Space Jam: Um Novo Legado (2021) - Crítica

Todo mundo curte uma metalinguagem. E ela é ainda mais prazerosa quando sai pela culatra. Lembro ainda do momento do pavoroso "X-Men: Apocalipse", em que alguns personagens satirizam como o terceiro capítulo de uma franquia tende a ser o mais fraco dela (o que Apocalipse foi com honras até a chegada do ainda mais deplorável Fênix Negra). Space Jam 2, entretanto, leva essa gag involuntária para um novo nível, ao transformar toda sua história em uma grande piada. O incidente incitante do filme fala sobre um algoritmo (um programa de computador interpretado por Don Cheadle) que, revoltado por ter uma de suas ideias medíocres e espalhafatosas rejeitadas por Lebron, planeja vingança sequestrando o atleta e seu filho, culminando numa disputa de basquete que vai decidir o futuro dos Looney Tunes, Lebron e outras pessoas randômicas.

Sim, o filme é sobre a revolta de um algoritmo ruim. E nada parece tão relacionado a ele quando Space Jam parecer, exatamente, uma colagem robótica das propriedades intelectuais da Warner com uma estrutura narrativa que aglomera tudo que há de pior no entretenimento moderno - aqui até cruzando a barreira da sétima arte, já que o mundo dos games é intrinsecamente inserido na obra. É o típico filme de algoritmo que a Marvel se especializou em fazer, algo que parece completamente automático e sem esforço, como um roteiro feito artificialmente através de uma miscelânea de elementos para agradar um público alvo em potencial. Não é em vão, então, que além de usar um game como elemento fundamental da trama, Space Jam também seja um filme de super-herói, pois nada mais em voga atualmente. Assim como há o tempero inevitável da lição de moral (ei, nada contra mensagens em filmes, mas sim essa necessidade cômica de que inserir algum significado vai naturalmente aprofundar e agregar valor no conjunto).

E se você pouco leu sobre Pernalonga e sua turma até aqui, é exatamente por serem tratados com desleixo pelo roteiro, assim como o basquete. O nome Space Jam parece mais um truque para angariar atenção sem de fato resgatar em nada o espírito do original, assim como suas principais características. Tanto os Looney quanto o basquete e o próprio Lebron acabam sendo vítimas de uma narrativa porca criada por executivos como uma celebração tosca do catálogo da Warner - aí o lançamento para HBO Max soa, novamente, bastante metalinguístico, e não seria surpresa o longa ser um presente de inauguração para chamar atenção ao serviço. 

Foram 25 anos para o filme de 96, eternizado na mente do brasileiro pelas noites do SBT, Space Jam, receber sua sequência, e a razão absolutamente não é finalmente terem encontrado uma boa história para continuá-la (algo que Brad Bird alegou para a demora de voltar ao universo dos Incríveis), tampouco o surgimento de uma lenda que transcende o esporte com suficiente apelo para justificar um orçamento milionário. O que reforça ainda mais o argumento de Space Jam 2 como um artigo de publicidade é o conturbado processo de produção do longa, que contou com substituição de diretor e o crédito de seis roteiristas (e dica: muitos escritores nunca vai significar coisa boa, e sim uma bagunça). 

Concluído, então, que o objetivo de Space Jam parece mesmo fazer uma homenagem à Warner, o saldo final é tão somente um desrespeito que serve de amálgama e lição do que há de pior na arte popular atual, que é um foco insuportável em sacadinhas imediatas, uma ventilação incessante e fatigante de estímulos visuais, efeitos alucinógenos e ritmo acelerado. Não há tributo, através disso, com os Looney, tão simbólicos para o que o estúdio se tornou, como o original, o esporte, nem Lebron. Os clássicos cartoons (que nos breves momentos que são focados em sua originalidade e animação 2D - inclusive Lebron -, protagonizam os poucos momentos genuinamente divertidos da fita), tão marcantes pela esperteza e surrealidade de seu tom, mas também imenso carisma, são cruelmente usados de artifícios descartáveis para enquadramentos que parecem mais preocupados em revelar o maior número possível de referências da Warner - em sua maioria pessoas com fantasias cospobre dos personagens. 

Space Jam 2, criado por um algoritmo ruim tanto dentro quanto fora das telas, acaba sendo inacreditavelmente unânime em conseguir ofender quem foi ver o filme por nostalgia, por curtir o esporte, por idolatrar Lebron, amar os Looney Tunes ou buscar somente um bom entretenimento. 

2 comentários:

  1. Concordo com a crítica. Na verdade o que temos é um Space Jam sem Space Jam, igual tivemos um Mortal Kombat sem Mortal Kombat. (haha)

    Esses dias eu tava lendo sobre Space Jam e descobri que queriam continuar a franquia desde a época do primeiro, inclusive com outros esportes. O que mais chegou perto de acontecer foi 'Skate Jam' com Tony Hawk, que só foi cancelado devido ao fracasso de Looney Tunes De Volta à Ação. Talvez no fim tivesse sido menos pior que Um Novo Legado.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Bah, não fazia ideia que houve essa ideia, haha. Confesso que fiquei curioso, mas o Tony Hawk e skate nunca tiveram tanto status internacional quanto basquete e MJ. Iria flopar em bilheteria, e isso que interessa pros caras.

      Excluir