Depois de anos fazendo a mesma coisa a Marvel assumiu em Guardiões 2 que a ação em seus filmes é absolutamente acessória e sem consequência, e está aí um filme em que as cenas de ação não fingem ser o que não são. Uma acontece no pano de fundo, embaçada, outra é operada à distância, outra é mais uma montagem musical, a última se parece com a primeira e acontece essencialmente no extracampo (e o Star Lord entra nela como se se jogasse numa piscina de bolinha, escondida da gente). Acho que tem algum valor aí em fazer um filme de ação de mais de duas horas que não dá a mínima para ação e mesmo assim segura o espectador com algum interesse
Sua sexualidade. Moonlight tem uma narrativa bem similar, mas a diferença que poderia e deveria parecer apenas estética acaba por ser algo extremamente significativo para a trajetória do protagonista: Sua cor de pele.
A história, dividida em capítulos, aborda as três fases da vida de um rapaz negro, de nome Chiron: Criança (o bom Alex Hibbert), o qual encontra-se em dificuldades por sofrer com bullying e com a irresponsabilidade de sua mãe (Naomie Harris, a qual rouba todas as suas cenas), uma mulher tão carinhosa quanto propensa ao consumo de drogas pesadas. Este encontra conforto ao passar a ser cuidado pelo traficante Juan (Mahershala Ali) e pela gentil namorada deste (Janelle Monáe). A segunda fase enquanto adolescente (o excelente Ashton Sanders), quando há a descoberta sexual ao passo em que o preconceito e a violência tornam-se recorrentes na vida do rapaz. Por fim, a terceira o traz adulto (o fraco porém funcional Trevante Rhodes) quando vemos as consequências de toda esta trajetória.
A abordagem é simples e efetiva. Assim como ocorrera no recente Fences, não vemos nenhum personagem branco, porém sentimos a todo o momento o resultado de séculos de maus tratos, intolerância e falta de empatia de uma sociedade formada por indivíduos desta cor. Se o garoto de Boyhood tinha todo um espaço para poder calmamente se descobrir, Chiron precisa primeiramente sobreviver. Sua trajetória é marcada por momentos de calmaria sucedidos por verdadeiros pesadelos.
Os instantes em que Chiron pode respirar envolvem figuras constantemente estereotipadas pelo universo midiático e oratório, e aquela que chama atenção de imediato é Juan. Homem de aparência imediatamente intimidadora, surpreende ao tratar Chiron com tanta consideração. Podemos então perceber aos poucos por que aquele homem desempenha o papel de traficante, mas não exatamente se este quer estar lá. Será que quer? Quando ele é obrigado a confrontar sua profissão, a imensa dimensão por trás do segregacionismo velado contemporâneo começa a ficar mais clara. A trajetória do protagonista complementa o que vimos inicialmente sobre Juan, mesmo que a falta da performance magistral de Mahershala Ali, o qual cria um homem de modos rígidos, postura defensiva porém com humanidade, seja sentida após o primeiro ato.
A luta do personagem central para fugir do destino de sua figura paterna, o caminho das drogas no caso, envolve contornar mundos de preconceitos projetados seja no ambiente ou numa ação individual. Envolve guardar o amor que pôde obter de suas duas mães ("Nesta casa só se permite amor e orgulho!" diz a namorada de Juan em ao ver a tristeza de Chiron em sua casa) e alimentá-lo num mundo onde o ódio cresce não importando o fator anacrônico. Como afinal prosperar economicamente e ter uma condição de cidadão branco de classe média se o mundo, o qual já negou um crescimento construtivo do indivíduo negro, só tem a oferecer empregos marcados por baixo pagamento e tratamento excludente? Moonlight é um filme no qual os personagens, pessoas comuns que encaramos com total indiferença no dia a dia, encerram em si conflitos pesados demais cuja origem vem de fatores externos quase incontornáveis.
O trabalho do jovem diretor Barry Jenkins para então criar uma narrativa sóbria porém de notável personalidade é louvável. O sentimento de simplicidade, de acompanhar uma vida a se desenvolver, jamais é confundido com simplismo, e assim momentos brilhantes tais como aquele envolvendo dois personagens no mar ou outro que envolve o Chiron adolescente e cubos de gelo, estão bastante presentes. Jenkins prioriza o silêncio, as reações e a dinâmica de seus retratados com relação ao mundo, o qual é visualizado fotograficamente com um misto de beleza e mistério. Isto é acompanhado pela trilha sonora cuja melodia é oriunda da melancolia em cena e do impacto do que não imaginamos ser mundano.
Assim podemos contar com o poder do trabalho de um artista, o qual desafia sem escancarar pontos de vista. É uma produção cuja transcendência vem pela empatia e o entendimento, cujo poder é a única coisa capaz de alinhar seu protagonista mundano, melancólico e curioso com um mundo tão ameaçador, imenso e acima de tudo diverso.
Alguns filmes jamais abandonarão seu público. Isso se dá pelo fato de seu diretor se comprometer a não só contar uma história mas deixar séries de detalhes que serão eternamente desvendados com o passar dos tempos. Falemos um pouco do cineasta Mel Gibson, um sujeito tão talentoso quanto intempestivo. Há doze anos suas polêmicas envolvendo anti semitismo e alcoolismo se sobrepuseram ao seu trabalho como profissional, e mesmo tendo um sucesso colossal com seu A Paixão de Cristo e um moderado com o belíssimo e subestimado Apocalypto, Gibson se entregou a um ostracismo artístico. Ora ou outra retornou como ator em filmes tais como O Fim da Escuridão e Mercenários 3, mas sem conseguir muito destaque.
A verdade é que todos os filmes que este dirigiu lidavam com culpa. Até naqueles em que atuara contavam com um personagem com problemas de alcoolismo e tendo que lidar com consequências de suas próprias ações ou então de um mundo corrompido. Com o passar dos anos chegou a hora de Gibson mostrar seu amadurecimento, e assim atuou no mesmo ano no elogiado Herança de Sangue e dirigiu este Até o Último Homem, onde utiliza suas habilidades de contador de histórias não só para falar sobre um acontecimento verídico fenomenal como para de fato se confessar como pessoa.
O roteiro de Andrew Knight e Robert Schenkkan conta a história baseada em fatos de Desmond Doss (Andrew Garfield), um homem simples e religioso que sempre quis ser médico porém não teve oportunidades de estudo. Filho de um alcoólatra veterano da Primeira Guerra Mundial (Hugo Weaving) e irmão de um jovem recruta que parte para o devastador combate da Segunda Guerra, Desmond decide se alistar enquanto na posição de Objetor de Consciência, determinado a ir ao campo não para atacar quem quer que seja, porém para tirar soldados feridos do campo de batalha. Este é confrontado por seu Capitão (Sam Worthington), seu Sargento (Vince Vaughn), e por seus colegas, porém resiste até finalmente chegar ao cenário onde a missão principal é confrontar soldados japoneses na montanha Hacksaw.
Por mais que se trate de um filme no qual o trabalho do diretor chama muito a atenção, o roteiro também merece diversas citações positivas. É nos diálogos certeiros nos quais a dupla de roteiristas desconstroem inúmeras falácias modernas acerca da questão armamentista, como um subterfúgio digno do “Cidadão de Bem”. A postura do protagonista, o qual mesmo não tendo tido acesso à escolaridade que merecia, aprendeu a ter senso crítico para abraçar o que de melhor uma crença poderia ter a oferecer, é frequentemente incisiva, e sua dinâmica com o resto do exército é algo excepcional. Tão excepcional é que falarei mais desta em breve. O humor do longa também deriva da desconstrução: Inacreditavelmente a cena mais engraçada que pude ver num filme nos últimos anos está aqui (onde foi que Vince Vaughn se meteu por todos estes tempos?!) e tira um sarro maravilhoso em cima de conceitos ultrapassados de masculinidade.
Trata-se de um filme no qual os personagens têm de lidar com esteriótipos prontos de uma sociedade conflituosa. Por isso, a relação entre tais figuras é desenvolvida a partir da humanidade, e as atuações excepcionais acompanham a estratégia. A escolha prioritária foi por atores que, de alguma maneira pareciam limitados a necessidades mercadológicas genéricas e que finalmente ganham a chance de mostrar dimensões mais complexas. A começar por Teresa Palmer, a qual há pouco tempo era chamada apenas para encarnar figuras que se destacavam por seus atributos físicos e aqui interpreta uma mulher expressiva e decidida, e por mais que o longa se passe na década de quarenta, é injusto limitá-la numa análise a “interesse romântico do herói”. Hugo Weaving, por sua vez, traz intensidade ao veterano amargurado, o qual procura na bebedeira, na agressividade e no distanciamento uma saída pelas perdas que a guerra o trouxe. Uma certa cena entre este e Garfield escancaram a sensibilidade dos dois intérpretes.
Outros que ganham o direito de fazer um belo retorno às telas são Vince Vaughn, o qual equilibra o humor desbocado de seu Sargento com uma crescente empatia, e Sam Worthington. Este último é um ator que sempre elogiei e aqui, como o Capitão do pelotão traz em seu olhar a luta de um homem contra regulamentos burocráticos e a pressão de uma sociedade preconceituosa em prol de sua contraparte altruísta. O que priorizar afinal? Missão cumprida ou a segurança de seres humanos? E a resposta está na gentileza e da satisfação do olhar de Worthington quando seu personagem contempla uma oração de Doss.
Assim sendo, uma das grandes proezas do longa é trazer momentos notáveis que evidenciam desenvolvimento individual dos coadjuvantes. Mas não tem jeito, pois Doss é mesmo um personagem único. Encarnado por Andrew Garfield, quase um jovem Tom Hanks, como um homem cuja falta de instrução e de tato social é compensada por uma imensa vontade de contemplar a beleza do mundo, Desmond traz em seu olhar uma inocência que não se confunde com ingenuidade. Conhece o mundo tanto quanto conhece os preceitos bíblicos, e por isso lida com a agressividade seja de interlocutores quanto de si mesmo com dignidade. Sim, Garfield não faz a menor questão de trazer um estoicismo caricato a seu personagem: Este pode dar a outra face, mas é um ser humano comum, o qual sente além de amor (por pessoas ou pela divindade que satisfaz) raiva, desgosto e tristeza. Só um intérprete com sensibilidade gigantesca poderia ter a expressão no olhar para carregar um momento tal como o que o soldado confronta seu Sargento após ser agredido. É como se um turbilhão de ressentimento fosse contido pela satisfação de um dever sendo cumprido, e palmas neste momento não só para o jovem ator como para Vaughn, o qual dá uma resposta expressiva perfeita para este momento. É uma atuação sincera, que denota imensa maturidade.
Maturidade, enfatizo, acompanhada por seu diretor, o qual confronta a bondade de seu herói com a selvageria do mundo em guerra. Desde O Resgate do Soldado Ryan não há tanta visceralidade em combates quanto aqui: Iniciando com um choque literal de realidade medonho, o confronto com os japoneses assume uma escala de brutalidade inacreditável, com rostos sendo destruídos, corpos devorados por ratos (enquanto não pegam fogo) e explosões ocorrem em qualquer que seja o terreno. Gibson evita efeitos digitais para dar destaque ao prático e também aos efeitos de maquiagem. Não há a menor minimização quando o assunto é o horror que o homem pode causar numa batalha, e mesmo que a narrativa se concentre na jornada de Doss, e portanto protagonize os soldados estadunidenses, os japoneses também ganham destaque, seja no começo quando seus cadáveres dividem o mesmo espaço de cena que os do outro lado quanto num momento envolvendo um esconderijo e no desfecho. O fato de serem adversários não torna os japoneses mera caricatura, e Gibson demonstra consciência ao destacar as ações destes em um dos vários momentos marcantes do longa. A tensão maior é enquanto acompanhamos o protagonista em sua missão particular, pois somos doutrinados a enxergar os interesses políticos mais do que as vítimas de um combate. Doss torna-se a verdadeira personificação da humanidade em meio ao mais animalesco.
Rodado com uma fotografia que evita ao máximo o ar documental e prioriza as cores e a amplitude visual, e com uma trilha de Rupert Gregson Williams cujas beleza e gravidade jamais se tornam intrusivas, Até o Último Homem não busca ser documento histórico, e sim uma amostra de como é possível ser fiel a convicções não importando a fonte sem se limitar a dogmas. A convicção, se acompanhada do senso crítico é o que auxilia Doss em sua fidelidade a um Deus o qual vai além de uma série de mandos e desmandos. Em tempos de supostos fascistas escondidos pelo véu de “cidadãos de bem”, os quais se orgulham de justificar preconceitos com religiosidade, um homem cristão que se recusou a aderir à violência teve como seu Deus o ideal de responsabilidade e empatia com relação a seres humanos. E é por isso que a última imagem do filme jamais, jamais vai sair de minha mente.
Há muito tempo falo sobre os problemas em torno da nostalgia no cinema. A saudade do passado tem virado pretexto para que longas sem nenhum potencial criativo apareçam. Por que? Potencial lucrativo. O público por alguma razão tem preferido pagar pra ver elementos que os lembrem de filmes adorados em vez de simplesmente revisitá-los. Só isso explica por que Rogue One: Uma História Star Wars ou Procurando Dory conseguiram tantos defensores.
O que nos traz a este La La Land (vou seguir a política do Tiago Belotti e evitar expôr subtítulos ridículos). Franco favorito em premiações, o longa vem num momento no qual a saudade por outros tempos do cinema tem surgido fortemente nas mentes dos cinéfilos, e também no qual o papel do artista no mundo tem sido questionado frequentemente. O projeto busca trazer este desejo nostálgico unido a uma sugestão de debate que é ofuscada pelo brilho de tal anseio.
Acompanhamos no processo a atendente de cafeteria Mia Dolan (Emma Stone), a qual salta de teste em teste buscando oportunidades como atriz. Seu percurso esbarra com o de Sebastian (Ryan Gosling), um pianista fracassado que sonha em abrir seu próprio clube de jazz. Os dois iniciam um romance, sendo a relação amorosa entre estes uma motivação maior para que ambos busquem alcançar suas ambições.
É um longa que tem uma visão saudosista sobre a indústria cinematográfica. É um conto de fadas meritocrático como tantos, e isso não é defeito. A partir do momento em que uma obra abraça o fantasioso, espera-se apenas que esta consiga transpôr seu melhor a partir disso. Surgem aí os musicais: São o ápice da fuga da realidade, a visualização do sonho em meio ao caos.
Por isso La La Land acaba surgindo decepcionante. Trata-se de um longa que prioriza o funcional sobre o criativo. Tudo deve remeter a tempos passados e só. É uma lógica de subserviência referencial. Desde o início as coreografias soam como básicas, as canções esquecíveis e os vocais se não são falsos, são extremamente fracos. Assim, a história do relacionamento aparentemente perfeito e do amadurecimento individual consequente torna-se previsível e formulaica demais. A jornada através do processo criativo e do impacto da arte no mundo também se perde no processo. Falta energia, tudo soa demais como encenação e homenagem excessiva. A trama, já fácil de se antecipar, perde muito de sua força a partir da metade, arrastando-se e muito até o final. Quando a trama não vai pelo caminho chamado "clichê", é porque Chazelle minimamente respeita seu público, e não por algum brilhantismo criativo.
Dependemos excessivamente do elenco então. Apesar de vocalmente limitadíssimos, Stone e Gosling além de terem ótima dinâmica, conseguem desenvolver os dramas de seus personagens com facilidade graças ao seu talento individual.
Damien Chazelle tem todos os instrumentos necessários: Figurinos, design de produção, fotografia, tudo parece impecável para que suspendamos descrença e abracemos a era da nostalgia. O aspecto de tela Cinemascope também seria um belo trunfo se o diretor não recuasse tanto em sua abordagem referencial. Chazelle parece tão tradicionalista e antiquado quanto o personagem de Gosling, alcançando inspiração a partir de glórias passadas e tratando o presente como uma simplista desilusão. O resultado é um espetáculo limitado às lembranças e sem identidade.
"É uma modernização elegante e sem muita necessidade. " Foi o que eu disse para resumir Star Wars: O Despertar da Força. Mesmo que minha crítica para este tenha sido bastante elogiosa, foi o suficiente para deixar muitos fãs que descobriram recentemente o universo concebido por George Lucas completamente insanos de raiva. Dali pra frente não faltavam comentários de que eu não sabia o que falava, que o projeto era tão bom quanto Mad Max: Estrada da Fúria, que o filme só não é melhor que O Império Contra-Ataca (alguns falavam que era melhor até que este), que eu não conheço a franquia, que não sei o que é cinema, e por aí vai. Eram pessoas que não só discordavam do que falei como exigiam que eu pensasse exatamente que "Episódio VII" é uma obra-prima máxima.
Isso me faz lembrar de seis anos atrás, quando a "Saga" Crepúsculo estava em seu ápice no cinema. Qualquer um que falasse publicamente que o filme era ruim acabava bombardeado em questão de segundos com mensagens enfurecidas, como se a produção fosse algo intocável. Há um tempo, comparar Star Wars com Crepúsculo era crime brutal, porém se existe algo que merece uma comparação entre as duas franquias é a infantilidade dos fãs recém-chegados à primeira franquia com as fissuradas pela segunda. Digo isso porque se uma crítica menos empolgada sobre O Despertar da Força gerou raiva, meu comentário extremamente negativo sobre este Rogue One num grupo de cinema do qual participo no Facebook causou uma ira impressionante. De todo modo, fãs novos, velhos ou leitores merecem saber por que considero este novo filme da franquia um abacaxi com proporções quase galácticas.
O roteiro de Chris Weitz com Tony Gilroy (os quais têm entre seus últimos trabalhos Lua Nova, Cinderela e O Legado Bourne) é situado quase vinte anos após os eventos de A Vingança dos Sith e nos traz à Jyn Erso (Felicity Jones), a qual foi separada do seu pai quando pequena e auxiliada desde então pelo bruto Saw Gerrera (Forest Whitaker). A garota é convocada pela Aliança Rebelde galáctica para conseguir uma mensagem que aparentemente está com Gerrera, do qual esta se distanciou no decorrer de sua vida. Acontece que a mensagem foi enviada por seu pai, Galen Erso (Mads Mikkelsen), e só este, o qual foi forçado pelo Império Galáctico a construir a Estrela da Morte (arma gigantesca que toda pessoa que conhece a franquia já está careca de conhecer), tem os segredos sobre a vulnerabilidade deste instrumento de destruição. Para cumprir o objetivo de obter os segredos da Estrela da Morte e salvar seu pai, Jyn se une a um grupo de rebeldes e um robô reprogramado para ajudá-los.
Primeiramente, o filme precisa lidar com o fato de que todos sabemos como a história vai acabar. Como os rebeldes levaram as tais mensagens que foram cruciais em Uma Nova Esperança é uma história que nunca foi necessária para que compreendamos o cânone, portanto Rogue One já encontra sérias dificuldades para se justificar. Uma saída que justificaria seria construir uma história ao redor da tragédia dos rebeldes que entraram numa missão suicida pelo bem da galáxia. E para que uma história dessas, que permitiria a visão de uma vertente mais cinzenta do cânone de Star Wars, funcione, precisamos de personagens que valham o investimento emocional que neles faremos.
O problema é que o diretor é Garreth Edwards, um sujeito que provou não saber a diferença entre desenvolvimento de personagens e encheção de linguiça em seu Godzilla e que aqui comete os mesmíssimos erros. Aqui este traz como protagonistas duas figuras extremamente aborrecidas e desinteressantes. Pra começar, Felicity Jones conduz a narrativa em dois modos: Indiferente, no qual esta parece não ter expressão alguma, ou choramingo. O segundo é quase sempre acompanhado por Diego Luna, o qual, insuportável, percorre a narrativa com cara de "Olha mãe! Olha como sei fazer cara de sério!". O arco dramático da primeira é risível, tendo em vista que Weitz e Gilroy investem num drama digno de novela da Globo, desde a saudade do pai e até a carência que esta sentiu por causa de seu tutor. Basicamente um draminha que seria resolvido em uma linha de diálogo, mas que qualquer roteirista picareta percebe ser perfeito para justificar mais um monte de páginas de material.
Pra piorar, os coadjuvantes que têm algum potencial, depois de certo tempo são relegados a frases de efeito ridículas ("Eu estou com a força e a força está comigo"?) e a piadinhas. Tomemos como exemplo Donnie Yen e seu personagem. Quem assistiu ao maravilhoso O Grande Mestre ou ao razoável Kung Fu Killer sabe perfeitamente que o ator é um verdadeiro achado do cinema chinês. Após ser bem apresentado, seu personagem, o qual ainda era uma bela oportunidade para a franquia explorar sua inclusividade, afinal a homossexualidade deste é algo perceptível, é jogado de lado totalmente. A incompetência de Edwards e dos roteiristas o relega então a repetir um mantra ridículo e a fazer comentários espirituosos, sem mais nada a dizer além disso.
As alegorias acerca do totalitarismo contemporâneo não conseguem transpôr nada que já não tenha sido visto em outros exemplares da franquia. Não ajuda o fato de que o vilão, interpretado por Ben Mendelsohn, seja o mais patético de todos os oito filmes de Star Wars. Mesmo que o ator tente trazer alguma presença ao personagem, este só serve para ser desautorizado por seus superiores, perdendo no processo qualquer aura de temor que poderia despertar. Além disso, filme traz Forest Whitaker pela enésima vez desperdiçando seu talento com outro papel do tipo durão genérico.
Com uma história péssima, protagonistas péssimos, vilão coitadinho, coadjuvantes mal aproveitados e situações dignas de novelão, resta a Rogue One investir fartamente naquele que tem sido o maior pilar dos blockbusters picaretas: A nostalgia. Assim, mesmo que não faça o menor sentido em termos de cronologia (quem viu Uma Nova Esperança sabe que Darth Vader era hierarquicamente significantemente inferior ao vilão Moff Tarkin), temos que trazer Darth Vader assustando o "vilão" de Mendelsohn, temos que encomendar uma trilha sonora totalmente genérica que ocasionalmente traga acordes de John Williams (santa decadência hein Michael Giacchino?), socar elementos visuais e personagens que lembrem os longas clássicos e temos que ressuscitar Peter Cushing utilizando efeitos visuais que o transformam no Ebenezer Scrooge de Os Fantasmas de Scrooge. Pra ser sincero, se os cinco minutos finais não forçassem tanto o fator nostálgico, tecendo uma conexão do longa com relação a Uma Nova Esperança, Rogue One seria facilmente visto como a pior coisa que essa franquia já gerou. Qual a praticidade em pagar um ingresso para apenas ver coisas que lembrem você de um filme que você gosta? Não é mais fácil ficar em casa e assistir ao original?
Sim, pois aguentar tamanha bobagem numa roupagem pomposa de drama sofisticado que jamais se justifica é a sentença por comprar o ingresso para Rogue One. Há uma sucessão de clímaxes na narrativa para preencher os 133 minutos de duração no qual o espectador é anestesiado com cenas de morte e frases genéricas que beiram a auto-ajuda. Em geral, mesmo com alívios cômicos, o longa se leva a sério demais, e se alguém vier defender o longa alegando que trata-se de um "filme de guerra", lembremos que o princípio por trás do gênero que comporta longas tais como Platoon e O Franco Atirador reside em ver os limites do ser humano, e isso tem tudo a ver com construção de personagens por quem possamos criar empatia. Algo que nunca acontece aqui. Com pessoas aleatórias morrendo pra cá e pra lá, parece bem mais um longa de assassino "slasher", a lá Sexta-Feira 13, do que algo que se aproxime do gênero guerra.
Justiça seja feita: Edwards até consegue originar um ou outro momento mais interessante ao conduzir cenas de ação, e o minuto no qual Darth Vader parte para a ação é disparadamente a melhor coisa que isso aqui poderia oferecer.
Uma pena que pra ver um momentinho bacana tenhamos que suportar um filme tão sisudo e sem personalidade.
invocação do mal 2 é o exemplo de uma sequência bem feita. tem a estrutura do antecessor, mas dá espaço para novas histórias e pirações estéticas do diretor. este, aliás, se chama James Wan, um dos nomes mais importantes da nova geração de cineastas de hollywood. o cara sabe criar tensão, sabe te dar susto e o melhor de tudo, ele sabe contar uma boa história com personagens que têm tempo de tela suficiente para você se afeiçoar por eles. eu sei que wan se divertiu para fazer este filme pois os traços da assinatura dele estão expressos na trilha sonora, na maquiagem, nos cenários e até nos erros. se for ao cinema este final de semana, sua escolha tem que ser invocação do mal 2.
mogli - o menino lobo é o exemplo perfeito de como disney consegue se reinventar. os caras pegaram um clássico do século passado e transformaram a história, sem se entregar para os modismos atuais. nada de explicações longas, origens obscuras, ligações sem nexo ou gancho para sequências. jon favreau conta a trajetória do garoto e dos animais sem perder a aura infantil e inocente da disney, ao mesmo tempo que inclui tensão e perigo na medida certa para não assustar os mais jovens. uma história boa e bem contada acima de tudo. a beleza do roteiro é também refletida na tecnologia embasbacante que reproduz tigres, elefantes, panteras e lobos. dentro de uma selva construída com perfeição, mogli - o menino lobo deixa um sentimento de nostalgia ao fim da sessão, e ao mesmo tempo apresenta um nova era do estúdio de animação mais importante dos nossos tempos. leve a família para assistir, é um filme para todo mundo. ps: só vi a versão legendado, que está incrível.
Batman vs Superman não é uma bomba, tão pouco uma obra-prima do cinema de quadrinhos. Ele talvez seja o DNA de Zack Snyder escancarado na tela. Um conjunto de cenas épicas e páginas de HQs clássicas transportadas com habilidade pra tela de cinema. Visualmente, o diretor continua a mostrar quão bom é em compor quadros em movimento, sem deixar escapar a beleza estética dos quadrinhos. Há coragem também em apresentar uma perspectiva diferente para alguns personagens, como os protagonistas, que nem sempre seguem as regras estabelecidas em mais de 70 anos de história. Na ação, ele consegue definir escalas para cada personagem: Batman o bruto, Superman o mítico e a Trindade o épico.
Algo que Snyder não sabe fazer, pelo menos nos filmes mais recentes, é contar uma história. E aí não é só jogar cenas sensacionais ou referências na cara da gente. É construir uma narrativa, trazer um ritmo ao filme que empolgue não só pela espetáculo mas pela conclusão dos arcos apresentados desde o início. Em BvS, ele consegue cumprir isso com Batman, mas falha com todos os outros personagens. O erro fica mais evidente com os gatilhos que o roteiro usa para emocionar e supostamente dar complexidade às situações. A questão da mãe, tão debatida nas redes, é uma ótima sacada usada de forma precária e não combina com nada que foi apresentado até ali. Batman é cascudo, experiente, tem mais de 20 anos no crime e se desmantela com um nome. Um nome que vive na cabeça dele, sim, mas um nome recorrente. Não é o seu Calcanhar de Aquiles, é um problema conhecido, um traço óbvio da personalidade dele.
Esse é só um dos problemas do roteiro de BvS, que ainda encaixa outras cenas neste sentido - a participação de Kevin Costner é outro exemplo. E a Liga da Justiça? Bem, ela está lá. Jogada na cara de todos. As aparições são os fan services óbvios e belos de se ver, mas dentro da narrativa poucos servem para alguma coisa. A primeira aparição de Flash, o email do Batman e as pastas de Lex Luthor estão ali com uma presença grande, e sugam tempo de um filme que sequer consegue contar a própria história e já apresenta outra trama. O melhor fan service de BvS é o uniforme de Robin e Apokolypse - sutis, feitos com propósito de não só agradar ao fã como agregar ao roteiro em si. O problema não é fazer, mas sim o fazer por fazer.
Entre altos e baixos, BvS ao menos finca de vez o tom que a DC quer apresentar no cinema. Batman e Mulher-Maravilha saem bem representados e com uma boa expectativa para os filme solo. E tomara que as comparações diminuam, pois heróis da DC nunca serão iguais aos da Marvel, as questões são mais existenciais e os problemas são outros. Então é óbvio que os filmes serão diferentes - e nada é melhor que isso. A disputa não vai terminar, claro, mas talvez BvS deixe claro que o campo onde cada uma das 'editoras' joga é bem diferente.
Ridley Scott aplica em "Perdido em Marte" a tendência da ficção científica, humor e positivismo. Diretores novos como Nolan impressionam com filmes sérios e cabeçudos (Interestelar), a experiência do velho Scott o faz desviar do passado e acreditar no carisma de Matt Damon para abrir portas para uma ficção mais divertida, embora inteligente. A tendência de referenciar a cultura pop misturada com o 'timing' perfeito da edição cria momentos de identificação imediata com o personagem, só um diretor que já caminhou por vários tempos e espaços é capaz de subverter o gênero que ajudou a criar. Mas note que o cerne do 'sci-fi' que é a exploração espacial questionando a crença e a ciência e levando o homem ao desconhecido continua intacta Emoticon wink
Lembrar desse filme é visualizar o Matt Damon se divertindo em Marte ao som de Starman. Que venham mais, embora só exista um Scott, há muitas músicas do Bowie.
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Guardiões da Galáxia Vol. 2
4.0 1,7K Assista AgoraDepois de anos fazendo a mesma coisa a Marvel assumiu em Guardiões 2 que a ação em seus filmes é absolutamente acessória e sem consequência, e está aí um filme em que as cenas de ação não fingem ser o que não são. Uma acontece no pano de fundo, embaçada, outra é operada à distância, outra é mais uma montagem musical, a última se parece com a primeira e acontece essencialmente no extracampo (e o Star Lord entra nela como se se jogasse numa piscina de bolinha, escondida da gente). Acho que tem algum valor aí em fazer um filme de ação de mais de duas horas que não dá a mínima para ação e mesmo assim segura o espectador com algum interesse
Moonlight: Sob a Luz do Luar
4.1 2,4K Assista AgoraSua sexualidade. Moonlight tem uma narrativa bem similar, mas a diferença que poderia e deveria parecer apenas estética acaba por ser algo extremamente significativo para a trajetória do protagonista: Sua cor de pele.
A história, dividida em capítulos, aborda as três fases da vida de um rapaz negro, de nome Chiron: Criança (o bom Alex Hibbert), o qual encontra-se em dificuldades por sofrer com bullying e com a irresponsabilidade de sua mãe (Naomie Harris, a qual rouba todas as suas cenas), uma mulher tão carinhosa quanto propensa ao consumo de drogas pesadas. Este encontra conforto ao passar a ser cuidado pelo traficante Juan (Mahershala Ali) e pela gentil namorada deste (Janelle Monáe). A segunda fase enquanto adolescente (o excelente Ashton Sanders), quando há a descoberta sexual ao passo em que o preconceito e a violência tornam-se recorrentes na vida do rapaz. Por fim, a terceira o traz adulto (o fraco porém funcional Trevante Rhodes) quando vemos as consequências de toda esta trajetória.
A abordagem é simples e efetiva. Assim como ocorrera no recente Fences, não vemos nenhum personagem branco, porém sentimos a todo o momento o resultado de séculos de maus tratos, intolerância e falta de empatia de uma sociedade formada por indivíduos desta cor. Se o garoto de Boyhood tinha todo um espaço para poder calmamente se descobrir, Chiron precisa primeiramente sobreviver. Sua trajetória é marcada por momentos de calmaria sucedidos por verdadeiros pesadelos.
Os instantes em que Chiron pode respirar envolvem figuras constantemente estereotipadas pelo universo midiático e oratório, e aquela que chama atenção de imediato é Juan. Homem de aparência imediatamente intimidadora, surpreende ao tratar Chiron com tanta consideração. Podemos então perceber aos poucos por que aquele homem desempenha o papel de traficante, mas não exatamente se este quer estar lá. Será que quer? Quando ele é obrigado a confrontar sua profissão, a imensa dimensão por trás do segregacionismo velado contemporâneo começa a ficar mais clara. A trajetória do protagonista complementa o que vimos inicialmente sobre Juan, mesmo que a falta da performance magistral de Mahershala Ali, o qual cria um homem de modos rígidos, postura defensiva porém com humanidade, seja sentida após o primeiro ato.
A luta do personagem central para fugir do destino de sua figura paterna, o caminho das drogas no caso, envolve contornar mundos de preconceitos projetados seja no ambiente ou numa ação individual. Envolve guardar o amor que pôde obter de suas duas mães ("Nesta casa só se permite amor e orgulho!" diz a namorada de Juan em ao ver a tristeza de Chiron em sua casa) e alimentá-lo num mundo onde o ódio cresce não importando o fator anacrônico. Como afinal prosperar economicamente e ter uma condição de cidadão branco de classe média se o mundo, o qual já negou um crescimento construtivo do indivíduo negro, só tem a oferecer empregos marcados por baixo pagamento e tratamento excludente? Moonlight é um filme no qual os personagens, pessoas comuns que encaramos com total indiferença no dia a dia, encerram em si conflitos pesados demais cuja origem vem de fatores externos quase incontornáveis.
O trabalho do jovem diretor Barry Jenkins para então criar uma narrativa sóbria porém de notável personalidade é louvável. O sentimento de simplicidade, de acompanhar uma vida a se desenvolver, jamais é confundido com simplismo, e assim momentos brilhantes tais como aquele envolvendo dois personagens no mar ou outro que envolve o Chiron adolescente e cubos de gelo, estão bastante presentes. Jenkins prioriza o silêncio, as reações e a dinâmica de seus retratados com relação ao mundo, o qual é visualizado fotograficamente com um misto de beleza e mistério. Isto é acompanhado pela trilha sonora cuja melodia é oriunda da melancolia em cena e do impacto do que não imaginamos ser mundano.
Assim podemos contar com o poder do trabalho de um artista, o qual desafia sem escancarar pontos de vista. É uma produção cuja transcendência vem pela empatia e o entendimento, cujo poder é a única coisa capaz de alinhar seu protagonista mundano, melancólico e curioso com um mundo tão ameaçador, imenso e acima de tudo diverso.
Até o Último Homem
4.2 2,0K Assista AgoraAlguns filmes jamais abandonarão seu público. Isso se dá pelo fato de seu diretor se comprometer a não só contar uma história mas deixar séries de detalhes que serão eternamente desvendados com o passar dos tempos. Falemos um pouco do cineasta Mel Gibson, um sujeito tão talentoso quanto intempestivo. Há doze anos suas polêmicas envolvendo anti semitismo e alcoolismo se sobrepuseram ao seu trabalho como profissional, e mesmo tendo um sucesso colossal com seu A Paixão de Cristo e um moderado com o belíssimo e subestimado Apocalypto, Gibson se entregou a um ostracismo artístico. Ora ou outra retornou como ator em filmes tais como O Fim da Escuridão e Mercenários 3, mas sem conseguir muito destaque.
A verdade é que todos os filmes que este dirigiu lidavam com culpa. Até naqueles em que atuara contavam com um personagem com problemas de alcoolismo e tendo que lidar com consequências de suas próprias ações ou então de um mundo corrompido. Com o passar dos anos chegou a hora de Gibson mostrar seu amadurecimento, e assim atuou no mesmo ano no elogiado Herança de Sangue e dirigiu este Até o Último Homem, onde utiliza suas habilidades de contador de histórias não só para falar sobre um acontecimento verídico fenomenal como para de fato se confessar como pessoa.
O roteiro de Andrew Knight e Robert Schenkkan conta a história baseada em fatos de Desmond Doss (Andrew Garfield), um homem simples e religioso que sempre quis ser médico porém não teve oportunidades de estudo. Filho de um alcoólatra veterano da Primeira Guerra Mundial (Hugo Weaving) e irmão de um jovem recruta que parte para o devastador combate da Segunda Guerra, Desmond decide se alistar enquanto na posição de Objetor de Consciência, determinado a ir ao campo não para atacar quem quer que seja, porém para tirar soldados feridos do campo de batalha. Este é confrontado por seu Capitão (Sam Worthington), seu Sargento (Vince Vaughn), e por seus colegas, porém resiste até finalmente chegar ao cenário onde a missão principal é confrontar soldados japoneses na montanha Hacksaw.
Por mais que se trate de um filme no qual o trabalho do diretor chama muito a atenção, o roteiro também merece diversas citações positivas. É nos diálogos certeiros nos quais a dupla de roteiristas desconstroem inúmeras falácias modernas acerca da questão armamentista, como um subterfúgio digno do “Cidadão de Bem”. A postura do protagonista, o qual mesmo não tendo tido acesso à escolaridade que merecia, aprendeu a ter senso crítico para abraçar o que de melhor uma crença poderia ter a oferecer, é frequentemente incisiva, e sua dinâmica com o resto do exército é algo excepcional. Tão excepcional é que falarei mais desta em breve. O humor do longa também deriva da desconstrução: Inacreditavelmente a cena mais engraçada que pude ver num filme nos últimos anos está aqui (onde foi que Vince Vaughn se meteu por todos estes tempos?!) e tira um sarro maravilhoso em cima de conceitos ultrapassados de masculinidade.
Trata-se de um filme no qual os personagens têm de lidar com esteriótipos prontos de uma sociedade conflituosa. Por isso, a relação entre tais figuras é desenvolvida a partir da humanidade, e as atuações excepcionais acompanham a estratégia. A escolha prioritária foi por atores que, de alguma maneira pareciam limitados a necessidades mercadológicas genéricas e que finalmente ganham a chance de mostrar dimensões mais complexas. A começar por Teresa Palmer, a qual há pouco tempo era chamada apenas para encarnar figuras que se destacavam por seus atributos físicos e aqui interpreta uma mulher expressiva e decidida, e por mais que o longa se passe na década de quarenta, é injusto limitá-la numa análise a “interesse romântico do herói”. Hugo Weaving, por sua vez, traz intensidade ao veterano amargurado, o qual procura na bebedeira, na agressividade e no distanciamento uma saída pelas perdas que a guerra o trouxe. Uma certa cena entre este e Garfield escancaram a sensibilidade dos dois intérpretes.
Outros que ganham o direito de fazer um belo retorno às telas são Vince Vaughn, o qual equilibra o humor desbocado de seu Sargento com uma crescente empatia, e Sam Worthington. Este último é um ator que sempre elogiei e aqui, como o Capitão do pelotão traz em seu olhar a luta de um homem contra regulamentos burocráticos e a pressão de uma sociedade preconceituosa em prol de sua contraparte altruísta. O que priorizar afinal? Missão cumprida ou a segurança de seres humanos? E a resposta está na gentileza e da satisfação do olhar de Worthington quando seu personagem contempla uma oração de Doss.
Assim sendo, uma das grandes proezas do longa é trazer momentos notáveis que evidenciam desenvolvimento individual dos coadjuvantes. Mas não tem jeito, pois Doss é mesmo um personagem único. Encarnado por Andrew Garfield, quase um jovem Tom Hanks, como um homem cuja falta de instrução e de tato social é compensada por uma imensa vontade de contemplar a beleza do mundo, Desmond traz em seu olhar uma inocência que não se confunde com ingenuidade. Conhece o mundo tanto quanto conhece os preceitos bíblicos, e por isso lida com a agressividade seja de interlocutores quanto de si mesmo com dignidade. Sim, Garfield não faz a menor questão de trazer um estoicismo caricato a seu personagem: Este pode dar a outra face, mas é um ser humano comum, o qual sente além de amor (por pessoas ou pela divindade que satisfaz) raiva, desgosto e tristeza. Só um intérprete com sensibilidade gigantesca poderia ter a expressão no olhar para carregar um momento tal como o que o soldado confronta seu Sargento após ser agredido. É como se um turbilhão de ressentimento fosse contido pela satisfação de um dever sendo cumprido, e palmas neste momento não só para o jovem ator como para Vaughn, o qual dá uma resposta expressiva perfeita para este momento. É uma atuação sincera, que denota imensa maturidade.
Maturidade, enfatizo, acompanhada por seu diretor, o qual confronta a bondade de seu herói com a selvageria do mundo em guerra. Desde O Resgate do Soldado Ryan não há tanta visceralidade em combates quanto aqui: Iniciando com um choque literal de realidade medonho, o confronto com os japoneses assume uma escala de brutalidade inacreditável, com rostos sendo destruídos, corpos devorados por ratos (enquanto não pegam fogo) e explosões ocorrem em qualquer que seja o terreno. Gibson evita efeitos digitais para dar destaque ao prático e também aos efeitos de maquiagem. Não há a menor minimização quando o assunto é o horror que o homem pode causar numa batalha, e mesmo que a narrativa se concentre na jornada de Doss, e portanto protagonize os soldados estadunidenses, os japoneses também ganham destaque, seja no começo quando seus cadáveres dividem o mesmo espaço de cena que os do outro lado quanto num momento envolvendo um esconderijo e no desfecho. O fato de serem adversários não torna os japoneses mera caricatura, e Gibson demonstra consciência ao destacar as ações destes em um dos vários momentos marcantes do longa. A tensão maior é enquanto acompanhamos o protagonista em sua missão particular, pois somos doutrinados a enxergar os interesses políticos mais do que as vítimas de um combate. Doss torna-se a verdadeira personificação da humanidade em meio ao mais animalesco.
Rodado com uma fotografia que evita ao máximo o ar documental e prioriza as cores e a amplitude visual, e com uma trilha de Rupert Gregson Williams cujas beleza e gravidade jamais se tornam intrusivas, Até o Último Homem não busca ser documento histórico, e sim uma amostra de como é possível ser fiel a convicções não importando a fonte sem se limitar a dogmas. A convicção, se acompanhada do senso crítico é o que auxilia Doss em sua fidelidade a um Deus o qual vai além de uma série de mandos e desmandos. Em tempos de supostos fascistas escondidos pelo véu de “cidadãos de bem”, os quais se orgulham de justificar preconceitos com religiosidade, um homem cristão que se recusou a aderir à violência teve como seu Deus o ideal de responsabilidade e empatia com relação a seres humanos. E é por isso que a última imagem do filme jamais, jamais vai sair de minha mente.
La La Land: Cantando Estações
4.1 3,6K Assista AgoraHá muito tempo falo sobre os problemas em torno da nostalgia no cinema. A saudade do passado tem virado pretexto para que longas sem nenhum potencial criativo apareçam. Por que? Potencial lucrativo. O público por alguma razão tem preferido pagar pra ver elementos que os lembrem de filmes adorados em vez de simplesmente revisitá-los. Só isso explica por que Rogue One: Uma História Star Wars ou Procurando Dory conseguiram tantos defensores.
O que nos traz a este La La Land (vou seguir a política do Tiago Belotti e evitar expôr subtítulos ridículos). Franco favorito em premiações, o longa vem num momento no qual a saudade por outros tempos do cinema tem surgido fortemente nas mentes dos cinéfilos, e também no qual o papel do artista no mundo tem sido questionado frequentemente. O projeto busca trazer este desejo nostálgico unido a uma sugestão de debate que é ofuscada pelo brilho de tal anseio.
Acompanhamos no processo a atendente de cafeteria Mia Dolan (Emma Stone), a qual salta de teste em teste buscando oportunidades como atriz. Seu percurso esbarra com o de Sebastian (Ryan Gosling), um pianista fracassado que sonha em abrir seu próprio clube de jazz. Os dois iniciam um romance, sendo a relação amorosa entre estes uma motivação maior para que ambos busquem alcançar suas ambições.
É um longa que tem uma visão saudosista sobre a indústria cinematográfica. É um conto de fadas meritocrático como tantos, e isso não é defeito. A partir do momento em que uma obra abraça o fantasioso, espera-se apenas que esta consiga transpôr seu melhor a partir disso. Surgem aí os musicais: São o ápice da fuga da realidade, a visualização do sonho em meio ao caos.
Por isso La La Land acaba surgindo decepcionante. Trata-se de um longa que prioriza o funcional sobre o criativo. Tudo deve remeter a tempos passados e só. É uma lógica de subserviência referencial. Desde o início as coreografias soam como básicas, as canções esquecíveis e os vocais se não são falsos, são extremamente fracos. Assim, a história do relacionamento aparentemente perfeito e do amadurecimento individual consequente torna-se previsível e formulaica demais. A jornada através do processo criativo e do impacto da arte no mundo também se perde no processo. Falta energia, tudo soa demais como encenação e homenagem excessiva. A trama, já fácil de se antecipar, perde muito de sua força a partir da metade, arrastando-se e muito até o final. Quando a trama não vai pelo caminho chamado "clichê", é porque Chazelle minimamente respeita seu público, e não por algum brilhantismo criativo.
Dependemos excessivamente do elenco então. Apesar de vocalmente limitadíssimos, Stone e Gosling além de terem ótima dinâmica, conseguem desenvolver os dramas de seus personagens com facilidade graças ao seu talento individual.
Damien Chazelle tem todos os instrumentos necessários: Figurinos, design de produção, fotografia, tudo parece impecável para que suspendamos descrença e abracemos a era da nostalgia. O aspecto de tela Cinemascope também seria um belo trunfo se o diretor não recuasse tanto em sua abordagem referencial. Chazelle parece tão tradicionalista e antiquado quanto o personagem de Gosling, alcançando inspiração a partir de glórias passadas e tratando o presente como uma simplista desilusão. O resultado é um espetáculo limitado às lembranças e sem identidade.
Rogue One: Uma História Star Wars
4.2 1,7K Assista Agora"É uma modernização elegante e sem muita necessidade. "
Foi o que eu disse para resumir Star Wars: O Despertar da Força. Mesmo que minha crítica para este tenha sido bastante elogiosa, foi o suficiente para deixar muitos fãs que descobriram recentemente o universo concebido por George Lucas completamente insanos de raiva. Dali pra frente não faltavam comentários de que eu não sabia o que falava, que o projeto era tão bom quanto Mad Max: Estrada da Fúria, que o filme só não é melhor que O Império Contra-Ataca (alguns falavam que era melhor até que este), que eu não conheço a franquia, que não sei o que é cinema, e por aí vai. Eram pessoas que não só discordavam do que falei como exigiam que eu pensasse exatamente que "Episódio VII" é uma obra-prima máxima.
Isso me faz lembrar de seis anos atrás, quando a "Saga" Crepúsculo estava em seu ápice no cinema. Qualquer um que falasse publicamente que o filme era ruim acabava bombardeado em questão de segundos com mensagens enfurecidas, como se a produção fosse algo intocável. Há um tempo, comparar Star Wars com Crepúsculo era crime brutal, porém se existe algo que merece uma comparação entre as duas franquias é a infantilidade dos fãs recém-chegados à primeira franquia com as fissuradas pela segunda. Digo isso porque se uma crítica menos empolgada sobre O Despertar da Força gerou raiva, meu comentário extremamente negativo sobre este Rogue One num grupo de cinema do qual participo no Facebook causou uma ira impressionante. De todo modo, fãs novos, velhos ou leitores merecem saber por que considero este novo filme da franquia um abacaxi com proporções quase galácticas.
O roteiro de Chris Weitz com Tony Gilroy (os quais têm entre seus últimos trabalhos Lua Nova, Cinderela e O Legado Bourne) é situado quase vinte anos após os eventos de A Vingança dos Sith e nos traz à Jyn Erso (Felicity Jones), a qual foi separada do seu pai quando pequena e auxiliada desde então pelo bruto Saw Gerrera (Forest Whitaker). A garota é convocada pela Aliança Rebelde galáctica para conseguir uma mensagem que aparentemente está com Gerrera, do qual esta se distanciou no decorrer de sua vida. Acontece que a mensagem foi enviada por seu pai, Galen Erso (Mads Mikkelsen), e só este, o qual foi forçado pelo Império Galáctico a construir a Estrela da Morte (arma gigantesca que toda pessoa que conhece a franquia já está careca de conhecer), tem os segredos sobre a vulnerabilidade deste instrumento de destruição. Para cumprir o objetivo de obter os segredos da Estrela da Morte e salvar seu pai, Jyn se une a um grupo de rebeldes e um robô reprogramado para ajudá-los.
Primeiramente, o filme precisa lidar com o fato de que todos sabemos como a história vai acabar. Como os rebeldes levaram as tais mensagens que foram cruciais em Uma Nova Esperança é uma história que nunca foi necessária para que compreendamos o cânone, portanto Rogue One já encontra sérias dificuldades para se justificar. Uma saída que justificaria seria construir uma história ao redor da tragédia dos rebeldes que entraram numa missão suicida pelo bem da galáxia. E para que uma história dessas, que permitiria a visão de uma vertente mais cinzenta do cânone de Star Wars, funcione, precisamos de personagens que valham o investimento emocional que neles faremos.
O problema é que o diretor é Garreth Edwards, um sujeito que provou não saber a diferença entre desenvolvimento de personagens e encheção de linguiça em seu Godzilla e que aqui comete os mesmíssimos erros. Aqui este traz como protagonistas duas figuras extremamente aborrecidas e desinteressantes. Pra começar, Felicity Jones conduz a narrativa em dois modos: Indiferente, no qual esta parece não ter expressão alguma, ou choramingo. O segundo é quase sempre acompanhado por Diego Luna, o qual, insuportável, percorre a narrativa com cara de "Olha mãe! Olha como sei fazer cara de sério!". O arco dramático da primeira é risível, tendo em vista que Weitz e Gilroy investem num drama digno de novela da Globo, desde a saudade do pai e até a carência que esta sentiu por causa de seu tutor. Basicamente um draminha que seria resolvido em uma linha de diálogo, mas que qualquer roteirista picareta percebe ser perfeito para justificar mais um monte de páginas de material.
Pra piorar, os coadjuvantes que têm algum potencial, depois de certo tempo são relegados a frases de efeito ridículas ("Eu estou com a força e a força está comigo"?) e a piadinhas. Tomemos como exemplo Donnie Yen e seu personagem. Quem assistiu ao maravilhoso O Grande Mestre ou ao razoável Kung Fu Killer sabe perfeitamente que o ator é um verdadeiro achado do cinema chinês. Após ser bem apresentado, seu personagem, o qual ainda era uma bela oportunidade para a franquia explorar sua inclusividade, afinal a homossexualidade deste é algo perceptível, é jogado de lado totalmente. A incompetência de Edwards e dos roteiristas o relega então a repetir um mantra ridículo e a fazer comentários espirituosos, sem mais nada a dizer além disso.
As alegorias acerca do totalitarismo contemporâneo não conseguem transpôr nada que já não tenha sido visto em outros exemplares da franquia. Não ajuda o fato de que o vilão, interpretado por Ben Mendelsohn, seja o mais patético de todos os oito filmes de Star Wars. Mesmo que o ator tente trazer alguma presença ao personagem, este só serve para ser desautorizado por seus superiores, perdendo no processo qualquer aura de temor que poderia despertar. Além disso, filme traz Forest Whitaker pela enésima vez desperdiçando seu talento com outro papel do tipo durão genérico.
Com uma história péssima, protagonistas péssimos, vilão coitadinho, coadjuvantes mal aproveitados e situações dignas de novelão, resta a Rogue One investir fartamente naquele que tem sido o maior pilar dos blockbusters picaretas: A nostalgia. Assim, mesmo que não faça o menor sentido em termos de cronologia (quem viu Uma Nova Esperança sabe que Darth Vader era hierarquicamente significantemente inferior ao vilão Moff Tarkin), temos que trazer Darth Vader assustando o "vilão" de Mendelsohn, temos que encomendar uma trilha sonora totalmente genérica que ocasionalmente traga acordes de John Williams (santa decadência hein Michael Giacchino?), socar elementos visuais e personagens que lembrem os longas clássicos e temos que ressuscitar Peter Cushing utilizando efeitos visuais que o transformam no Ebenezer Scrooge de Os Fantasmas de Scrooge. Pra ser sincero, se os cinco minutos finais não forçassem tanto o fator nostálgico, tecendo uma conexão do longa com relação a Uma Nova Esperança, Rogue One seria facilmente visto como a pior coisa que essa franquia já gerou. Qual a praticidade em pagar um ingresso para apenas ver coisas que lembrem você de um filme que você gosta? Não é mais fácil ficar em casa e assistir ao original?
Sim, pois aguentar tamanha bobagem numa roupagem pomposa de drama sofisticado que jamais se justifica é a sentença por comprar o ingresso para Rogue One. Há uma sucessão de clímaxes na narrativa para preencher os 133 minutos de duração no qual o espectador é anestesiado com cenas de morte e frases genéricas que beiram a auto-ajuda. Em geral, mesmo com alívios cômicos, o longa se leva a sério demais, e se alguém vier defender o longa alegando que trata-se de um "filme de guerra", lembremos que o princípio por trás do gênero que comporta longas tais como Platoon e O Franco Atirador reside em ver os limites do ser humano, e isso tem tudo a ver com construção de personagens por quem possamos criar empatia. Algo que nunca acontece aqui. Com pessoas aleatórias morrendo pra cá e pra lá, parece bem mais um longa de assassino "slasher", a lá Sexta-Feira 13, do que algo que se aproxime do gênero guerra.
Justiça seja feita: Edwards até consegue originar um ou outro momento mais interessante ao conduzir cenas de ação, e o minuto no qual Darth Vader parte para a ação é disparadamente a melhor coisa que isso aqui poderia oferecer.
Uma pena que pra ver um momentinho bacana tenhamos que suportar um filme tão sisudo e sem personalidade.
Invocação do Mal 2
3.8 2,1K Assista AgoraDICA DA SEMANA: Invocação do Mal 2
invocação do mal 2 é o exemplo de uma sequência bem feita. tem a estrutura do antecessor, mas dá espaço para novas histórias e pirações estéticas do diretor. este, aliás, se chama James Wan, um dos nomes mais importantes da nova geração de cineastas de hollywood. o cara sabe criar tensão, sabe te dar susto e o melhor de tudo, ele sabe contar uma boa história com personagens que têm tempo de tela suficiente para você se afeiçoar por eles. eu sei que wan se divertiu para fazer este filme pois os traços da assinatura dele estão expressos na trilha sonora, na maquiagem, nos cenários e até nos erros. se for ao cinema este final de semana, sua escolha tem que ser invocação do mal 2.
Mogli: O Menino Lobo
3.8 1,0K Assista Agoramogli - o menino lobo é o exemplo perfeito de como disney consegue se reinventar. os caras pegaram um clássico do século passado e transformaram a história, sem se entregar para os modismos atuais. nada de explicações longas, origens obscuras, ligações sem nexo ou gancho para sequências. jon favreau conta a trajetória do garoto e dos animais sem perder a aura infantil e inocente da disney, ao mesmo tempo que inclui tensão e perigo na medida certa para não assustar os mais jovens. uma história boa e bem contada acima de tudo. a beleza do roteiro é também refletida na tecnologia embasbacante que reproduz tigres, elefantes, panteras e lobos. dentro de uma selva construída com perfeição, mogli - o menino lobo deixa um sentimento de nostalgia ao fim da sessão, e ao mesmo tempo apresenta um nova era do estúdio de animação mais importante dos nossos tempos. leve a família para assistir, é um filme para todo mundo.
ps: só vi a versão legendado, que está incrível.
Batman vs Superman - A Origem da Justiça
3.4 5,0K Assista AgoraBatman vs Superman não é uma bomba, tão pouco uma obra-prima do cinema de quadrinhos. Ele talvez seja o DNA de Zack Snyder escancarado na tela. Um conjunto de cenas épicas e páginas de HQs clássicas transportadas com habilidade pra tela de cinema. Visualmente, o diretor continua a mostrar quão bom é em compor quadros em movimento, sem deixar escapar a beleza estética dos quadrinhos. Há coragem também em apresentar uma perspectiva diferente para alguns personagens, como os protagonistas, que nem sempre seguem as regras
estabelecidas em mais de 70 anos de história. Na ação, ele consegue definir escalas para cada personagem: Batman o bruto, Superman o mítico e a Trindade o épico.
Algo que Snyder não sabe fazer, pelo menos nos filmes mais recentes, é contar uma história. E aí não é só jogar cenas
sensacionais ou referências na cara da gente. É construir uma narrativa, trazer um ritmo ao filme que empolgue não só pela espetáculo mas pela conclusão dos arcos apresentados desde o início. Em BvS, ele consegue cumprir isso com Batman, mas falha com todos os outros personagens. O erro fica mais evidente com os gatilhos que o roteiro usa para emocionar e supostamente dar complexidade às situações. A questão da mãe, tão debatida nas redes, é uma ótima sacada usada de forma precária e não combina com nada que foi apresentado até ali. Batman é cascudo, experiente, tem mais de 20 anos no crime e se desmantela com um nome. Um nome que vive na cabeça dele, sim, mas um nome recorrente. Não é o seu Calcanhar de Aquiles, é um problema conhecido, um traço óbvio da personalidade dele.
Esse é só um dos problemas do roteiro de BvS, que ainda encaixa outras cenas neste sentido - a participação de Kevin Costner é outro exemplo. E a Liga da Justiça? Bem, ela está lá. Jogada na cara de todos. As aparições são os fan services óbvios e belos de se ver, mas dentro da narrativa poucos servem para alguma coisa. A primeira aparição de Flash, o email do Batman e as pastas de Lex Luthor estão ali com uma presença grande, e sugam tempo de um filme que sequer consegue contar a própria história e já apresenta outra trama. O melhor fan service de BvS é o uniforme de Robin e Apokolypse - sutis, feitos com propósito de não só agradar ao fã como agregar ao roteiro em si. O problema não é fazer, mas sim o fazer por fazer.
Entre altos e baixos, BvS ao menos finca de vez o tom que a DC quer apresentar no cinema. Batman e Mulher-Maravilha saem bem representados e com uma boa expectativa para os filme solo. E tomara que as comparações diminuam, pois heróis da DC nunca serão iguais aos da Marvel, as questões são mais existenciais e os problemas são outros. Então é óbvio que os filmes serão diferentes - e nada é melhor que isso. A disputa não vai terminar, claro, mas talvez BvS deixe claro que o campo onde cada uma das 'editoras' joga é bem diferente.
Perdido em Marte
4.0 2,3K Assista AgoraRidley Scott aplica em "Perdido em Marte" a tendência da ficção científica, humor e positivismo. Diretores novos como Nolan impressionam com filmes sérios e cabeçudos (Interestelar), a experiência do velho Scott o faz desviar do passado e acreditar no carisma de Matt Damon para abrir portas para uma ficção mais divertida, embora inteligente. A tendência de referenciar a cultura pop misturada com o 'timing' perfeito da edição cria momentos de identificação imediata com o personagem, só um diretor que já caminhou por vários tempos e espaços é capaz de subverter o gênero que ajudou a criar. Mas note que o cerne do 'sci-fi' que é a exploração espacial questionando a crença e a ciência e levando o homem ao desconhecido continua intacta Emoticon wink
Lembrar desse filme é visualizar o Matt Damon se divertindo em Marte ao som de Starman. Que venham mais, embora só exista um Scott, há muitas músicas do Bowie.