A favorita (2018)

Título original: The favourite

Países: Irlanda, Reino Unidos, Estados Unidos

Duração: 1 h e 59 min

Gêneros: Biografia, comédia, drama, história

Elenco principal: Olivia Colman, Emma Stone, Rachel Weisz

Diretor: Yorgos Lanthimos

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt5083738/


“Favoritismo é uma brisa que muda de lado a toda hora.”


Antes de qualquer comentário sobre o filme em tela, cabe destacar que a filmografia do diretor Yorgos Lanthimos permite que ele receba o adjetivo excêntrico como uma de suas características mais marcantes. Quem já assistiu a “Dente Canino” (2009), “O lagosta” (2015) ou “O sacrifício do cervo sagrado” (2017), que julgo serem seus filmes mais famosos, percebe claramente que seu estilo de fazer cinema é um ponto fora da curva, é algo fora do convencional. Seus filmes são metáforas audiovisuais muitas vezes não inteligíveis por espectadores menos familiarizados com esse viés, entretanto, em “A favorita“, temos um Lanthimos mais comedido em seus devaneios e mais preocupado com o refinamento de sua produção, apesar de percebemos em algumas passagens o seu toque diferenciado – as cenas da corrida de patos e da malhação do bobo da corte são memoráveis. Dito isto, temos um filme que se destaca por diversos aspectos componentes de uma obra cinematográfica: elenco e atuações; direção, sobre a qual posso destacar o estilo de filmagem e a utilização de recursos incomuns; montagem; som, fotografia; figurino; roteiro; cenários; direção de arte; etc. Não tem sido à toa a grande quantidade de premiações e indicações nos mais diversos festivais de cinema ao redor do mundo. Mesmo que o espectador não goste da história, o grau de excelência em quase tudo é tão alto, que vale muito a pena a jornada.

A sinopse, retirada da internet e com adaptações, é a seguinte: “Século XVIII. Inglaterra está em guerra com a França. A frágil rainha Anne (Olivia Colman) ocupa o trono, e sua amiga próxima, Lady Sarah (Rachel Weisz) governa em seu nome enquanto cuida da saúde e do temperamento da rainha. Quando uma nova empregada, Abigail (Emma Stone), chega à corte, seu charme a aproxima de Sarah, que a coloca sob sua égide e Abigail vê isso como a chance de retornar ao seu status aristocrata de outrora. Conforme as políticas de guerra tomam cada vez mais tempo de Sarah, Abigail começa a se aproximar cada vez mais da rainha. Essa amizade a deixa mais próxima de alcançar seus objetivos, e ela não deixará nenhuma mulher, homem ou políticas ficarem em seu caminho.”

Mesmo com tanta excelência reunida, considero o roteiro como o calcanhar de Aquiles de “A favorita“, apesar de também ter se destacado nesse ponto. Digamos que é o aspecto menos destacado entre os destacados. O roteiro pode ser comparado, em relação à capacidade de obter interesse de seu público, a uma parábola invertida, isto é, há um interesse crescente até mais ou menos a metade do filme, e depois há um declínio até o desfecho, que, por sinal, é muito pobre. Temos a comédia e o drama caminhando lado a lado. Há um sarcasmo e uma irreverência extravagantes, embutidos principalmente no lado cômico da narrativa, juntamente com um viés sexual que mantém a mais forte chama narrativa acesa enquanto perduram. É tudo muito intenso mas, quando as situações adquirem uma dramaticidade maior, o roteiro perde força pela superficialidade da abordagem e a falta de ousadia, que historicamente nunca faltou na filmografia de Lanthimos. É bom lembrar que o roteiro não foi escrito pelo diretor. No entanto, considero essa observação apenas um detalhe que serve para informar que a parte cômica é melhor que a parte dramática do filme, sem prejuízo do todo, que é bastante apreciável, apesar de ser simples e previsível em sua essência.

Há duas linhas narrativas na obra: a relação entre as 3 protagonistas e a uma guerra entre Inglaterra e França. A primeira é o foco total e absoluto do filme, enquanto a segunda serve apenas como subterfúgio para divergências entre os personagens. Para que a estratégia de privilegiar as relações entre Anne, Sarah e Abgail funcione perfeitamente, há de haver muita entrega e competência de suas intérpretes, e realmente essas características são facilmente identificadas em todas elas, principalmente em Olivia Colman – a Rainha -, que entrega um verdadeiro show de atuação – ainda teve crítico que elegeu Lady Gaga como melhor atriz no Critic’s Choice Awards. A complexidade de seu personagem é tamanha, pois a Rainha varia de humor e comportamento ao longo de todo o filme, além de carregar consigo uma história trágica e triste, que uma eventual excelência interpretativa deve ser exaltada com veemência e louvor. As premiações individuais de Colman falam por si mesmas. Gostaria realmente de saber qual o critério para a identificação de quem é principal ou coadjuvante dentre as três, pois elas têm a mesma importância e as atenções do roteiro, como já salientado, são direcionadas para a relação entre as três personagens. Na verdade, no enredo, as três se complementam e necessitam umas das outras para brilhar.

A favorita” é uma obra baseada em uma história real de intriga, ciúmes e traição, que exibe um tipo de humor deliciosamente inteligente, malicioso, sombrio, obsceno e luxurioso, advindo, dentre outras origens, da tragédia, e repleta de travessuras morais e sexuais. Mostra a podridão da aristocracia, a futilidade do cotidiano, o desejo pelo poder e o amor, sem se furtar de abordar e humanizar a dificuldade de lidar com os problemas da vida, que podem recair sobre qualquer pessoa, inclusive aquelas mais poderosas. Essa cínica alegoria cinematográfica, dotada de uma frivolidade que salta aos olhos, pelas almas envolvidas na narrativa, mesmo em locações tão exuberantes e contando com personagens tão elegantemente trajados, retrata que, independentemente de classe social, o pior do ser humano pode se exteriorizar a qualquer momento, depende apenas da ambição que cada um carrega consigo. Essa película é um prodígio da sétima arte no ano de 2018. Talvez, a favorita de muita gente.

O trailer, com legendas em português, segue abaixo.

Adriano Zumba


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