Padmaavat (2018)

País: Índia

Duração: 2 h e 44 min

Gêneros: Drama, história, romance

Diretor: Sanjay Leela Bhansali

IMDB: http://www.imdb.com/title/tt5935704/


Segundo a Wikipedia, liberdade de expressão é apanágio da natureza racional do indivíduo e é o direito de qualquer um manifestar, livremente, opiniões, ideias e pensamentos pessoais sem medo de retaliação ou censura por parte do governo ou de outros membros da sociedade. Comecei o texto com essa definição porque, apesar de ser uma característica do mundo moderno, a liberdade de expressão ainda sofre ataques de toda natureza, principalmente quando há motivações escusas por trás deles. Saliento isso por toda polêmica que o filme em tela causou na Índia, por conta de um sonho amoroso/erótico que um dos personagens, o sultão Alauddin, que é muçulmano, tem com a rainha Padmaavat, que é hindu. Trata-se de uma narrativa com viés histórico, adaptada a partir de um poema do ano de 1540, porém, também com um caráter ficcional, pois, apesar de Padmaavat ser tratada como uma divindade no país, assume igualmente uma condição de lenda, pela ausência de outros registros literários sobre ela. Houve manifestações de cunho religioso de extremistas da casta Rajapute – mesma casta da rainha – contra a cena aludida, e o aproveitamento da iminente comoção generalizada por uma parte da classe política da Índia que atingiu seu ápice quando um político fixou uma vultosa “recompensa” pelas cabeças do diretor Sanjay Leela Bhansali e da intérprete de Padmaavat, a famosa atriz de Bollywood, Deepika Padukone. Sem entrar no mérito dessa questão indiana, pois não me diz respeito, moro no Brasil e vejo bastantes semelhanças entre o tratamento político do caso em tela e o caso do assassinato da vereadora Marielle Franco, no Rio de Janeiro, que, recentemente, ficou conhecido em todo o mundo. Motivações religiosas são mais bem aceitas, apesar de muitas vezes serem absurdas e hiperbolizadas na Índia, pois estão entranhadas na cultura e tradições de seu povo. Politizar os fatos denota oportunismo e manipulação da população. É a política sem escrúpulos que revela a podridão que existe no meio por visar apenas ao poder. Melhor dissecar o filme, que é o objetivo desse post, pois política não me traz bons pensamentos – só me lembra corrupção e desonestidade.

A sinopse, retirada da internet, é a seguinte: “Na era medieval em Rajasthan, situado no norte da Índia, a rainha Rani Padmavati (Deepika Padukone) é casada com um nobre rei Maharawal Ratan Singh (Shahid Kapoor) e vive em uma próspera fortaleza com seus súditos. Alauddin Khilji (Ranveer Singh), um ambicioso sultão, descobre a beleza de Padmavati e desenvolve um amor obsessivo pela Rainha de Mewar.”

Padmaavat” é o típico filme indiano que poderia perfeitamente possuir uma narrativa mais apoteótica, repleta de exageros  e extravagâncias, como Baahubali, porém, para a satisfação dos amantes do cinema, tais características só devem ser atribuídas à ambientação visual do filme – cenários, figurino, fotografia, etc. -, que é suntuosa e excepcional. É um deleite para os olhos dos espectadores. Em relação a esses aspectos técnicos, o filme, indubitavelmente, é um exagero de qualidade. O roteiro, que, na minha opinião, é o componente de uma obra cinematográfica que deve sempre se sobressair, em nome da excelência, acompanha em partes o primor aludido anteriormente, pois, em determinados momentos, assume um caráter muito burocrático – principalmente na interação entre o rei e o sultão – e se torna um tanto quanto enfadonho, porém, há outros pontos de interesse que compensam essas passagens “descartáveis”. O poder intrínseco à rainha, ainda que oculto, chama a atenção, pelo caráter secundário – e até figurativo –  que as mulheres possuem em narrativas épicas, pois os holofotes recaem sempre em reis, príncipes, sultões, faraós e guerreiros em geral. Seu maior atributo é a beleza e suas maiores estratégias de combate são sua honra, dignidade e o amor por seu rei e marido.

Mesmo tendo um esquema narrativo comum, com a apresentação dos personagens, a identificação de um fato gerador de discórdia – a cobiça pela beleza da rainha – e um posterior conflito – ou guerra -, a maneira como tudo isso é apresentado é o diferencial do filme em relação a outros filmes de todo o mundo – principalmente os americanos -, que seguem a mesma rota narrativa. Rotulo essa maneira de “o jeito indiano de fazer cinema”: personagens chamativos – mesmo os vilões -; a presença do amor, sempre que possível, mesmo que nas entrelinhas; as cenas de música que proporcionam um show à parte; a presença de vários gêneros cinematográficos em uma única obra – o tal gênero masala -; o apreço pela excelência visual, etc. “Padmaavat” não é apenas mais um filme masala, é uma poesia audiovisual feminina, na qual os homens denotam força física e as mulheres, força espiritual.

Como não destacar a atuação de Ranveer Singh como o sultão Alauddin? É absolutamente espetacular, por mostrar com perfeição, até em seus olhos, a insanidade e a cobiça que preenchem sua alma. Um personagem que chama a atenção por seus “galões de psicopatia” e sua construção pelo artista – apesar de representar o mal. Ele puxa as atenções para si sempre que está em cena, ao passo que o rei, que representa o bem, é um tanto quanto apagado, por seu comportamento ético e ligado às características de sua casta. O traiçoeiro sultão malvado, definitivamente, abrilhanta mais a narrativa do que o insosso rei apaixonado.

Temos um filme que, a princípio, desperta o interesse pela polêmica, contudo, à medida que assistimos ao desenrolar da história, constatamos que “Padmaavat” proporciona uma experiência cinematográfica bastante apreciável. Que sua qualidade seja também tornada pública, pois filmes acima da média estão cada vez mais raros, e polêmicas, conflitos e intolerância estão cada vez mais em evidência.

O trailer segue abaixo.

Adriano Zumba


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