Surtado, irado e inteligente. Uma sátira sobre o formato e estilo dos filmes dos anos 80. Temos os estereótipos e as gags da época. Ao mesmo tempo, tão nerd, com humor, ágil. Interessante como tem elementos daquela época e a própria trama se delicia com suas referências. Impossível não sentir uma espécie de nostalgia com tantos elementos em cena. A trilha sonora eletrônica e o tema-principal, "Survivor do David Hasselhof" é delirante e transmite toda essa aura de outrora. Foda demais!
O aflorar do sentimento entre dois juvenis. O despertar do desejo frente a surpresa do destino que tenta separá-los, quando um dos dois precisa mudar de cidade por conta das decisões dos pais. Explora os sentidos e tenta destrancar as ânsias da adolescência. Porém, fragiliza-se com a superficialidade do roteiro e da inexpressividade dos atores.
A prática do voyeurismo como um ato humano. O desejo mais obscuro possível. O tesão como elemento da natureza e da libido selvagem. Não há como fugir, o ser humano sente-se atraído pelo desconhecido, pelo que é tabu, pelo que existe ainda segredado. O lado mais possível da sexualidade está muito atrelado a essa percepção: o tesão vem, em grande parte, por algo que seja "proibido" ou que seja visto como libertino, transgressor ou mesmo perverso. A ideia da concepção de "sexo sujo" ou mesmo "sexo selvagem" é algo que se relaciona à sexualidade mais primária, longe do conservadorismo ou mesmo do puritanismo. Não é à toa que o exercício do voyeur seja basicamente este, exercer seu interesse na observação e, dessa forma, externar sua libido mais obscura possível. Não é por menos que o sexo ainda seja um condicionamento de debate e descobertas, tido como mistério eterno, visto que as possibilidades para os caminhos dos prazeres carnais sejam fundamentadas no ilimitado. Cada ser humano exerce seu prazer individual, cada um tem seus anseios e seus fetiches. Em 1950 o novelista francês Jean Genet foi provocador ao lançar um filme mudo, em preto e branco, com metragem de apenas 25 minutos.
Este é um trabalho perfeito para a atmosfera homoerótica, um filme bastante ousado e de proporção sexualizada por conta das intenções narrativas. Por trazer uma forte carga de erotismo, muitas pessoas o classificam como soft-porn. Superficialmente, o filme seria apenas uma amostra sobre um olhar mais íntimo ou mesmo um aprofundamento do desejo homossexual: fantasias dentro do espaço de uma prisão.
Centrando-se no típico imaginário homossexual e bem de acordo com os fetiches mais proeminentes, Genet exerce um trabalho que centra seu fascínio na linguagem imagética, recurso perfeito para o aspecto do voyeurismo homossexual: gays que gostam de observar outros em práticas de sexo imoderado, perverso ou até sadomasoquista — há a exploração do elemento do sadomasoquismo e violência como aspectos de atração entre os homens retratados no filme e do provável espectador que, assim como o guarda vouyer, mantém o olhar direcionado para esses elementos geralmente classificados como “libertinagem e perversão”.
Interessante que este filme utiliza-se de imagens em ebulição, corpos em movimentos, ideias mais básicas com o intuito de friccionar a mais pura reflexão libidinal — qual o imaginário mais evidente do homossexual? Homens másculos em exercícios perfeitos de desejos, liberando a testosterona e exercendo a "pegação carnal". O filme utiliza-se de três personagens principais: dois prisioneiros gays confinados e que se amam entre si, sob o olhar atento de um guarda que sente necessidade em observá-los.
Contra os tabus e tipicamente fugindo do estereótipo da moralidade, o filme apresenta o desejo mais absurdo. O filme mostra este guarda na prática do voyeurismo, não só admirando o casal central de prisioneiros, mas os demais de diversas celas — o tesão em ver outros corpos de homens em danças particulares (a sequência de um negro ritmando uma coreografia particular); um outro masturbando-se num banho; etc. A câmera de Genet não tem pudor em exteriorizar ou mesmo "esteriotipar" o que há de mais caloroso no universo homoerótico: closes em axilas, pernas, braços, pescoço ou mesmo tornando-se também mais voyeur em colocar os homens suados com o membro fálico bem à mostra, ereto, sem pudor.
Como uma espécie de "sonho sexual", por ter essa transparência um tanto surrealista em termos de imagens — principalmente por conta do uso do contraste das luzes — e da mise-en-scène dos presos com certos posicionamentos maliciosos, o filme se fundamenta bem como algo até surrealista. O erotismo aqui se transveste como algo poético, irrevogavelmente sensorial e de extrema capacidade de tornar algo tão transgressor em apreciação natural. A sutileza também é presente na maneira como o filme expõe o desejo e até o sentimento entre os dois prisioneiros principais, o público percebe que ali coexiste o tesão juntamente com uma afetividade — ainda que sem tocar, separados por uma parede, os dois homens interagem de maneira própria, buscando alguma espécie de contato.
Jean Genet claramente quis exercer um ato deliberado e promissor quanto às motivações e idealizações do mundo gay. E conseguiu, o trabalho ainda exerce fascínio e é ponto de provocação na contemporaneidade. Curiosamente, o filme não possuia som algum quando lançado, porém em 1973 o instrumentista Gavin Bryars compôs uma trilha sonora para a obra — dando um aspecto mais psicodélico e até mais delirante à degustação.
"Eu fui enterrada e não me deram a extrema unção, e agora a minha alma está presa dentro do caixão. Eu sinto as vermes comendo a minha carne, eu sinto a dor."
O dinheiro pode até comprar o sexo, mas nunca o sentimento. Gregor Schmidinger tem uma ideia interessante, espero que seja concebido em formato de longa-metragem em breve.
Apenas a intenção de apresentar em cena um figurino retrô? Um quadro que estampa "Laranja Mecânica"? Isso que chamo de nonsense mais puro possível. Os primeiros dois minutos aparentam uma boa concepção, mas o curta é muito frágil e os atores demonstram uma canastrice exorbitante.
Como diluir a timidez que inviabiliza a expressão do sentimento? Afinal, do coração nada se sabe - só se sente. E é com a tocante sensibilidade que o curta sueco Lucky Blue, dirigido por Håkon Liu, exerce seu objetivo. É um pequeno trabalho que valoriza a expressão do sentimento, singelo drama romântico juvenil homossexual. O curta centraliza a vivência de dois jovens: Olle (Tobias Bengtsson) prepara-se para organizar um festival de música anual (karaokê), evento que ocorre anualmente em todo verão, num vilarejo pacato no interior da Suécia, em um tipo de acampamento com traillers. Inesperadamente, o destino reserva: a amiga do pai de Olle convida seu sobrinho: Kevin (Tom Lofterud), um rapaz da mesma faixa de idade dele, para passar uns dias com a família. E é aí que reside o argumento também escrito pelo diretor Liu: o que poderia ser apenas uma amizade ocasional, torna-se uma atração que surpreende os dois jovens. Como entender esta sensação inesperada? O que ocorre, na verdade? Será apenas uma confusão? Enquanto Olle é extremamente introspectivo, calmo e um tanto tímido - Kevin é seu oposto, demonstra uma hiperatividade e um determinismo mais vital. E ambos se aproximam com papos desconexos, diálogos do cotidiano e uma intimidade que cresce e ganha forma. Através de um incidente com um pássaro (chamado Lucky Blue) da tia de Kevin - ele foge da gaiola - os dois garotos tornam-se cúmplices. Algo que evolui, gradativamente os deixando confusos e com dúvidas intensas. Curiosa a analogia com o pássaro: Lucky Blue se liberta da gaiola, exerce o livre-arbítrio, age com a própria vontade e escolha - seria essa a grande necessidade que sente os garotos? Seguir o desejo, demonstrar o que sente? Essa interpretação é evidente. A intimidade entre os dois permite o já inevitável: Kevin, numa atitude impulsiva, beija Olle.
Nota-se aí os abalos: enquanto Olle, um pacato rapaz intimista e frágil, assume seu lado mais passional - demonstra gostar do companheiro, procura entendê-lo e questiona seus próprios desejos íntimos e esse sentimento amoroso que vivencia; Kevin se mostra mais áspero, tem atitudes inconstantes de mal-humor e descaso, como se mascarasse o próprio desejo que o fere. Bem verdade, ambos se apaixonam e necessitam viver tudo imediatamente - mas, como enfrentar? Se Olle é mais sentimental, ainda que seja difícil lidar com sua timidez - Kevin tem uma rebeldia mais nítida, opondo-se a ele para apenas fugir do que sente. Ambos se desejam - dois jovens belos, sintonia cativante. E, aos poucos, tanto um quanto o outro aprende a expressar esse estranho e confuso sentimento. Questionar a própria intimidade é tarefa complicada, ainda mais quando se é jovem e imerso nas fragilidades do desejo - mais, é na fase da adolescência que muitos rapazes descobre seus interesses sexuais e não só os hormônios estão em ebulição, mas os sentires também. Atração pelo mesmo sexo? Desejos secretos? Olle e Kevin refletem a realidade de muitos garotos por aí - jovens que tendem a ter medo de se assumir, até pra si mesmo. Tem algo mais dolorido que tentar conter o desejo? Quem dirá atenuar o que pulsa o coração. A alma sofre. E o corpo pede, clama.
O curta é extremamente singelo, sensível, repleto de olhares e momentos silenciosos entre os dois. Há uma direção cuidadosa, o tom narrativo favorece por ser extremamente objetivo e focar nos dois, visto que o filme tem pouca duração. Há um ar poético na composição das falas, na maneira como os personagens demonstram o que sentem - a canção "Words Don't Come Easy"(sucesso de F.R. Davis da década de 80) cantada por Olle para Kevin, em dado momento, é delicada e envolvente. Há cenas que ambos apenas se olham e é perceptível o que eles vivenciam. E o curta tem esta expressão naturalizada, realista, sem adornos. Tudo flui harmonicamente. Não há a valorização do sexo entre os garotos - mas, a descoberta da paixão e do aflorar do desejo que é consequente do sentimento juvenil. Um discreto trabalho humano gay de imensa qualidade.
O curta metragem brasileiro Café com leite, dirigido por Daniel Ribeiro é extremamente simples: contudo, cativa de maneira eficaz pela naturalidade proposta. O enredo foca no casal de namorados Danilo e Marcos: ambos vivem imersos em amor condensado em sexo, sintonia e fidelidade. Ambos atingem a maturidade no relacionamento. Quando o fotógrafo Danilo decide sair da casa dos pais para fidelizar compromisso com o namorado, eis que subitamente a tragédia: seus pais morrem num acidente de carro. Como se não bastasse tamanha reviravolta emocional, Danilo torna-se o único responsável pelo seu irmão caçula, Lucas. O curta foca nessa sutil problemática: como lidar com o inesperado? Como manter um desejo no namoro? Danilo preocupa-se em cuidar do pequeno irmão e ainda tem que promover articulações para sustentar seu relacionamento- já que este expressa carência afetiva e sexual. Então, novos laços são recriados e o cotidiano se transforma: Danilo convida Marcos a dividir seu apartamento em companhia do menino. Enquanto os irmãos tentam driblar a própria vivência de um para o outro, Marcos tenta encontrar seu sentido dentro daquela nova relação estrutural familiar. O pequeno Lucas é esperto, mas sensível e logo percebe que seu irmão mais velho é homossexual.
O diretor Daniel Ribeiro em tão poucos minutos recria um universo brasileiro, os diálogos parecem improvisados e são naturalizados pelos atores à vontade com a câmera observadora. Observamos o dia a dia dos três, a relação de família que se configura: Seriam Danilo e Marcos os pais educacionais do menino Lucas? Como sustentar essa adoção? Todo casal gay merece adotar um filho - será que os namorados estão cientes do novo encargo? Haja vista que tudo não foi premeditado, as circunstâncias do destino, apenas.
Sem maniqueísmo, o discurso do filme é abraçar e comprometer-se com delicadas questões da adoção gay, direitos à união civil homossexual - ainda que tão rapidamente, há esse discurso subliminar, essencialmente humanista. O curioso é que a figura da criança determina abalos no relacionamento do casal - o menino, por vezes, inclusive, parece mais maduro que o irmão em algumas situações. Apesar de nítidas dificuldades, o que poderia ter se evidenciado um fardo, traz à tona admiráveis e profundos sentimentos humanos: altruísmo, confiança, solidariedade e, acima de tudo, a dedicação da amorosidade. Relações ternas, intensas dos três - sem ser piegas. E
m Café com Leite, a pureza e a ternura emergem da dor, ilustrada no ícone maternal do copo de leite, surgindo como remédio e alento para o coração. Este drama soft gay desvia de polêmicas e mira exatamente no afeto humano. É cativante a maneira como o cinema queer consegue se recriar fora do espaço underground e corteja seu próprio espaço no mainstream. Daniel Tavares e Diego Torraca são íntimos e têm química interpretando o casal e Eduardo Melo, o pequeno Lucas, demonstra talento e se destaca na produção. O curta foi recentemente premiado com o Urso de Cristal no 58º Festival Internacional de Cinema de Berlim. Ganhou menção honrosa na categoria curta-metragem de ficção do Festival de Cartagena, na Colômbia, além de presença nos principais festivais nacionais e internacionais de cinema. Um curta tão interessante merecia ter maior tempo de duração – tudo que é bom dura pouco.
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Kung Fury
4.2 366 Assista AgoraSurtado, irado e inteligente. Uma sátira sobre o formato e estilo dos filmes dos anos 80. Temos os estereótipos e as gags da época. Ao mesmo tempo, tão nerd, com humor, ágil. Interessante como tem elementos daquela época e a própria trama se delicia com suas referências. Impossível não sentir uma espécie de nostalgia com tantos elementos em cena. A trilha sonora eletrônica e o tema-principal, "Survivor do David Hasselhof" é delirante e transmite toda essa aura de outrora. Foda demais!
Enquanto Ainda é Tempo
1.7 21O aflorar do sentimento entre dois juvenis. O despertar do desejo frente a surpresa do destino que tenta separá-los, quando um dos dois precisa mudar de cidade por conta das decisões dos pais. Explora os sentidos e tenta destrancar as ânsias da adolescência. Porém, fragiliza-se com a superficialidade do roteiro e da inexpressividade dos atores.
Um Canto de Amor
4.1 52A prática do voyeurismo como um ato humano. O desejo mais obscuro possível. O tesão como elemento da natureza e da libido selvagem. Não há como fugir, o ser humano sente-se atraído pelo desconhecido, pelo que é tabu, pelo que existe ainda segredado. O lado mais possível da sexualidade está muito atrelado a essa percepção: o tesão vem, em grande parte, por algo que seja "proibido" ou que seja visto como libertino, transgressor ou mesmo perverso. A ideia da concepção de "sexo sujo" ou mesmo "sexo selvagem" é algo que se relaciona à sexualidade mais primária, longe do conservadorismo ou mesmo do puritanismo. Não é à toa que o exercício do voyeur seja basicamente este, exercer seu interesse na observação e, dessa forma, externar sua libido mais obscura possível. Não é por menos que o sexo ainda seja um condicionamento de debate e descobertas, tido como mistério eterno, visto que as possibilidades para os caminhos dos prazeres carnais sejam fundamentadas no ilimitado. Cada ser humano exerce seu prazer individual, cada um tem seus anseios e seus fetiches. Em 1950 o novelista francês Jean Genet foi provocador ao lançar um filme mudo, em preto e branco, com metragem de apenas 25 minutos.
Este é um trabalho perfeito para a atmosfera homoerótica, um filme bastante ousado e de proporção sexualizada por conta das intenções narrativas. Por trazer uma forte carga de erotismo, muitas pessoas o classificam como soft-porn. Superficialmente, o filme seria apenas uma amostra sobre um olhar mais íntimo ou mesmo um aprofundamento do desejo homossexual: fantasias dentro do espaço de uma prisão.
Centrando-se no típico imaginário homossexual e bem de acordo com os fetiches mais proeminentes, Genet exerce um trabalho que centra seu fascínio na linguagem imagética, recurso perfeito para o aspecto do voyeurismo homossexual: gays que gostam de observar outros em práticas de sexo imoderado, perverso ou até sadomasoquista — há a exploração do elemento do sadomasoquismo e violência como aspectos de atração entre os homens retratados no filme e do provável espectador que, assim como o guarda vouyer, mantém o olhar direcionado para esses elementos geralmente classificados como “libertinagem e perversão”.
Interessante que este filme utiliza-se de imagens em ebulição, corpos em movimentos, ideias mais básicas com o intuito de friccionar a mais pura reflexão libidinal — qual o imaginário mais evidente do homossexual? Homens másculos em exercícios perfeitos de desejos, liberando a testosterona e exercendo a "pegação carnal". O filme utiliza-se de três personagens principais: dois prisioneiros gays confinados e que se amam entre si, sob o olhar atento de um guarda que sente necessidade em observá-los.
Contra os tabus e tipicamente fugindo do estereótipo da moralidade, o filme apresenta o desejo mais absurdo. O filme mostra este guarda na prática do voyeurismo, não só admirando o casal central de prisioneiros, mas os demais de diversas celas — o tesão em ver outros corpos de homens em danças particulares (a sequência de um negro ritmando uma coreografia particular); um outro masturbando-se num banho; etc. A câmera de Genet não tem pudor em exteriorizar ou mesmo "esteriotipar" o que há de mais caloroso no universo homoerótico: closes em axilas, pernas, braços, pescoço ou mesmo tornando-se também mais voyeur em colocar os homens suados com o membro fálico bem à mostra, ereto, sem pudor.
Como uma espécie de "sonho sexual", por ter essa transparência um tanto surrealista em termos de imagens — principalmente por conta do uso do contraste das luzes — e da mise-en-scène dos presos com certos posicionamentos maliciosos, o filme se fundamenta bem como algo até surrealista. O erotismo aqui se transveste como algo poético, irrevogavelmente sensorial e de extrema capacidade de tornar algo tão transgressor em apreciação natural. A sutileza também é presente na maneira como o filme expõe o desejo e até o sentimento entre os dois prisioneiros principais, o público percebe que ali coexiste o tesão juntamente com uma afetividade — ainda que sem tocar, separados por uma parede, os dois homens interagem de maneira própria, buscando alguma espécie de contato.
Jean Genet claramente quis exercer um ato deliberado e promissor quanto às motivações e idealizações do mundo gay. E conseguiu, o trabalho ainda exerce fascínio e é ponto de provocação na contemporaneidade. Curiosamente, o filme não possuia som algum quando lançado, porém em 1973 o instrumentista Gavin Bryars compôs uma trilha sonora para a obra — dando um aspecto mais psicodélico e até mais delirante à degustação.
Extrema Unção
3.2 86"Eu fui enterrada e não me deram a extrema unção, e agora a minha alma está presa dentro do caixão. Eu sinto as vermes comendo a minha carne, eu sinto a dor."
O Dia M
3.4 10Metáfora de mundo efêmero, falsa felicidade e solidão humana.
EletroTorpe
3.8 3Excelente! Intriga.
The Boy Next Door
3.6 45O dinheiro pode até comprar o sexo, mas nunca o sentimento. Gregor Schmidinger tem uma ideia interessante, espero que seja concebido em formato de longa-metragem em breve.
Sangue Alugado
1.8 37Apenas a intenção de apresentar em cena um figurino retrô? Um quadro que estampa "Laranja Mecânica"? Isso que chamo de nonsense mais puro possível. Os primeiros dois minutos aparentam uma boa concepção, mas o curta é muito frágil e os atores demonstram uma canastrice exorbitante.
Os Filhos de Nelson
3.2 5A sexualidade é um ato de mistério, medo e provocação. O ser humano não consegue fugir disso, ainda que queira.
Heiko
2.3 10Símbolo perfeito do sexo obscuro, da dependência emocional e das relações casuais tão desconexas e sinistras da contemporaneidade. Tenso demais.
Lucky Blue
3.5 98Como diluir a timidez que inviabiliza a expressão do sentimento? Afinal, do coração nada se sabe - só se sente. E é com a tocante sensibilidade que o curta sueco Lucky Blue, dirigido por Håkon Liu, exerce seu objetivo. É um pequeno trabalho que valoriza a expressão do sentimento, singelo drama romântico juvenil homossexual. O curta centraliza a vivência de dois jovens: Olle (Tobias Bengtsson) prepara-se para organizar um festival de música anual (karaokê), evento que ocorre anualmente em todo verão, num vilarejo pacato no interior da Suécia, em um tipo de acampamento com traillers. Inesperadamente, o destino reserva: a amiga do pai de Olle convida seu sobrinho: Kevin (Tom Lofterud), um rapaz da mesma faixa de idade dele, para passar uns dias com a família. E é aí que reside o argumento também escrito pelo diretor Liu: o que poderia ser apenas uma amizade ocasional, torna-se uma atração que surpreende os dois jovens. Como entender esta sensação inesperada? O que ocorre, na verdade? Será apenas uma confusão? Enquanto Olle é extremamente introspectivo, calmo e um tanto tímido - Kevin é seu oposto, demonstra uma hiperatividade e um determinismo mais vital. E ambos se aproximam com papos desconexos, diálogos do cotidiano e uma intimidade que cresce e ganha forma. Através de um incidente com um pássaro (chamado Lucky Blue) da tia de Kevin - ele foge da gaiola - os dois garotos tornam-se cúmplices. Algo que evolui, gradativamente os deixando confusos e com dúvidas intensas. Curiosa a analogia com o pássaro: Lucky Blue se liberta da gaiola, exerce o livre-arbítrio, age com a própria vontade e escolha - seria essa a grande necessidade que sente os garotos? Seguir o desejo, demonstrar o que sente? Essa interpretação é evidente. A intimidade entre os dois permite o já inevitável: Kevin, numa atitude impulsiva, beija Olle.
Nota-se aí os abalos: enquanto Olle, um pacato rapaz intimista e frágil, assume seu lado mais passional - demonstra gostar do companheiro, procura entendê-lo e questiona seus próprios desejos íntimos e esse sentimento amoroso que vivencia; Kevin se mostra mais áspero, tem atitudes inconstantes de mal-humor e descaso, como se mascarasse o próprio desejo que o fere. Bem verdade, ambos se apaixonam e necessitam viver tudo imediatamente - mas, como enfrentar? Se Olle é mais sentimental, ainda que seja difícil lidar com sua timidez - Kevin tem uma rebeldia mais nítida, opondo-se a ele para apenas fugir do que sente. Ambos se desejam - dois jovens belos, sintonia cativante. E, aos poucos, tanto um quanto o outro aprende a expressar esse estranho e confuso sentimento. Questionar a própria intimidade é tarefa complicada, ainda mais quando se é jovem e imerso nas fragilidades do desejo - mais, é na fase da adolescência que muitos rapazes descobre seus interesses sexuais e não só os hormônios estão em ebulição, mas os sentires também. Atração pelo mesmo sexo? Desejos secretos? Olle e Kevin refletem a realidade de muitos garotos por aí - jovens que tendem a ter medo de se assumir, até pra si mesmo. Tem algo mais dolorido que tentar conter o desejo? Quem dirá atenuar o que pulsa o coração. A alma sofre. E o corpo pede, clama.
O curta é extremamente singelo, sensível, repleto de olhares e momentos silenciosos entre os dois. Há uma direção cuidadosa, o tom narrativo favorece por ser extremamente objetivo e focar nos dois, visto que o filme tem pouca duração. Há um ar poético na composição das falas, na maneira como os personagens demonstram o que sentem - a canção "Words Don't Come Easy"(sucesso de F.R. Davis da década de 80) cantada por Olle para Kevin, em dado momento, é delicada e envolvente. Há cenas que ambos apenas se olham e é perceptível o que eles vivenciam. E o curta tem esta expressão naturalizada, realista, sem adornos. Tudo flui harmonicamente. Não há a valorização do sexo entre os garotos - mas, a descoberta da paixão e do aflorar do desejo que é consequente do sentimento juvenil. Um discreto trabalho humano gay de imensa qualidade.
Café com Leite
3.5 364O curta metragem brasileiro Café com leite, dirigido por Daniel Ribeiro é extremamente simples: contudo, cativa de maneira eficaz pela naturalidade proposta. O enredo foca no casal de namorados Danilo e Marcos: ambos vivem imersos em amor condensado em sexo, sintonia e fidelidade. Ambos atingem a maturidade no relacionamento. Quando o fotógrafo Danilo decide sair da casa dos pais para fidelizar compromisso com o namorado, eis que subitamente a tragédia: seus pais morrem num acidente de carro. Como se não bastasse tamanha reviravolta emocional, Danilo torna-se o único responsável pelo seu irmão caçula, Lucas. O curta foca nessa sutil problemática: como lidar com o inesperado? Como manter um desejo no namoro? Danilo preocupa-se em cuidar do pequeno irmão e ainda tem que promover articulações para sustentar seu relacionamento- já que este expressa carência afetiva e sexual. Então, novos laços são recriados e o cotidiano se transforma: Danilo convida Marcos a dividir seu apartamento em companhia do menino. Enquanto os irmãos tentam driblar a própria vivência de um para o outro, Marcos tenta encontrar seu sentido dentro daquela nova relação estrutural familiar. O pequeno Lucas é esperto, mas sensível e logo percebe que seu irmão mais velho é homossexual.
O diretor Daniel Ribeiro em tão poucos minutos recria um universo brasileiro, os diálogos parecem improvisados e são naturalizados pelos atores à vontade com a câmera observadora. Observamos o dia a dia dos três, a relação de família que se configura: Seriam Danilo e Marcos os pais educacionais do menino Lucas? Como sustentar essa adoção? Todo casal gay merece adotar um filho - será que os namorados estão cientes do novo encargo? Haja vista que tudo não foi premeditado, as circunstâncias do destino, apenas.
Sem maniqueísmo, o discurso do filme é abraçar e comprometer-se com delicadas questões da adoção gay, direitos à união civil homossexual - ainda que tão rapidamente, há esse discurso subliminar, essencialmente humanista. O curioso é que a figura da criança determina abalos no relacionamento do casal - o menino, por vezes, inclusive, parece mais maduro que o irmão em algumas situações. Apesar de nítidas dificuldades, o que poderia ter se evidenciado um fardo, traz à tona admiráveis e profundos sentimentos humanos: altruísmo, confiança, solidariedade e, acima de tudo, a dedicação da amorosidade. Relações ternas, intensas dos três - sem ser piegas. E
m Café com Leite, a pureza e a ternura emergem da dor, ilustrada no ícone maternal do copo de leite, surgindo como remédio e alento para o coração. Este drama soft gay desvia de polêmicas e mira exatamente no afeto humano. É cativante a maneira como o cinema queer consegue se recriar fora do espaço underground e corteja seu próprio espaço no mainstream. Daniel Tavares e Diego Torraca são íntimos e têm química interpretando o casal e Eduardo Melo, o pequeno Lucas, demonstra talento e se destaca na produção. O curta foi recentemente premiado com o Urso de Cristal no 58º Festival Internacional de Cinema de Berlim. Ganhou menção honrosa na categoria curta-metragem de ficção do Festival de Cartagena, na Colômbia, além de presença nos principais festivais nacionais e internacionais de cinema. Um curta tão interessante merecia ter maior tempo de duração – tudo que é bom dura pouco.
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