Você está em
  1. > Home
  2. > Usuários
  3. > jptito
39 years, Goiânia (BRA)
Usuário desde Agosto de 2015
Grau de compatibilidade cinéfila
Baseado em 0 avaliações em comum

Últimas opiniões enviadas

  • João Paulo

    O Sean Baker é aquele cara que fez um filme inteiro usando um iPhone 5s e uma engenhoca como adaptador de lentes, em 2015. Saiu "Tangerine" (2015), que faturou uma porção de prêmios no circuito independente (o Independent Spirit e o Gotham Independent Film Awards são os de maior destaque, mas também chamou a atenção em Sundance). Essa, aliás, é a veia do diretor: a produção independente de baixo orçamento, com qualidade inversamente proporcional.

    Em "Projeto Flórida", apesar de tecnicamente mais bem elaborado, Baker mantém seu espírito. Depois de algum tempo de pesquisa entre trabalhadores e moradores dos arredores dos grandes parques da Disney, em Orlando, saiu com essa análise profunda da vida barata que circunda aquele universo mágico capitalista.

    Rodado em 35 milímetros, o filme se aproxima de Moonee, uma garotinha (interpretada magistralmente pela Brooklyn Price) que mora com a mãe num hotel barato no entorno da Disneylândia. O hotel, ironicamente, se chama "Magic Castle Inn", gerenciado pelo Bobby (papel que rendeu a Willem Dafoe uma indicação ao Oscar na categoria de melhor ator coadjuvante.)

    Moonee e seus coleguinhas atazanam a vida dos vizinhos com suas molecagens. Criança é cruel até quando brinca, todo mundo sabe disso. A falta de malícia existe para bem e para mal, o bom senso é quase zero. E se por um lado acompanhamos a garotinha inescrupulosamente cuspindo no carro da vizinha que mora no hotel ao lado (que se chama "Futureland". Barato e irônico), com a mesma facilidade ela é capaz de fazer amizade com a filha da vítima. Essa facilidade em relevar o contexto e seguir vivendo - visto de modo mais claro nessas pequenas aventuras do dia a dia infantil - abre a porta para que enxerguemos a verdadeira matéria do filme: a condição precária em que vivem aquelas pessoas, sem instrução, grana contada, sem sustentação emocional e afetiva, e a força que a criançada encontra para crescer e se desenvolver à parte do caos.

    De frente para a tela, estamos acostumados a uma visão mais extremada da aridez nas relações sociais. A pobreza é aquela sintetizada como ausência total de recursos básicos como comida, moradia, roupa. Aqui, o incômodo vem principalmente pelo caos emocional. Porque os recursos materiais são poucos, mas não falta comida ou roupas. A grana é curta, mas nada que um trambique bem executado não resolva. O teto pode sumir a qualquer momento, mas a amizade (ainda que turbulenta) com o gerente garante uns dias a mais de aconchego e privacidade. Mas do lado emocional, puxa-se a coberta para cobrir a cabeça, destampa-se os pés.

    Se por um lado Moonee tem o carinho que julga necessário e suficiente de sua mãe, socialmente isso pode não parecer o mais adequado. Nossos olhos, inclusive, fazem o papel de inevitável assistente social, a vasculhar cada falta de zelo de Halley (a mãe), a bagunça do quarto, a falta de vigilância e educação das crianças. E não é que Halley não seja carinhosa: ela é. Mas não do jeito que esperamos. Apenas da forma como é possível ser.

    Não vou comentar o final do filme. Mas é tocante. Contrasta com o ritmo parcialmente monótono que Baker insiste em impor durante certa parte da obra, conforme vamos nos acostumando às pequenas aventuras das crianças.

    Vivamos em que mundo for, no final das contas, a realidade bate à porta. Injusta ou não, a conta vem. E quando isso acontece, cada um foge para o castelo que lhe estiver ao alcance.

    Ps.: Vamos concordar numa coisa: Que cartaz sensacional o desse filme, hein?

    Você precisa estar logado para comentar. Fazer login.
  • João Paulo

    Os altos e baixos de Tonya Harding

    Fica bem mais interessante assistir aos Jogos Olímpicos de Inverno depois de conhecer a história de Tonya Harding, patinadora da equipe olímpica americana de 1994. A saga da brasileira Isadora Williams esse ano em PyeongChang, por exemplo, toma contornos épicos! Para quem sempre foi entusiasta da patinação no gelo então, o filme é um prato cheio.

    “Eu, Tonya” (2017) é o mais novo filme do diretor Craig Gillespie, e adota o tom de docudrama para recontar a polêmica história da atleta americana. Gillespie ficou conhecido pelo filme “Garota Ideal”, de 2007. Na verdade, não tão conhecido assim, o que o torna uma agradável surpresa dentre os lançamentos deste ano.

    No início da década de 1990, Tonya (interpretada de forma muito competente por Margot Robbie) teve uma rápida ascensão à fama depois de se destacar nas competições nacionais de patinação do gelo, tornando-se quase uma popstar. Foi a primeira mulher americana a realizar o salto triplo axel em competições.

    Adotando um visual um pouco mais rude do que as outras competidoras e optando por trilhas musicais bem menos clássicas, Harding conquistou a simpatia do público mas deixou os narizes dos juízes torcidos por distanciar-se da imagem ideal de “patinadora princesa”. Uma espécie de André Agassi do gelo (exceto pelo fato de que, no tênis, os resultados não dependem de um julgamento tão subjetivo dos árbitros).

    Ares de tribunal

    A coisa começa a tomar tons mais pessoais e dramáticos quando caminha para “o incidente”. Como todo mundo acompanhou pela imprensa na época (portanto, tecnicamente não estou dando nenhum spoiler), Tonya foi acusada de, junto com seu marido, Jeff Gillooly (encarnado pelo Sebastian Stan, o irreconhecível “Soldado Invernal” da Marvel), perpetrar ataques físicos contra sua principal concorrente, Nancy Kerrigan.

    No julgamento popular e midiático, Tonya sempre soube e teve participação ativa no ataque a Kerrigan. O filme, entretanto, tenta trazer uma nova visão ao incidente.

    É interessante notar que, apesar de se chamar “Eu, Tonya”, o filme não se reveste da visão individual da personagem Tonya Harding. Pelo contrário, toma ares de tribunal, jogando o depoimento de testemunhas na tela para patrocinar a “versão Tonya” dos fatos. Durante vários momentos, entretanto, temos a nítida impressão de que a própria Harding não tem o domínio completo da realidade que lhe seria favorável e, eventualmente, lhe absolveria das acusações sérias impostas pela imprensa.

    Assim, a obra transita de forma bastante interessante entre os depoimentos da mãe de Tonya (magnífica, Allison Janney é favoritíssima ao Oscar), o segurança pessoal Shawn Eckhart (também em atuação muito boa), o repórter e produtor Martin Maddox (Bobby Cannavale mostrando o lado da mídia na parada) e uma das treinadoras de Tonya, Diane Rawling (interpretada por Julianne Nicholson, conhecida mais no mundo das séries).

    Em certo ponto, entretanto, causa certo incômodo a tentativa do diretor de retirar qualquer autoria do discurso do filme. Sim, sabemos que a versão construída na tela não pertence a ninguém especificamente, isso foi informado logo nos créditos iniciais com os cortes no estilo entrevista. Mas não bastasse isso, os próprios personagens, no decorrer da história, assumem um tom onisciente e quebram a quarta parede, dirigindo-se diretamente ao espectador para transmitir suas impressões.

    Esse efeito utilizado mais de uma, duas ou três vezes descamba para a propaganda publicitária, tirando um pouco da credibilidade da narrativa e afastando o espectador do universo do filme. A experiência perde um pouco da imersão absoluta.

    White trash

    Um lado muito importante e pouco discutido que o filme traz também diz respeito ao racismo e à pobreza nos Estados Unidos – assunto de fundamental importância na Era Trump. Tonya era branca, pobre, violentada diuturnamente pelo namorado e desprezada pela mãe. A perfeita encarnação do conceito de “white trash”, construído desde o século 19, e que pode ser definido como as letras miúdas no contrato que dá acesso ao “sonho americano”.

    Desde a época das comunidades pobres de imigrantes europeus, segregadas pelos “verdadeiros americanos” antes da guerra civil americana em nome da pureza hereditária (a chamada “one-drop rule” ou regra da gota de sangue única, em que americanos legítimos não podiam se casar com imigrantes europeus), existe um nicho de pessoas brancas, operárias, pobres e sem instrução que enfrenta muito mais dificuldade em ascender socialmente na terra das oportunidades.

    A América não é tão grandiosa para essas pessoas. E esse discurso é brutalmente escancarado para Tonya (e para nós, inocentes espectadores) quando da fala de um dos árbitros, ao justificar uma nota baixa a uma performance da atleta: Harding não é a imagem que as pessoas querem como representante dos Estados Unidos da América. Meritocracia não é a única moeda de troca.

    “Eu, Tonya” está entre os indicados à 90ª edição do Oscar. Margot Robbie concorre na categoria de Melhor Atriz, Allison Janney na de Melhor Atriz Coadjuvante e Tatiana S. Riegel é a responsável pela indicação na categoria de Melhor Edição/Montagem. O prêmio será merecidíssimo, caso venha para qualquer uma delas.

    Com uma trilha sonora vibrante – parte do universo de Tonya da vida real – as duas horas de projeção passam voando, alternando entre momentos de euforia, melancolia e até perplexidade (essa última, quase sempre, de responsabilidade dos personagens de Stan e de Janney).

    Tonya Harding foi – e permanece – como um ponto fora da curva na história da patinação do gelo. Mas sua vida na tela nos faz lembrar que, na carreira de qualquer atleta, por mais que pareçam duros, os tombos da pista de patinação são apenas a ponta de um iceberg muito mais profundo.

    PS: Não deixe de assistir no YouTube o vídeo completo da performance real de Tonya Harding em Lillehammer, nos Jogos Olímpicos de Inverno de 1994. Emocionante.

    Você precisa estar logado para comentar. Fazer login.
  • João Paulo

    Fábula indigesta

    O novo filme do diretor sul-coreano Bong Joon-ho, “Okja”, começou a gerar alardes antes mesmo de estrear. E as polêmicas que carrega têm a ver, basicamente, com uma expressão, utilizada em dois contextos diferentes: “distribuição em massa”.

    A primeira questão surgiu no Festival de Cannes desse ano, no qual a obra concorria à Palma de Ouro. “Okja” é uma produção da rede de streaming Netflix, uma plataforma virtual que distribui suas produções de forma direta. Até o ano passado, era impossível encontrar uma produção original Netflix num cinema perto de você. Os críticos em geral e, posteriormente, a própria organização do evento passaram a questionar se um filme que não tem distribuição regular estaria apto a concorrer. Afinal, como premiar uma obra que não foi exibida em nenhum cinema?

    Dessa vez, passou batido. Quando a logo da Netflix apareceu, pela primeira vez na história, na tela de exibição do Grande Teatro Lumière do Palácio de Festivais, a plateia vaiou. Mas o filme de Bong Joon-ho foi exibido mesmo assim, e aplaudido ao final. Concorreu, mas não levou nada.

    De todo modo, levantar essa questão quanto à forma de distribuição de uma obra audiovisual serviu para questionar a própria essência dos filmes e a sua função social. Afinal, se uma obra não é amplamente distribuída e de acesso fácil a qualquer pessoa do mundo, qual a sua serventia? Para quê produzir, se não se vai exibir? A quem é conveniente elitizar o acesso à produção cinematográfica? Enfim, acertados ou não, questionamentos pipocaram para todos os lados.

    Esse tipo de polêmica não estava nos planos do diretor Joon-ho. Mas, sem dúvida nenhuma, foi um excelente marketing para outro tipo de questionamento – esse sim, pensado cuidadosamente por ele na trama do filme. A segunda polêmica envolvendo “distribuição em massa”.

    “Okja” é o nome de um superporco. “Superporco” é um animal geneticamente modificado, com a forma aproximada de um hipopótamo. Sua carne é comestível, mas com sabor ainda desconhecido (um dos personagens brinca, a certo ponto: “vamos torcer para que seja gostoso”.) E é a principal esperança de grana fácil para a “Mirando Corporation”, uma espécie de Friboi mundial.

    O filme começa com uma propaganda didática da Mirando, na qual a CEO Nancy Mirando (interpretada pela sempre competente Tilda Swinton) explica para seus investidores, jornalistas e a nós, espectadores, a premissa básica do produto – e do filme. O mundo passa por uma crise na produção de alimentos. O futuro é incerto. Com base nisso, a espécie humana precisa se virar para continuar sobrevivendo. A esperança surge quando a Mirando, uma empresa ambientalmente comprometida (ra-ram) encontra por acaso (ra-raaaam) uma espécie nova na natureza: os superporcos. Nancy então assume seu lado Silvio Santos e esclarece que a Mirando conseguiu reproduzir em cativeiro a nova espécie, resultando em 26 novos filhotes. Tais espécimes foram distribuídas a fazendeiros ambientalmente comprometidos do mundo inteiro. A partir daí, como uma espécie de Presidente Alma Coin, de Jogos Vorazes, Nancy declara aberta a competição na busca do melhor superporco do mundo. O resultado seria conhecido depois de 10 anos.

    “Okja” é o nome que recebeu o superporco distribuído à Coreia do Sul, ao pai de Mija (interpretada pela ótima Ahn Seo-Hyun). Dez anos depois, quando a Mirando retorna para buscar o animal, Mija e Okja não querem mais desgrudar uma da outra. E a garota vai ter que lutar para não se separar da sua melhor amiga.

    A estória é contada em forma de fábula. O que pode, num primeiro instante, desagradar aos que buscam um filme mais sério, de questionamento social profundo. Mas não se apresse: Okja não é um filme para crianças.

    Tudo bem que o roteiro, no geral, lembre um típico filme da Sessão da Tarde, com saídas meio óbvias de roteiro e um ritmo bastante previsível. A jornada do herói, descrita por Joseph Campbell em “O herói de mil faces”, está ali o tempo todo, cumprindo requisitos básicos que Syd Field impõe em seu manual de roteiro. Temos a protagonista destemida, a vilã caricata (só faltou ter um bordão), os camaleões, os pícaros, mentores. Jake Gyllenhaal surge num exagerado papel secundário, Steve Yeun parece reprisar seu papel de Glenn em “The Walking Dead”, Paul Dano aparece sóbrio, consistente, interpretando o que pediram para ele interpretar. Giancarlo Esposito tira os óculos, mas ainda não teve oportunidade de mostrar mais do que o já conhecido Gus Fring, de “Breaking Bad”. Está tudo lá, mais ou menos repetido. A ponto de antevermos o que vai acontecer no final.

    O formato de fábula, entretanto, adiciona um elemento interessante. Remonta aos filmes de Hayao Miyazaki e outros mestres da animação japonesa. Não por acaso, “Okja” lembra bastante Totoro, o mascote dos Estúdios Ghibli e símbolo da obra de Miyazaki (Tilda Swinton e Bong são fãs confessos). A trupe que acompanha Mija em sua jornada também lembra bastante equipes como a de Cowboy Bebop, Gantz, Yu Yu Hakusho, ou até mesmo a atuação desastrada da “Rocket Team” de Pokémon. Esse clima de anime permeia toda a obra, em momentos de tensão e de reflexão. E reveste o questionamento mais profundo da obra: o sistema de produção e distribuição de alimentos no mundo. Não à toa, Otto Von Bismarck teria dito que ninguém dormiria à noite se soubesse como são feitas as leis e as salsichas.

    O diretor Bong declarou que escolheu um porco como animal protagonista da trama porque achou que seria o mais comumente associado a comida. Pessoas comuns vêem bichinhos apenas de duas formas: estimação ou alimentação. E o porco seria o campeão em alimentação, com todo o seu bacon, pernil, presunto, salsichas, linguiças e tudo mais.

    Toda a saga de Mija por tentar salvar sua doce Okja da eliminação redunda na negação completa do cruel sistema de produção. E da impotência em enfrentá-lo. O sistema é triste, é indigno, frio, cruel. E necessário, ao mesmo tempo. A luta contra ele deve ser racional, equilibrada. A crítica bem-humorada à militância radical e desequilibrada, inclusive, é mostrada em vários trechos.

    Mas a realidade é pesada. Por mais lúdica e simples que seja a história, nos mostra a cruel verdade que está aí para todos verem, mas à qual muitos viram a cabeça. Os campos de produção agropecuários talvez sejam o mais próximo de campos de concentração que jamais conheceremos – as referências também são claras na tela. O próprio Bong Joon-ho virou pescetariano (alimenta-se só de vegetais e peixes) após a conclusão da obra.

    Não há final feliz. Não há como passar incólume por todos esses tipos de questionamento. E ainda que a saída oferecida pelo roteiro pareça ser a melhor para todo mundo, os próprios personagens não parecem aceitá-la muito bem. O que sobra é um melancólico sorriso de Mona Lisa.

    Uma pequena dica: não perca a cena pós-créditos. O recado que fica é que a militância não está morta, a luta não pode acabar. Pensemos, todos nós, no tipo de alimento que queremos em nossas mesas, e na forma como ele chega lá. Equilíbrio e racionalidade são a chave de tudo.

    Você precisa estar logado para comentar. Fazer login.
  • Maciste
    Maciste

    Qdo sai a próxima resenha?

  • Maciste
    Maciste

    É normal que eles não se preocupem. O Google tem um monitoramento de todo texto que é postado e, principalmente, de onde! Por isso o jornal não se importa com republicações, pois o que importa para o Google é onde ele foi postado primeiro. Então, sempre que algo é repostado, o crédito pela visualização vai para o site original, o que não agrega nada para os sites "repostantes" no sentido de torná-los mais interessantes para investimento de patrocinadores, entende?

    Mas se vc se interessar, poderia participar do nosso projeto escrevendo coisas exclusivas, sob um pseudônimo. Claro que isso é só sugestão pretensiosa. rsrs

  • Maciste
    Maciste

    João, o site está em desenvolvimento, mas já estamos produzindo os textos para ter uma reserva inicial.
    Se algum dia quiser postar algo escrito especificamente pro site, é só me dar um toque. Seria muito bom ter textos como os seus no nosso projeto.

Este site usa cookies para oferecer a melhor experiência possível. Ao navegar em nosso site, você concorda com o uso de cookies.

Se você precisar de mais informações e / ou não quiser que os cookies sejam colocados ao usar o site, visite a página da Política de Privacidade.