Maestro | Crítica
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  • Foto do escritorMessias Adriano

Maestro | Crítica

Atualizado: 21 de dez. de 2023


Bernstein tacando o pau e suando

Após estrear na função de diretor em Nasce Uma Estrela, o segundo longa de Bradley Cooper na direção é a cinebiografia do maestro norte-americano Leonard Bernstein, que ainda contou com a ajuda dos legendários Martin Scorsese e Steven Spielberg como produtores. Scorsese e Spielberg, inclusive, eram inicialmente as pessoas em negociação para comandar a obra. Ainda houve na produção o envolvimento de Jake Gyllenhaal na briga pelos direitos da cinebiografia, que acabou parando nas mãos do ator de Se Beber Não Case! e Sniper Americano. Aparentemente, portanto, um projeto disputado em Hollywood, tendo Cooper demonstrado seu prestígio na indústria ao ser escolhido como comandante.


Ao longo de 129 minutos, o filme caminha por pontos da vida pessoal e carreira de Leonard Bernstein, um dos maiores condutores e compositores que a música já conheceu, com obras que vão do erudito a musicais clássicos da Broadway e do cinema, como Amor, Sublime Amor. Em Maestro, o relacionamento com a esposa Felicia Montalegre (Carey Mulligan) é posto no centro emocional da trama e que em determinado momento motivará conflitos pela complexidade que as situações irão impor.


Não há menção à maior aluna do compositor (Lydia Tár), nem Shallow em versão orquestrada, mas Cooper consegue provar mais uma vez suas habilidades como diretor, seja nos pequenos detalhes, ou em demonstrações mais claras de vigor. É divertido, por exemplo, notar que a cortina da janela do primeiro quarto no qual vemos o protagonista pode ser facilmente confundida com as cortinas de um palco de um teatro. O desenrolar dessa mesma cena mostra uma vitalidade enérgica na câmera que passeia rapidamente em transições vertiginosas, logo após o protagonista receber a ligação informando que ele irá reger o primeiro grande concerto de sua vida por um acaso do destino (o condutor principal ficara doente).


Esse longo plano-sequência simulado, aliás, pode soar aos desavisados como virtuosismo gratuito, desnecessário. No entanto, o exagero veloz faz total sentido para servir à trama: naquele momento, o protagonista está com 25 anos de idade, cheio de energia e recebendo a notícia que mudará sua carreira. Da mesma forma, as passagens musicais pertencem a um ambiente onírico e esperançoso do rapaz, que vê com alegria um mundo de possibilidades pronto para ser devorado. À medida que o personagem amadurece, notem que não há mais tantos movimentos assim. O furor da juventude foi substituído por planos mais estáticos e comportados.

Bradley Cooper como Bernstein

O trabalho sonoro dá quase sempre um maior valor aos silêncios em substituição a diálogos expositivos. Na cena em que Leonard conversa com a filha sobre os boatos que ela ouviu, há um longo olhar que permeia uma “quase confissão”. Na passagem de Leonard e Felicia discutindo em quarto, além da mise-en-scène bem trabalhada para distanciar fisicamente os dois personagens (ela encostada na janela em um canto do quadro, ele na poltrona no outro) só se percebe o desfile de carros passando pela janela quando a conversa é encerrada, com os dois voltando ao mundo pelo chamado dos filhos. Só aí os sons externos são ouvidos.


A maquiagem, feita por membros já responsáveis por bons trabalhos como O Destino de Uma Nação, O Escândalo e O Curioso Caso de Benjamin Button, não impressiona somente pela similaridade com o personagem real nos momentos de Bernstein mais velho, mas também pelo fato de mostrar diversas passagens da vida das mesmas pessoas sem jamais parecer falso: da juventude luminosa dos 25 anos, passando pelas marcas no rosto de alguém na casa dos 40, aos cabelos brancos e rugas mais profundas de alguém com 60 primaveras.

Bradley Cooper como Leonard Bernstein e Carey Mulligan

Mas mesmo que Bernstein seja o claro protagonista admirado e dedicado (Cooper faz questão de mostrá-lo tão suado quanto um rockstar em alguns concertos que ele rege), o filme também gravita em torno de Felicia. A relação de amor e confiança entre os dois é bonita e retratada além dos diálogos assertivos de duas pessoas maduras, sendo curioso notar os paralelos que são estabelecidos na narrativa em torno da mulher: em uma das primeiras apresentações do maestro, enquanto é aplaudido, Bernstein sai do palco, vai à coxia e beija a esposa, gesto que se repete depois na apresentação do terço final, em um concerto feito numa igreja e após alguns percalços entre os dois. A força dessa relação não funcionaria, no entanto, se a personagem feminina não fosse interpretada por alguém de tanto talento como Carrey Mulligan, que transmite amor, dúvida ou desconforto com pequenas expressões, ou vergonha e tristeza cortantes ao baixar a cabeça e pôr a mão na testa em determinada cena, quando a personagem está doente.


Melodramático além da conta em determinados momentos (a fala de Felicia no concerto da igreja talvez tenha sido um tantinho demais, assim como a pequena apresentação e abraço coletivo da família em casa), um dos pontos que faz Maestro funcionar é o foco na relação do casal, evitando ser um filme-Wikipédia sobre a obra do artista, com diversas informações jogadas apressadamente. Cooper alcança um bom equilíbrio entre o drama e a exaltação da obra do músico, com uma preferência para a primeira opção e uma segurança de alguém com bastante potencial na direção.


Por buscar tanto um reconhecimento por trás das câmeras, talvez o diretor e ator se inspire justamente em uma das falas do filme, a da entrevista de Bernstein que fala sobre as diferenças entre ser um compositor musical e um condutor de orquestra, entre alguém nos holofotes e alguém que trabalha de forma mais silenciosa. Seja na frente das lentes ou por trás delas, ele está indo bem.


 

Nota: 4/5

nota 4 de 5 estrelas

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