Inteligente e muito sensível, conforme eu esperava, ao saber que o roteiro era do Charlie Kaufman - que amo. E, da mesma forma, há muitas questões metalingüísticas e narratológicas em curso, em meio à trama de superação, a lição de moral infantil, sobre as construções de personalidade que se insurgem a partir dos enfrentamentos necessários do cotidiano. Por motivos compreensíveis e esperados, isso faz com que o escopo de ensinamentos do filme não fique reservado às crianças: é um filme adulto, em muitos âmbitos, mas que se desperdiça um pouco quando aceita a convenção enredística clicherosa do sumiço de alguém machucado, previsível e rapidamente solucionada. Há muitos aspectos em comum com o recente DIVERTIDA MENTE, o que cansa um pouquinho o espectador, sobretudo pela celeridade com que as situações ocorrem e são resolvidas. Mas, em suas entrelinhas psicanalíticas, é um filme que grita aquilo que já ouvimos bastante e, ainda assim, precisamos reouvir. De quebra, ainda somos inebriados pela voz do Werner Herzog, em relances. Que belezura de longa-metragem animado! (WPC>)
No começo, a impressão era a de que eu assistia a um extra dirigido por Paul Thomas Anderson, para um DVD da banda Sonic Youth. Pouco a pouco, fui notando que, ao documentar as reações das pessoas do colégio às "garotas sujas" do título - zineiras 'riot girls' -, o diretor registrava uma mudança geracional de paradigma, uma ascensão orgânica do feminismo adolescente, que abraça lutas transversais. importantíssimas para a fruição musical dos artistas que elas citam. Neste sentido, o filme é muito importante por aquilo que traz à tona, ainda que não o seja muito enquanto produto cinematográfico específico. Mas merece ser considerado como tão seminal quanto o PUNK ROCK HARDCORE, dirigido por Adelina Pontual, Cláudio Assis e Marcelo Gomes. Ao término da sessão, fiz questão de recomendá-lo a algumas amigas, que, obviamente, identificaram-se bastante. Uhuuuuu! (WPC>
Primeiro, uma confissão: da mesma maneira que, na Literatura, ainda tenho problemas de concentração/recepção com a Poesia, em Cinema, filmes silenciosos demoram um pouco para me cativarem. Foi o que aconteceu aqui. Porém, vamos ao segundo ponto: a despeito de meu travamento inicial, logo percebi a conjunção estilístico-imagética entre motes de Jonas Mekas e Jean Genet, numa conotação muito própria, em que a masturbação surge como tema e ônus, como solução e como perigo, como convite ao prazer e deixa para a perdição... O mito de Narciso é recontado de maneira belíssima e sensual, numa versão em curta-metragem que, estranhamente, era estranha para mim. Gostei, mas preciso voltar a ele, já sabendo do que se trata. Fascina, deveras: isso ninguém nega! (WPC>)
No início, eu estava incomodando-me com algo muito recorrente nessa abordagem oriental para o 'bullying': o exagero na incomunicabilidade, o modo como as mentiras e as rejeições dialogísticas contribuem para que as violências contra os alunos se perpetuem... De repente, isso aparece como assunto mesmo do filme: ao contrário do que alguns alegam, não há versões "à la RASHOMON" para o enredo, em que as contradições aparecem, mas testemunhos complementares, que adicionam novos enfoques a uma situação julgada às pressas e, por conta disso, desencadeando problemas muito maiores que aqueles inicialmente detectados. O segundo testemunho, entretanto, ainda continha o aspecto incômodo, no que tange aos gritos do professor, clamando por contato em meio á chuva torrencial, por exemplo. Mas eis que o terceiro relato aparece, em que o garotinho protagonista pode realmente ser o protagonista de sua própria trama. A emoção cresce, em alinhamento com os ternos acordes do Ryuichi Sakamoto, que permite que enxerguemos aquele desfecho como feliz, diante de tudo o que ocorre anteriormente... Lindo, lindo, lindo: o diretor consegue se superar em relação às suas auto-fórmulas familiares. Meus parabéns - e tem muito a ver com o recente CLOSE, como alguém disse: é a mesma conjuntura! (WPC>)
Que beleza de filme, que direção refinada, que interpretações sensíveis! O roteiro mereceu o Oscar e o desfecho que não "conclui" em excesso reitera aquilo que mais amo no estilo de Peter Weir: as aberturas à realidade que prossegue depois que luzes do cinema se acendem... Trilha musical muito bem inserida e momentos insignes, protagonizados pelo eloqüente garotinho Lukas Haas. Poderia ser um policial oitentista convencional, mas o diretor preferiu outro ritmo, mais comedido, tanto quanto o cotidiano da comunidade que aborda. O 'male gaze' está la, na cena de nudez com a Kelly McGillis, mas ela tira de letra, virando-se de costas, adicionando poesia á observação furtiva. Muitíssimo bonito e repleto de camadas a serem discursivamente preenchidas, fazendo jus ao sobrenome do personagem principal, um livro ainda sendo escrito. Incrível! (WPC>)
Julian Sands era o muso de minha adolescência e, como tal, sempre tive muita curiosidade em conferir este filme. O fiz ao lado de minha mãe, que divertiu-se bastante, sobretudo pelo absurdo da trama, pelas situações sem sentido, pela falta de lógica na adaptação dos personagens do Século XVII à atualidade. Em meio ás interpretações quase 'camp', Richard E. Grant brilha, enquanto Julian Sans encarna a suma malevolência, matador de homossexuais, mulheres, idosos e crianças, sem piedade. O terror e o nonsense convivem juntos, na maior parte da metragem, mas o tom geral é lúgubre, em razão das perdas enfrentadas pelos personagens, da crueldade crescente do vilão. Bacana, no cômputo geral. Mas não o suficiente para me fazer encarar as continuações! (WPC>)
Adentrei a sessão relativamente descrente: confiava no taco do Mojica, brilhante até mesmo em seus trabalho póstumo (perdido após várias tentativas de finalização), mas não achava que a montagem organizadora e mui esforçada de Eugênio Puppo fosse capaz de resgatar a maestria do projeto original. De fato, no início, os enxertos das apresentações do "Cine Trash" e cenas de outros filmes pareceram forçados (em sua valiosa tentativa), bem como soa problemática a maneira como as religiões de matriz africana são mostradas aqui. Mas, do meio para o final, quando Wanda Kosmo está em cena, como o filme cresce! Idem para os repugnantes e maravilhosos efeitos de maquiagem, bem como a sensualidade inerente ao casal protagonista. Saí da sessão enjoado (por aquilo que o filme provoca - ou seja, é uma reação positiva dentro do gênero) e encantado. Filmaço! (WPC>)
Amo musicais e detesto regravações, uma combinação de opiniões que encontra, neste objeto, um píncaro e enfrentamento. Relutei por algum tempo em conferi-lo, mas minha mãe ficou curiosa, obcecada que é pelo filme anterior. O que já configurou um problema para ela, que ficou comparando as duas versões, o tempo inteiro. Algo que eu tentei evitar, mais preocupado com maneira como as canções seriam inseridas em meio aos estupros e espancamentos. Surpreendentemente, o diretor fez isso muito bem: depois de uma abertura 'gospel' e objetiva, que não funcionou tanto - apesar do talento dos artistas envolvidos - , percebi que as canções serviriam como evasão fantasiosa para as duas irmãs, o que é justificado pelas convenções históricas do gênero. Em meio à celeridade da narrativa, mais compacta que a anterior - em relação à qual posta-se de maneira imitativa -, comecei a curtir a trama dolorosa e permeada pela esperança comprobatória de que Deus exista. No terço final, a trama avança bastante em relação ao desfecho da versão spielberguiana - e, daí por diante, gostei muito, caí na esparrela do perdão, na necessidade compensatória (e cristã) do final feliz. Achei a derradeira seqüência muito bonita e gostei de reconhecer os participantes famosos do elenco. Afinal, aplaudo o realizador: conseguiu dotar a sua versão de simpatia e unicidade. Era "desnecessária", claro, mas demonstrou-se útil nos seus complementos de caráter religioso. (WPC>)
Não sei por que motivo eu evitei este filme por tanto tempo: é maravilhoso! Além de o protagonista canino ser magnífico (que olhar eloqüente!), as situações são muito elaboradas, enquanto ainda não há efetivamente uma trama: o que é abordado, na maior parte do enredo, é a rotina de amizades múltiplas de uma cachorro de rua. Pouco a pouco, através de 'flashbacks', entendemos o que aconteceu anteriormente ao bichinho protagonista. E, quando insurge-se uma ocorrência policial que confirma o heroísmo nato de Benji, a direção revela-se mui exitosa na aplicação de clichês familiares e convenções de gênero. Com momentos mui aplaudíveis à parte, como toda a seqüência da delegacia de polícia e a entrada em cena da sofrida Thiffany. Eu e minha mãe ficamos muito emocionados: filme lindo! (WPC>)
A sinopse promete mais que o filme entrega, no sentido de que a imersão no "plano improvável" soa um tanto infantilizado, numa crença de "salvação mundial" que, na prática, é menos funcional que aplicável. A interação entre o excelente trio de atrizes é muito bacana, mas o deslumbramento da personagem de Grace Passô traz à tona um problema de composição orgânica, no sentido de que sua argumentação lacradora beira o delírio, desperdiçando as possibilidades de interação com as demais irmãs. Ah, é um enredo sobre o surgimento de distúrbios psicológicos, acentuados pelo confinamento no contexto de poderio bolsonarista? Se for assim, talvez até sirva, enquanto contra-exemplo. Mas é um trabalho bastante inferior aos demais projetos da diretora! (WPC>)
Muitíssimo imponente tanto em seus aspectos enciclopédicos quanto ensaísticos. Por algum motivo injusto, não é tão conhecido quanto os trabalhos de Mark Cousins - e merecia: não conhecia vários dos títulos citados, e já estou em busca dos mesmos. Gostaria muito que também fosse lançado em versão escrita: os depoimentos e entrevistas são excelentes, e foi muito sagaz que a história tenha "terminado" em 1978, pois há um ponto de virada fundamental a partir dali, que justifica, inclusive, a feitura de continuações documentais (tomara que elas surjam, nalgum momento). A narração é extraordinária, os argumentos são muito bem fundamentados, e as reflexões são esplêndidas. Um tesouro, a ser exibido e revisto como aula! (WPC>)
Não gosto do oportunismo do Ken Wiederhorn, no que tange ao aproveitamos das condições de terror em voga, mas fiquei curioso quanto ao seu primeiro longa-metragem. Quando soube que este filme seria visto e debatido pelos integrantes de um cineclube formado por pessoas inteligentes e queridas, revolvi rever, antes da sessão, um clássico fulciano que cria possuir vários pontos em contato com ele. De fato, confirmaram-se, mas isso evidenciou ainda mais a fraqueza do roteiro desta obra, tão rápida na apresentação de seus fatos, que desperdiça o ótimo ponto de partida e o elenco com nomes famosos. É tudo rápido demais, superficial demais. Gosto da fotografia super iluminada - que lembra as produções da Ozploitation - e curto alguns breves momentos (a condução das situações que explicam o trauma da sobrevivente encontrada na cena inicial, por exemplo). Mas, como sói acontecer em 'slasher movies', desgosto de como a tese do "assassinato por procuração" serve para que eliminemos desejosamente personagens que se associam a comportamentos preconceituosos ou desagradáveis. Diverte, ao menos. Mas poderia ir beeeeeeeem mais longe! (WPC>)
A cada novo contato, melhor fica: além de eu ser obcecado pelas elaboradas seqüências do Fulci (vide a célebre luta submarina entre o zumbi e o tubarão, as câmeras subjetivas dos conquistadores espanhóis renascidos, as situações de morte), surpreendi-me ao percebi críticas coloniais impressionantes no roteiro. O desenvolvimento dos personagens é vago, mas não as situações em que eles se envolvem. Fotografia impressionante, bem como o suo inventivo da trilha musical. Desfecho pessimista de alto calibre. Clássico! (WPC>)
'Cult' discreto da década em que eu nasci, que explora ao máximo o 'sex appeal' do jovem Dennis Quaid, mostrado seminu em diversas oportunidades. Os efeitos visuais são interessantes e a narrativa tem um ótimo ponto de partida, mas, quanto o enredo mergulha de vez no suspense político, não me empolgou tanto (ao contrário de minha mãe, ao meu lado, que torcia euforicamente pelo presidente). O elenco é primoroso e a equipe envolvida no filme tornar-se-ia deveras relevante naquele período. Vale a pena ser conhecido, portanto: é um preâmbulo gostoso de uma época! (WPC>)
Desde que este filme foi lançado, minha mãe demonstrou interesse em conferi-lo. Eu detestava tanto a diretora (por causa do ranço referente à comédia ALGUÉM TEM QUE CEDER), que não consegui fazer o básico: ceder. Ontem, no meio de uma crise de borocoxismo, consegui. Fosse noutro contexto, talvez largasse o filme no começo, por causa de suas exacerbações classistas, de seus elogios 'yuppies', em conjuntura cyber-corporativa. Mas segui em frente - e, tal como a protagonista, fui cativado pela bonomia do protagonista, que até ereção ostenta, aos 70 anos de idade! (Quando Rene Russo está em cena, o filme cresce bastante). Em mais de metade da produção, parecia que eu assistia a um testemunho prolongado da crise contemporânea da narrativa hollywoodiana (vide a seqüência do roubo do computador, urgh!), mas, depois que os clichês matrimoniais e familiares surgem, a esperada simpatia do filme é manifesta, começo a me interessar pelo inevitável feliz feliz. E curti, identifiquei-me pelas bordas (sou um trabalhador estressado, também, afinal de contas). É longo e digressivo, mas com um leve charme convencional. O problema é essa obsessão da diretora em imitar/substituir a Nora Ephron. Um dia, ela consegue, quem sabe? (WPC>)
Ok, enfrentei. Esperava um lixo total, mas, quando a montagem permite o filme consiga ter um plano que dure mais de 5 segundos, a narrativa até que consegue comunicar algo. Poderia ser uma trama regular, uma volta às origens de uma banda que, inequivocamente, causou um temporal midiático no Brasil, a despeito do eventual rechaço à vulgaridade intencionalmente contida nas letras das canções. Conforme o enredo demonstra, inclusive, há muito mais seriedade no processo do que se pensava. O problema é que há uma descompasso atroz na maneira como isso é contato: sempre que se pronunciava a palavra "sonho", dava vontade de vomitar, de tão mal inserida que a pieguice era em meio à baderna. Idem para a forçação de barra em relação à subtrama dos dois irmãos, cortejados pela mesma sacana. Bento é quase um figurante, tadinho: não tinham nada a contar sobre ele? A direção é péssima e as interpretações rendem-se a meros estereótipos. Minha mãe estava na sala comigo, e eu senti vergonha por ela. Não agüentou muito, entretanto. Mas eu até que estava deixando o embalo passar, o filme é que não permitia que isso acontecesse: aquela montagem é simplesmente criminosa! (WPC>)
Fazia muito, muito tempo que eu não ficava tão desesperado para ver um filme. Antes da sessão, um amigo comentou que o sobejo de expectativas poderia desencadear alguma frustração em relação à obra. Em dez minutos de filme, sumamente deslumbrado, pensei que isso não fosse ocorrer. Mas ocorreu, em determinado momento: quando surgem as situações "correspondentes" à fábula de João e Maria, que adiciona um novo dispositivo, em relação a outro já em curso. Ao invés de ambos se combinarem, ocorreu uma espécie de competição estética, prejudicial para a apreciação destes segmentos em negativo/câmera noturna. O que talvez se manifestou nas aparições das telas monocromáticas - que adorei! -, no sentido de que um terceiro dispositivo é adicionado, confirmando a intenção do diretor em ser notado por sua genialidade, por seu experimentalismo, por sua criatividade... Nem precisava tanto: já bastava a magnificência do contraste entre as imagens resplandecentes e as atrocidades sonoras. Tecnicamente, que filme! Discursivamente, idem. Não é uma obra-prima, como eu esperava e tinha quase certeza de que seria, mas é espantosamente assertivo e intimidados. Apavorante, até: a personagem da Sandra Hüller é o suprassumo da maldade, quase deformando a si mesma, em sua ambição incontida. Como os meus companheiros de sessão, fiquei mui atordoado naquele 'flash-forward' histórico do desfecho, em que o inverso do que é denunciado vem à tona: e se a espectacularização do "ser vítima" for também um problema, em âmbito malevolente. As notícias de agora estão aí para demonstrar que a equiparação, infelizmente, não é vã, nem precipitada, nem desprovida de sentido. Adorei a montagem seca, quase como se fosse um jogo eletrônico. Christian Friedlel está imponente e aterrador, numa interpretação que faz com que ela cresça bastante em tela. Li o livro, e amei, mas a adaptação cinematográfica aproveita muito pouco do entrecho original: apenas o contexto geográfico/(i)moral, em verdade. Mas o faz com excelência, exceto pelos excessos supramencionados. Mica Levi ganha mais e mais meu coração a cada trabalho. Magnífico. Imperfeito, mas magnífico: fiquei com aquele zumbido, aquela algaravia, por muito tempo, zunindo em meus ouvidos, após a sessão. E já quero (e preciso) rever este filme, por vezes sutil, por vezes escancarado! (WPC>)
Ainda que o projeto não seja de todo inédito (pensamos na cinessérie "Up" ou em ANNA DOS6 AOS 18, para ficar em títulos imediatos), o diretor foi assertivo na união de crianças provenientes de classes sociais radicalmente distintas. Quando há o reencontro com os personagens reais, ficamos curiosos quanto às confirmações do que era possibilidade a partir do título, mas isso torna-se, gradualmente, uma constatação dos piores determinismos, sobretudo porque, numa atitude ousada (e contrária às suas realizadores anteriores), o diretor narra os eventos, adéqua o que é filmado às suas teses já confirmadas. Por uma lado, isso é válido, em âmbito político-sociológico, mas diminui o charme do documentário, no que tange à naturalidade dos eventos, afinal confirmada pela inteligência espontânea de Júlia e pelo carisma apaixonante de Cristian. Há algo de desagradavelmente paternalista, a partir de determinado momento, mas o projeto é bem realizado, ainda que o diretor relute em aceitar os caminhos inventivos que os percalços da realidade pareciam obrigá-lo: ele insiste em levar a cabo o que planejara e, a despeito de uma recusa "esperada", consegue fazê-lo. Funciona enquanto registro de um Brasil em confronto, após a ascensão do bolsonarismo. Mas sem aderir ao fatalismo: a união entre os dois irmãos é cativantes, mesmo quando eles se separam, eventualmente... (WPC>)
É interessante como, apesar das quatro horas de duração, percebemos muito mais as ausências que as presenças: é um filme que passa muito rapidamente por períodos e títulos, encontrando um bom rumo descritivo na metade final, quando insere não apenas filmes, mas também jogos, séries e programas de TV. Assisti aos quatro capítulos em dias distintos, para respeitar a divisão dos episódios: o primeiro é o mais problemático, em termos de celeridade do registro, de condensação exagerada dos eventos; o segundo promete mais do que cumpre, mas é bacana em sua exposição de projetos autorais relacionados aos estúdios, sendo que a biografia dos fundadores não recai na exposição "chapa-branca", seus erros e pecadilhos são comentados pelo narrador Morgan Freeman; o terceiro episódio talvez seja o meu favorito, no que tange à consciência de que "os tempos mudaram" e de que uma nova configuração corporativa é exigida para a sobrevivência da empresa; e o quarto é uma continuação direta dessa percepção, de modo que ficamos querendo saber mais, ver mais, assistir a tudo o que é mencionado (acerca de algumas séries, por exemplo, apesar da menção elogiosa enquanto sucesso, eu sequer ouvira falar!). É menos um documentário cinéfilo que uma homenagem conscienciosa a uma grande empresa de produção audiovisual. Serve, mas acho que eu queria mais... (WPC>)
Ao contrário de quase todos os meus amigos, não gosto muito de VOU RIFAR MEU CORAÇÃO, obra mais famosa da diretora. Tal como aconteceu lá, eu temi que aqui, a sua abordagem fosse rasa, disfarçada de olhar sentimental/afetivo sobre a história. De fato, ocorreu. E isso dá origem a momentos muito interessantes, de comunhão mnemônica entre os músicos. Porém, eles não chegam a se reencontrar efetivamente (não a propósito do documentário, pelo menos) e a linguagem é menos a de um documentário que a de um extra de DVD, de um 'making-of' tardio. Não há qualquer comentário sobre a célebre capa do disco e o processo de gravação é comentado 'en passant', como se fosse a coisa mais habitual do mundo! Foi ótimo ouvir compositores tão inspirados e saber um pouco mais sobre a intimidade dos responsáveis por um dos melhores discos da música brasileira, mas é um filme que não aborda com profundidade a sua temática, e que, por conta disso, é destinado sobretudo a quem já conhece (muito) o disco. Pessoalmente, acho que um pouco de enciclopedismo faria bem a este projeto. Não era o que a diretora queria, entretanto. Direito dela: encontrará o seu público. Não funcionou comigo, infelizmente! (WPC>)
Não tem como não ficar encantado pelos filmes deste grande mestre: por mais que, às vezes, parece que ele se deixou influenciar pelo saudoso Satoshi Kon (na perspectiva onírica), a lógica miyazakiana é facilmente reconhecível: aqui, ao invés das típicas meninas de doze anos, temos um menino. Nos diálogos, a maldade é explicitamente citada, mais de uma vez. E a pletora de animais e situações sobrenaturais/mágicas parece relacionada, de maneira direta, a um delírio convalescente do protagonista, que se recupera de uma ferida auto-infligida na cabeça. Há diferenças mui perceptíveis em relação aos filmes anteriores, portanto. Mas o charme habitual explode em imagens belíssimas, na trilha musical inebriante de Joe Hisaishi e num roteiro que se desenvolve de maneira tão lenta quanto fascinante, em que somos surpreendidos por novas informações e contextos a cada dez minutos. Como não amar, portanto? Não está entre os meus favoritos do diretor, mas ele acostumou-nos a escalas tão altas, que revela-se um filme extraordinário, portanto! (WPC>)
Já assisti à regravação mais de uma vez, porém o charme da descoberta desta versão original é impactante: as interpretações são ótimas e mui expressivas, bem como o uso indicial dos objetos. Aquela bicicleta, por exemplo, é um personagem tão presente quanto o próprio Shinkichi! Em sentido formal, Ozu antecipa procedimentos antonionianos, aqui, mas em viés oposto, já que ele acredita e fomenta a comunicabilidade entre os personagens. Ainda que só tenhamos acesso a este filmaço em versão completamente silenciosa, sem acompanhamento musical, a trama é tão bem contada e tão direta que logo estamos apaixonados por todos os envolvidos, torcendo para eles estejam bem, em seu percurso similar às ervas do título: a fotografia e os enquadramentos são sublimes! (WPC>)
Não sei se, em comunhão com o outro episódio do longa-metragem, o filme faz mais sentido em sua denúncia cínica. Admiro a relevância histórica do filme, mas o discurso é problemático, em sua lógica da inveja de classe: é como se, ao final, o ranço do personagem só fizesse sentido porque ele foi pego, não porque discorda dos "granjestes". Gostei dos flertes com a ficção científica - a ponto de alguns cinéfilos notarem antecipações temáticas em relação a CORRA! - mas a coadjuvação do personagem Magrão cria outra emenda discursiva que merece debate: comigo, infelizmente, não funcionou. A Dialética da Malandragem, aqui, está pouco dialética (ao menos, num primeiro contato)! :( - WPC>
Apesar de a publicidade do filme destacar a filiação do diretor à Escola de Berlim e de o material de divulgação alegar que há algo de fassbinderiano na trama, as referências que pude identificar na trama são MÁQUINA MORTÍFERA e O PAGAMENTO FINAL, com as devidas oposições estilísticas, claro. Trata-se de um filme que adere à narrativa policialesca clássica - um tanto 'noir', conforme notaram alguns exegetas - , mas com largas aberturas às reflexões sobre os preconceitos e desconfianças enfrentados pelas pessoas transexuais. Neste sentido, a personificação de Thea Eher é mui elogiável e aplaudível, mas há algo de incomodamente afetado na interpretação de Timocin Ziegler, o que tem a ver com as dúvidas de seu personagem. A narrativa é afobada, na maneira como os personagens se conhecem e se aproximam, e o desfecho é antecipado dialogisticamente, em mais de um instante. O que tem menos a ver com previsibilidade que com tragicidade, com um determinismo associado ás convenções do gênero - e/ou de gênero, já que as rusgas entre homens e mulheres são reiteradas através das insatisfações dos dois casais observados pelo roteiro. Gosto do uso das baladas cancionais e da condução entretenedora, de modo que nem sentimos a duração um tanto prolongada. Não inova muito, mas é uma atualização tipicamente alemã de tramas reconhecidamente hollywoodianas. Curti! (WPC>)
Orion e o Escuro
3.3 72 Assista AgoraInteligente e muito sensível, conforme eu esperava, ao saber que o roteiro era do Charlie Kaufman - que amo. E, da mesma forma, há muitas questões metalingüísticas e narratológicas em curso, em meio à trama de superação, a lição de moral infantil, sobre as construções de personalidade que se insurgem a partir dos enfrentamentos necessários do cotidiano. Por motivos compreensíveis e esperados, isso faz com que o escopo de ensinamentos do filme não fique reservado às crianças: é um filme adulto, em muitos âmbitos, mas que se desperdiça um pouco quando aceita a convenção enredística clicherosa do sumiço de alguém machucado, previsível e rapidamente solucionada. Há muitos aspectos em comum com o recente DIVERTIDA MENTE, o que cansa um pouquinho o espectador, sobretudo pela celeridade com que as situações ocorrem e são resolvidas. Mas, em suas entrelinhas psicanalíticas, é um filme que grita aquilo que já ouvimos bastante e, ainda assim, precisamos reouvir. De quebra, ainda somos inebriados pela voz do Werner Herzog, em relances. Que belezura de longa-metragem animado! (WPC>)
Dirty Girls
4.3 5No começo, a impressão era a de que eu assistia a um extra dirigido por Paul Thomas Anderson, para um DVD da banda Sonic Youth. Pouco a pouco, fui notando que, ao documentar as reações das pessoas do colégio às "garotas sujas" do título - zineiras 'riot girls' -, o diretor registrava uma mudança geracional de paradigma, uma ascensão orgânica do feminismo adolescente, que abraça lutas transversais. importantíssimas para a fruição musical dos artistas que elas citam. Neste sentido, o filme é muito importante por aquilo que traz à tona, ainda que não o seja muito enquanto produto cinematográfico específico. Mas merece ser considerado como tão seminal quanto o PUNK ROCK HARDCORE, dirigido por Adelina Pontual, Cláudio Assis e Marcelo Gomes. Ao término da sessão, fiz questão de recomendá-lo a algumas amigas, que, obviamente, identificaram-se bastante. Uhuuuuu! (WPC>
Jerovi
3.5 1Primeiro, uma confissão: da mesma maneira que, na Literatura, ainda tenho problemas de concentração/recepção com a Poesia, em Cinema, filmes silenciosos demoram um pouco para me cativarem. Foi o que aconteceu aqui. Porém, vamos ao segundo ponto: a despeito de meu travamento inicial, logo percebi a conjunção estilístico-imagética entre motes de Jonas Mekas e Jean Genet, numa conotação muito própria, em que a masturbação surge como tema e ônus, como solução e como perigo, como convite ao prazer e deixa para a perdição... O mito de Narciso é recontado de maneira belíssima e sensual, numa versão em curta-metragem que, estranhamente, era estranha para mim. Gostei, mas preciso voltar a ele, já sabendo do que se trata. Fascina, deveras: isso ninguém nega! (WPC>)
Monstro
4.3 281 Assista AgoraNo início, eu estava incomodando-me com algo muito recorrente nessa abordagem oriental para o 'bullying': o exagero na incomunicabilidade, o modo como as mentiras e as rejeições dialogísticas contribuem para que as violências contra os alunos se perpetuem... De repente, isso aparece como assunto mesmo do filme: ao contrário do que alguns alegam, não há versões "à la RASHOMON" para o enredo, em que as contradições aparecem, mas testemunhos complementares, que adicionam novos enfoques a uma situação julgada às pressas e, por conta disso, desencadeando problemas muito maiores que aqueles inicialmente detectados. O segundo testemunho, entretanto, ainda continha o aspecto incômodo, no que tange aos gritos do professor, clamando por contato em meio á chuva torrencial, por exemplo. Mas eis que o terceiro relato aparece, em que o garotinho protagonista pode realmente ser o protagonista de sua própria trama. A emoção cresce, em alinhamento com os ternos acordes do Ryuichi Sakamoto, que permite que enxerguemos aquele desfecho como feliz, diante de tudo o que ocorre anteriormente... Lindo, lindo, lindo: o diretor consegue se superar em relação às suas auto-fórmulas familiares. Meus parabéns - e tem muito a ver com o recente CLOSE, como alguém disse: é a mesma conjuntura! (WPC>)
A Testemunha
3.6 142 Assista AgoraQue beleza de filme, que direção refinada, que interpretações sensíveis! O roteiro mereceu o Oscar e o desfecho que não "conclui" em excesso reitera aquilo que mais amo no estilo de Peter Weir: as aberturas à realidade que prossegue depois que luzes do cinema se acendem... Trilha musical muito bem inserida e momentos insignes, protagonizados pelo eloqüente garotinho Lukas Haas. Poderia ser um policial oitentista convencional, mas o diretor preferiu outro ritmo, mais comedido, tanto quanto o cotidiano da comunidade que aborda. O 'male gaze' está la, na cena de nudez com a Kelly McGillis, mas ela tira de letra, virando-se de costas, adicionando poesia á observação furtiva. Muitíssimo bonito e repleto de camadas a serem discursivamente preenchidas, fazendo jus ao sobrenome do personagem principal, um livro ainda sendo escrito. Incrível! (WPC>)
Warlock: O Demônio
3.3 89Julian Sands era o muso de minha adolescência e, como tal, sempre tive muita curiosidade em conferir este filme. O fiz ao lado de minha mãe, que divertiu-se bastante, sobretudo pelo absurdo da trama, pelas situações sem sentido, pela falta de lógica na adaptação dos personagens do Século XVII à atualidade. Em meio ás interpretações quase 'camp', Richard E. Grant brilha, enquanto Julian Sans encarna a suma malevolência, matador de homossexuais, mulheres, idosos e crianças, sem piedade. O terror e o nonsense convivem juntos, na maior parte da metragem, mas o tom geral é lúgubre, em razão das perdas enfrentadas pelos personagens, da crueldade crescente do vilão. Bacana, no cômputo geral. Mas não o suficiente para me fazer encarar as continuações! (WPC>)
A Praga
3.1 1Adentrei a sessão relativamente descrente: confiava no taco do Mojica, brilhante até mesmo em seus trabalho póstumo (perdido após várias tentativas de finalização), mas não achava que a montagem organizadora e mui esforçada de Eugênio Puppo fosse capaz de resgatar a maestria do projeto original. De fato, no início, os enxertos das apresentações do "Cine Trash" e cenas de outros filmes pareceram forçados (em sua valiosa tentativa), bem como soa problemática a maneira como as religiões de matriz africana são mostradas aqui. Mas, do meio para o final, quando Wanda Kosmo está em cena, como o filme cresce! Idem para os repugnantes e maravilhosos efeitos de maquiagem, bem como a sensualidade inerente ao casal protagonista. Saí da sessão enjoado (por aquilo que o filme provoca - ou seja, é uma reação positiva dentro do gênero) e encantado. Filmaço! (WPC>)
A Cor Púrpura
3.5 105Amo musicais e detesto regravações, uma combinação de opiniões que encontra, neste objeto, um píncaro e enfrentamento. Relutei por algum tempo em conferi-lo, mas minha mãe ficou curiosa, obcecada que é pelo filme anterior. O que já configurou um problema para ela, que ficou comparando as duas versões, o tempo inteiro. Algo que eu tentei evitar, mais preocupado com maneira como as canções seriam inseridas em meio aos estupros e espancamentos. Surpreendentemente, o diretor fez isso muito bem: depois de uma abertura 'gospel' e objetiva, que não funcionou tanto - apesar do talento dos artistas envolvidos - , percebi que as canções serviriam como evasão fantasiosa para as duas irmãs, o que é justificado pelas convenções históricas do gênero. Em meio à celeridade da narrativa, mais compacta que a anterior - em relação à qual posta-se de maneira imitativa -, comecei a curtir a trama dolorosa e permeada pela esperança comprobatória de que Deus exista. No terço final, a trama avança bastante em relação ao desfecho da versão spielberguiana - e, daí por diante, gostei muito, caí na esparrela do perdão, na necessidade compensatória (e cristã) do final feliz. Achei a derradeira seqüência muito bonita e gostei de reconhecer os participantes famosos do elenco. Afinal, aplaudo o realizador: conseguiu dotar a sua versão de simpatia e unicidade. Era "desnecessária", claro, mas demonstrou-se útil nos seus complementos de caráter religioso. (WPC>)
Benji, o Filme
3.2 52Não sei por que motivo eu evitei este filme por tanto tempo: é maravilhoso! Além de o protagonista canino ser magnífico (que olhar eloqüente!), as situações são muito elaboradas, enquanto ainda não há efetivamente uma trama: o que é abordado, na maior parte do enredo, é a rotina de amizades múltiplas de uma cachorro de rua. Pouco a pouco, através de 'flashbacks', entendemos o que aconteceu anteriormente ao bichinho protagonista. E, quando insurge-se uma ocorrência policial que confirma o heroísmo nato de Benji, a direção revela-se mui exitosa na aplicação de clichês familiares e convenções de gênero. Com momentos mui aplaudíveis à parte, como toda a seqüência da delegacia de polícia e a entrada em cena da sofrida Thiffany. Eu e minha mãe ficamos muito emocionados: filme lindo! (WPC>)
O Nosso Pai
3.5 8A sinopse promete mais que o filme entrega, no sentido de que a imersão no "plano improvável" soa um tanto infantilizado, numa crença de "salvação mundial" que, na prática, é menos funcional que aplicável. A interação entre o excelente trio de atrizes é muito bacana, mas o deslumbramento da personagem de Grace Passô traz à tona um problema de composição orgânica, no sentido de que sua argumentação lacradora beira o delírio, desperdiçando as possibilidades de interação com as demais irmãs. Ah, é um enredo sobre o surgimento de distúrbios psicológicos, acentuados pelo confinamento no contexto de poderio bolsonarista? Se for assim, talvez até sirva, enquanto contra-exemplo. Mas é um trabalho bastante inferior aos demais projetos da diretora! (WPC>)
A História do Cinema Negro nos EUA
4.2 14 Assista AgoraMuitíssimo imponente tanto em seus aspectos enciclopédicos quanto ensaísticos. Por algum motivo injusto, não é tão conhecido quanto os trabalhos de Mark Cousins - e merecia: não conhecia vários dos títulos citados, e já estou em busca dos mesmos. Gostaria muito que também fosse lançado em versão escrita: os depoimentos e entrevistas são excelentes, e foi muito sagaz que a história tenha "terminado" em 1978, pois há um ponto de virada fundamental a partir dali, que justifica, inclusive, a feitura de continuações documentais (tomara que elas surjam, nalgum momento). A narração é extraordinária, os argumentos são muito bem fundamentados, e as reflexões são esplêndidas. Um tesouro, a ser exibido e revisto como aula! (WPC>)
Horror em Alto Mar
3.0 35Não gosto do oportunismo do Ken Wiederhorn, no que tange ao aproveitamos das condições de terror em voga, mas fiquei curioso quanto ao seu primeiro longa-metragem. Quando soube que este filme seria visto e debatido pelos integrantes de um cineclube formado por pessoas inteligentes e queridas, revolvi rever, antes da sessão, um clássico fulciano que cria possuir vários pontos em contato com ele. De fato, confirmaram-se, mas isso evidenciou ainda mais a fraqueza do roteiro desta obra, tão rápida na apresentação de seus fatos, que desperdiça o ótimo ponto de partida e o elenco com nomes famosos. É tudo rápido demais, superficial demais. Gosto da fotografia super iluminada - que lembra as produções da Ozploitation - e curto alguns breves momentos (a condução das situações que explicam o trauma da sobrevivente encontrada na cena inicial, por exemplo). Mas, como sói acontecer em 'slasher movies', desgosto de como a tese do "assassinato por procuração" serve para que eliminemos desejosamente personagens que se associam a comportamentos preconceituosos ou desagradáveis. Diverte, ao menos. Mas poderia ir beeeeeeeem mais longe! (WPC>)
Zombie: A Volta dos Mortos
3.7 182A cada novo contato, melhor fica: além de eu ser obcecado pelas elaboradas seqüências do Fulci (vide a célebre luta submarina entre o zumbi e o tubarão, as câmeras subjetivas dos conquistadores espanhóis renascidos, as situações de morte), surpreendi-me ao percebi críticas coloniais impressionantes no roteiro. O desenvolvimento dos personagens é vago, mas não as situações em que eles se envolvem. Fotografia impressionante, bem como o suo inventivo da trilha musical. Desfecho pessimista de alto calibre. Clássico! (WPC>)
A Morte nos Sonhos
3.2 55 Assista Agora'Cult' discreto da década em que eu nasci, que explora ao máximo o 'sex appeal' do jovem Dennis Quaid, mostrado seminu em diversas oportunidades. Os efeitos visuais são interessantes e a narrativa tem um ótimo ponto de partida, mas, quanto o enredo mergulha de vez no suspense político, não me empolgou tanto (ao contrário de minha mãe, ao meu lado, que torcia euforicamente pelo presidente). O elenco é primoroso e a equipe envolvida no filme tornar-se-ia deveras relevante naquele período. Vale a pena ser conhecido, portanto: é um preâmbulo gostoso de uma época! (WPC>)
Um Senhor Estagiário
3.9 1,2K Assista AgoraDesde que este filme foi lançado, minha mãe demonstrou interesse em conferi-lo. Eu detestava tanto a diretora (por causa do ranço referente à comédia ALGUÉM TEM QUE CEDER), que não consegui fazer o básico: ceder. Ontem, no meio de uma crise de borocoxismo, consegui. Fosse noutro contexto, talvez largasse o filme no começo, por causa de suas exacerbações classistas, de seus elogios 'yuppies', em conjuntura cyber-corporativa. Mas segui em frente - e, tal como a protagonista, fui cativado pela bonomia do protagonista, que até ereção ostenta, aos 70 anos de idade! (Quando Rene Russo está em cena, o filme cresce bastante). Em mais de metade da produção, parecia que eu assistia a um testemunho prolongado da crise contemporânea da narrativa hollywoodiana (vide a seqüência do roubo do computador, urgh!), mas, depois que os clichês matrimoniais e familiares surgem, a esperada simpatia do filme é manifesta, começo a me interessar pelo inevitável feliz feliz. E curti, identifiquei-me pelas bordas (sou um trabalhador estressado, também, afinal de contas). É longo e digressivo, mas com um leve charme convencional. O problema é essa obsessão da diretora em imitar/substituir a Nora Ephron. Um dia, ela consegue, quem sabe? (WPC>)
Mamonas Assassinas: O Filme
2.4 221 Assista AgoraOk, enfrentei. Esperava um lixo total, mas, quando a montagem permite o filme consiga ter um plano que dure mais de 5 segundos, a narrativa até que consegue comunicar algo. Poderia ser uma trama regular, uma volta às origens de uma banda que, inequivocamente, causou um temporal midiático no Brasil, a despeito do eventual rechaço à vulgaridade intencionalmente contida nas letras das canções. Conforme o enredo demonstra, inclusive, há muito mais seriedade no processo do que se pensava. O problema é que há uma descompasso atroz na maneira como isso é contato: sempre que se pronunciava a palavra "sonho", dava vontade de vomitar, de tão mal inserida que a pieguice era em meio à baderna. Idem para a forçação de barra em relação à subtrama dos dois irmãos, cortejados pela mesma sacana. Bento é quase um figurante, tadinho: não tinham nada a contar sobre ele? A direção é péssima e as interpretações rendem-se a meros estereótipos. Minha mãe estava na sala comigo, e eu senti vergonha por ela. Não agüentou muito, entretanto. Mas eu até que estava deixando o embalo passar, o filme é que não permitia que isso acontecesse: aquela montagem é simplesmente criminosa! (WPC>)
Zona de Interesse
3.6 603 Assista AgoraFazia muito, muito tempo que eu não ficava tão desesperado para ver um filme. Antes da sessão, um amigo comentou que o sobejo de expectativas poderia desencadear alguma frustração em relação à obra. Em dez minutos de filme, sumamente deslumbrado, pensei que isso não fosse ocorrer. Mas ocorreu, em determinado momento: quando surgem as situações "correspondentes" à fábula de João e Maria, que adiciona um novo dispositivo, em relação a outro já em curso. Ao invés de ambos se combinarem, ocorreu uma espécie de competição estética, prejudicial para a apreciação destes segmentos em negativo/câmera noturna. O que talvez se manifestou nas aparições das telas monocromáticas - que adorei! -, no sentido de que um terceiro dispositivo é adicionado, confirmando a intenção do diretor em ser notado por sua genialidade, por seu experimentalismo, por sua criatividade... Nem precisava tanto: já bastava a magnificência do contraste entre as imagens resplandecentes e as atrocidades sonoras. Tecnicamente, que filme! Discursivamente, idem. Não é uma obra-prima, como eu esperava e tinha quase certeza de que seria, mas é espantosamente assertivo e intimidados. Apavorante, até: a personagem da Sandra Hüller é o suprassumo da maldade, quase deformando a si mesma, em sua ambição incontida. Como os meus companheiros de sessão, fiquei mui atordoado naquele 'flash-forward' histórico do desfecho, em que o inverso do que é denunciado vem à tona: e se a espectacularização do "ser vítima" for também um problema, em âmbito malevolente. As notícias de agora estão aí para demonstrar que a equiparação, infelizmente, não é vã, nem precipitada, nem desprovida de sentido. Adorei a montagem seca, quase como se fosse um jogo eletrônico. Christian Friedlel está imponente e aterrador, numa interpretação que faz com que ela cresça bastante em tela. Li o livro, e amei, mas a adaptação cinematográfica aproveita muito pouco do entrecho original: apenas o contexto geográfico/(i)moral, em verdade. Mas o faz com excelência, exceto pelos excessos supramencionados. Mica Levi ganha mais e mais meu coração a cada trabalho. Magnífico. Imperfeito, mas magnífico: fiquei com aquele zumbido, aquela algaravia, por muito tempo, zunindo em meus ouvidos, após a sessão. E já quero (e preciso) rever este filme, por vezes sutil, por vezes escancarado! (WPC>)
Amanhã
2.8 2Ainda que o projeto não seja de todo inédito (pensamos na cinessérie "Up" ou em ANNA DOS6 AOS 18, para ficar em títulos imediatos), o diretor foi assertivo na união de crianças provenientes de classes sociais radicalmente distintas. Quando há o reencontro com os personagens reais, ficamos curiosos quanto às confirmações do que era possibilidade a partir do título, mas isso torna-se, gradualmente, uma constatação dos piores determinismos, sobretudo porque, numa atitude ousada (e contrária às suas realizadores anteriores), o diretor narra os eventos, adéqua o que é filmado às suas teses já confirmadas. Por uma lado, isso é válido, em âmbito político-sociológico, mas diminui o charme do documentário, no que tange à naturalidade dos eventos, afinal confirmada pela inteligência espontânea de Júlia e pelo carisma apaixonante de Cristian. Há algo de desagradavelmente paternalista, a partir de determinado momento, mas o projeto é bem realizado, ainda que o diretor relute em aceitar os caminhos inventivos que os percalços da realidade pareciam obrigá-lo: ele insiste em levar a cabo o que planejara e, a despeito de uma recusa "esperada", consegue fazê-lo. Funciona enquanto registro de um Brasil em confronto, após a ascensão do bolsonarismo. Mas sem aderir ao fatalismo: a união entre os dois irmãos é cativantes, mesmo quando eles se separam, eventualmente... (WPC>)
100 Anos da Warner Bros.
3.7 9 Assista AgoraÉ interessante como, apesar das quatro horas de duração, percebemos muito mais as ausências que as presenças: é um filme que passa muito rapidamente por períodos e títulos, encontrando um bom rumo descritivo na metade final, quando insere não apenas filmes, mas também jogos, séries e programas de TV. Assisti aos quatro capítulos em dias distintos, para respeitar a divisão dos episódios: o primeiro é o mais problemático, em termos de celeridade do registro, de condensação exagerada dos eventos; o segundo promete mais do que cumpre, mas é bacana em sua exposição de projetos autorais relacionados aos estúdios, sendo que a biografia dos fundadores não recai na exposição "chapa-branca", seus erros e pecadilhos são comentados pelo narrador Morgan Freeman; o terceiro episódio talvez seja o meu favorito, no que tange à consciência de que "os tempos mudaram" e de que uma nova configuração corporativa é exigida para a sobrevivência da empresa; e o quarto é uma continuação direta dessa percepção, de modo que ficamos querendo saber mais, ver mais, assistir a tudo o que é mencionado (acerca de algumas séries, por exemplo, apesar da menção elogiosa enquanto sucesso, eu sequer ouvira falar!). É menos um documentário cinéfilo que uma homenagem conscienciosa a uma grande empresa de produção audiovisual. Serve, mas acho que eu queria mais... (WPC>)
Nada Será como Antes - A Música do Clube da …
3.4 6Ao contrário de quase todos os meus amigos, não gosto muito de VOU RIFAR MEU CORAÇÃO, obra mais famosa da diretora. Tal como aconteceu lá, eu temi que aqui, a sua abordagem fosse rasa, disfarçada de olhar sentimental/afetivo sobre a história. De fato, ocorreu. E isso dá origem a momentos muito interessantes, de comunhão mnemônica entre os músicos. Porém, eles não chegam a se reencontrar efetivamente (não a propósito do documentário, pelo menos) e a linguagem é menos a de um documentário que a de um extra de DVD, de um 'making-of' tardio. Não há qualquer comentário sobre a célebre capa do disco e o processo de gravação é comentado 'en passant', como se fosse a coisa mais habitual do mundo! Foi ótimo ouvir compositores tão inspirados e saber um pouco mais sobre a intimidade dos responsáveis por um dos melhores discos da música brasileira, mas é um filme que não aborda com profundidade a sua temática, e que, por conta disso, é destinado sobretudo a quem já conhece (muito) o disco. Pessoalmente, acho que um pouco de enciclopedismo faria bem a este projeto. Não era o que a diretora queria, entretanto. Direito dela: encontrará o seu público. Não funcionou comigo, infelizmente! (WPC>)
O Menino e a Garça
4.0 218Não tem como não ficar encantado pelos filmes deste grande mestre: por mais que, às vezes, parece que ele se deixou influenciar pelo saudoso Satoshi Kon (na perspectiva onírica), a lógica miyazakiana é facilmente reconhecível: aqui, ao invés das típicas meninas de doze anos, temos um menino. Nos diálogos, a maldade é explicitamente citada, mais de uma vez. E a pletora de animais e situações sobrenaturais/mágicas parece relacionada, de maneira direta, a um delírio convalescente do protagonista, que se recupera de uma ferida auto-infligida na cabeça. Há diferenças mui perceptíveis em relação aos filmes anteriores, portanto. Mas o charme habitual explode em imagens belíssimas, na trilha musical inebriante de Joe Hisaishi e num roteiro que se desenvolve de maneira tão lenta quanto fascinante, em que somos surpreendidos por novas informações e contextos a cada dez minutos. Como não amar, portanto? Não está entre os meus favoritos do diretor, mas ele acostumou-nos a escalas tão altas, que revela-se um filme extraordinário, portanto! (WPC>)
Uma História de Ervas Flutuantes
4.0 4Já assisti à regravação mais de uma vez, porém o charme da descoberta desta versão original é impactante: as interpretações são ótimas e mui expressivas, bem como o uso indicial dos objetos. Aquela bicicleta, por exemplo, é um personagem tão presente quanto o próprio Shinkichi! Em sentido formal, Ozu antecipa procedimentos antonionianos, aqui, mas em viés oposto, já que ele acredita e fomenta a comunicabilidade entre os personagens. Ainda que só tenhamos acesso a este filmaço em versão completamente silenciosa, sem acompanhamento musical, a trama é tão bem contada e tão direta que logo estamos apaixonados por todos os envolvidos, torcendo para eles estejam bem, em seu percurso similar às ervas do título: a fotografia e os enquadramentos são sublimes! (WPC>)
Vida Nova... Por Acaso
3.6 1Não sei se, em comunhão com o outro episódio do longa-metragem, o filme faz mais sentido em sua denúncia cínica. Admiro a relevância histórica do filme, mas o discurso é problemático, em sua lógica da inveja de classe: é como se, ao final, o ranço do personagem só fizesse sentido porque ele foi pego, não porque discorda dos "granjestes". Gostei dos flertes com a ficção científica - a ponto de alguns cinéfilos notarem antecipações temáticas em relação a CORRA! - mas a coadjuvação do personagem Magrão cria outra emenda discursiva que merece debate: comigo, infelizmente, não funcionou. A Dialética da Malandragem, aqui, está pouco dialética (ao menos, num primeiro contato)! :( - WPC>
Até o Cair da Noite
2.9 2 Assista AgoraApesar de a publicidade do filme destacar a filiação do diretor à Escola de Berlim e de o material de divulgação alegar que há algo de fassbinderiano na trama, as referências que pude identificar na trama são MÁQUINA MORTÍFERA e O PAGAMENTO FINAL, com as devidas oposições estilísticas, claro. Trata-se de um filme que adere à narrativa policialesca clássica - um tanto 'noir', conforme notaram alguns exegetas - , mas com largas aberturas às reflexões sobre os preconceitos e desconfianças enfrentados pelas pessoas transexuais. Neste sentido, a personificação de Thea Eher é mui elogiável e aplaudível, mas há algo de incomodamente afetado na interpretação de Timocin Ziegler, o que tem a ver com as dúvidas de seu personagem. A narrativa é afobada, na maneira como os personagens se conhecem e se aproximam, e o desfecho é antecipado dialogisticamente, em mais de um instante. O que tem menos a ver com previsibilidade que com tragicidade, com um determinismo associado ás convenções do gênero - e/ou de gênero, já que as rusgas entre homens e mulheres são reiteradas através das insatisfações dos dois casais observados pelo roteiro. Gosto do uso das baladas cancionais e da condução entretenedora, de modo que nem sentimos a duração um tanto prolongada. Não inova muito, mas é uma atualização tipicamente alemã de tramas reconhecidamente hollywoodianas. Curti! (WPC>)