Temos um filme aqui de trama riquíssima, cheio de referências não só culturais, como uma trilha sonora potente e aguçada, indo de Janis Joplin a Jimmy Hendrix , como também Simon & Garfunkel, isso é só um trecho a que me limito.
Saindo desse ambiente mais sutil e ganhando corpo nos personagens, vemos ali , nos heróis, a materialização além de diversas estruturas que remetem ao universo do simbólico, temos ali os arquetipos e a delimitação de personalidades bem arrojadas num universo multifacetado.
Watchmen é um filme que vem a tona e fora da curva pra mostrar também justamente a face que se esconde de cada herói, num universo em que possamos nos projetar e ver, que a cada dia, somos nós a encarar desafios e ao mesmo tempo a lidar com vícios.
No entanto, a atitude heróica, creio, e sem me delongar sobre o roteiro do filme, persiste no sonho, na utopia e se, de certo, um dia é plantado algo, germinará para além da unidade, e o que era potência, se fará ato.
Venho ressaltar ao falar desta película tão característica, tão leve, assim como os são a maioria do Studio Ghibli, uma conjuntura de plumas. Ícone e um dos mestres deste empreendimento é o conhecido Hayao Miyazaki, também com suas pérolas, seus filmes capazes de remeter suavemente o território do simbólico, enquanto embarcamos no sonho lúcido. Decifrar estes filmes, além de senti-los principalmente, na mesma medida, penso que seja a forma de levar para nós a mensagem cifrada, o aprendizado.
Neste filme do Ghibli, dirigido por Goro Miyazaki,essa linguagem presente que se faz em nuances, em detalhes, que dá abertura ao tempo para que se preencha e não apenas a sucessão de espaços, ao lúdico, e a tradição mesmo da própria animação japonesa que por se fazer em seus traços simplistas, se mantém de pé, sem apelos quaisquer que sejam além do coração.
E aí podemos fazer dois diálogos o próprio filme, tem em seu âmago um embate entre forças que se faz entre tradições, em torno da "preservação da memória". Desde então aqui para quem assistir o filme verá que essa memória é imaterial, mas ganha corpo, porém, no território do patrimônio, ganha corpo na história, no parentesco, e no que se sucede. Assim como também enquanto clama a assinatura do estilo, seria uma espécie de contracultura a esses valores vigentes? Ou uma forma de valorização do que é simples, para se mostrar mais complexo em outras esferas.
Por falar em outras esferas, talvez numa esfera mais distante, vi este filme tão simples e que não me pareceu absurdo linkar com ele obras como "Aquarius", e se ainda não me falhe a memória "Hiroshima mon Amour".
Muito mais do que um mero filme de terror, esta pérola do cinema, ao pé da letra "não estaremos sozinhos" , oscila entre a figura da treva, do diabólico, bem como do sagrado e que remete a própria essência. É uma filme que se faz necessário ao dialogar sobre o patriarcado, o feminismo, heranças geracionais e ouso dizer que aqui há uma aproximação dos arquétipos do feminino, que se fazem presentes no mundo, e que se delineando ali, tem muitas faces. Estonteante experiência! Tanto pelo modo a que se mostra o horror, como também o poder de imersão a que se sugere as imagens e as paisagens, os monólogos.
Acabando de assistir mais um filme do diretor norueguês Eskil Vogt. Ambos os filmes e únicos lançados(este e blind -2014)até agora tratando da temática de pessoas com deficiência(PCD) de maneira extremamente original e envolvente, mesclando vários elementos que tanto sabem prender o espectador como possuem em si um história rica e cheia de aprendizados, uma experiência única.
Em The Innocents(2021), vemos , provavelmente no título uma referência ao filme de terror também com crianças num ambiente sobrenatural, datado em 1961. No entanto, aquele se trata do sobrenatural ligado ao mundo dos espíritos, este aqui se utiliza de pretextos da infância, seus meandros e aspectos únicos, bem como o autismo, para se desmembrar numa história que se manifesta em fenômenos paranormais, e aí é onde a história também ganha densidade, do início e cada vez mais para chegar ao seu clímax, desenvolvendo-se este terror/suspense com menos apelo ao palpável.
The Innocents é uma história fascinante, e é também interessante ver que a atriz que fazia a deficiente visual em blind, é aqui a mãe de duas irmãs, umas delas autistas. Creio eu que essa possível simbologia ainda que se mostre metaforicamente, no desenrolar da trama, certamente tem um sentido aqui também. Recomendo o filme!
Terminei de assistir na madrugada deste sábado a mais uma pérola do inovador e marcante estúdio A24, que vem cada vez mais mostrando como se faz cinema de arte e pensante. E falando a verdade, posso confessar que minhas expectativas eram baixas, justamente por não gostar do gênero terror slasher, com muita violência e super exposição, mas ao terminar o filme e pensar a proposta como um todo ,deu pra perceber o quão grande a dimensão daquela película se apresentava, e a estética era apenas um dentro desses possíveis recursos para dialogar com um público, creio que em primeira instância a dimensão dos mais jovens e das outras pessoas abertas a essa linguagem.
Antes de tudo, o filme é retratado na década de 70 , e tem como um dos grandes elementos a ser diálogado a pornografia. Como na maioria dos filmes de shasher, há ali um grupo de jovens, os anseios pela liberdade, o sexo, e as inúmeras formas de se ganhar o mundo, e dentro disso, num sistema que não discrimina bem os seus meios de acesso para se obter capital e atingir o lucro, onde aí também está boa extensão da liberdade. Porque então não se utilizar deste próprio sexo como meio para tal fim? O corpo estará ali talvez como libertação ou instrumento?
Dentro disso há um pensamento sobre quem consome, e para isso é preciso haver atuação, atuações convincentes, que seduzam,e nisto onde fica a autenticidade? O espírito?
Neste polo, onde entrará o caráter de suspense com o terror/slasher é onde vejo o encaixe com a hipervisibilidade e toda sorte de estímulos que nos é deixada no contemporâneo. Numa linguagem radical, é exposto visceralmente o que a nosso caráter é banal, se tornanando desbanalizado, contrastado, e referênciando a própria forma que se estabelece a linguagem do pornô
Ainda sobre contrastar, o filme para estabelecer o terror e quem é o vilão, apresenta àqueles jovens aos donos de uma casa que os abrigam após haver um acidente na estrada, um casal de velhinhos, muito idosos e de aparência acabada pelo tempo. Serão ali, aqueles dois, os empreendedores dos crimes, após descobrirem a serviço de que a casa deles está a ser utilizada.
No entanto, falamos aqui de artifícios, e a imagem do casal de velhos, é evocada pra fazer um paralelo com o grupo de jovens, na flor da idade. Os velhos ,invejam sua vitalidade, bem como a indústria do pornô prega o eterno mito da juventude, e dentro desta dinâmica sucedem-se todas as formas de "enganar" o tempo em torno do ideal pregado.
Em torno da figura daqueles velhos, 24 Hrs por dia parece estar ligada a TV, num canal irrefreavel de pregações e moralismos, a reprimir os instintos e incentivar a santidade.
Nesta casa ,onde a velha, um dia já fora uma bela dançarina, hoje procura o seu marido, ele não a olha, ao passo que diz ama-la .
Tudo isto numa encruzilhada, mostrando dilemas contraditórios e que ao mesmo tempo, do velho, vem o novo. E assim se sucede.
No entanto, na iminência do conflito, a trajetória sanguinária do casal de velhinhos se dá, onde cada morte em seu local, forma, ou contexto, traz um caráter simbólico, e como nestes filmes, a morte tem um fator moral e catártico, para expurgar algo do expectador que se encontrava no filme e novamente retornar em catarse, como recurso.
Algumas coisas gostaria de acrescentar neste meu texto feito as pressas e sem organização alguma:
A atriz, protagonista do filme, se mostra como um ideal para a velha da casa, o que a faz recebê-la e lembrar de seus tempos de juventude, além de expia-la nua e deitar a seu lado. A velha dormia com bonecas e via de forma vívida seus tempos áureos, como o passado de suas bonecas e de alguém que não envelheceu bem, a sombra de um marido repressor.
O filme deixa claro ao final um embate entre as gerações , o livre-arbitrio e auto superação, dialoga com o feminismo em mais de uma cena, e apesar de mostrar aquelas figuras muito velhas como elementos ligados ao feio, e daí a trilha macabra, o mau, num contraponto ,não os mostram nenhum pouco como Inofensivos e também, em certo caráter, os humaniza.
Para deixar uma curiosidade e um plus, gostaria de citar talvez uma referência implícita
que tenha ficado aqui neste filme, a um outro filme de terror não citado, o filme se chama Suspiria, e eu não assisti o original do Dario Argento, tive acesso através da versão mais atual. A protagonista do filme é uma das personagens dele e também uma dançarina, onde a professora é tida como "a grande mãe", uma bruxa, interpretada no filme por Tilda Swinton Bem curioso. 🎥
Um grandioso suspense, que além de tocar na complexidade do que também pode acarretar um relacionamento a dois, faz valer bem a questão do que é trilhar seu próprio caminho e sustenta-lo de maneira autêntica. O filme carrega passagens que podem ser reinterpretadas seguindo um viés psicológico a fazer emergir o caráter verdadeiro do quebra-cabeça que parece se ocultar na ficção, para emergir na realidade. O cerne da obra, a "vingança", não distingue amor de ódio, desejo de desprezo. O ápice é está linha tênue , onde talvez pode-se equibrar e atravessar o outro lado com mais firmeza, ou enrolar-se e cortar-se neste emaranhado.
Me parece ser um retrato mais intimista do diretor, que se expõe, mas aqui se utilizando de mais sutilezas e menos dramaticidade. O filme mostra toda uma jornada de amadurecimento e caminhos percorridos, conflitos, a relação do cineasta e seu ofício. O jogo entre ficção e realidade. E na medida que há o sofrimento da imersão e do emaranhamento disto tudo, emerge-se daí o seu aprendizado em forma de catarse, com o poder que a arte lhe confere, traduzindo e universalizando o particular. O filme faz uso, portanto ,da metalinguagem a todo momento, e nos convida ao papel de expectador ativo ,além de tudo.
Meu primeiro Almodóvar, confesso que ainda não fez muito meu estilo por achar algumas situações um pouco forçadas , no entanto, ressalto sua genialidade por representar tão bem o universo feminino e dar desenvoltura as suas facetas de uma forma completamente plural. Por hora, me parece ser um diretor que conhece muito bem as nuances desse mundo, explorando , por vezes, isto, com tamanha originalidade em alguns diálogos. Há aqui também personagens de carisma único e que dão um brilho especial ao filme, demonstrando toda a sua autenticidade. Senti um pouco mais falta de substância e amarramento da obra, mas confesso estar curioso para conhecer mais filmes do diretor
A minha impressão é ter visto um filme que transita entre "o indiferente" e "aquilo que se apossa do núcleo da situação", assim como também há um constante jogo entre a reprodução do real( o que lembra a ficção) e os fatos, e aí existe uma linha tênue. Parece também haver uma tentativa de mostrar a coexistência entre passado e presente, como por exemplo se mostra no antiquário, nos protestos da rua. No entanto, o fotógrafo, se faz como uma testemunha, apegado aquela manifestação dos fatos, a imagem e seu registro são também parte de seu legado. Um fato no filme então(sem deixar spoilers) nos sugere possibilidades para além do que possa nos atestar os olhos, e assim como se sucede os ponteiros da história , ausente de linearidade, a arte transgride.
FILME ESTUPENDO, REPLETO DE POESIA ,REFERÊNCIAS E AUTO- REFERÊNCIAS, SE UTILIZA TAMBÉM DO PODER DE EXPRESSÃO DE CADA IDEIA COLOCADA NAQUELES DIÁLOGOS E EM CADA PERSONAGEM, ESMIUÇANDO MUNDOS, E INDO DO MICRO(a arte no homem), AO MACRO(a natureza), FAZENDO ASSIM DESABROCHAR POR SI A BELEZA. LEMBRANDO QUE O FILME SE UTILIZA DO SEU REFERÊNCIAL CONTEMPORÂNEO PARA SE FAZER REBELAR TAMBÉM CONTRA O TRADICIONALISMO E AÍ ESTÁ TAMBÉM O PODER DA ARTE.
O filme tem ritmo lento e uma narrativa que percorre um caminho repleto de nuances, são dois personagens com estados de espírito distintos mas que de alguma maneira se atraem, fazendo disto um catalisador de tudo que um verdadeiro encontro pode dar, do que pode verdadeiramente eclodir deste, ou desta.
Uma das películas mais belas e arrebatadoras que já vi, de uma beleza estonteante, e uma técnica narrativa perfeita, utilizando-se muito bem do surreal. Exalto aqui também a metáfora que ilustra o filme, carregando consigo sua atmosfera melancólica, capaz de se contrapor do forte e resistente, ao que é mais puro, singelo e delicado.
Sobre o filme, interessante notar a construção inicial da narrativa como panfleto jornalístico, até uma forma de metalinguagem a interagir com o próprio universo da trama, onde "o mito", Kane , após sua morte misteriosa passa a ser estudado. O que vemos então é uma mistura de relato documental, um traçado que se delineia pela vida deste personagem, desde suas origens, suas conquistas , a sua derrocada, seus relacionamentos, o caráter, o homem, o que o molda, e o que o corrompe. Numa estrutura formada por um conjunto de informações até aparentemente descontextualizadas do desfecho, da última palavra dita por Kane antecedendo seu derradeiro fim, acabamos diante de um gigantesco quebra-cabeça, onde este gesto poderia remeter a uma peça, onde uma palavra na verdade pode ser um símbolo, e algo tão incrustado e representante da vida de um sujeito, que acaba por ser nada mais que a raiz que o sustenta, que para além do trauma lhe dita os desejos, e os impetos mais profundos. Desde a criação de um império como a criação de uma expressão de si, a busca de uma identidade, o devido reconhecimento, e aí mesmo também a expressão do "afeto" na materialidade, onde os gestos e a elaboração subjetiva se mostra empobrecida. Kane dá ao mundo o que teve, impossibilitado de amar, de ser recíproco, ainda que fosse um bom homem. Agora, mais uma vez, o que lhe confronta ao fim de seu império é justamente a simplicidade aparente, e o elo, de um tempo remoto, onde existia felicidade, e a vida era nada mais do que o ser na expressão mais pura, e a ausência mesma de qualquer preocupação, num contraponto com todo seu esforço pueril, essa ânsia mesma por algo regida pelo foço de seu inconsciente, e o meio mesmo a lhe apontar as formas de ser, na medida que ele mesmo também as ditava.
Meu primeiro longa de Bunuel e confesso que amei. Consegue mostrar desde certa comunhão entre as pessoas, a bondade, a caridade, o que as une, como também o que as dilacera, fruto muitas vezes de seus desejos mais reprimidos. O filme mostra uma protagonista que nos parece ser testada a quase todo instante, que com certa resignação tenta continuar, tentando combater forças que parecem oprimi-la de todos os lados que parecem querer engoli-la, com tamanha voracidade. Viridiana, ainda assim, com boa fé, sempre mostra a outra face, pois debaixo de suas atitudes há uma visão apaixonada e esperançosa de mundo, há uma ânsia metafísica que a transcende. No entanto, Bunuel, enquanto diretor, para nos mostrar a verdade vai quebrando aos poucos com essa visão utópica de mundo, com essa versão de paraíso concebido na terra, todo esse idealismo. É por isso que o filme apesar de nos apresentar certos alívios cômicos, se mostra também como um drama cruel e muito real. Bunuel no instiga o pensamento e nos abre os olhos para a realidade, não como pessimismo puro, mas atentando as facetas do mundo, das pessoas , e suas manifestações, desde a face que parece se mostrar ingênua, a cruel, ou a mais perspicaz .
Há uma relação com o sentimento de sagrado, o transcendente, e a forma que os homens mesmo se organizam ou se deixam tomar em torno de ideologias, maneiras de pensar e governar de forma passional, tudo numa estrutura narrativa que se sustenta em forma de anteparo durante o caminhar da película. Em certas passagens é como se fosse revelado de forma mais "humana" todo o pensamento que está por trás dos homens, e daí emergem suas ideologias, por muitas vezes seu caráter mais oculto e sombrio. Interessante notar isso pois nas duas vezes há uma aproximação com um sentimento do belo, da poesia, do sagrado ou do mais palpável, do que remete ao humano. É através do protagonista,um astrônomo, onde, no início, dá-se um ensaio do que seria o movimento da terra, do sol, da lua, e um possível eclipse, tudo isso utilizando-se daqueles homens embriagados no bar, não só como astros, mas a representar uma metáfora do que havia de vir, e o sono destes se mostrando ali presente como condição de torpor, inconsciência. Enquanto que também, outro homem da cidade, um senhor, parceiro do protagonista, e amante de piano, nos revela sobre as harmonias musicais, nas quais as mais remotas remetiam a um maior ideal de conformidade com a natureza, uma espécie de "lei divina", e ali ele nos fala também sobre as As Harmonias de Werckmeister. Uma variação e adaptação de um determinado músico, portanto fruto da criação humana(outra metáfora). É o que nomeia o filme, e assim como arte musical exprime sua beleza, mas como sub-produto nosso, enquanto forma de representação do que é puramente humano, no seu seu processo também se desmembra em suas vicissitudes, em suas narrativas por poder, e em seus devaneios. O filme nos faz pensar também sobre a ideia dos grandes ídolos, sobre a alienação e a falta mesma de amor. A figura da baleia enquanto "ícone" é simbólica, bela e grandiosa, majestosa, imponente, no entanto, imóvel, morta, talvez nos sugerindo a ideia de esterelidade. Belíssimo filme que nos faz refletir sobre inúmeras questões, sobretudo políticas e filosóficas.
Um dos melhores filmes que já assisti, trazendo a tona questões sobre a moralidade, a hipocrisia da sociedade capitalista, onde estão ali os marginalizados e os que estão acima dessa casta social. O filme toca no âmbito da lei, e também da comoção popular quanto ao fato de fazer justiça com as próprias mãos. Ainda que seja um tema delicado, e que por isso mereça atenção, ele também toca na questão dos estigmas sociais, nas feridas psíquicas. E quem é capaz de lidar com isso? E de cuidar disso? Onde está a raiz dos problemas de um ser humano perturbado, como "M", por ex?Na verdade, quando o estado não faz sua função, quando as instituições e o seres humanos não são sensíveis uns com os outros, pela configuração mesmo social, podem surgir sintomas sociais que apontam como um problema de toda a estrutura. A trama parece deixar implícita essa questão de "M" e seus anseios, sua compulsão por assassinatos, de outra forma mas contribuindo para esse karma, existem humanos como tantos outros , absortos em problemas, dores, questões individuais que acabam por se projetar nos outros, se perpetuando.
A cena do júri, por parte, além de toda a dor, representa também a desesperança da humanidade, e o clamor de fazer "justiça" com as próprias mãos. Onde o ciclo não cessa, ao contrário, se prolifera, quer se fazer reincenado, talvez como tentativa de cessar a dor.
Já a cena do tribunal, quando uma mulher trajando um manto preto diz: "é preciso cuidar das nossas crianças", isso pra mim, em todo contexto, sentido e encenação, me soou de uma tristeza sem igual, de uma atualidade. Um filme de 1931, e aquele clamor desesperado e feminino, quase materno , um pedido de socorro, é na verdade a resposta para além desta ficção. Nos noticiários e jornais que acompanhamos, ou nas andanças pela cidade grande, para onde está caminhando esta juventude?
Temos aqui uma obra do cinema grego que retrata muito bem características intrínsecas a não só a nossa época mas ao que é mais cru do ser humano, e não só isso, o filme em questão evoca a proposta por trás do argumento de forma bastante original, nos fazendo refletir e nos aguçando através do poder da arte. Aqui vemos questões como o luto, sentimentos de apatia, auto-piedade, a perversão e até a humanidade. É um filme forte, que vai te impactar, podendo te fazer chorar e experimentar sensações ainda mais diversas.
Acabei de assistir o filme "O sacrifício"(1986), do diretor russo Andrey Tarkovsky. Depois de assistir "Stalker",confesso que já estou me acostumando com seu ritmo mais lento e imersivo. Até agora me parece que seus filmes refletem um caráter denso, porque trabalham questões universais, e que cada um de nós já nos confrontamos, querendo ou não.
Vemos aqui neste drama de impacto, a existência desnuda, que nos é apresentada por aqueles personagens que aparecem no plano. O protagonista inicialmente se mostra como um personagem sem fé, e que se debruça junto as suas questões antes mesmo de lidar com o que o filme o revelará. O filme foca inicialmente na sua relação com seu pequeno filho, seus momentos lúdicos, contemplativos e de aprendizado. Posteriormente ficamos sabendo através dos outros personagens que ali aparecem que na verdade é aniversário do personagem principal. É neste cenário que aos poucos vai se criando pano de fundo para dar substância ao que será revelado depois. Desde questões místicas, a relação com Deus,a fé, a filosofia do eterno retorno de Niezstche e o possível início de um terceira guerra nuclear. É a partir daí que a trama se revela em um novo quadro, e tudo que nos foi apresentado parece se colocar em xeque, assim como é a vida, quando muitas vezes a olhamos cheios de nossas certezas.
Para não me alongar e não fazer revelações sobre o filme, é interessante dizer que este foi o último filme de Tarkovsky e que ele o dedicou a seu filho. Ele estava sofrendo com um câncer e muito provavelmente projetou na obra suas questões.
Filme belíssimo, tanto estéticamente, pelas cores, como por toda a poesia que permeia a película. Fora isso, a narrativa carrega um drama forte, traçando a pequena história de cada personagem, em seu enfrentamento diante do cotidiano, seja de forma passiva, ou ativa. Dodeskaden revela também a resiliência daquelas pessoas que vivem em condição de vulnerabilidade , ao passo que também somos levados a ter empatia por cada personagem, por cada história que se revela dentro daquele microcosmos. É um filme aparentemente simples, que nos faz refletir sobre a humanidade, que nos instiga a sensibilidade e que nos ensina que apesar de tudo a vida continua
Um homem que dorme(1974) - Fazia tempo que um filme não tocava tão fortemente nas minhas feridas. Essa película é uma verdadeira provocação sobre a condição que podemos estar inseridos no mundo, tudo isso sendo mostrado a partir de uma narração deveras poética da vida de um homem comum na França. O filme é lento e completamente atmosférico, hipnótico e ainda assim, belo. É um filme curto, no entanto , bastante denso enquanto algo para se assimilar, para refletir, digerir. Terminei de assistir e tudo que eu sinto é uma espécie de vertigem com um lampejo de esperança. Para quem tem interesse por temática existencialista, recomendo fortemente.
Vertigo, ou como título traduzido para o português, um corpo que cai, é um dos filmes mais detalhados e minuciosos que já vi dentro do seu gênero, o suspense. Assisti esse filme nessa madrugada, e a impressão que tinha era que estava lendo um livro, tamanha eram as minúcias que se revelavam na trama, as questões que o filme conseguia tocar. Não é a toa que Hitchcok era visto como um dos maiores gênios que o cinema já teve, ele sabia realmente oque estava fazendo, e assim fazia , com a verdadeira excelência de um mestre. Fui ver esta película esperando um simples suspense para matar o tempo e fui contemplado com a genialidade profunda desta obra. Sem entrar em detalhes ou procurar fazer uma crítica ainda, posso dizer que assim como o protagonista, fui tomado por sua vertigem, e ora me tomava também pela angústia de que existia algo metafísico na trama ou ora me tomava pelo ceticismo. O filme viaja entre passado e futuro, brinca com os nossos sentidos e nos questiona até o que será a verdadeira sanidade, os limites da mente e toda a sua fragilidade quando colocada sobre determinadas circunstâncias.
"Mother!" , o novo filme de Aronofsky é um verdadeiro tiro no pé! Sinto que não vou parar de remoer esse filme em pensamento por um certo tempo. Um filme que no mínimo vale a pena ser visto, tanto pelas sensações que evocam como pelos múltiplos jogos de sentidos que cria através de suas representações simbólicas. Recomendo aos curiosos que assistam e alerto,não esperem sair da sala de cinema da mesma forma que ali entraram.
Watchmen: O Filme
4.0 2,8K Assista AgoraWatchmen(2009)- Zacy Snyder
Temos um filme aqui de trama riquíssima, cheio de referências não só culturais, como uma trilha sonora potente e aguçada, indo de Janis Joplin a Jimmy Hendrix , como também Simon & Garfunkel, isso é só um trecho a que me limito.
Saindo desse ambiente mais sutil e ganhando corpo nos personagens, vemos ali , nos heróis, a materialização além de diversas estruturas que remetem ao universo do simbólico, temos ali os arquetipos e a delimitação de personalidades bem arrojadas num universo multifacetado.
Watchmen é um filme que vem a tona e fora da curva pra mostrar também justamente a face que se esconde de cada herói, num universo em que possamos nos projetar e ver, que a cada dia, somos nós a encarar desafios e ao mesmo tempo a lidar com vícios.
No entanto, a atitude heróica, creio, e sem me delongar sobre o roteiro do filme, persiste no sonho, na utopia e se, de certo, um dia é plantado algo, germinará para além da unidade, e o que era potência, se fará ato.
Da Colina Kokuriko
4.0 243 Assista AgoraFilme visto esta manhã: Da colina Kokuriko(2011)
Venho ressaltar ao falar desta película tão característica, tão leve, assim como os são a maioria do Studio Ghibli, uma conjuntura de plumas. Ícone e um dos mestres deste empreendimento é o conhecido Hayao Miyazaki, também com suas pérolas, seus filmes capazes de remeter suavemente o território do simbólico, enquanto embarcamos no sonho lúcido. Decifrar estes filmes, além de senti-los principalmente, na mesma medida, penso que seja a forma de levar para nós a mensagem cifrada, o aprendizado.
Neste filme do Ghibli, dirigido por Goro Miyazaki,essa linguagem presente que se faz em nuances, em detalhes, que dá abertura ao tempo para que se preencha e não apenas a sucessão de espaços, ao lúdico, e a tradição mesmo da própria animação japonesa que por se fazer em seus traços simplistas, se mantém de pé, sem apelos quaisquer que sejam além do coração.
E aí podemos fazer dois diálogos o próprio filme, tem em seu âmago um embate entre forças que se faz entre tradições, em torno da "preservação da memória". Desde então aqui para quem assistir o filme verá que essa memória é imaterial, mas ganha corpo, porém, no território do patrimônio, ganha corpo na história, no parentesco, e no que se sucede. Assim como também enquanto clama a assinatura do estilo, seria uma espécie de contracultura a esses valores vigentes? Ou uma forma de valorização do que é simples, para se mostrar mais complexo em outras esferas.
Por falar em outras esferas, talvez numa esfera mais distante, vi este filme tão simples e que não me pareceu absurdo linkar com ele obras como "Aquarius", e se ainda não me falhe a memória "Hiroshima mon Amour".
Você Não Estará Só
3.6 124 Assista AgoraMuito mais do que um mero filme de terror, esta pérola do cinema, ao pé da letra "não estaremos sozinhos" , oscila entre a figura da treva, do diabólico, bem como do sagrado e que remete a própria essência. É uma filme que se faz necessário ao dialogar sobre o patriarcado, o feminismo, heranças geracionais e ouso dizer que aqui há uma aproximação dos arquétipos do feminino, que se fazem presentes no mundo, e que se delineando ali, tem muitas faces. Estonteante experiência! Tanto pelo modo a que se mostra o horror, como também o poder de imersão a que se sugere as imagens e as paisagens, os monólogos.
The Innocents
3.7 157Acabando de assistir mais um filme do diretor norueguês Eskil Vogt. Ambos os filmes e únicos lançados(este e blind -2014)até agora tratando da temática de pessoas com deficiência(PCD) de maneira extremamente original e envolvente, mesclando vários elementos que tanto sabem prender o espectador como possuem em si um história rica e cheia de aprendizados, uma experiência única.
Em The Innocents(2021), vemos , provavelmente no título uma referência ao filme de terror também com crianças num ambiente sobrenatural, datado em 1961. No entanto, aquele se trata do sobrenatural ligado ao mundo dos espíritos, este aqui se utiliza de pretextos da infância, seus meandros e aspectos únicos, bem como o autismo, para se desmembrar numa história que se manifesta em fenômenos paranormais, e aí é onde a história também ganha densidade, do início e cada vez mais para chegar ao seu clímax, desenvolvendo-se este terror/suspense com menos apelo ao palpável.
The Innocents é uma história fascinante, e é também interessante ver que a atriz que fazia a deficiente visual em blind, é aqui a mãe de duas irmãs, umas delas autistas. Creio eu que essa possível simbologia ainda que se mostre metaforicamente, no desenrolar da trama, certamente tem um sentido aqui também. Recomendo o filme!
X: A Marca da Morte
3.4 1,2K Assista AgoraX(2022) - Direção: Ti West
Terminei de assistir na madrugada deste sábado a mais uma pérola do inovador e marcante estúdio A24, que vem cada vez mais mostrando como se faz cinema de arte e pensante. E falando a verdade, posso confessar que minhas expectativas eram baixas, justamente por não gostar do gênero terror slasher, com muita violência e super exposição, mas ao terminar o filme e pensar a proposta como um todo ,deu pra perceber o quão grande a dimensão daquela película se apresentava, e a estética era apenas um dentro desses possíveis recursos para dialogar com um público, creio que em primeira instância a dimensão dos mais jovens e das outras pessoas abertas a essa linguagem.
Antes de tudo, o filme é retratado na década de 70 , e tem como um dos grandes elementos a ser diálogado a pornografia. Como na maioria dos filmes de shasher, há ali um grupo de jovens, os anseios pela liberdade, o sexo, e as inúmeras formas de se ganhar o mundo, e dentro disso, num sistema que não discrimina bem os seus meios de acesso para se obter capital e atingir o lucro, onde aí também está boa extensão da liberdade. Porque então não se utilizar deste próprio sexo como meio para tal fim? O corpo estará ali talvez como libertação ou instrumento?
Dentro disso há um pensamento sobre quem consome, e para isso é preciso haver atuação, atuações convincentes, que seduzam,e nisto onde fica a autenticidade? O espírito?
Neste polo, onde entrará o caráter de suspense com o terror/slasher é onde vejo o encaixe com a hipervisibilidade e toda sorte de estímulos que nos é deixada no contemporâneo. Numa linguagem radical, é exposto visceralmente o que a nosso caráter é banal, se tornanando desbanalizado, contrastado, e referênciando a própria forma que se estabelece a linguagem do pornô
Ainda sobre contrastar, o filme para estabelecer o terror e quem é o vilão, apresenta àqueles jovens aos donos de uma casa que os abrigam após haver um acidente na estrada, um casal de velhinhos, muito idosos e de aparência acabada pelo tempo. Serão ali, aqueles dois, os empreendedores dos crimes, após descobrirem a serviço de que a casa deles está a ser utilizada.
No entanto, falamos aqui de artifícios, e a imagem do casal de velhos, é evocada pra fazer um paralelo com o grupo de jovens, na flor da idade. Os velhos ,invejam sua vitalidade, bem como a indústria do pornô prega o eterno mito da juventude, e dentro desta dinâmica sucedem-se todas as formas de "enganar" o tempo em torno do ideal pregado.
Em torno da figura daqueles velhos, 24 Hrs por dia parece estar ligada a TV, num canal irrefreavel de pregações e moralismos, a reprimir os instintos e incentivar a santidade.
Nesta casa ,onde a velha, um dia já fora uma bela dançarina, hoje procura o seu marido, ele não a olha, ao passo que diz ama-la .
Tudo isto numa encruzilhada, mostrando dilemas contraditórios e que ao mesmo tempo, do velho, vem o novo.
E assim se sucede.
No entanto, na iminência do conflito, a trajetória sanguinária do casal de velhinhos se dá, onde cada morte em seu local, forma, ou contexto, traz um caráter simbólico, e como nestes filmes, a morte tem um fator moral e catártico, para expurgar algo do expectador que se encontrava no filme e novamente retornar em catarse, como recurso.
Algumas coisas gostaria de acrescentar neste meu texto feito as pressas e sem organização alguma:
A atriz, protagonista do filme, se mostra como um ideal para a velha da casa, o que a faz recebê-la e lembrar de seus tempos de juventude, além de expia-la nua e deitar a seu lado. A velha dormia com bonecas e via de forma vívida seus tempos áureos, como o passado de suas bonecas e de alguém que não envelheceu bem, a sombra de um marido repressor.
O filme deixa claro ao final um embate entre as gerações , o livre-arbitrio e auto superação, dialoga com o feminismo em mais de uma cena, e apesar de mostrar aquelas figuras muito velhas como elementos ligados ao feio, e daí a trilha macabra, o mau, num contraponto ,não os mostram nenhum pouco como Inofensivos e também, em certo caráter, os humaniza.
Para deixar uma curiosidade e um plus, gostaria de citar talvez uma referência implícita
que tenha ficado aqui neste filme, a um outro filme de terror não citado, o filme se chama Suspiria, e eu não assisti o original do Dario Argento, tive acesso através da versão mais atual. A protagonista do filme é uma das personagens dele e também uma dançarina, onde a professora é tida como "a grande mãe", uma bruxa, interpretada no filme por Tilda Swinton
Bem curioso. 🎥
Animais Noturnos
4.0 2,2K Assista AgoraUm grandioso suspense, que além de tocar na complexidade do que também pode acarretar um relacionamento a dois, faz valer bem a questão do que é trilhar seu próprio caminho e sustenta-lo de maneira autêntica. O filme carrega passagens que podem ser reinterpretadas seguindo um viés psicológico a fazer emergir o caráter verdadeiro do quebra-cabeça que parece se ocultar na ficção, para emergir na realidade. O cerne da obra, a "vingança", não distingue amor de ódio, desejo de desprezo. O ápice é está linha tênue , onde talvez pode-se equibrar e atravessar o outro lado com mais firmeza, ou enrolar-se e cortar-se neste emaranhado.
Dor e Glória
4.2 619 Assista AgoraMe parece ser um retrato mais intimista do diretor, que se expõe, mas aqui se utilizando de mais sutilezas e menos dramaticidade. O filme mostra toda uma jornada de amadurecimento e caminhos percorridos, conflitos, a relação do cineasta e seu ofício. O jogo entre ficção e realidade. E na medida que há o sofrimento da imersão e do emaranhamento disto tudo, emerge-se daí o seu aprendizado em forma de catarse, com o poder que a arte lhe confere, traduzindo e universalizando o particular. O filme faz uso, portanto ,da metalinguagem a todo momento, e nos convida ao papel de expectador ativo ,além de tudo.
Tudo Sobre Minha Mãe
4.2 1,3K Assista AgoraMeu primeiro Almodóvar, confesso que ainda não fez muito meu estilo por achar algumas situações um pouco forçadas , no entanto, ressalto sua genialidade por representar tão bem o universo feminino e dar desenvoltura as suas facetas de uma forma completamente plural. Por hora, me parece ser um diretor que conhece muito bem as nuances desse mundo, explorando , por vezes, isto, com tamanha originalidade em alguns diálogos. Há aqui também personagens de carisma único e que dão um brilho especial ao filme, demonstrando toda a sua autenticidade. Senti um pouco mais falta de substância e amarramento da obra, mas confesso estar curioso para conhecer mais filmes do diretor
Blow-Up: Depois Daquele Beijo
3.9 370 Assista AgoraA minha impressão é ter visto um filme que transita entre "o indiferente" e "aquilo que se apossa do núcleo da situação", assim como também há um constante jogo entre a reprodução do real( o que lembra a ficção) e os fatos, e aí existe uma linha tênue. Parece também haver uma tentativa de mostrar a coexistência entre passado e presente, como por exemplo se mostra no antiquário, nos protestos da rua. No entanto, o fotógrafo, se faz como uma testemunha, apegado aquela manifestação dos fatos, a imagem e seu registro são também parte de seu legado. Um fato no filme então(sem deixar spoilers) nos sugere possibilidades para além do que possa nos atestar os olhos, e assim como se sucede os ponteiros da história , ausente de linearidade, a arte transgride.
A Academia das Musas
3.4 11 Assista AgoraFILME ESTUPENDO, REPLETO DE POESIA ,REFERÊNCIAS E AUTO- REFERÊNCIAS, SE UTILIZA TAMBÉM DO PODER DE EXPRESSÃO DE CADA IDEIA COLOCADA NAQUELES DIÁLOGOS E EM CADA PERSONAGEM, ESMIUÇANDO MUNDOS, E INDO DO MICRO(a arte no homem), AO MACRO(a natureza), FAZENDO ASSIM DESABROCHAR POR SI A BELEZA. LEMBRANDO QUE O FILME SE UTILIZA DO SEU REFERÊNCIAL CONTEMPORÂNEO PARA SE FAZER REBELAR TAMBÉM CONTRA O TRADICIONALISMO E AÍ ESTÁ TAMBÉM O PODER DA ARTE.
O Souvenir
3.0 51 Assista AgoraO filme tem ritmo lento e uma narrativa que percorre um caminho repleto de nuances, são dois personagens com estados de espírito distintos mas que de alguma maneira se atraem, fazendo disto um catalisador de tudo que um verdadeiro encontro pode dar, do que pode verdadeiramente eclodir deste, ou desta.
O Silêncio Não Tem Asas
4.3 10Uma das películas mais belas e arrebatadoras que já vi, de uma beleza estonteante, e uma técnica narrativa perfeita, utilizando-se muito bem do surreal. Exalto aqui também a metáfora que ilustra o filme, carregando consigo sua atmosfera melancólica, capaz de se contrapor do forte e resistente, ao que é mais puro, singelo e delicado.
Cidadão Kane
4.3 990 Assista AgoraSobre o filme, interessante notar a construção inicial da narrativa como panfleto jornalístico, até uma forma de metalinguagem a interagir com o próprio universo da trama, onde "o mito", Kane , após sua morte misteriosa passa a ser estudado. O que vemos então é uma mistura de relato documental, um traçado que se delineia pela vida deste personagem, desde suas origens, suas conquistas , a sua derrocada, seus relacionamentos, o caráter, o homem, o que o molda, e o que o corrompe. Numa estrutura formada por um conjunto de informações até aparentemente descontextualizadas do desfecho, da última palavra dita por Kane antecedendo seu derradeiro fim, acabamos diante de um gigantesco quebra-cabeça, onde este gesto poderia remeter a uma peça, onde uma palavra na verdade pode ser um símbolo, e algo tão incrustado e representante da vida de um sujeito, que acaba por ser nada mais que a raiz que o sustenta, que para além do trauma lhe dita os desejos, e os impetos mais profundos. Desde a criação de um império como a criação de uma expressão de si, a busca de uma identidade, o devido reconhecimento, e aí mesmo também a expressão do "afeto" na materialidade, onde os gestos e a elaboração subjetiva se mostra empobrecida. Kane dá ao mundo o que teve, impossibilitado de amar, de ser recíproco, ainda que fosse um bom homem. Agora, mais uma vez, o que lhe confronta ao fim de seu império é justamente a simplicidade aparente, e o elo, de um tempo remoto, onde existia felicidade, e a vida era nada mais do que o ser na expressão mais pura, e a ausência mesma de qualquer preocupação, num contraponto com todo seu esforço pueril, essa ânsia mesma por algo regida pelo foço de seu inconsciente, e o meio mesmo a lhe apontar as formas de ser, na medida que ele mesmo também as ditava.
Viridiana
4.2 141Meu primeiro longa de Bunuel e confesso que amei. Consegue mostrar desde certa comunhão entre as pessoas, a bondade, a caridade, o que as une, como também o que as dilacera, fruto muitas vezes de seus desejos mais reprimidos. O filme mostra uma protagonista que nos parece ser testada a quase todo instante, que com certa resignação tenta continuar, tentando combater forças que parecem oprimi-la de todos os lados que parecem querer engoli-la, com tamanha voracidade. Viridiana, ainda assim, com boa fé, sempre mostra a outra face, pois debaixo de suas atitudes há uma visão apaixonada e esperançosa de mundo, há uma ânsia metafísica que a transcende. No entanto, Bunuel, enquanto diretor, para nos mostrar a verdade vai quebrando aos poucos com essa visão utópica de mundo, com essa versão de paraíso concebido na terra, todo esse idealismo. É por isso que o filme apesar de nos apresentar certos alívios cômicos, se mostra também como um drama cruel e muito real. Bunuel no instiga o pensamento e nos abre os olhos para a realidade, não como pessimismo puro, mas atentando as facetas do mundo, das pessoas , e suas manifestações, desde a face que parece se mostrar ingênua, a cruel, ou a mais perspicaz
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As Harmonias de Werckmeister
4.3 94Há uma relação com o sentimento de sagrado, o transcendente, e a forma que os homens mesmo se organizam ou se deixam tomar em torno de ideologias, maneiras de pensar e governar de forma passional, tudo numa estrutura narrativa que se sustenta em forma de anteparo durante o caminhar da película.
Em certas passagens é como se fosse revelado de forma mais "humana" todo o pensamento que está por trás dos homens, e daí emergem suas ideologias, por muitas vezes seu caráter mais oculto e sombrio. Interessante notar isso pois nas duas vezes há uma aproximação com um sentimento do belo, da poesia, do sagrado ou do mais palpável, do que remete ao humano. É através do protagonista,um astrônomo, onde, no início, dá-se um ensaio do que seria o movimento da terra, do sol, da lua, e um possível eclipse, tudo isso utilizando-se daqueles homens embriagados no bar, não só como astros, mas a representar uma metáfora do que havia de vir, e o sono destes se mostrando ali presente como condição de torpor, inconsciência. Enquanto que também, outro homem da cidade, um senhor, parceiro do protagonista, e amante de piano, nos revela sobre as harmonias musicais, nas quais as mais remotas remetiam a um maior ideal de conformidade com a natureza, uma espécie de "lei divina", e ali ele nos fala também sobre as As Harmonias de Werckmeister. Uma variação e adaptação de um determinado músico, portanto fruto da criação humana(outra metáfora). É o que nomeia o filme, e assim como arte musical exprime sua beleza, mas como sub-produto nosso, enquanto forma de representação do que é puramente humano, no seu seu processo também se desmembra em suas vicissitudes, em suas narrativas por poder, e em seus devaneios. O filme nos faz pensar também sobre a ideia dos grandes ídolos, sobre a alienação e a falta mesma de amor. A figura da baleia enquanto "ícone" é simbólica, bela e grandiosa, majestosa, imponente, no entanto, imóvel, morta, talvez nos sugerindo a ideia de esterelidade. Belíssimo filme que nos faz refletir sobre inúmeras questões, sobretudo políticas e filosóficas.
M, o Vampiro de Dusseldorf
4.3 278 Assista AgoraUm dos melhores filmes que já assisti, trazendo a tona questões sobre a moralidade, a hipocrisia da sociedade capitalista, onde estão ali os marginalizados e os que estão acima dessa casta social. O filme toca no âmbito da lei, e também da comoção popular quanto ao fato de fazer justiça com as próprias mãos. Ainda que seja um tema delicado, e que por isso mereça atenção, ele também toca na questão dos estigmas sociais, nas feridas psíquicas. E quem é capaz de lidar com isso? E de cuidar disso? Onde está a raiz dos problemas de um ser humano perturbado, como "M", por ex?Na verdade, quando o estado não faz sua função, quando as instituições e o seres humanos não são sensíveis uns com os outros, pela configuração mesmo social, podem surgir sintomas sociais que apontam como um problema de toda a estrutura. A trama parece deixar implícita essa questão de "M" e seus anseios, sua compulsão por assassinatos, de outra forma mas contribuindo para esse karma, existem humanos como tantos outros , absortos em problemas, dores, questões individuais que acabam por se projetar nos outros, se perpetuando.
A cena do júri, por parte, além de toda a dor, representa também a desesperança da humanidade, e o clamor de fazer "justiça" com as próprias mãos. Onde o ciclo não cessa, ao contrário, se prolifera, quer se fazer reincenado, talvez como tentativa de cessar a dor.
Já a cena do tribunal, quando uma mulher trajando um manto preto diz: "é preciso cuidar das nossas crianças", isso pra mim, em todo contexto, sentido e encenação, me soou de uma tristeza sem igual, de uma atualidade. Um filme de 1931, e aquele clamor desesperado e feminino, quase materno , um pedido de socorro, é na verdade a resposta para além desta ficção. Nos noticiários e jornais que acompanhamos, ou nas andanças pela cidade grande, para onde está caminhando esta juventude?
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Piedade
3.6 17Temos aqui uma obra do cinema grego que retrata muito bem características intrínsecas a não só a nossa época mas ao que é mais cru do ser humano, e não só isso, o filme em questão evoca a proposta por trás do argumento de forma bastante original, nos fazendo refletir e nos aguçando através do poder da arte. Aqui vemos questões como o luto, sentimentos de apatia, auto-piedade, a perversão e até a humanidade. É um filme forte, que vai te impactar, podendo te fazer chorar e experimentar sensações ainda mais diversas.
O Sacrifício
4.3 147Acabei de assistir o filme "O sacrifício"(1986), do diretor russo Andrey Tarkovsky.
Depois de assistir "Stalker",confesso que já estou me acostumando com seu ritmo mais lento e imersivo. Até agora me parece que seus filmes refletem um caráter denso, porque trabalham questões universais, e que cada um de nós já nos confrontamos, querendo ou não.
Vemos aqui neste drama de impacto, a existência desnuda, que nos é apresentada por aqueles personagens que aparecem no plano. O protagonista inicialmente se mostra como um personagem sem fé, e que se debruça junto as suas questões antes mesmo de lidar com o que o filme o revelará. O filme foca inicialmente na sua relação com seu pequeno filho, seus momentos lúdicos, contemplativos e de aprendizado. Posteriormente ficamos sabendo através dos outros personagens que ali aparecem que na verdade é aniversário do personagem principal. É neste cenário que aos poucos vai se criando pano de fundo para dar substância ao que será revelado depois. Desde questões místicas, a relação com Deus,a fé, a filosofia do eterno retorno de Niezstche e o possível início de um terceira guerra nuclear.
É a partir daí que a trama se revela em um novo quadro, e tudo que nos foi apresentado parece se colocar em xeque, assim como é a vida, quando muitas vezes a olhamos cheios de nossas certezas.
Para não me alongar e não fazer revelações sobre o filme, é interessante dizer que este foi o último filme de Tarkovsky e que ele o dedicou a seu filho.
Ele estava sofrendo com um câncer e muito provavelmente projetou na obra suas questões.
Dodeskaden - O Caminho da Vida
4.3 45Filme belíssimo, tanto estéticamente, pelas cores, como por toda a poesia que permeia a película. Fora isso, a narrativa carrega um drama forte, traçando a pequena história de cada personagem, em seu enfrentamento diante do cotidiano, seja de forma passiva, ou ativa. Dodeskaden revela também a resiliência daquelas pessoas que vivem em condição de vulnerabilidade , ao passo que também somos levados a ter empatia por cada personagem, por cada história que se revela dentro daquele microcosmos. É um filme aparentemente simples, que nos faz refletir sobre a humanidade, que nos instiga a sensibilidade e que nos ensina que apesar de tudo a vida continua
Um Homem que Dorme
4.4 195Um homem que dorme(1974) - Fazia tempo que um filme não tocava tão fortemente nas minhas feridas. Essa película é uma verdadeira provocação sobre a condição que podemos estar inseridos no mundo, tudo isso sendo mostrado a partir de uma narração deveras poética da vida de um homem comum na França. O filme é lento e completamente atmosférico, hipnótico e ainda assim, belo. É um filme curto, no entanto , bastante denso enquanto algo para se assimilar, para refletir, digerir. Terminei de assistir e tudo que eu sinto é uma espécie de vertigem com um lampejo de esperança. Para quem tem interesse por temática existencialista, recomendo fortemente.
Um Corpo que Cai
4.2 1,3K Assista AgoraVertigo, ou como título traduzido para o português, um corpo que cai, é um dos filmes mais detalhados e minuciosos que já vi dentro do seu gênero, o suspense. Assisti esse filme nessa madrugada, e a impressão que tinha era que estava lendo um livro, tamanha eram as minúcias que se revelavam na trama, as questões que o filme conseguia tocar. Não é a toa que Hitchcok era visto como um dos maiores gênios que o cinema já teve, ele sabia realmente oque estava fazendo, e assim fazia , com a verdadeira excelência de um mestre. Fui ver esta película esperando um simples suspense para matar o tempo e fui contemplado com a genialidade profunda desta obra. Sem entrar em detalhes ou procurar fazer uma crítica ainda, posso dizer que assim como o protagonista, fui tomado por sua vertigem, e ora me tomava também pela angústia de que existia algo metafísico na trama ou ora me tomava pelo ceticismo. O filme viaja entre passado e futuro, brinca com os nossos sentidos e nos questiona até o que será a verdadeira sanidade, os limites da mente e toda a sua fragilidade quando colocada sobre determinadas circunstâncias.
Três Homens em Conflito
4.6 1,2K Assista Agora"Existem dois tipos de homens neste mundo meu amigo: Aqueles com armas carregadas e aqueles que cavam. Você cava..."
Bacurau
4.3 2,7K Assista Agora"Vim aqui só pra dizer
Ninguém há de me calar
Se alguém tem que morrer
Que seja pra melhorar
Tanta vida pra viver
Tanta vida a se acabar
Com tanto pra se fazer
Com tanto pra se salvar
Você que não me entendeu
Não perde por esperar"
G.Vandré
Mãe!
4.0 3,9K Assista Agora"Mother!" , o novo filme de Aronofsky é um verdadeiro tiro no pé! Sinto que não vou parar de remoer esse filme em pensamento por um certo tempo. Um filme que no mínimo vale a pena ser visto, tanto pelas sensações que evocam como pelos múltiplos jogos de sentidos que cria através de suas representações simbólicas. Recomendo aos curiosos que assistam e alerto,não esperem sair da sala de cinema da mesma forma que ali entraram.