Belíssimo nos aspectos técnicos e com um tema interessante, "Nell" pode parecer estranho no começo, mas, aos poucos, vamos nos acostumando e enxergando uma história tocante. Lembrando filmes como "O Quarto de Jack" e a antiga história do "Menino selvagem de Aveyron", presenciamos as dificuldades de uma pessoa criada completamente fora da civilização em interagir com desconhecidos e de se integrar com o resto do mundo.
No entanto, se o tema é fascinante, a impressão que fica ao espectador é que o potencial da história não é muito bem utilizado, com o filme se tornando bastante previsível em muitos momentos e caminhando uma trilha mais melodramática do que propriamente explorando as questões éticas ou filosóficas envolvidas. Outro ponto que me incomodou foi a pouca presença da personagem principal Nell, que em diversas oportunidades mais parece uma coadjuvante em uma narrativa que acaba por girar excessivamente em torno dos doutores Lovell e Paula.
Esses problemas no roteiro são parcialmente compensados, por outro lado, com uma excelente atuação de Jodie Foster, que, em uma papel extremamente difícil e desafiador, consegue "roubar a cena" mesmo em situações nas quais a história não foca muito em sua personagem. A atriz, em uma performance que lhe rendeu uma indicação ao Oscar, consegue expressar bem a complexidade de Nell, uma jovem mulher doce e com um coração puro, mas que se encontra com medo de se conectar com o resto do mundo.
De uma maneira geral, é um filme razoável, destacando-se pelos aspectos técnicos, pelo tema e pela grande atuação de Foster, mas que peca no roteiro e na maneira como a história é conduzida.
Após assistir novamente esta obra prima, deixo aqui mais um comentário, agora destinado para aquelas pessoas que criticam o filme por não terem compreendido o final ou por considerá-lo confuso. Em primeiro lugar, deixo bem claro que é perfeitamente normal ter essa sensação depois de ver pela primeira vez e não há qualquer absurdo nessa situação, e isso tem um motivo bem simples: este filme não foi feito para ser compreendido totalmente.
O principal propósito de "2001", em especial o seu final, é o de evocar imagens, sons, associações e sugestões em nossa mente, produzindo uma resposta, da nossa parte, tanto mental quanto emocional. O filme busca abrir nossa mente, não fechá-la entregando respostas prontas e definitivas, ao mesmo tempo que procura inspirar questionamentos, mas não resolvê-los. Em diversas entrevistas, o próprio Kubrick afirmou que o final não era para ser claro de uma maneira convencional, tendo inclusive dito uma vez: "o seu poder se encontra na resposta emocional e subconsciente da plateia, o que torna o seu efeito mais prolongado, sendo que ser específico acerca do seu significado iria tirar esse prazer dos espectadores e negar a eles as suas próprias reações e interpretações". Sendo assim, qualquer pessoa que terminou de assistir ao filme e já tenha uma resposta simples e clara acerca do que acabou de ver está, na verdade, mais distante do que Kubrick desejava do que aquele que ficou sem entender nada.
Uma das interpretações, por exemplo, é a de que o filme gira em torno da figura dos deuses. E aqui não temos deuses semelhantes aos das religiões tradicionais, mas deuses distantes, impenetráveis e cujas intenções não conseguiríamos sequer chegar perto de compreender. Eles deixam os monólitos em contato com os humanos em momentos específicos, mas em instante algum da história somos apresentados a eles ou às suas reais intenções. Inclusive, acredito que esse também seja um ponto positivo do filme, pois se Kubrick decidisse mostrar aliens e as suas faces verdadeiras, talvez perdesse bastante do efeito que é causado com a total ausência deles nesta obra, isto é, o fato desses deuses serem completamente desconhecidos provoca uma sensação forte de mistério e até de medo.
E dentro dessa teoria, existe a ideia de que o bebê que aparece no final é, na verdade, Bowman tendo alcançado um novo estágio da evolução humana, mais poderoso e iluminado e tendo a missão de levar esse avanço ao resto da civilização. Alguns críticos, inclusive, apontam a presença de pinturas e outros objetos renascentistas no quarto do astronauta em sua fase mais velha, sendo que a Renascença foi uma época conhecida como uma época de "iluminação". Sendo assim, o filme, que se inicia com a raça humana em seus primórdios, iria se encerrar com a mesma alcançando o seu estágio mais avançado. Outro ponto também que vale a pena mencionar é que a música tema é uma obra composta por Richard Strauss, baseada em um texto de Nietzsche que falava exatamente sobre a noção do "super homem".
No entanto, essa é a apenas um teoria dentre várias. Não há uma resposta concreta e definitiva e o próprio Kubrick não desejava que houvesse, sendo um filme mais para ser sentido do que para ser compreendido, mais para provocar reações do que entregar respostas. E esse é apenas um dos motivos que fazem "2001" ser uma verdadeira obra prima.
Este filme pode ser resumido da seguinte maneira: não é ruim, mas também não é lá grande coisa e nem se esforça muito para isso. Embora a história seja interessante, tendo se inspirado no escândalo de prostituição em Odessa, Texas, em 2004, a forma como é explorada é bem superficial.
O foco maior de "A Lista de Clientes" não é na profissão exercida por Sam, mas em sua vida pessoal. Ela, bonita e já tendo sido miss, tinha grandes sonhos quando jovem, mas agora está praticamente falida e, com três filhos para cuidar e um marido que teve a carreira arruinada por uma lesão, procura utilizar sua beleza para ganhar dinheiro, mesmo que seja de uma maneira indecente e ilegal. No início, ela tinha nojo do que fazia, apenas prosseguindo por conta das dificuldades financeiras e devido à família. Com o passar do tempo, no entanto, ela continuava trabalhando no "spa" mais por conta da atenção recebida do que qualquer outra coisa, estando rodeada de homens ricos e poderosos que, por baixo das convenções sociais e aparências, traíam suas respectivas esposas com Sam, que se sentia especial. Ela, por outro lado, também vivia uma vida dupla, sendo uma mãe/esposa atenciosa em casa e uma prostituta no trabalho.
Esses aspectos, porém, não são explorados muito bem ao longo da história, com o filme preferindo valorizar algumas cenas desnecessárias e outras caricatas, como a cena final envolvendo as esposas dos clientes. O resto do elenco também não me agradou muito e teve atuações discretas e sem grande emoção.
Jennifer Love Hewitt está aqui naquele que é, provavelmente, o seu melhor papel e que depois lhe rendeu uma série de duas temporadas com um enredo semelhante, mas é difícil encontrar outra coisa no filme, além da performance da atriz, que mereça maiores elogios. Tinha potencial, mas, no final das contas, é apenas um filme mediano com alguns bons momentos.
Filme muito bom e o tempo passou voando ao assistir. Combinando ótimos personagens, um roteiro criativo e uma boa mistura entre comédia e drama, "Gato de Botas: O Último Pedido" talvez já seja um dos melhores filmes do "universo Shrek", garantindo diversão pura para jovens e adultos e ainda deixando uma belíssima mensagem sobre valorizar a vida.
É interessante observar como cada um dos antagonistas tem características próprias e o seu devido papel na história. "Goldi", ou "Cachinhos Dourados", uma órfã criada desde pequeno por ursos, é uma criminosa, mas também tem um lado bom, apenas desejando ter uma família de verdade. "Jack Horner", por sua vez, é um completo psicopata e a mais pura forma do mal, pois nasceu em um berço de ouro e não tem qualquer acontecimento em sua vida que explicasse suas atitudes, mas mesmo assim optou por trilhar o caminho da maldade. Por fim, temos o misterioso e assustador "Lobo" ou "A Morte", que, além de um vilão, é uma força da natureza, sendo inevitável para todos e estando ali para cumprir sua missão de tirar a vida de quem não a valoriza e, embora apareça pouco, possui presença marcante em cada cena e é o grande motivo da aventura protagonizada pelo Gato de Botas. No final, Goldi percebe que já possui uma família de verdade, o Lobo não mais anseia tirar a vida do Gato naquele momento, pois vê que este, diferente de antes, já passou a valorizar a sua própria vida, enquanto Jack, o verdadeiro vilão, termina da pior maneira possível, mas tendo o que merece.
Dentre os protagonistas, Kitty busca alguém a quem possa confiar, o Gato busca prolongar suas vidas para manter viva a sua lenda e o carismático e amável Perrito acaba funcionando não somente como um alívio cômico, mas exatamente como um "cão de terapia", auxiliando a suavizar as personalidades fortes dos dois gatos e a ensinar a valorizar mais os laços afetivos e a vida de uma maneira geral, sendo aquele personagem com a história de origem mais trágica, mas curiosamente também sendo aquele que enxerga a vida de maneira mais positiva. Ao término da história, Kitty obtém o seu desejo, o Gato não vê mais necessidade de ter mais vidas e procura valorizar aquela que já tem e o Perrito não somente ajuda os outros como também consegue finalmente ter amigos.
Vale a pena também mencionar a maneira como alternaram os estilos de animação em algumas cenas e, claro, a dublagem do Wagner Moura, que foi bem em seu papel e contribui bastante para o ar misterioso e assustador de seu personagem.
Então, quem quiser um filme para assistir com a família e se divertir, este aqui é perfeito para acompanhar e sair com um sorriso no rosto ao final. Super recomendado.
Com brilhante direção de Scorsese, excelente fotografia e grandes atuações de todo o elenco, "Touro Indomável" é uma das melhores obras do diretor e uma verdadeira imersão não somente na conturbada vida do pugilista Jake LaMotta, mas no mundo do boxe dos anos 40.
O principal aspecto do filme é mostrar como características que levaram LaMotta à glória e sucesso nos ringues, como sua violência e comportamento explosivo, também contribuíram para a sua autodestruição na vida pessoal, afastando-o da esposa e do irmão e o deixando sozinho e praticamente sem amigos. Inclusive, como comentaram anteriormente aqui, não é um filme sobre boxe e nem sobre um pugilista, mas sim sobre o homem LaMotta, com todos os seus defeitos e atitudes deploráveis, com o boxe servindo apenas como um pano de fundo.
Embora a aclamação geral seja para a atuação de DeNiro, que realmente está espetacular e teve de passar por uma transformação física para interpretar o ex-lutador no período de aposentadoria, eu também gostaria de destacar Pesci, que também está ótimo. O seu personagem, Joey, alterna entre o amor pelo irmão e o temor pela personalidade explosiva de Jake, e esse conflito interno é bem interpretado pelo ator.
Veredito final: embora muitos pensem assim, não considero este como sendo o grande trabalho de Scorsese, mas é sim um de seus melhores filmes e uma das melhores obras biográficas do cinema. Recomendado.
"À Prova de Morte" faz parte um projeto, realizado por Tarantino junto a Robert Rodriguez, que busca homenagear os filmes baratos de horror e suspense exibidos nos anos 70 e 80, os famosos "filmes B". No entanto, embora funcione bem como uma homenagem a essas saudosas produções que deixaram sua marca no cinema, o filme, em si, é fraco, apenas se salvando um pouco por algumas boas cenas, como na sequência final, e pela trilha sonora.
De resto, realmente não sobra muita coisa, em uma história que é praticamente separada em dois tipos de situações: conversas, em geral recheadas de falas fúteis e com pouca utilidade ao filme, entre mulheres e perseguições envolvendo carros. Quanto à primeira parte, isto é, as conversas entre as personagens, é bom lembrar que cenas que envolvem pessoas conversando de maneira casual são uma parte importante dos roteiros do Tarantino e geralmente são divertidas e com falas bem elaboradas que revelam aspectos relevantes dos personagens envolvidos, mas aqui o diretor pecou pelo excesso e essas interações não funcionaram da maneira esperada.
Sendo assim, este talvez seja o pior filme de sua carreira, exatamente por servir mais como um tributo aos "filmes B" de suspense do que exatamente como uma obra com identidade própria. Além disso, outros elementos que se encaixam de maneira interessante em outras películas do diretor aqui não têm o mesmo efeito, exceto pela boa trilha sonora, como já mencionado antes.
"Maverick" tem os seus bons momentos, com a dupla Mel Gibson e Jodie Foster carregando o filme nas costas durante boa parte do tempo e a química entre seus personagens sendo o ponto alto da história. No entanto, também tem vários furos no roteiro e se torna um pouco cansativo na segunda metade com as suas sucessivas tentativas de provocar reviravoltas e surpresas. É um bom e divertido passatempo, mas nada além disso e não me empolgou muito.
É comum que, depois de um bom filme, a sequência produzida tenha dificuldade de apresentar algo novo ao espectador e acabe proporcionando uma queda de qualidade. No entanto, não é isso que vemos em "Por uns Dólares a Mais", em que Sergio Leone consegue superar, por muito, o filme antecessor, o também clássico "Por um Punhado de Dólares", em todos os aspectos.
Essa situação se deve, dentre outras coisas, ao fato do diretor escolher por realizar uma trilogia em que os filmes, embora se encontrem dentro do mesmo ambiente do faroeste americano e tenham algumas semelhanças entre si, apresentem histórias e personagens diferentes, fazendo com que cada obra seja única e não apenas uma continuação da outra. Além disso, nesta segunda película da trilogia, também presenciamos uma trama não apenas distinta, mas bem mais elaborada e com um roteiro cheio de reviravoltas. E, como "cereja do bolo", temos mais uma brilhante trilha sonora de Morricone, que eleva esta obra a um outro patamar dentro não apenas dos filmes de Leone, mas do gênero western em geral.
Um aspecto interessante é que fiquei com a sensação de que o personagem interpretado por Lee Van Cleef, o Coronel Mortimer, é a grande alma do filme, com o "Homem sem nome" de Eastwood sendo um pouco secundário, o que se confirma durante o final, no qual é revelado que a sua busca por El Indio nada tem haver com dinheiro, sendo, na verdade, uma espécie de vingança pessoal por algo terrível ocorrido no passado, o que confere um aspecto mais sentimental a uma trama que parecia girar apenas em torno de um "punhado de dólares", mas vai além disso. O curioso é que Van Cleef sempre se acostumou a interpretar vilões, inclusive é isso que ocorre no seguinte filme de Leone, "Três Homens em Conflito", mas aqui o que ocorre é exatamente o oposto.
Um ótimo filme, que vai crescendo à medida que a trama se desenrola, surpreendendo o espectador e prendendo sua atenção do início ao fim. Super recomendado e um dos grandes clássicos do cinema.
O primeiro filme da "trilogia dos dólares" e o trabalho de estréia de Sergio Leone no gênero western, onde iria imortalizar o seu nome, "Por um Punhado de Dólares", além de ter uma bela fotografia e boa trilha sonora, cumpre bem o seu papel de entreter e prender a atenção do espectador, mesmo com um roteiro simples, à medida que a trama gradativamente aumenta sua tensão até o marcante duelo final.
Não é o trabalho mais grandioso do diretor, que anos depois iria conseguir levar as histórias do faroeste americano a um patamar épico e memorável, mas é um bom filme. Vale também mencionar que esta produção foi feita com um orçamento baixíssimo, o que também contribuiu para ser uma película de duração curta e com um roteiro mais sucinto.
A trama gira em torno de três forasteiros, muito diferentes entre si, mas que têm em comum a mesma ganância por uma grande quantia de dinheiro escondida em um local que ninguém sabe ao certo qual é. Inclusive, é exatamente o fato de nenhum deles ter a informação precisa do local que evita com que os três se matem de imediato, apesar do clima de desconfiança permanente entre eles. Se todos sobreviverem, ninguém terá a fortuna completa, mas, se pelo menos um morrer, ninguém terá um centavo sequer. Dito isso, o que torna "The Good, The Bad and The Ugly" um grande filme é a forma como a história, aparentemente simples, é apresentada ao espectador, com excelente fotografia, ótimos diálogos e a brilhante direção de Sergio Leone.
No entanto, o que faz com que este grande filme se transforme em um verdadeiro clássico e continue a ser aclamado mesmo décadas após o lançamento é a magnífica trilha sonora de Ennio Morricone, conferindo, ao mesmo tempo, tensão, mistério e grandiosidade ao filme. Tanto isso é verdade que até quem nunca assistiu a essa película já ouviu, ao menos uma vez na vida, à música tema desta memorável obra, que acabou se tornando uma espécie de "hino" do gênero western, despertando toda a imaginação acerca do Velho Oeste americano.
E depois de mais de duas horas, que passam rapidamente, acompanhando uma trama com intrigas e reviravoltas, o espectador é presenteado com um dos melhores finais da história do cinema. Excelente filme, um grande clássico e super recomendado.
A história do filme é simples: um homem decidiu encerrar a amizade com seu melhor amigo sem mais nem menos, e este fica maluco querendo descobrir o motivo da escolha tão repentina. No entanto, o grande diferencial de "Os Banshees de Inisherin" não é na história principal, mas nos temas abordados nas entrelinhas e na forma como tudo isso é contado.
Em primeiro lugar, temos o diretor e roteirista Martin McDonagh, conhecido por balancear drama e comédia em roteiros criativos e fazer uso de um bom e velho humor negro em suas obras, que aqui marca presença novamente com o seu estilo peculiar, mas desta vez de uma maneira mais melancólica e reflexiva, abordando temas como depressão e isolamento, e como isso pode impactar as pessoas. Em segundo lugar, temos uma grande atuação do elenco, acompanhada de excepcionais aspectos técnicos, como fotografia e trilha sonora.
Em síntese, o filme fala, acima de tudo, do medo de estar só, que pode provocar angústia e levar as pessoas, como o protagonista Padraic, a tomarem decisões longe de serem as mais adequadas. Não acredito que seja o melhor trabalho de McDonagh, nem o meu preferido do diretor, mas ainda assim é um bom filme e que vale a pena assistir.
Gostei mais do que esperava, mas ainda assim há de se reconhecer que é um filme bem comum de terror, que cria tensão e prende a atenção do espectador até um certo ponto, a partir do qual torna-se cansativo. Os dois atores principais estão bem em seus papéis, em especial Wes Bentley, porém o roteiro deixa muito a desejar. Um bom passatempo para quem gosta de produções do gênero, mas nada além disso e a única coisa realmente memorável do filme são os peitos da Rachel Nichols.
Cumpre bem o seu papel de mostrar as dificuldades dos veteranos de guerra ao voltar para casa, balanceando drama e romance e com diferentes histórias se entrelaçando. No entanto, enquanto a primeira metade é boa, o resto do filme é lento demais em alguns momentos e apresenta um roteiro um pouco previsível, além de que os problemas de reintegração à sociedade poderiam ter sido melhor desenvolvidos. O ponto alto talvez seja a história de Homer e o fato do ator que o interpreta realmente ter perdido as mãos na guerra.
Na época, o filme comoveu muita gente e foi aclamado, em grande parte, provavelmente pela proximidade ao fim do Segunda Guerra e pela realidade ainda presente dos ex combatentes nos EUA, mas devo ser sincero e afirmar que esta obra não me "conquistou", embora tenha os seus bons momentos. Não é ruim, mas também está longe de ser memorável.
Em seu primeiro trabalho, Paul Thomas Anderson já mostra a sua assinatura na direção, proporcionando ao espectador uma imersão no ambiente dos cassinos, em uma abordagem menos glamourizada e mais humana e até com toques de "noir".
Por outro lado, a história, que tem boas idéias e personagens interessantes, deixa um pouco a desejar no ritmo, em alguns pontos não muito bem explicados e em elementos que poderiam ter sido explorados de uma melhor forma. No final das contas, fica a sensação de que estamos diante de algo que tinha grande potencial, mas ficou, de certa maneira, incompleto.
Sendo assim, um bom início de PTA no mundo do cinema, mas ainda com erros de "estreante".
Um filme despretensioso, com uma história criativa e mais uma excelente atuação de Mads Mikkelsen. Caminhando na linha tênue entre o drama e a comédia, aborda o tema do alcoolismo e como a bebida é uma faca de dois gumes: por um lado, pode funcionar como a famosa "coragem líquida", nos tornando mais espontâneos e relaxados, mas, por outro, pode afetar a nossa percepção da realidade, nos impedir de controlar os impulsos e nos afastar de quem mais amamos.
E o final nos fornece uma daquelas cenas que, ao mesmo tempo que ficam na memória, também podem suscitar diversas interpretações. Apesar de todos os problemas, de todo o sofrimento e de toda dor que os personagens enfrentam e tentam escapar com o álcool, celebra-se a vida, com os seus bons e maus momentos.
Um divertido filme que já vi duas vezes, pretendo rever futuramente e recomendo para quem ainda não teve a oportunidade.
“Sabe o que Lênin disse sobre a Apassionata de Beethoven? Se eu continuar ouvindo, não levarei a cabo a Revolução.”
Esta poderosa frase, dita de maneira despretensiosa ainda em uma das primeiras cenas, sintetiza bem um dos temas abordados por este ótimo filme, que conta com excelentes atuações e um roteiro muito bem construído.
O primeiro ponto a se destacar é a parte histórica. "A Vida dos Outros" se passa na época da Alemanha Oriental, governada por uma ditadura socialista, logo, nesse contexto, quaisquer questionamentos ao partido mandante ou a sua ideologia não seriam tolerados, o que leva as autoridades a exercerem um controle rígido sob os cidadãos, em especial aqueles considerados "suspeitos", passando por cima de noções de privacidade ou liberdade, que aqui inexistem. Sendo assim, este filme funciona, antes de tudo, como uma dura crítica a esse aspecto autoritário do Estado e às consequências dessa constante vigilância na vida das pessoas.
Inclusive, uma das grandes qualidades do filme é a forma como mostra esse momento histórico da sociedade alemã, provocando um estado de tensão no espectador sem, em qualquer momento, ter de recorrer, por exemplo, a cenas de violência física. O mero sentimento de estar constantemente vigiado (ou o de temer estar sendo vigiado) funciona como uma espécie de tortura aos personagens envolvidos, levando-os a uma constante luta para tentar sobreviver dentro desse sistema. Logo, a violência é psicológica e moral, não sendo aquela que leva à explosões de ódio, punhos e armas, mas sim ao suicídio lento e angustiante. É brutal e, de alguma forma, delicado e sutil ao mesmo tempo.
O segundo ponto do filme é exatamente o que remete a frase mencionada no início. Assim como Lênin quase abandonou sua causa por uma obra de Beethoven, vemos que a sensibilidade de Dreyman e de sua companheira Christa, e também a bela música tocada pelo escritor no piano, sensibilizam o duro coração do agente Wiesler, que passa a tentar ajudar, na medida do possível, as pessoas que ele foi encarregado de espionar. Dessa maneira, a história também aborda a forma como a arte pode mudar até mesmo as mais rígidas pessoas, direcionando-as a um outro caminho.
O ritmo pode ser um pouco lento em alguns momentos, mas é um filme que vale muito a pena assistir. Recomendado.
Um dos primeiros trabalhos do mestre Kubrick, "The Killing" é um filme que foge um pouco do estilo ao qual estamos acostumados no diretor, mas nem por isso deixa de apresentar tanta qualidade quanto outras das suas produções. Com um clima "noir" e uma trama objetiva, a história combina suspense, ação, ótimos diálogos e reviravoltas, que prendem a atenção do espectador, fazem o tempo passar rápido e tornam esta obra bem agradável de se assistir.
Depois de todos os esforços de Johny para elaborar o roubo de maneira meticulosa e executá-lo de forma precisa, eu devo ser sincero e afirmar que torci para ele conseguir sair com o dinheiro. Por outro lado, o final, embora não fosse o que eu queria, é bem interessante e irônico, mostrando-nos que podemos fazer inúmeros planos, mas, por mais detalhados e minuciosos que sejam, sempre podem terminar sendo vítimas de algo que não controlamos: o acaso.
Logo, mesmo sendo apenas um dos primeiros trabalhos do diretor e longe de ser uma de suas melhores películas, ainda assim é um filme muito bom de se acompanhar, com todos os elementos de uma boa história na medida certa. Recomendado.
O começo nos desperta curiosidade, o meio é um pouco confuso e entediante e o final (ou devo dizer, os finais) é bom, mas este filme não deve ser encarado com muita seriedade, e sim como aquilo que se propôs a ser: uma típica comédia pastelão ou mesmo como uma sátira aos filmes de investigação policial. Dessa maneira, naturalmente o roteiro é cheio de furos e tem diversas coisas que poderiam ter sido melhor desenvolvidas, mas o ideal é simplesmente ignorar tudo isso e se divertir, pois, apesar de tudo, ainda vale à pena acompanhar para dar umas risadas e pela bela Colleen Camp.
Divertido, mas, agora que sei o desfecho, não creio que irei rever, pois o que realmente segura o espectador é tentar desvendar o segredo, como se fosse o famoso jogo que inspirou o filme. No entanto, para quem nunca viu, é um bom passatempo.
Um dos grandes clássicos do gênero "gangster" e que, curiosamente, não tem a temática do crime como o ponto central, sendo, na verdade, um filme que trata, sobretudo, sobre amizade e paixão. No entanto, pelo fato dos personagens envolvidos crescerem dentro do mundo do crime, naturalmente somos submetidos, ao longo da história, a uma extrema dose de violência, das mais variadas formas, o que pode ser chocante para muitos espectadores, em especial ao público feminino, mas que, para o bem ou para o mal, retrata de maneira fiel a época e o meio nos quais a trama se insere.
Pessoalmente, gostei da maneira não linear com a qual a história é apresentada, pois isso já nos mostra que alguma coisa, em algum momento, deu errado para os envolvidos, porém não sabemos o porquê e nem como tudo isso ocorreu, com tudo isso sendo explicado gradativamente e de forma paralela a construção dos próprios personagens. E tudo isso com uma excelente atuação do elenco, brilhante direção de Leone e mais uma marcante trilha sonora assinada por Morricone, que também contribuem para que o filme, apesar da longa duração, em momento algum se torne cansativo.
O único aspecto que deixou a desejar, em minha avaliação, foi o final. Depois de uma longa e cuidadosa construção dos acontecimentos e dos personagens ao longo de todo o filme, os momentos finais me pareceram mal explicados e um pouco corridos. Por que Max, que ainda não sabia que David tinha o entregue à polícia, se envolveu com Deborah? As acusações contra Max, no final, eram verdadeiras ou não, e, aliás, o que o levou a ser acusado? São alguns pontos que ficaram um pouco soltos e sem maiores explicações, embora eu dê um "desconto" ao Leone pelo fato da sua versão original ser ainda um pouco maior (cerca de 20 minutos) em relação à já longa versão estendida, então é possível que essas perguntas pudessem ser respondidas nas cenas que foram cortadas, mas infelizmente jamais iremos saber.
Uma obra minuciosamente construída, com impecáveis aspectos técnicos e grandes atuações. Crime, violência, amizade e paixão igualmente representados neste ótimo filme.
Em "A Morte de Stalin", estamos diante de algo raro atualmente: uma inteligente e historicamente precisa sátira política. Neste caso, a trama gira em torno dos acontecimentos após a morte do longevo ditador soviético e, em uma mistura de drama com humor ácido, ironiza as disputas de poder dentro do partido comunista e as constantes intrigas entre os seus membros, em um contexto onde o que é verdadeiro ou falso muda a todo instante, amigos e inimigos se confundem e ninguém confia em ninguém.
No entanto, por trás de todos os absurdos e situações cômicas, esta obra trata diversos acontecimentos com precisão histórica admirável, como, por exemplo, as perversões sexuais de Laventiy Beria, que costumava entregar flores para as mulheres estupradas por ele, algo que é sutilmente mostrado no filme. Aliás, este é um aspecto interessante desta película, pois os fatos descritos são tão surreais que, por vezes, até parece que foram inventados por algum roteirista, mas quem puder realizar uma breve pesquisa e conferir as memória do Nikita Khrushchev irá verificar que muito do que é retratado realmente aconteceu. Essa incomum precisão, inclusive, é o que torna este filme tão aterrorizante quanto hilário.
Além disso, vale destacar o elenco perfeitamente escolhido, em especial Jeffrey Tambor e Steve Buscemi, que estão excelentes em seus respectivos papéis e elevam essa bem elaborada comédia a um outro nível.
Para quem gosta de história e de um bom e velho humor negro, recomendado.
Um dos primeiros grandes sucessos de Kubrick, "Glória Feita de Sangue", apesar do título, explora um outro lado da guerra, isto é, um lado nada glorioso ou nobre. Neste filme, o diretor analisa, em uma obra com grandes atuações, diálogos bem elaborados e primorosos aspectos técnicos, a maneira como um conflito bélico pode mostrar o pior que existe na raça humana. Não somente um filme sobre guerra, mas, acima de tudo, um filme anti guerra, inteligente e sempre atual.
Curiosamente, ao longo da história, não somos apresentados, em momento algum, a uma cena de combate direto entre soldados inimigos. Da mesma forma, não presenciamos mortes em massa, torturas ou quaisquer outros acontecimentos do tipo e que fazem parte não somente do ambiente de uma guerra, mas que também são frequentemente mostrados em películas do gênero. E existe uma razão para isso: a grande crítica à guerra neste filme não envolve os soldados, mas sim aqueles que os comandam, isto é, os oficiais, mais especificamente os generais. Dessa maneira, Kubrick nos mostra que, apesar de todos os confrontos, mortes e embates sangrentos, o verdadeiro lado obscuro e deplorável deste conflito passa longe dos campos de batalha, mas se encontra dentro de salas e de trás de mesas. Isso pode ser sintetizado por uma antiga frase: "A guerra é um lugar onde jovens que não se conhecem e não se odeiam se matam entre si, por decisão de velhos que se conhecem e se odeiam, mas não se matam".
E o personagem que melhor representa esse espirito deplorável da guerra é o general Mireau, que obviamente não está sozinho em seus terríveis atos, mas mostra, de maneira brutal, covardia e falsidade gritantes, além de um total desprezo pela vida humana, não somente ao levar os seus soldados a uma missão sabidamente suicida, mas também ao, no momento em que a impossível operação naturalmente fracassa, se encontrar disposto a atirar em seu próprio batalhão, acusando posteriormente os soldados de serem covardes por não conseguirem cumprir suas ordens absurdas. Aliás, é irônico que justamente um general com tais características queira enviar soldados ao pelotão por covardia. E o pior de tudo é que tudo isso é feito com anuência de outros generais e oficiais do exército, que, no final, ainda concordam por fuzilar os pobres soldados que não tinham qualquer culpa pelos erros de seus superiores.
Ao final do filme, no entanto, temos uma cena belíssima na qual o coronel Dax observa uma jovem alemã cantando em frente a soldados franceses e estes fazendo coro ao canto da moça. Ali, após todos os atos deploráveis que ele havia presenciado, o coronel brevemente restaura a sua fé na raça humana, como se o filme nos mostrasse que a guerra, de fato, pode nos tirar, durante um certo período, a nossa coragem, os nossos sentidos e a nossa humanidade, mas essas virtudes ainda estão presentes dentro de nós apenas esperando para serem recuperadas em algum momento, como foi recuperada pelos soldados ao ouvirem a música.
Uma obra bem dirigida, com uma excelente mensagem e cujo único defeito talvez seja que durou muito pouco e que poderia ter sido alongado mais. Recomendado.
Kubrick afirmou, diversas vezes, que os seus filmes buscam falar sobre a natureza humana, tendo, em dada oportunidade, dito: "estou interessado na mais brutal e violenta natureza do homem, por que esse é um retrato verdadeiro dos homens". Em "De Olhos Bem Fechados", o diretor aborda a parte da nossa natureza relacionada à sexualidade, em uma obra que, como diversas outras desse gênio do cinema, apresenta diversas camadas, simbolismos e detalhes, e sempre requer que assistamos mais de uma vez para compreender melhor.
O ponto central da trama gira em torno do casal Bill e Alice. Logo no início vemos que são duas pessoas bem atraentes (Tom Cruise e Nicole Kidman, que estavam realmente casados na época) e que apresentam uma família aparentemente estável, com uma filha e em boas condições financeiras. No entanto, já durante a festa a história vai nos levando para a temática principal do filme: a sexualidade. Enquanto Alice flerta com um homem húngaro, Bill faz o mesmo com outras duas mulheres. No entanto, é o húngaro que solta duas frases que são marcantes aqui: “O charme do casamento é tornar o fingimento uma necessidade para ambas as partes" e “Como uma mulher linda, que poderia ter qualquer homem neste salão, pode querer estar casada?”. A primeira ainda será aprofundada mais à frente, mas a segunda talvez impacte a personagem de maneira imediata: ela é uma mulher belíssima, jovem, sensual e que poderia ter qualquer homem daquele salão ou fora dele, então porque já está casada? Por que não se entrega aos seus desejos em um mundo de prazeres? O mesmo, inclusive, pode valer para Bill, que poderia se envolver não somente com as duas mulheres da festa, mas com várias outras. No final da festa, porém, ambos voltam para casa tendo rejeitado as tentações que surgiram e mantido a fidelidade intacta, em contraste, por exemplo, com Ziegler, que se envolveu com uma drogada no banheiro da mansão.
No entanto, na noite seguinte, Alice, talvez movida por ciúmes em relação ao marido com aquelas duas mulheres ou mesmo refletindo sobre a frase do húngaro sobre casamento, decide ser honesta com o seu marido e admitir algo que talvez nem fosse necessário contar: ela confessa à Bill que, embora não o tenha traído de maneira concreta, desejou ter feito isso certa vez com um outro homem, tendo seriamente pensado até em abandonar o marido, a filha e toda a família para se entregar aos prazeres e viver essa aventura. Mesmo com essa vontade tendo ficado apenas na imaginação e a tentação não ter se materializado, isso fica na mente de Bill, que antes tinha total confiança na esposa e em seu casamento, mas que agora já não tinha mais a mesma certeza inabalável de outrora, tendo a sua mulher revelado desejos que ele não pensava que ela possuía.
Com a confiança na sua esposa abalada e pelo temor da traição, Bill já não evita mais as tentações por conta do vínculo do matrimônio, mas incessantemente as busca como forma de atender aos seus desejos ou mesmo como uma vingança contra sua mulher. Sendo assim, a partir deste instante, ele começa a se encontrar inserido, seja de maneira involuntária seja pela própria vontade, em eventos que marcam uma longa aventura naquela madrugada e que acabam culminando em uma sociedade secreta, em uma espécie de ritual marcado por mulheres peladas e sexo por toda parte. No entanto, Bill, que estava buscando trair a esposa, não se viu em momento algum agraciado por estar naquele lugar, que teoricamente deveria ser o ideal para um homem que tinha as intenções que possuía, mas, na verdade, se viu muito mais chocado com o que presenciava do que propriamente atraído.
E aí que se encontra a grande ironia da história: o que Bill vê com os olhos bem abertos é mais fantasioso e absurdo do que o que Alice vê de olhos bem fechados. Enquanto ela confessa abertamente seu desejo, ele está mergulhado na sua confusão sexual. O sonho da esposa é mais excitante e assustador que a orgia presenciada na mansão. Percebemos, então, que Alice tem desejos reais e está consciente deles, enquanto Bill não sabe muito bem o que sente, a não ser a certeza de que ele, como homem, tem direito a estes desejos. Exatamente por isso o médico sentia que precisava vivenciar suas fantasias na prática, enquanto sua esposa as mantinha apenas em sua mente. É comum, portanto, que Bill saia de casa em busca de luxúria apenas para sentir-se tão sexualmente estimulado quanto sua esposa, quando ouve dela relatos eróticos. No entanto, ele se encontra assustado com o que vê, foge do local após ser descoberto pelos membros dessa seita e, no final das contas, volta para casa sem ter traído a esposa.
Outro ponto importante que essa cena em particular e o filme de maneira geral abordam, além dos desejos reprimidos pelo casal, é como a elite de nossa sociedade coloca por baixo dos panos os seus instintos mais primitivos. Aqui, por exemplo, temos a reunião dessa sociedade secreta representando isso, com membros da mais alta sociedade utilizando máscaras para não serem reconhecidos e, dessa maneira, poderem se entregar aos seus desejos carnais sem qualquer tipo de pudor. Logo, por baixo de toda a riqueza, a luxúria e a beleza da elite, haveriam os segredos mais sujos e podres, para os quais fechamos os olhos. E, convenhamos, quando vemos nas notícias casos como os de Epstein, Príncipe Andrew e outros, é difícil, ao assistir este filme, não imaginar que realmente tenha sido, mesmo que de forma involuntária, uma retratação dessas seitas secretas que devem existir e envolver pessoas famosas e ricas.
Ao final do filme, Bill vê, na cama e em mais um momento genial de Kubrick, sua esposa e a máscara que usou na festa lado a lado, como se ele tivesse que escolher entre uma coisa ou outra, isto é, deveria decidir em continuar uma vida de fingimentos (vestindo uma máscara) ou se deveria se abrir para a sua esposa, admitir tudo e continuar vivendo com ela. Ele, enfim, escolhe pela esposa, e ambos param de fechar os olhos para os desejos reprimidos um do outro, deixam as tentações que surgiram pelo caminho no passado e seguem em frente, se entregando definitivamente ao parceiro, ao seu casamento e a sua família.
Curiosidades e detalhes escondidos:
O nome da prostituta que abordou Bill na rua é "Domino", que é o mesmo nome de uma máscara veneziana.
"Fidelio", a senha usada para entrar na orgia daquela sociedade secreta, significa, ironicamente, "fidelidade" em latim.
A máscara que Bill usou para entrar no encontro da seita era uma do tipo "Volto", que é a mais comum dentre todas as máscaras venezianas. Talvez até por isso a mulher com a qual ele conversou na mansão logo percebeu que ele não pertencia aquele local.
Na cena de Bill com a prostituta, aparece um boneco de um tigre na cama. Na cena final dele com sua esposa e filha, também vemos os mesmos bonecos de tigre na loja de brinquedos.
A música aterrorizante tocada durante o ritual foi feita pela compositora Jocelyn Pook e incorpora trechos de uma música litúrgica da Igreja Ortodoxa no idioma romeno, sendo que esses trechos são colocados de forma invertida. Em inglês, essa parte diz: "And God told to his apprentices...I gave you a comand...to pray to the Lord fot the mercy, life, peace, health, salvation, the search, the leave and the forgiveness of the sins of God's children. The ones that pray, they have mercy and they take good care of this holy place" Pois bem, colocado de trás pra frente, tem o significado exatamente oposto, beirando a blasfêmia e o satanismo.
Kubrick morreu dias depois de entregar um corte preliminar do filme ao estúdio. No entanto, o diretor sempre costumava realizar edições em suas obras até o último instante, então muitos afirmam, por isso, que provavelmente a edição final liberada ao público e lançada não foi a que o diretor realmente queria e que ele ainda poderia ter feito alterações. Nunca saberemos, no entanto, se essas mudanças seriam feitas ou se seriam relevantes ao filme.
Um ótimo filme para assistir, desfrutar e analisar incessantemente. Super recomendado.
Em uma mistura de suspense e terror e com pitadas de comédia, "O Menu" nos apresenta, em meio a uma trama com surpresas e acontecimentos absurdos, uma crítica à sociedade atual e, sobretudo, à elite, apontando para os seus excessos, à sua falsidade e à sua arrogância.
O ponto central do filme gira em torno chefe Slowik, que não sente mais prazer em exercer a sua profissão, sendo o principal motivo para tal desilusão o fato de estar alimentando pessoas que comem sua comida apenas porque podem pagar, e não porque realmente gostam ou porque estão com fome. Dessa maneira, a sua culinária estaria sendo apropriada por uma elite que não somente não enxergava o seu real valor e significado, mas também estaria contribuindo para a sua própria destruição ao tirar a paixão pelo exercício do seu trabalho. Sendo assim, ele simplesmente decide matar todos os seus clientes, mas, como ele, ao cobrar preços altíssimos por seus pratos, teria culpa nessa "elitização da gastronomia", o chefe também opta por se matar e levar toda a sua equipe junto, que diga-se, concorda com tudo isso.
Dessa maneira, à medida que a história vai se desenrolando, vamos conhecendo mais sobre os clientes, e dos motivos pelos quais o chefe escolheu cada um para aquela noite. E, nesse processo, encontramos um casal que já desfrutou de vários pratos de Slowik e mesmo assim não consegue se lembrar de um sequer, uma crítica gastronômica responsável por fechar diversos restaurantes, três funcionários de uma grande empresa que estão ali apenas para se divertir e não apreciar os pratos, um artista que abandonou a paixão por sua profissão e um assíduo fã de culinária que finge saber tudo sobre comida, mas não sabe cozinhar.
O único cliente que não se encaixaria no perfil de pessoa que o chefe planejava matar era Margot, afinal ela sequer deveria estar ali, sendo apenas uma acompanhante contratada de última hora por Tyler, que havia se separado da namorada. Em contraste com o resto dos personagens, ela não finge gostar dos pratos de Slowik, mas, em vez disso, exige algo de que realmente goste: um simples cheeseburger. Essa sua honestidade é a prova final de que o chefe precisava para concluir que ela não fazia parte daquela elite rica da qual ele nutria tanto ódio e, por isso, liberou-a para ir embora e sair viva da ilha.
No entanto, embora o filme possa ser saudado pela sua criatividade, pela sua crítica social e pela forma como a história vai se desenrolando, com as suas devidas surpresas, também apresenta alguns pontos negativos. Em primeiro lugar, se todos os clientes foram escolhidos a dedo, o único cuja motivação para estar ali é fraca é a do ator famoso (o chefe ter o escolhido só por que não gostou de um filme dele e por que considera que o mesmo perdeu a paixão pela arte não me convenceu, sobretudo considerando que o ator é um dos poucos ali que realmente parece apreciar os pratos). Em segundo lugar, a briga entre Margot e a assistente de Slowik é um arco que foge completamente do foco do enredo principal e simplesmente não tem sentido, sendo desnecessário e descartável. E, em terceiro lugar, acredito que a própria temática do filme poderia ter sido melhor aprofundada, pois, apesar de todas as suas reviravoltas, o final foi um pouco previsível.
O filme, assim como os pratos de Slowik, tem um conceito interessante, mas não vai "matar a fome" daquele espectador que espera uma grande história. É bom e prende a atenção enquanto estamos degustando, mas é esquecível.
Um filme que passa longe de qualquer tentativa de "romantizar" a guerra, mas, pelo contrário, a apresenta da maneira realista, realizando uma representação brutal e fiel dos últimos momentos do Terceiro Reich. Dessa maneira, também cumpre um excelente papel de informar sobre os horrores do conflito.
Bruno Ganz, por sua vez, entrega a melhor interpretação de Hitler em um filme, sem exageros ou caricaturas, e sim um retrato fiel não somente de um ditador vendo o seu império ruir, mas de um homem alucinado, melancólico e egoísta com o seu próprio povo, entregando-o à ruína e ainda culpando-o pelo fracasso.
Nell
3.7 221 Assista AgoraBelíssimo nos aspectos técnicos e com um tema interessante, "Nell" pode parecer estranho no começo, mas, aos poucos, vamos nos acostumando e enxergando uma história tocante. Lembrando filmes como "O Quarto de Jack" e a antiga história do "Menino selvagem de Aveyron", presenciamos as dificuldades de uma pessoa criada completamente fora da civilização em interagir com desconhecidos e de se integrar com o resto do mundo.
No entanto, se o tema é fascinante, a impressão que fica ao espectador é que o potencial da história não é muito bem utilizado, com o filme se tornando bastante previsível em muitos momentos e caminhando uma trilha mais melodramática do que propriamente explorando as questões éticas ou filosóficas envolvidas. Outro ponto que me incomodou foi a pouca presença da personagem principal Nell, que em diversas oportunidades mais parece uma coadjuvante em uma narrativa que acaba por girar excessivamente em torno dos doutores Lovell e Paula.
Esses problemas no roteiro são parcialmente compensados, por outro lado, com uma excelente atuação de Jodie Foster, que, em uma papel extremamente difícil e desafiador, consegue "roubar a cena" mesmo em situações nas quais a história não foca muito em sua personagem. A atriz, em uma performance que lhe rendeu uma indicação ao Oscar, consegue expressar bem a complexidade de Nell, uma jovem mulher doce e com um coração puro, mas que se encontra com medo de se conectar com o resto do mundo.
De uma maneira geral, é um filme razoável, destacando-se pelos aspectos técnicos, pelo tema e pela grande atuação de Foster, mas que peca no roteiro e na maneira como a história é conduzida.
2001: Uma Odisseia no Espaço
4.2 2,4K Assista AgoraApós assistir novamente esta obra prima, deixo aqui mais um comentário, agora destinado para aquelas pessoas que criticam o filme por não terem compreendido o final ou por considerá-lo confuso. Em primeiro lugar, deixo bem claro que é perfeitamente normal ter essa sensação depois de ver pela primeira vez e não há qualquer absurdo nessa situação, e isso tem um motivo bem simples: este filme não foi feito para ser compreendido totalmente.
O principal propósito de "2001", em especial o seu final, é o de evocar imagens, sons, associações e sugestões em nossa mente, produzindo uma resposta, da nossa parte, tanto mental quanto emocional. O filme busca abrir nossa mente, não fechá-la entregando respostas prontas e definitivas, ao mesmo tempo que procura inspirar questionamentos, mas não resolvê-los. Em diversas entrevistas, o próprio Kubrick afirmou que o final não era para ser claro de uma maneira convencional, tendo inclusive dito uma vez: "o seu poder se encontra na resposta emocional e subconsciente da plateia, o que torna o seu efeito mais prolongado, sendo que ser específico acerca do seu significado iria tirar esse prazer dos espectadores e negar a eles as suas próprias reações e interpretações". Sendo assim, qualquer pessoa que terminou de assistir ao filme e já tenha uma resposta simples e clara acerca do que acabou de ver está, na verdade, mais distante do que Kubrick desejava do que aquele que ficou sem entender nada.
Uma das interpretações, por exemplo, é a de que o filme gira em torno da figura dos deuses. E aqui não temos deuses semelhantes aos das religiões tradicionais, mas deuses distantes, impenetráveis e cujas intenções não conseguiríamos sequer chegar perto de compreender. Eles deixam os monólitos em contato com os humanos em momentos específicos, mas em instante algum da história somos apresentados a eles ou às suas reais intenções. Inclusive, acredito que esse também seja um ponto positivo do filme, pois se Kubrick decidisse mostrar aliens e as suas faces verdadeiras, talvez perdesse bastante do efeito que é causado com a total ausência deles nesta obra, isto é, o fato desses deuses serem completamente desconhecidos provoca uma sensação forte de mistério e até de medo.
E dentro dessa teoria, existe a ideia de que o bebê que aparece no final é, na verdade, Bowman tendo alcançado um novo estágio da evolução humana, mais poderoso e iluminado e tendo a missão de levar esse avanço ao resto da civilização. Alguns críticos, inclusive, apontam a presença de pinturas e outros objetos renascentistas no quarto do astronauta em sua fase mais velha, sendo que a Renascença foi uma época conhecida como uma época de "iluminação". Sendo assim, o filme, que se inicia com a raça humana em seus primórdios, iria se encerrar com a mesma alcançando o seu estágio mais avançado. Outro ponto também que vale a pena mencionar é que a música tema é uma obra composta por Richard Strauss, baseada em um texto de Nietzsche que falava exatamente sobre a noção do "super homem".
No entanto, essa é a apenas um teoria dentre várias. Não há uma resposta concreta e definitiva e o próprio Kubrick não desejava que houvesse, sendo um filme mais para ser sentido do que para ser compreendido, mais para provocar reações do que entregar respostas. E esse é apenas um dos motivos que fazem "2001" ser uma verdadeira obra prima.
A Lista de Clientes
3.0 484 Assista AgoraEste filme pode ser resumido da seguinte maneira: não é ruim, mas também não é lá grande coisa e nem se esforça muito para isso. Embora a história seja interessante, tendo se inspirado no escândalo de prostituição em Odessa, Texas, em 2004, a forma como é explorada é bem superficial.
O foco maior de "A Lista de Clientes" não é na profissão exercida por Sam, mas em sua vida pessoal. Ela, bonita e já tendo sido miss, tinha grandes sonhos quando jovem, mas agora está praticamente falida e, com três filhos para cuidar e um marido que teve a carreira arruinada por uma lesão, procura utilizar sua beleza para ganhar dinheiro, mesmo que seja de uma maneira indecente e ilegal. No início, ela tinha nojo do que fazia, apenas prosseguindo por conta das dificuldades financeiras e devido à família. Com o passar do tempo, no entanto, ela continuava trabalhando no "spa" mais por conta da atenção recebida do que qualquer outra coisa, estando rodeada de homens ricos e poderosos que, por baixo das convenções sociais e aparências, traíam suas respectivas esposas com Sam, que se sentia especial. Ela, por outro lado, também vivia uma vida dupla, sendo uma mãe/esposa atenciosa em casa e uma prostituta no trabalho.
Esses aspectos, porém, não são explorados muito bem ao longo da história, com o filme preferindo valorizar algumas cenas desnecessárias e outras caricatas, como a cena final envolvendo as esposas dos clientes. O resto do elenco também não me agradou muito e teve atuações discretas e sem grande emoção.
Jennifer Love Hewitt está aqui naquele que é, provavelmente, o seu melhor papel e que depois lhe rendeu uma série de duas temporadas com um enredo semelhante, mas é difícil encontrar outra coisa no filme, além da performance da atriz, que mereça maiores elogios. Tinha potencial, mas, no final das contas, é apenas um filme mediano com alguns bons momentos.
Gato de Botas 2: O Último Pedido
4.1 452 Assista AgoraFilme muito bom e o tempo passou voando ao assistir. Combinando ótimos personagens, um roteiro criativo e uma boa mistura entre comédia e drama, "Gato de Botas: O Último Pedido" talvez já seja um dos melhores filmes do "universo Shrek", garantindo diversão pura para jovens e adultos e ainda deixando uma belíssima mensagem sobre valorizar a vida.
É interessante observar como cada um dos antagonistas tem características próprias e o seu devido papel na história. "Goldi", ou "Cachinhos Dourados", uma órfã criada desde pequeno por ursos, é uma criminosa, mas também tem um lado bom, apenas desejando ter uma família de verdade. "Jack Horner", por sua vez, é um completo psicopata e a mais pura forma do mal, pois nasceu em um berço de ouro e não tem qualquer acontecimento em sua vida que explicasse suas atitudes, mas mesmo assim optou por trilhar o caminho da maldade. Por fim, temos o misterioso e assustador "Lobo" ou "A Morte", que, além de um vilão, é uma força da natureza, sendo inevitável para todos e estando ali para cumprir sua missão de tirar a vida de quem não a valoriza e, embora apareça pouco, possui presença marcante em cada cena e é o grande motivo da aventura protagonizada pelo Gato de Botas. No final, Goldi percebe que já possui uma família de verdade, o Lobo não mais anseia tirar a vida do Gato naquele momento, pois vê que este, diferente de antes, já passou a valorizar a sua própria vida, enquanto Jack, o verdadeiro vilão, termina da pior maneira possível, mas tendo o que merece.
Dentre os protagonistas, Kitty busca alguém a quem possa confiar, o Gato busca prolongar suas vidas para manter viva a sua lenda e o carismático e amável Perrito acaba funcionando não somente como um alívio cômico, mas exatamente como um "cão de terapia", auxiliando a suavizar as personalidades fortes dos dois gatos e a ensinar a valorizar mais os laços afetivos e a vida de uma maneira geral, sendo aquele personagem com a história de origem mais trágica, mas curiosamente também sendo aquele que enxerga a vida de maneira mais positiva. Ao término da história, Kitty obtém o seu desejo, o Gato não vê mais necessidade de ter mais vidas e procura valorizar aquela que já tem e o Perrito não somente ajuda os outros como também consegue finalmente ter amigos.
Vale a pena também mencionar a maneira como alternaram os estilos de animação em algumas cenas e, claro, a dublagem do Wagner Moura, que foi bem em seu papel e contribui bastante para o ar misterioso e assustador de seu personagem.
Então, quem quiser um filme para assistir com a família e se divertir, este aqui é perfeito para acompanhar e sair com um sorriso no rosto ao final. Super recomendado.
Touro Indomável
4.2 708 Assista AgoraCom brilhante direção de Scorsese, excelente fotografia e grandes atuações de todo o elenco, "Touro Indomável" é uma das melhores obras do diretor e uma verdadeira imersão não somente na conturbada vida do pugilista Jake LaMotta, mas no mundo do boxe dos anos 40.
O principal aspecto do filme é mostrar como características que levaram LaMotta à glória e sucesso nos ringues, como sua violência e comportamento explosivo, também contribuíram para a sua autodestruição na vida pessoal, afastando-o da esposa e do irmão e o deixando sozinho e praticamente sem amigos. Inclusive, como comentaram anteriormente aqui, não é um filme sobre boxe e nem sobre um pugilista, mas sim sobre o homem LaMotta, com todos os seus defeitos e atitudes deploráveis, com o boxe servindo apenas como um pano de fundo.
Embora a aclamação geral seja para a atuação de DeNiro, que realmente está espetacular e teve de passar por uma transformação física para interpretar o ex-lutador no período de aposentadoria, eu também gostaria de destacar Pesci, que também está ótimo. O seu personagem, Joey, alterna entre o amor pelo irmão e o temor pela personalidade explosiva de Jake, e esse conflito interno é bem interpretado pelo ator.
Veredito final: embora muitos pensem assim, não considero este como sendo o grande trabalho de Scorsese, mas é sim um de seus melhores filmes e uma das melhores obras biográficas do cinema. Recomendado.
À Prova de Morte
3.9 2,0K Assista Agora"À Prova de Morte" faz parte um projeto, realizado por Tarantino junto a Robert Rodriguez, que busca homenagear os filmes baratos de horror e suspense exibidos nos anos 70 e 80, os famosos "filmes B". No entanto, embora funcione bem como uma homenagem a essas saudosas produções que deixaram sua marca no cinema, o filme, em si, é fraco, apenas se salvando um pouco por algumas boas cenas, como na sequência final, e pela trilha sonora.
De resto, realmente não sobra muita coisa, em uma história que é praticamente separada em dois tipos de situações: conversas, em geral recheadas de falas fúteis e com pouca utilidade ao filme, entre mulheres e perseguições envolvendo carros. Quanto à primeira parte, isto é, as conversas entre as personagens, é bom lembrar que cenas que envolvem pessoas conversando de maneira casual são uma parte importante dos roteiros do Tarantino e geralmente são divertidas e com falas bem elaboradas que revelam aspectos relevantes dos personagens envolvidos, mas aqui o diretor pecou pelo excesso e essas interações não funcionaram da maneira esperada.
Sendo assim, este talvez seja o pior filme de sua carreira, exatamente por servir mais como um tributo aos "filmes B" de suspense do que exatamente como uma obra com identidade própria. Além disso, outros elementos que se encaixam de maneira interessante em outras películas do diretor aqui não têm o mesmo efeito, exceto pela boa trilha sonora, como já mencionado antes.
Maverick
3.6 140 Assista Agora"Maverick" tem os seus bons momentos, com a dupla Mel Gibson e Jodie Foster carregando o filme nas costas durante boa parte do tempo e a química entre seus personagens sendo o ponto alto da história. No entanto, também tem vários furos no roteiro e se torna um pouco cansativo na segunda metade com as suas sucessivas tentativas de provocar reviravoltas e surpresas. É um bom e divertido passatempo, mas nada além disso e não me empolgou muito.
Por uns Dólares a Mais
4.3 362 Assista AgoraÉ comum que, depois de um bom filme, a sequência produzida tenha dificuldade de apresentar algo novo ao espectador e acabe proporcionando uma queda de qualidade. No entanto, não é isso que vemos em "Por uns Dólares a Mais", em que Sergio Leone consegue superar, por muito, o filme antecessor, o também clássico "Por um Punhado de Dólares", em todos os aspectos.
Essa situação se deve, dentre outras coisas, ao fato do diretor escolher por realizar uma trilogia em que os filmes, embora se encontrem dentro do mesmo ambiente do faroeste americano e tenham algumas semelhanças entre si, apresentem histórias e personagens diferentes, fazendo com que cada obra seja única e não apenas uma continuação da outra. Além disso, nesta segunda película da trilogia, também presenciamos uma trama não apenas distinta, mas bem mais elaborada e com um roteiro cheio de reviravoltas. E, como "cereja do bolo", temos mais uma brilhante trilha sonora de Morricone, que eleva esta obra a um outro patamar dentro não apenas dos filmes de Leone, mas do gênero western em geral.
Um aspecto interessante é que fiquei com a sensação de que o personagem interpretado por Lee Van Cleef, o Coronel Mortimer, é a grande alma do filme, com o "Homem sem nome" de Eastwood sendo um pouco secundário, o que se confirma durante o final, no qual é revelado que a sua busca por El Indio nada tem haver com dinheiro, sendo, na verdade, uma espécie de vingança pessoal por algo terrível ocorrido no passado, o que confere um aspecto mais sentimental a uma trama que parecia girar apenas em torno de um "punhado de dólares", mas vai além disso. O curioso é que Van Cleef sempre se acostumou a interpretar vilões, inclusive é isso que ocorre no seguinte filme de Leone, "Três Homens em Conflito", mas aqui o que ocorre é exatamente o oposto.
Um ótimo filme, que vai crescendo à medida que a trama se desenrola, surpreendendo o espectador e prendendo sua atenção do início ao fim. Super recomendado e um dos grandes clássicos do cinema.
Por um Punhado de Dólares
4.2 419 Assista AgoraO primeiro filme da "trilogia dos dólares" e o trabalho de estréia de Sergio Leone no gênero western, onde iria imortalizar o seu nome, "Por um Punhado de Dólares", além de ter uma bela fotografia e boa trilha sonora, cumpre bem o seu papel de entreter e prender a atenção do espectador, mesmo com um roteiro simples, à medida que a trama gradativamente aumenta sua tensão até o marcante duelo final.
Não é o trabalho mais grandioso do diretor, que anos depois iria conseguir levar as histórias do faroeste americano a um patamar épico e memorável, mas é um bom filme. Vale também mencionar que esta produção foi feita com um orçamento baixíssimo, o que também contribuiu para ser uma película de duração curta e com um roteiro mais sucinto.
Três Homens em Conflito
4.6 1,2K Assista AgoraA trama gira em torno de três forasteiros, muito diferentes entre si, mas que têm em comum a mesma ganância por uma grande quantia de dinheiro escondida em um local que ninguém sabe ao certo qual é. Inclusive, é exatamente o fato de nenhum deles ter a informação precisa do local que evita com que os três se matem de imediato, apesar do clima de desconfiança permanente entre eles. Se todos sobreviverem, ninguém terá a fortuna completa, mas, se pelo menos um morrer, ninguém terá um centavo sequer. Dito isso, o que torna "The Good, The Bad and The Ugly" um grande filme é a forma como a história, aparentemente simples, é apresentada ao espectador, com excelente fotografia, ótimos diálogos e a brilhante direção de Sergio Leone.
No entanto, o que faz com que este grande filme se transforme em um verdadeiro clássico e continue a ser aclamado mesmo décadas após o lançamento é a magnífica trilha sonora de Ennio Morricone, conferindo, ao mesmo tempo, tensão, mistério e grandiosidade ao filme. Tanto isso é verdade que até quem nunca assistiu a essa película já ouviu, ao menos uma vez na vida, à música tema desta memorável obra, que acabou se tornando uma espécie de "hino" do gênero western, despertando toda a imaginação acerca do Velho Oeste americano.
E depois de mais de duas horas, que passam rapidamente, acompanhando uma trama com intrigas e reviravoltas, o espectador é presenteado com um dos melhores finais da história do cinema. Excelente filme, um grande clássico e super recomendado.
Os Banshees de Inisherin
3.9 572 Assista AgoraA história do filme é simples: um homem decidiu encerrar a amizade com seu melhor amigo sem mais nem menos, e este fica maluco querendo descobrir o motivo da escolha tão repentina. No entanto, o grande diferencial de "Os Banshees de Inisherin" não é na história principal, mas nos temas abordados nas entrelinhas e na forma como tudo isso é contado.
Em primeiro lugar, temos o diretor e roteirista Martin McDonagh, conhecido por balancear drama e comédia em roteiros criativos e fazer uso de um bom e velho humor negro em suas obras, que aqui marca presença novamente com o seu estilo peculiar, mas desta vez de uma maneira mais melancólica e reflexiva, abordando temas como depressão e isolamento, e como isso pode impactar as pessoas. Em segundo lugar, temos uma grande atuação do elenco, acompanhada de excepcionais aspectos técnicos, como fotografia e trilha sonora.
Em síntese, o filme fala, acima de tudo, do medo de estar só, que pode provocar angústia e levar as pessoas, como o protagonista Padraic, a tomarem decisões longe de serem as mais adequadas. Não acredito que seja o melhor trabalho de McDonagh, nem o meu preferido do diretor, mas ainda assim é um bom filme e que vale a pena assistir.
P2: Sem Saída
3.1 475 Assista AgoraGostei mais do que esperava, mas ainda assim há de se reconhecer que é um filme bem comum de terror, que cria tensão e prende a atenção do espectador até um certo ponto, a partir do qual torna-se cansativo. Os dois atores principais estão bem em seus papéis, em especial Wes Bentley, porém o roteiro deixa muito a desejar. Um bom passatempo para quem gosta de produções do gênero, mas nada além disso e a única coisa realmente memorável do filme são os peitos da Rachel Nichols.
Os Melhores Anos de Nossa Vida
4.1 83Cumpre bem o seu papel de mostrar as dificuldades dos veteranos de guerra ao voltar para casa, balanceando drama e romance e com diferentes histórias se entrelaçando. No entanto, enquanto a primeira metade é boa, o resto do filme é lento demais em alguns momentos e apresenta um roteiro um pouco previsível, além de que os problemas de reintegração à sociedade poderiam ter sido melhor desenvolvidos. O ponto alto talvez seja a história de Homer e o fato do ator que o interpreta realmente ter perdido as mãos na guerra.
Na época, o filme comoveu muita gente e foi aclamado, em grande parte, provavelmente pela proximidade ao fim do Segunda Guerra e pela realidade ainda presente dos ex combatentes nos EUA, mas devo ser sincero e afirmar que esta obra não me "conquistou", embora tenha os seus bons momentos. Não é ruim, mas também está longe de ser memorável.
Jogada de Risco
3.6 102 Assista AgoraEm seu primeiro trabalho, Paul Thomas Anderson já mostra a sua assinatura na direção, proporcionando ao espectador uma imersão no ambiente dos cassinos, em uma abordagem menos glamourizada e mais humana e até com toques de "noir".
Por outro lado, a história, que tem boas idéias e personagens interessantes, deixa um pouco a desejar no ritmo, em alguns pontos não muito bem explicados e em elementos que poderiam ter sido explorados de uma melhor forma. No final das contas, fica a sensação de que estamos diante de algo que tinha grande potencial, mas ficou, de certa maneira, incompleto.
Sendo assim, um bom início de PTA no mundo do cinema, mas ainda com erros de "estreante".
Druk: Mais Uma Rodada
3.9 798 Assista AgoraUm filme despretensioso, com uma história criativa e mais uma excelente atuação de Mads Mikkelsen. Caminhando na linha tênue entre o drama e a comédia, aborda o tema do alcoolismo e como a bebida é uma faca de dois gumes: por um lado, pode funcionar como a famosa "coragem líquida", nos tornando mais espontâneos e relaxados, mas, por outro, pode afetar a nossa percepção da realidade, nos impedir de controlar os impulsos e nos afastar de quem mais amamos.
E o final nos fornece uma daquelas cenas que, ao mesmo tempo que ficam na memória, também podem suscitar diversas interpretações. Apesar de todos os problemas, de todo o sofrimento e de toda dor que os personagens enfrentam e tentam escapar com o álcool, celebra-se a vida, com os seus bons e maus momentos.
Um divertido filme que já vi duas vezes, pretendo rever futuramente e recomendo para quem ainda não teve a oportunidade.
A Vida dos Outros
4.3 645“Sabe o que Lênin disse sobre a Apassionata de Beethoven? Se eu continuar ouvindo, não levarei a cabo a Revolução.”
Esta poderosa frase, dita de maneira despretensiosa ainda em uma das primeiras cenas, sintetiza bem um dos temas abordados por este ótimo filme, que conta com excelentes atuações e um roteiro muito bem construído.
O primeiro ponto a se destacar é a parte histórica. "A Vida dos Outros" se passa na época da Alemanha Oriental, governada por uma ditadura socialista, logo, nesse contexto, quaisquer questionamentos ao partido mandante ou a sua ideologia não seriam tolerados, o que leva as autoridades a exercerem um controle rígido sob os cidadãos, em especial aqueles considerados "suspeitos", passando por cima de noções de privacidade ou liberdade, que aqui inexistem. Sendo assim, este filme funciona, antes de tudo, como uma dura crítica a esse aspecto autoritário do Estado e às consequências dessa constante vigilância na vida das pessoas.
Inclusive, uma das grandes qualidades do filme é a forma como mostra esse momento histórico da sociedade alemã, provocando um estado de tensão no espectador sem, em qualquer momento, ter de recorrer, por exemplo, a cenas de violência física. O mero sentimento de estar constantemente vigiado (ou o de temer estar sendo vigiado) funciona como uma espécie de tortura aos personagens envolvidos, levando-os a uma constante luta para tentar sobreviver dentro desse sistema. Logo, a violência é psicológica e moral, não sendo aquela que leva à explosões de ódio, punhos e armas, mas sim ao suicídio lento e angustiante. É brutal e, de alguma forma, delicado e sutil ao mesmo tempo.
O segundo ponto do filme é exatamente o que remete a frase mencionada no início. Assim como Lênin quase abandonou sua causa por uma obra de Beethoven, vemos que a sensibilidade de Dreyman e de sua companheira Christa, e também a bela música tocada pelo escritor no piano, sensibilizam o duro coração do agente Wiesler, que passa a tentar ajudar, na medida do possível, as pessoas que ele foi encarregado de espionar. Dessa maneira, a história também aborda a forma como a arte pode mudar até mesmo as mais rígidas pessoas, direcionando-as a um outro caminho.
O ritmo pode ser um pouco lento em alguns momentos, mas é um filme que vale muito a pena assistir. Recomendado.
O Grande Golpe
4.1 236 Assista AgoraUm dos primeiros trabalhos do mestre Kubrick, "The Killing" é um filme que foge um pouco do estilo ao qual estamos acostumados no diretor, mas nem por isso deixa de apresentar tanta qualidade quanto outras das suas produções. Com um clima "noir" e uma trama objetiva, a história combina suspense, ação, ótimos diálogos e reviravoltas, que prendem a atenção do espectador, fazem o tempo passar rápido e tornam esta obra bem agradável de se assistir.
Depois de todos os esforços de Johny para elaborar o roubo de maneira meticulosa e executá-lo de forma precisa, eu devo ser sincero e afirmar que torci para ele conseguir sair com o dinheiro. Por outro lado, o final, embora não fosse o que eu queria, é bem interessante e irônico, mostrando-nos que podemos fazer inúmeros planos, mas, por mais detalhados e minuciosos que sejam, sempre podem terminar sendo vítimas de algo que não controlamos: o acaso.
Logo, mesmo sendo apenas um dos primeiros trabalhos do diretor e longe de ser uma de suas melhores películas, ainda assim é um filme muito bom de se acompanhar, com todos os elementos de uma boa história na medida certa. Recomendado.
Os 7 Suspeitos
3.8 354 Assista AgoraO começo nos desperta curiosidade, o meio é um pouco confuso e entediante e o final (ou devo dizer, os finais) é bom, mas este filme não deve ser encarado com muita seriedade, e sim como aquilo que se propôs a ser: uma típica comédia pastelão ou mesmo como uma sátira aos filmes de investigação policial. Dessa maneira, naturalmente o roteiro é cheio de furos e tem diversas coisas que poderiam ter sido melhor desenvolvidas, mas o ideal é simplesmente ignorar tudo isso e se divertir, pois, apesar de tudo, ainda vale à pena acompanhar para dar umas risadas e pela bela Colleen Camp.
Divertido, mas, agora que sei o desfecho, não creio que irei rever, pois o que realmente segura o espectador é tentar desvendar o segredo, como se fosse o famoso jogo que inspirou o filme. No entanto, para quem nunca viu, é um bom passatempo.
Era uma Vez na América
4.3 531 Assista AgoraUm dos grandes clássicos do gênero "gangster" e que, curiosamente, não tem a temática do crime como o ponto central, sendo, na verdade, um filme que trata, sobretudo, sobre amizade e paixão. No entanto, pelo fato dos personagens envolvidos crescerem dentro do mundo do crime, naturalmente somos submetidos, ao longo da história, a uma extrema dose de violência, das mais variadas formas, o que pode ser chocante para muitos espectadores, em especial ao público feminino, mas que, para o bem ou para o mal, retrata de maneira fiel a época e o meio nos quais a trama se insere.
Pessoalmente, gostei da maneira não linear com a qual a história é apresentada, pois isso já nos mostra que alguma coisa, em algum momento, deu errado para os envolvidos, porém não sabemos o porquê e nem como tudo isso ocorreu, com tudo isso sendo explicado gradativamente e de forma paralela a construção dos próprios personagens. E tudo isso com uma excelente atuação do elenco, brilhante direção de Leone e mais uma marcante trilha sonora assinada por Morricone, que também contribuem para que o filme, apesar da longa duração, em momento algum se torne cansativo.
O único aspecto que deixou a desejar, em minha avaliação, foi o final. Depois de uma longa e cuidadosa construção dos acontecimentos e dos personagens ao longo de todo o filme, os momentos finais me pareceram mal explicados e um pouco corridos. Por que Max, que ainda não sabia que David tinha o entregue à polícia, se envolveu com Deborah? As acusações contra Max, no final, eram verdadeiras ou não, e, aliás, o que o levou a ser acusado? São alguns pontos que ficaram um pouco soltos e sem maiores explicações, embora eu dê um "desconto" ao Leone pelo fato da sua versão original ser ainda um pouco maior (cerca de 20 minutos) em relação à já longa versão estendida, então é possível que essas perguntas pudessem ser respondidas nas cenas que foram cortadas, mas infelizmente jamais iremos saber.
Uma obra minuciosamente construída, com impecáveis aspectos técnicos e grandes atuações. Crime, violência, amizade e paixão igualmente representados neste ótimo filme.
A Morte de Stalin
3.6 135 Assista AgoraEm "A Morte de Stalin", estamos diante de algo raro atualmente: uma inteligente e historicamente precisa sátira política. Neste caso, a trama gira em torno dos acontecimentos após a morte do longevo ditador soviético e, em uma mistura de drama com humor ácido, ironiza as disputas de poder dentro do partido comunista e as constantes intrigas entre os seus membros, em um contexto onde o que é verdadeiro ou falso muda a todo instante, amigos e inimigos se confundem e ninguém confia em ninguém.
No entanto, por trás de todos os absurdos e situações cômicas, esta obra trata diversos acontecimentos com precisão histórica admirável, como, por exemplo, as perversões sexuais de Laventiy Beria, que costumava entregar flores para as mulheres estupradas por ele, algo que é sutilmente mostrado no filme. Aliás, este é um aspecto interessante desta película, pois os fatos descritos são tão surreais que, por vezes, até parece que foram inventados por algum roteirista, mas quem puder realizar uma breve pesquisa e conferir as memória do Nikita Khrushchev irá verificar que muito do que é retratado realmente aconteceu. Essa incomum precisão, inclusive, é o que torna este filme tão aterrorizante quanto hilário.
Além disso, vale destacar o elenco perfeitamente escolhido, em especial Jeffrey Tambor e Steve Buscemi, que estão excelentes em seus respectivos papéis e elevam essa bem elaborada comédia a um outro nível.
Para quem gosta de história e de um bom e velho humor negro, recomendado.
Glória Feita de Sangue
4.4 448 Assista AgoraUm dos primeiros grandes sucessos de Kubrick, "Glória Feita de Sangue", apesar do título, explora um outro lado da guerra, isto é, um lado nada glorioso ou nobre. Neste filme, o diretor analisa, em uma obra com grandes atuações, diálogos bem elaborados e primorosos aspectos técnicos, a maneira como um conflito bélico pode mostrar o pior que existe na raça humana. Não somente um filme sobre guerra, mas, acima de tudo, um filme anti guerra, inteligente e sempre atual.
Curiosamente, ao longo da história, não somos apresentados, em momento algum, a uma cena de combate direto entre soldados inimigos. Da mesma forma, não presenciamos mortes em massa, torturas ou quaisquer outros acontecimentos do tipo e que fazem parte não somente do ambiente de uma guerra, mas que também são frequentemente mostrados em películas do gênero. E existe uma razão para isso: a grande crítica à guerra neste filme não envolve os soldados, mas sim aqueles que os comandam, isto é, os oficiais, mais especificamente os generais. Dessa maneira, Kubrick nos mostra que, apesar de todos os confrontos, mortes e embates sangrentos, o verdadeiro lado obscuro e deplorável deste conflito passa longe dos campos de batalha, mas se encontra dentro de salas e de trás de mesas. Isso pode ser sintetizado por uma antiga frase: "A guerra é um lugar onde jovens que não se conhecem e não se odeiam se matam entre si, por decisão de velhos que se conhecem e se odeiam, mas não se matam".
E o personagem que melhor representa esse espirito deplorável da guerra é o general Mireau, que obviamente não está sozinho em seus terríveis atos, mas mostra, de maneira brutal, covardia e falsidade gritantes, além de um total desprezo pela vida humana, não somente ao levar os seus soldados a uma missão sabidamente suicida, mas também ao, no momento em que a impossível operação naturalmente fracassa, se encontrar disposto a atirar em seu próprio batalhão, acusando posteriormente os soldados de serem covardes por não conseguirem cumprir suas ordens absurdas. Aliás, é irônico que justamente um general com tais características queira enviar soldados ao pelotão por covardia. E o pior de tudo é que tudo isso é feito com anuência de outros generais e oficiais do exército, que, no final, ainda concordam por fuzilar os pobres soldados que não tinham qualquer culpa pelos erros de seus superiores.
Ao final do filme, no entanto, temos uma cena belíssima na qual o coronel Dax observa uma jovem alemã cantando em frente a soldados franceses e estes fazendo coro ao canto da moça. Ali, após todos os atos deploráveis que ele havia presenciado, o coronel brevemente restaura a sua fé na raça humana, como se o filme nos mostrasse que a guerra, de fato, pode nos tirar, durante um certo período, a nossa coragem, os nossos sentidos e a nossa humanidade, mas essas virtudes ainda estão presentes dentro de nós apenas esperando para serem recuperadas em algum momento, como foi recuperada pelos soldados ao ouvirem a música.
Uma obra bem dirigida, com uma excelente mensagem e cujo único defeito talvez seja que durou muito pouco e que poderia ter sido alongado mais. Recomendado.
De Olhos Bem Fechados
3.9 1,5K Assista AgoraKubrick afirmou, diversas vezes, que os seus filmes buscam falar sobre a natureza humana, tendo, em dada oportunidade, dito: "estou interessado na mais brutal e violenta natureza do homem, por que esse é um retrato verdadeiro dos homens". Em "De Olhos Bem Fechados", o diretor aborda a parte da nossa natureza relacionada à sexualidade, em uma obra que, como diversas outras desse gênio do cinema, apresenta diversas camadas, simbolismos e detalhes, e sempre requer que assistamos mais de uma vez para compreender melhor.
O ponto central da trama gira em torno do casal Bill e Alice. Logo no início vemos que são duas pessoas bem atraentes (Tom Cruise e Nicole Kidman, que estavam realmente casados na época) e que apresentam uma família aparentemente estável, com uma filha e em boas condições financeiras. No entanto, já durante a festa a história vai nos levando para a temática principal do filme: a sexualidade. Enquanto Alice flerta com um homem húngaro, Bill faz o mesmo com outras duas mulheres. No entanto, é o húngaro que solta duas frases que são marcantes aqui: “O charme do casamento é tornar o fingimento uma necessidade para ambas as partes" e “Como uma mulher linda, que poderia ter qualquer homem neste salão, pode querer estar casada?”. A primeira ainda será aprofundada mais à frente, mas a segunda talvez impacte a personagem de maneira imediata: ela é uma mulher belíssima, jovem, sensual e que poderia ter qualquer homem daquele salão ou fora dele, então porque já está casada? Por que não se entrega aos seus desejos em um mundo de prazeres? O mesmo, inclusive, pode valer para Bill, que poderia se envolver não somente com as duas mulheres da festa, mas com várias outras. No final da festa, porém, ambos voltam para casa tendo rejeitado as tentações que surgiram e mantido a fidelidade intacta, em contraste, por exemplo, com Ziegler, que se envolveu com uma drogada no banheiro da mansão.
No entanto, na noite seguinte, Alice, talvez movida por ciúmes em relação ao marido com aquelas duas mulheres ou mesmo refletindo sobre a frase do húngaro sobre casamento, decide ser honesta com o seu marido e admitir algo que talvez nem fosse necessário contar: ela confessa à Bill que, embora não o tenha traído de maneira concreta, desejou ter feito isso certa vez com um outro homem, tendo seriamente pensado até em abandonar o marido, a filha e toda a família para se entregar aos prazeres e viver essa aventura. Mesmo com essa vontade tendo ficado apenas na imaginação e a tentação não ter se materializado, isso fica na mente de Bill, que antes tinha total confiança na esposa e em seu casamento, mas que agora já não tinha mais a mesma certeza inabalável de outrora, tendo a sua mulher revelado desejos que ele não pensava que ela possuía.
Com a confiança na sua esposa abalada e pelo temor da traição, Bill já não evita mais as tentações por conta do vínculo do matrimônio, mas incessantemente as busca como forma de atender aos seus desejos ou mesmo como uma vingança contra sua mulher. Sendo assim, a partir deste instante, ele começa a se encontrar inserido, seja de maneira involuntária seja pela própria vontade, em eventos que marcam uma longa aventura naquela madrugada e que acabam culminando em uma sociedade secreta, em uma espécie de ritual marcado por mulheres peladas e sexo por toda parte. No entanto, Bill, que estava buscando trair a esposa, não se viu em momento algum agraciado por estar naquele lugar, que teoricamente deveria ser o ideal para um homem que tinha as intenções que possuía, mas, na verdade, se viu muito mais chocado com o que presenciava do que propriamente atraído.
E aí que se encontra a grande ironia da história: o que Bill vê com os olhos bem abertos é mais fantasioso e absurdo do que o que Alice vê de olhos bem fechados. Enquanto ela confessa abertamente seu desejo, ele está mergulhado na sua confusão sexual. O sonho da esposa é mais excitante e assustador que a orgia presenciada na mansão. Percebemos, então, que Alice tem desejos reais e está consciente deles, enquanto Bill não sabe muito bem o que sente, a não ser a certeza de que ele, como homem, tem direito a estes desejos. Exatamente por isso o médico sentia que precisava vivenciar suas fantasias na prática, enquanto sua esposa as mantinha apenas em sua mente. É comum, portanto, que Bill saia de casa em busca de luxúria apenas para sentir-se tão sexualmente estimulado quanto sua esposa, quando ouve dela relatos eróticos. No entanto, ele se encontra assustado com o que vê, foge do local após ser descoberto pelos membros dessa seita e, no final das contas, volta para casa sem ter traído a esposa.
Outro ponto importante que essa cena em particular e o filme de maneira geral abordam, além dos desejos reprimidos pelo casal, é como a elite de nossa sociedade coloca por baixo dos panos os seus instintos mais primitivos. Aqui, por exemplo, temos a reunião dessa sociedade secreta representando isso, com membros da mais alta sociedade utilizando máscaras para não serem reconhecidos e, dessa maneira, poderem se entregar aos seus desejos carnais sem qualquer tipo de pudor. Logo, por baixo de toda a riqueza, a luxúria e a beleza da elite, haveriam os segredos mais sujos e podres, para os quais fechamos os olhos. E, convenhamos, quando vemos nas notícias casos como os de Epstein, Príncipe Andrew e outros, é difícil, ao assistir este filme, não imaginar que realmente tenha sido, mesmo que de forma involuntária, uma retratação dessas seitas secretas que devem existir e envolver pessoas famosas e ricas.
Ao final do filme, Bill vê, na cama e em mais um momento genial de Kubrick, sua esposa e a máscara que usou na festa lado a lado, como se ele tivesse que escolher entre uma coisa ou outra, isto é, deveria decidir em continuar uma vida de fingimentos (vestindo uma máscara) ou se deveria se abrir para a sua esposa, admitir tudo e continuar vivendo com ela. Ele, enfim, escolhe pela esposa, e ambos param de fechar os olhos para os desejos reprimidos um do outro, deixam as tentações que surgiram pelo caminho no passado e seguem em frente, se entregando definitivamente ao parceiro, ao seu casamento e a sua família.
Curiosidades e detalhes escondidos:
O nome da prostituta que abordou Bill na rua é "Domino", que é o mesmo nome de uma máscara veneziana.
"Fidelio", a senha usada para entrar na orgia daquela sociedade secreta, significa, ironicamente, "fidelidade" em latim.
A máscara que Bill usou para entrar no encontro da seita era uma do tipo "Volto", que é a mais comum dentre todas as máscaras venezianas. Talvez até por isso a mulher com a qual ele conversou na mansão logo percebeu que ele não pertencia aquele local.
Na cena de Bill com a prostituta, aparece um boneco de um tigre na cama. Na cena final dele com sua esposa e filha, também vemos os mesmos bonecos de tigre na loja de brinquedos.
A música aterrorizante tocada durante o ritual foi feita pela compositora Jocelyn Pook e incorpora trechos de uma música litúrgica da Igreja Ortodoxa no idioma romeno, sendo que esses trechos são colocados de forma invertida. Em inglês, essa parte diz: "And God told to his apprentices...I gave you a comand...to pray to the Lord fot the mercy, life, peace, health, salvation, the search, the leave and the forgiveness of the sins of God's children. The ones that pray, they have mercy and they take good care of this holy place" Pois bem, colocado de trás pra frente, tem o significado exatamente oposto, beirando a blasfêmia e o satanismo.
Kubrick morreu dias depois de entregar um corte preliminar do filme ao estúdio. No entanto, o diretor sempre costumava realizar edições em suas obras até o último instante, então muitos afirmam, por isso, que provavelmente a edição final liberada ao público e lançada não foi a que o diretor realmente queria e que ele ainda poderia ter feito alterações. Nunca saberemos, no entanto, se essas mudanças seriam feitas ou se seriam relevantes ao filme.
Um ótimo filme para assistir, desfrutar e analisar incessantemente. Super recomendado.
O Menu
3.6 1,0K Assista AgoraEm uma mistura de suspense e terror e com pitadas de comédia, "O Menu" nos apresenta, em meio a uma trama com surpresas e acontecimentos absurdos, uma crítica à sociedade atual e, sobretudo, à elite, apontando para os seus excessos, à sua falsidade e à sua arrogância.
O ponto central do filme gira em torno chefe Slowik, que não sente mais prazer em exercer a sua profissão, sendo o principal motivo para tal desilusão o fato de estar alimentando pessoas que comem sua comida apenas porque podem pagar, e não porque realmente gostam ou porque estão com fome. Dessa maneira, a sua culinária estaria sendo apropriada por uma elite que não somente não enxergava o seu real valor e significado, mas também estaria contribuindo para a sua própria destruição ao tirar a paixão pelo exercício do seu trabalho. Sendo assim, ele simplesmente decide matar todos os seus clientes, mas, como ele, ao cobrar preços altíssimos por seus pratos, teria culpa nessa "elitização da gastronomia", o chefe também opta por se matar e levar toda a sua equipe junto, que diga-se, concorda com tudo isso.
Dessa maneira, à medida que a história vai se desenrolando, vamos conhecendo mais sobre os clientes, e dos motivos pelos quais o chefe escolheu cada um para aquela noite. E, nesse processo, encontramos um casal que já desfrutou de vários pratos de Slowik e mesmo assim não consegue se lembrar de um sequer, uma crítica gastronômica responsável por fechar diversos restaurantes, três funcionários de uma grande empresa que estão ali apenas para se divertir e não apreciar os pratos, um artista que abandonou a paixão por sua profissão e um assíduo fã de culinária que finge saber tudo sobre comida, mas não sabe cozinhar.
O único cliente que não se encaixaria no perfil de pessoa que o chefe planejava matar era Margot, afinal ela sequer deveria estar ali, sendo apenas uma acompanhante contratada de última hora por Tyler, que havia se separado da namorada. Em contraste com o resto dos personagens, ela não finge gostar dos pratos de Slowik, mas, em vez disso, exige algo de que realmente goste: um simples cheeseburger. Essa sua honestidade é a prova final de que o chefe precisava para concluir que ela não fazia parte daquela elite rica da qual ele nutria tanto ódio e, por isso, liberou-a para ir embora e sair viva da ilha.
No entanto, embora o filme possa ser saudado pela sua criatividade, pela sua crítica social e pela forma como a história vai se desenrolando, com as suas devidas surpresas, também apresenta alguns pontos negativos. Em primeiro lugar, se todos os clientes foram escolhidos a dedo, o único cuja motivação para estar ali é fraca é a do ator famoso (o chefe ter o escolhido só por que não gostou de um filme dele e por que considera que o mesmo perdeu a paixão pela arte não me convenceu, sobretudo considerando que o ator é um dos poucos ali que realmente parece apreciar os pratos). Em segundo lugar, a briga entre Margot e a assistente de Slowik é um arco que foge completamente do foco do enredo principal e simplesmente não tem sentido, sendo desnecessário e descartável. E, em terceiro lugar, acredito que a própria temática do filme poderia ter sido melhor aprofundada, pois, apesar de todas as suas reviravoltas, o final foi um pouco previsível.
O filme, assim como os pratos de Slowik, tem um conceito interessante, mas não vai "matar a fome" daquele espectador que espera uma grande história. É bom e prende a atenção enquanto estamos degustando, mas é esquecível.
A Queda! As Últimas Horas de Hitler
4.1 775Um filme que passa longe de qualquer tentativa de "romantizar" a guerra, mas, pelo contrário, a apresenta da maneira realista, realizando uma representação brutal e fiel dos últimos momentos do Terceiro Reich. Dessa maneira, também cumpre um excelente papel de informar sobre os horrores do conflito.
Bruno Ganz, por sua vez, entrega a melhor interpretação de Hitler em um filme, sem exageros ou caricaturas, e sim um retrato fiel não somente de um ditador vendo o seu império ruir, mas de um homem alucinado, melancólico e egoísta com o seu próprio povo, entregando-o à ruína e ainda culpando-o pelo fracasso.