal ousadia do diretor aludida no primeiro parágrafo.

Almodóvar prepara o espírito dos espectadores para os fatos vindouros, ao tratar de alguns temas que tomarão corpo à medida que os minutos vão passando, mas muitos deles passam despercebidos. Mesmo assim, as surpresas são inevitáveis. Aliás, as reviravoltas são abundantes, e isso é uma marca registrada do diretor, entre outras. Um grande exemplo de como esse cineasta espanhol é diferenciado, é a cena do crime, que comentei no segundo parágrafo. Nunca assisti em um filme a um crime mostrado de uma maneira tão kafkiana. Um crime hediondo, pelo menos no Brasil, cuja execução não é mostrada, e, em vez de chocar o público com um ato selvagem, o diretor utiliza a metalinguagem, ao mostrar uma parte de um filme fictício chamado “O amante minguado”, que, diga-se de passagem, é engraçadíssimo e, hiperbolizando minha opinião, define a palavra surreal. Um cômico absurdo utilizado para mostrar uma trágica realidade. Um curioso e corajoso artifício narrativo tirado da manga por Almodóvar.

No fim das contas, basicamente temos uma história de amor e solidão dentro de uma narrativa complexa, na qual a comunicação tem importância primordial. Separei algumas frases ditas por Benigno que exemplificam o que comentei: “É preciso prestar muita atenção às mulheres; falar com elas e dar alguma atenção de vez em quando. Acariciá-las e lembrar-lhes que estão vivas e têm importância”. Falar com elas faz toda a diferença. No caso do filme, é a diferença entre a vida e a morte. Vocês verão!

Obs.: A trilha sonora cantada e tocada é simplesmente excepcional.

O trailer, com legendas em português, segue abaixo.

Adriano Zumba


 

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