filmow.com/usuario/joaodiegoleie0b6fc34416849b4
    Você está em
  1. > Home
  2. > Usuários
  3. > joaodiegoleie0b6fc34416849b4
36 years Curitiba - (BRA)
Usuário desde Dezembro de 2015
Grau de compatibilidade cinéfila
Baseado em 0 avaliações em comum

Jornalista, Crítico de Cinema e Trotskysta.

Últimas opiniões enviadas

  • João Diego

    O PRIMEIRO DIA DA MINHA VIDA — 2024 — CRÍTICA

    Conheço pouco sobre as culturas onde terminar com a própria vida é algo aceitável, mesmo assim, quando isso ocorre, a ação precisa de um contexto. Nos filmes medievais japoneses, conhecemos o ritual do Seppuku ou Haraquiri, quando os samurais, diante de uma desonra, encontravam na morte uma forma de perdão ou provação do seu valor. É a lembrança mais clara que tenho sobre uma cultura aceitar esse ato, mas mesmo assim, como observamos, a permissão está restrita a uma categoria de guerreiros.

    Na civilização ocidental a prática é condenada, mal vista, muito pela influência religiosa cristã em nossa cultura. O ato pode ser visto de inúmeras maneiras, mas majoritariamente de forma negativa e cheios de tabus. O filme do cineasta Paolo Genovese trata sobre isso, entre todas as formas nas quais poderíamos pensar no destino de quem põe fim à própria vida, a proposta de Genovese é, talvez, a mais otimista. Sem vínculo a um deus ou a uma religião, sem relação alguma com pecado, com a única preocupação em entender quem decide deixar o palco mais cedo. O cineasta nos fala da dor, da vontade e da necessidade de empatia com quem sofre dessa vontade.

    O roteiro assinado por Genovese, Isabella Aguilar, Paolo Costella e Rolando Ravello é baseado no livro de autoria do próprio diretor. A trama se passa em Roma e tem um personagem misterioso, interpretado por Toni Servillo. Ele reúne quatro pessoas que não se conhecem. Inicialmente, nas primeiras cenas e com a chuva, pensei ser um filme sobre máfia, algo assim, mas tudo vai ficando estranho e demoramos um pouco para perceber onde os personagens realmente estão e qual a temática do filme.

    Apesar de estarem mortos, não existe nenhuma referência explícita de imediato. Os espaços são todos de uma cidade: ruas, o hotel, auditório, bares e o cinema abandonado são parte de um cenário urbano. Caberia aqui uma ironia? Não sei, acredito que o sentido esteja melhor interligado com o destino dos personagens, quem fica entre os vivos? Aqueles que não morreram naturalmente. Essa escolha dos ambientes aparenta uma certa frieza, mas é uma forma não religiosa de construir o pós-vida. Apesar de em uma cena vemos uma igreja, a religião aqui é inexistente.

    Os cenários preenchem o filme de realismo. A parte da conciliação do grupo, ao se prepararem para o desfecho, ocorre em um almoço, em uma casa próxima à praia. Um ambiente diferente para não vivos decidirem sobre continuar ou não a viver. O único momento, “mágico” é com Daniele (Gabriele Cristini, de 12 anos), o restante das cenas, apesar da estranheza da situação e do fato deles serem invisíveis, não possuem nenhuma ação “sobrenatural”.

    O personagem misterioso de Sevillo é um terapeuta do “além”, não um barqueiro da morte. Ele tenta ajudar Arianna (Margherita Buy) a viver o luto e a ver a filha, nos momentos e nos lugares quais ela viveu. Para Emília (Sara Serraiocco) ele pede uma segunda chance, tenta ajudá-la a recuperar a sua autoconfiança e parar de se esconder. Napoleone (Valerio Mastandrea) um coach motivador que não consegue mais se motivar, ele tenta mostrar um sentido.

    Eles precisam estar entre os vivos, pois assim podem refletir sobre o quanto o ato, mesmo compreensível, representa uma perda enorme para muitas pessoas e para eles mesmos. Logo, cada personagem carrega uma dor ou angústia de nossa atual sociedade. É um filme bonito, sensível, sofre com alguns diálogos longos, mas tem Toni Sevillo, quem segura o leme e sempre nos mostra uma atuação excelente. Diferente de muitos atores, ele possui várias faces, encarna diferente corpos e gostamos de todos.

    João Diego Leite ou “Juan Diego” é crítico de cinema e trotskysta

    Você precisa estar logado para comentar. Fazer login.
  • João Diego

    MONEYBOYS— 2023 — CRÍTICA

    Fei (Ko Chen-Tung) quer proteger o primo, por isso o afasta, não o quer envolvido em suas atividades. Difícil convencê-lo, pois as opções não são nada atraentes, além de muito mais restritas e penosas. Não importa o quanto criminosa e ilegal seja o estilo de vida de Fei, entre trabalhar 12 horas por dia em uma fábrica e ser um garoto de programa, não existem dúvidas sobre qual é a melhor opção. Diante da vista da cidade, no jardim da varanda de Fei, Long (Yufan Bai), observa como tudo é limpo e bonito e toma a decisão definitiva. Os dois trabalhos exploram seu corpo, a diferença é que se prostituindo ele não dorme em um colchão duro, nem trabalha em um lugar sujo. O menino pobre da na zona rural da Taiwan, elege a opção que privilegia a vista diante de seus olhos.

    Me incomodou um pouco, esse aparente encanto da prostituição, mas conforme acompanhamos Fei, em sua jornada pela sobrevivência, o encanto parece perder cada vez mais o brilho. Pouco a pouco conhecemos a realidade dos “moneyboys”, homens jovens que se prostituem para outros homens. Fiquei pensando enquanto lugares do mundo, a homossexualidade ainda é crime. Na situação apresentada no filme, a prostituição parece como um meio de fugir da vida miserável do interior, mas também permite aos personagens viverem suas sexualidades. A cena no bar, quando conversam sobre os motivos de não voltarem para casa ou como, ao voltar, mentem sobre sua vida na cidade, demonstra a angústia sofrida pelos personagens.

    Existe também uma oposição entre os espaços, enquanto todo o apartamento e lugares frequentados por Fei e Long são limpos e bem iluminados, a vila e os lugares fora do ambiente da prostituição é suja. Não me parece existir um julgamento moral por parte do cineasta, em colocar a prostituição como limpo, mas condenável, pois lhe deixa sujo internamente. A proposta dessa oposição entre ambientes está mais conectada à necessidade de fuga, encontrar esses lugares pobres e sujos, reforça os sentimentos dos personagens pela necessidade de fugir.

    Gosto de como a fotografia coloca nossos olhos em posição de esperar a saída ou entrada no quadro, de como a câmera parada, em ângulos normais ou na altura da cintura, nos provoca uma expectativa. De como o personagem principal, com poucas falas, em alguns momentos não está centralizado e de como nossa atenção é desviada à medida que os personagens se movimentam no quadro. As cenas com os personagens de costas são muito interessantes para observar como nossa atenção percebe o personagem, mas acompanha a ação ao redor.

    O filme, dirigido e roteirizado por C.B. Yi, ao fim, trata sobre a jornada de Fei, entre duas paixões, entre a aceitação da família, que vive de seu dinheiro, mas não apoia seu modo de vida. O grande ponto da obra está na montagem, que desde início faz recortes e deixa situações subentendidas. Não responde todas as perguntas, mas estimula nossa curiosidade. Os primeiros momentos unem as sequências, como a nossa memória, espaçadamente, o vínculo entre elas é o personagem, não temos nada esclarecido, quando anos se passam. Isso nos deixa um pouco confusos, pois tudo parece estar acelerado na vida de Fei. No segundo ato, tudo se torna mais tranquilo, o tempo não tem saltos e ele é confrontado com seu passado e presente. Tudo, em uma história cheia de corações partidos de jovens sem perspectivas de uma mudança em suas vidas.

    João Diego Leite ou “Juan Diego” é crítico de cinema e trotskysta

    Você precisa estar logado para comentar. Fazer login.
  • João Diego

    AS BESTAS — 2024 — CRÍTICA

    O grande motivador dos personagens, no filme, são seus interesses econômicos. Não importa como eles o apresentam, pode ser um projeto cheio de sonhos e sentimentos ou apenas uma fuga de uma vida miserável. O motivador do conflito é o desejo de uma vida melhor. Sem consciência disso, eles encarnam os interesses estrangeiros e representam a transformação capitalista da vila. Os noruegueses, ao construir turbinas eólicas para gerar energia limpa para o desenvolvimento sustentável e econômico, expulsam os moradores por uns trocados e os forçam ao êxodo rural. Os franceses enxergam o lugar como um paraíso a ser preservado, criam uma horta agroecológica e compram casas, as reformam e pretendem atrair novos moradores. Um projeto de gentrificação. As duas propostas invisibilizam o modo de vida dos moradores originais.

    Nosso olhar tende a ser mais simpático ao casal francês Antoine (Denis Ménochet) e Olga (Marina Foïs), os personagens escolhidos pelo cineasta Rodrigo Sorogoyen para contar a história. Isso torna os irmãos Anta (Luis Zahera e Diego Anido) vilões? Talvez, tudo depende da nossa perspectiva ao observar. Todas as ações cometidas por eles não são fruto de uma personalidade perversa, mas da corrupção econômica e a cobiça por uma vida melhor. Esse pensamento é expresso pelo irmão mais velho a Antoine, no bar, “não sabíamos que eramos miseráveis, até nos mostrarem o quanto somos”. Todo o sentimento de xenofobia, todo o ódio, toda a sabotagem feita contra o casal estrangeiro é motivada por eles impedirem a vila de ser transformada em um campo de energia eólica. Enquanto os dois fedem a merda de vaca, o casal, vizinho de porta, exibe sua prosperidade.

    Isso torna a convivência mais insuportável, não há como eles se esconderem ou se ignorarem. A vila é pequena, todos se conhecem, vão nos mesmos lugares. Querendo ou não, acabam se esbarrando, apenas o caminhar na rua pode ser tomado por um dos lados, como uma provocação. O Bar é o espaço onde as tensões são elevadas, onde os personagens anunciam os próximos conflitos. O irmão mais velho está sempre sentado na mesa de dominó, no centro do nosso olhar e com todos os personagens voltados para ele, com exceção de Antoine, sempre no balcão de costas para nós e para os personagens. Temos uma mudança, quando senta na mesa do jogo e quando confronta os irmãos. O vemos de frente então, do lado direito do balcão, enquanto os irmãos do lado esquerdo. O convite para beber os retira do seu lugar habitual, muda nosso ponto de vista, os coloca no lugar escolhido por Antoine, que tem uma postura amigável e complacente. Diferente do irmão mais velho, quando em um momento vira de costas, demonstrando a recusa em entender e aceitar as motivações do vizinho.

    Além do espaço, observamos como os elementos de cena são importantes para marcar determinadas ações, atitudes ou traços de personalidade. Quando o vizinho, que é amigo, chega para fazer uma entrega, os dois estão trabalhando, Olga o convida para tomar um café e oferece ao marido, que nega. Aqui ele não aceita por querer terminar o trabalho, por estar absorvido pelo cuidado da horta. Em outro momento, quando o sobrinho do vizinho vem os convencer a aceitar a proposta de venda, a mulher lhe entrega um café, enquanto Antoine novamente o nega. Dessa vez por não querer perder tempo com uma discussão resolvida para ele. O único momento em que vemos tomando café é quando acorda pela manhã. Uma característica curiosa é Olga sempre estar lendo, apesar de Antoine se arrogar ser mais inteligente e superior, ela é quem parece ser dedicada ao estudo. Em compensação, quando ela assume o lugar do marido, não a vemos mais com livros.

    Além do livro e do café, podemos destacar o papel de dois objetos, a arma e câmera. Os dois não cumprem o papel para qual deveriam ser utilizados, mas reforçam os sentimentos e sensações de cada ação. A câmera, durante todo o tempo, age como um escudo para Antoine, enquanto a arma ostenta o perigo dos irmãos Anta. O fato de não terem servido aos fins originais, não invalida os dois objetos na progressão da narrativa. Eles adquirem importância no roteiro, escrito por Sorogoyen em conjunto com Isabel Peña, justamente por não servirem de maneira óbvia a resolução dos problemas.

    Por fugir das soluções simples e óbvias, o filme consegue nos despertar o interessante. Nunca vemos indícios de culpa dos vizinhos pelas sabotagens, vemos as provocações, os enfrentamentos, mas não os vemos escondidos planejando envenenar a água ou mijar na cadeira. Tudo indica a culpa dos dois, mas não se tem provas. Essa forma de contar a história nos coloca em uma posição de ver apenas aquilo que Olga e Antoine veem, apenas aquilo que os personagens principais enxergam. Isso explica vermos os irmãos distantes do ponto de vista do casal.

    Essa forma de filmar não muda quando Olga assume o papel do marido. Durante toda a primeira parte do filme é uma mulher calada, lê e o ajuda nos afazeres do sítio, faz comentários, mas não tem protagonismo algum nas disputas. Ao assumir as rédeas do local é absorvida pelo trabalho e pelo desejo de justiça, passa os dias atrás de pistas para incriminar os vizinhos e de dos cuidados com os animais, plantas e a feira. O olhar agora é dividido com a filha. Essa parte, torna os irmãos ainda mais ameaçadores, ainda mais bestas, pois a figura masculina parecia fazer frente a ameaça, agora duas mulheres parecem presas nas garras de predadores. Um sentimento que acaba sendo frustrado, pois Olga não só se mostra forte, como se mostra mais inteligente.

    Ao fim, temos uma obra construída de uma forma a nos despertar vários questionamentos, a nos suscitar vários sentimentos, mas não se preocupar em nos dar certeza de nada, a não ser da força e da coragem das mulheres.

    Filme visto na Cabine de Imprensa, estreia dia 25 de janeiro nos cinemas. Vencedor do prêmio Cesar e selecionado para Cannes, em 2023.

    João Diego Leite ou “Juan Diego” é crítico de cinema e trotskysta

    Você precisa estar logado para comentar. Fazer login.
  • Nenhum recado para João Diego.

Este site usa cookies para oferecer a melhor experiência possível. Ao navegar em nosso site, você concorda com o uso de cookies.

Se você precisar de mais informações e / ou não quiser que os cookies sejam colocados ao usar o site, visite a página da Política de Privacidade.