Boas intenções nem sempre se traduzem em bons filmes. Produção que se sustenta apenas pela denúncia de uma tradição imbuída de violência e pela sua narrativa linear, folhetinesca. Não há qualquer maior esforço artístico que seja. Não há maior preocupação com mise-en-scène ou com um discurso que dialogue com outras camadas. Há muitos momentos de câmera na mão, produzindo imagens trêmulas. Tal recurso, por mais que remeta a uma expressão de filme documental, acentuando o aspecto de denúncia, é um atalho fácil e batido que acrescenta pouco ao filme. Ainda que seja um curta-metragem, pareceu-me ter me consumido muito mais do meu tempo.
É quase uma subversão do gênero de "filme de assalto". Isto por que , diferente de outros filmes do tipo onde o foco é na tensão da construção e aplicação do plano criminoso, Claude Sautet prioriza detalhes, insinuações, situações aparentemente triviais que constroem todo um quadro de seus personagens com suas (aparentes) convicções e dúvidas. O foco aqui é a tribulação interna dessas figuras tão estereotipadas em outros filmes do gênero. Logo de início há uma sugestão que algo não saiu como esperado, mas não é tão óbvio o que seja. Com relação a cenas aparentemente triviais, duas se destacam: Max a olhar uma cartela de fósforos com o telefone de seu ex-colega, abatido por um repentino arrependimento sobre o destino de um conhecido que agora está em suas mãos, e a cena de um acidente de trânsito, meio que alertando o espectador sobre imprevistos que ocorrem à revelia de qualquer planejamento.
Fiquei interessado em saber o nome do documentário mencionado no filme (se é que existia mesmo) e suspeitei que tinha a participação do diretor/ator Werner Herzog pela imitação perfeita que o Jake (Colin Farrell) faz dele. O título é "All in This Tea" [https://filmow.com/all-in-this-tea-t68837/]. Aparentemente o Yang nunca chegou a assisti-lo.
Moralmente bem problemático para o público moderno pelo seu alto grau de misoginia. Em contrapartida, há um elo entre os dois amigos que parece suscitar uma homoafetividade.
É interessante que um dos maiores símbolos da beleza é a Vênus de Milo, reconhecida por todos na sua forma depredada, desmembrada. O filme é como um estudo neste sentido de idealização da beleza que dialoga com o decadente - sexo e morte, Eros e Tânatos. Em uma entrevista o autor e diretor Alain Robbe-Grillet identifica Istambul como a principal personagem do filme, a imortal que dá o título. Antigamente conhecida como Constantinopla, antes já fora Bizâncio. Única cidade localizada em dois continentes. A mulher (L) é meio que a personificação dessa cidade que abarca encanto e ruína. Também tem muitos nomes, vive rodeada de segredos e mistérios, e transita em dois polos, o real e o imaginário.
O pesar e rancor pela morte de Sharon Tate estão devassados nesta produção graficamente violenta, a primeira depois da tragédia em Beverly Hills. Nada mais explícito neste sentido que a cena na qual MacDuff recebe a notícia que sua esposa e filhos haviam sido assassinados em sua ausência. Para quem assistiu na época deve ter sido impossível não correlacionar a representação da realidade ainda fresca na memória. Obra fiel ao texto shakesperiano, mas algumas cenas que deveriam ser impactantes me pareceram vazias dramaticamente, ou ainda pior, beira a comicidade, tal qual a cena da luta final. Trilha sonora é da excelente banda de folk progressivo Third Ear Band.
Que preciosidade. Por que não vi este filme antes? Naruse já me era um diretor com quem tinha familiaridade, mas por alguma razão sempre posterguei de ver esta pequena obra prima (pequena pela duração). Um drama com verniz de comédia magistralmente equilibrado, e que exercício excepcional de economia narrativa.
Explosão visual inicial impressiona, mas rapidamente se torna repetitiva e cansativa. O filme procura tocar em temas delicados como luto, abuso infantil, e a necessidade de empatia e ação frente a essas questões. Mas o roteiro é tão raso e mal escrito. A resolução final revela uma visão simplista do problema - a cena do resgate é vergonhosa de tão risível. A referência a 'A Bela e a Fera' não é lá muito elaborada, e as canções são qualquer nota. Surpreendentemente o filme sequer questiona seriamente as questões éticas e sociais do mundo virtual, tendo uma visão muito complacente sobre o tema. De longe o pior filme do Hosoda.
2015? É o mesmo filme apresentado no Festival do Rio e na Mostra Tiradentes? Acho que foi iniciado em 2015, mas finalizado ano passado.
Achei o filme muito quadrado em seu didatismo e formalismo. Não diz nada além do que já se sabia, não perpassa o óbvio. Vale por alguns pequenos trechos quando seus personagens (Fred, Karina Buhr, Lucio Maia, Otto, entre outros) fazem um retrospecto daquele momento. Para quem viveu a época e o lugar, como eu, pode trazer muita nostalgia, felicidade e melancolia também. Isso, no entanto, é fruto mais da minha própria experiência que mérito do filme.
A princípio estava incomodado pelas atuações e situações um tanto amadoras ou afetadas, mas o filme cresce demais depois do preâmbulo em um mosaico de imagens e impressões das memórias montadas em sentido não cronológico, mas que parecem fazer sentido desse modo, tais como as nossas próprias memórias e fluxos de pensamento não seguem necessariamente uma ordem neste sentido.
Lembra um pouco O Som ao Redor do KMF, no sentido dos limites dados pela sociedade à ocupação de espaços (não apenas físicos). Alguns ainda conseguem negociar essa ocupação de espaço, como o pescador que invade constantemente a casa de veraneio, mas a maioria encontra resistências, tais como as crianças de baixa renda no clube, ou o menino que ultrapassa os limites da área do pedalinho. O buraco no quintal à espera da piscina é a personificação das ausências e frustrações, mas também a piscina é parte da quase ocupação dessa ausência, o repositório dos desejos de felicidade que só pode ser completada com a água, o elemento primordial da gestação da vida (o peixe, a criança que ainda irá nascer). Lindo filme.
Documentário que permeia vários aspectos do olhar como parâmetro de perspectivas e controle de narrativas. O tema central é que o olhar de uma câmera pode dizer mais sobre o que está fora do frame do que sobre o que está dentro dele. A respeito disso há o uso de uma recorrente corte de um grupo de pessoas a observar um eclipse, que por natureza é um fenômeno no qual o sol, a fonte primária da luz necessária a criação de imagens, é encoberto pela estrutura lunar.
CONTÉM SPOILERS A trama é previsível, mas não vejo problema nenhum nisso. O suspense aqui é quase puro estilo. Acho mais importante dar atenção ao subtexto que dialoga ancestralidade com posteridade, a relação entre a história pessoal com a coletiva e as escolhas que fazemos quando temos a exclusividade da informação. Sobre isso, em certo momento da trama, ciente que tem informações que podem mudar radicalmente sua relação com seus pares, Janis (Penélope Cruz) titubeia em relação ao que fazer com esse poder. Sabemos desde o início que sua luta e objetivo nunca foi ser mãe, mas sim libertar seu vilarejo de um véu de desconhecimento em relação aos corpos de seus familiares mortos durante a Guerra Civil Espanhola. Paradoxalmente, na esfera pessoal, já afeiçoada a menina, acaba inicialmente agindo como o governo ditatorial franquista agiu em relação aos seus crimes: omitindo a informação como se a vida pudesse seguir com a dor daqueles que ficaram. Os parentes das vítimas podem até não terem consciência desses crimes, como Ana (Milena Smit), simbolicamente a representar uma juventude ignorante, ainda que não por culpa sua, desconhecia o paradeiro da filha ou como muitos desconheciam a tragédia dos internatos indígenas no Canadá, que acabou eclodindo em revolta diante das revelações de abusos e mortes de crianças pelo governo e igreja católica, para contextualizar com fatos recentes.
Jacques Renoir, a partir de uma história original de Jean Castanier adaptado por Jacques Prévert, coloca o espectador em cheque com questões políticas e morais bem controversas, magistralmente acalentadas por uma montagem ágil e tom humorístico. Jules Berry, como o patrão canalha, está fenomenal, assim como Florelle como no papel de Valentine, uma mulher forte e independente, algo bem raro de se ver na época.
Para entender os motivos desse filme é necessário se conectar com a trajetória de expatriação do artista chileno, ele próprio filho de marinheiro, mas não necessariamente obrigatório para se conectar com o sentimento de não-pertencimento, elemento comum da mitologia marítima. Cinematografia fascinante, com uso de muito deep focus e outros recursos, que contribui em muito à construção desta obra alegórica, polissêmica e surrealista.
Definitivamente não dá para tentar replicar a estética e linguagem do anime/manga em live-action. Não sem alterar a dinâmica e narrativa na adaptação. Além disso, fazer uma obra diferente do material original pode irritar os fãs que não entendem essa dinâmica diferente entre as mídias. Problemático. A adaptação falha em tentar reproduzir o que o anime tem de melhor, a união de seres com passados traumáticos tentando tocar a vida pra frente onde o passado dita seus atos, mas não fazem do vocabulário para uma conexão. Tenta compensar isso com a repetição de signos e elementos do material original, incluído aqui a famosa abertura ao som da música de Yoko Kanno, mas não é o suficiente para convencer em seus 10 episódios.
A diretora, Firouzeh Khosrovani, acerta ao fazer um paralelo da trajetória do país com a história da família, produzindo um retrato da cisão em nível amplo e estrito. Geralmente não gosto de documentários com encenações/reconstituições, mas esse faz todo sentido que seja assim, mesmo que talvez não corresponda fielmente ao que aconteceu de fato. Afinal, trata-se de recuperação de memórias, e estas pode ser voláteis ou ilusórias. Mas fazer esse exercício, no caso a partir de fotos de família, leva a entender ou pelo menos exorcizar esse passado. Gostei como os capítulos, se assim podermos classificar, pautam o filme com figurações espaciais da residência do casal, modificando-se de acordo com as mudanças na sua relação. Algo simples, nada revolucionário, mas efetivo e elegante.
Mais um bom filme surgido do "Cinema Paralelo" indiano. Satyajit Ray preza pela economia de planos e falas, focando no essencial para o discurso. Já no início, por exemplo, nos é mostrado as duas forças que pautarão o conflito: o patriarca Kalikinkar Roy (Chhabi Biswas) em uma cerimônia religiosa ao som de música tradicional indiana, contraposto pelo filho Umaprasad (Soumitra Chatterjee) a assistir uma queima de fogos ao som de uma música ocidental ("Colonel Bogey March") - uma anacronia, já que a música em questão foi composta alguns anos após a época na qual se passa o filme (séc. XIX). A personagem principal, no entanto, é Doyamoyee (Sharmila Tagore), que pouco fala depois de sua "transformação" na reencarnação da deusa Kali. Sua interpretação nesta segunda metade, denotando tanto dúvida quanto medo, é magnificamente executada por micro expressões, como na cena de seu reencontro inesperado com o marido Umaprasad. A própria Sharmila Tagore considera este seu melhor trabalho com o diretor.
Inspirado em um conto de Prabhat Kumar Mukhopadhyay, o filme trata tanto do choque entre valores religiosos ortodoxos com o racionalismo científico, o tradicional frente ao moderno, ou o oriental frente ao ocidental, como também da figura feminina neste processo, quase sempre vista como símbolo ou objeto (paralelo aqui com a figura de argila da deusa que abre e fecha o filme) que como uma partícipe da construção de um diálogo. Isto é, da deusa Kali todos pedem e suplicam, mas ninguém, fora o marido e a cunhada - esta, no entanto, por interesses próprios - pedem a opinião da adolescente que supostamente incorpora a figura divina. Doya aparece na cena final com um olhar perturbado, o kohl a escorrer de seus olhos, manchando a face, e o desejo concreto de desaparecer do fanatismo dos velhos, mas também de não esperar pela boa vontade de figuras masculinas, supostamente iluminadas pelo conhecimento moderno ocidental. Satyajit parece dizer que a mulher deve construir seu próprio caminho, ainda que o destino final dessa jornada possa ser incerto. Diferente de outras obras do mesmo diretor relativas ao mesmo tema, Devi nos deixa com um gosto um tanto amargo ao final por essa incerteza.
No Ritmo do Coração
4.1 754 Assista AgoraAntes do surto do Will, teve o surto dos jurados neste Oscar.
Ala Kachuu - Take and Run
3.9 31 Assista AgoraBoas intenções nem sempre se traduzem em bons filmes. Produção que se sustenta apenas pela denúncia de uma tradição imbuída de violência e pela sua narrativa linear, folhetinesca. Não há qualquer maior esforço artístico que seja. Não há maior preocupação com mise-en-scène ou com um discurso que dialogue com outras camadas. Há muitos momentos de câmera na mão, produzindo imagens trêmulas. Tal recurso, por mais que remeta a uma expressão de filme documental, acentuando o aspecto de denúncia, é um atalho fácil e batido que acrescenta pouco ao filme. Ainda que seja um curta-metragem, pareceu-me ter me consumido muito mais do meu tempo.
Sublime Renúncia
3.8 3É quase uma subversão do gênero de "filme de assalto". Isto por que , diferente de outros filmes do tipo onde o foco é na tensão da construção e aplicação do plano criminoso, Claude Sautet prioriza detalhes, insinuações, situações aparentemente triviais que constroem todo um quadro de seus personagens com suas (aparentes) convicções e dúvidas. O foco aqui é a tribulação interna dessas figuras tão estereotipadas em outros filmes do gênero. Logo de início há uma sugestão que algo não saiu como esperado, mas não é tão óbvio o que seja. Com relação a cenas aparentemente triviais, duas se destacam: Max a olhar uma cartela de fósforos com o telefone de seu ex-colega, abatido por um repentino arrependimento sobre o destino de um conhecido que agora está em suas mãos, e a cena de um acidente de trânsito, meio que alertando o espectador sobre imprevistos que ocorrem à revelia de qualquer planejamento.
A Vida Depois de Yang
3.6 54Fiquei interessado em saber o nome do documentário mencionado no filme (se é que existia mesmo) e suspeitei que tinha a participação do diretor/ator Werner Herzog pela imitação perfeita que o Jake (Colin Farrell) faz dele. O título é "All in This Tea" [https://filmow.com/all-in-this-tea-t68837/].
Aparentemente o Yang nunca chegou a assisti-lo.
Gula de Amor
3.1 1Moralmente bem problemático para o público moderno pelo seu alto grau de misoginia. Em contrapartida, há um elo entre os dois amigos que parece suscitar uma homoafetividade.
L’Immortelle
3.7 4É interessante que um dos maiores símbolos da beleza é a Vênus de Milo, reconhecida por todos na sua forma depredada, desmembrada. O filme é como um estudo neste sentido de idealização da beleza que dialoga com o decadente - sexo e morte, Eros e Tânatos. Em uma entrevista o autor e diretor Alain Robbe-Grillet identifica Istambul como a principal personagem do filme, a imortal que dá o título. Antigamente conhecida como Constantinopla, antes já fora Bizâncio. Única cidade localizada em dois continentes. A mulher (L) é meio que a personificação dessa cidade que abarca encanto e ruína. Também tem muitos nomes, vive rodeada de segredos e mistérios, e transita em dois polos, o real e o imaginário.
Commodity City
3.0 1Filme completo no link do trailer.
Macbeth
3.9 51O pesar e rancor pela morte de Sharon Tate estão devassados nesta produção graficamente violenta, a primeira depois da tragédia em Beverly Hills. Nada mais explícito neste sentido que a cena na qual MacDuff recebe a notícia que sua esposa e filhos haviam sido assassinados em sua ausência. Para quem assistiu na época deve ter sido impossível não correlacionar a representação da realidade ainda fresca na memória. Obra fiel ao texto shakesperiano, mas algumas cenas que deveriam ser impactantes me pareceram vazias dramaticamente, ou ainda pior, beira a comicidade, tal qual a cena da luta final. Trilha sonora é da excelente banda de folk progressivo Third Ear Band.
Wife! Be Like a Rose!
4.2 1Que preciosidade. Por que não vi este filme antes? Naruse já me era um diretor com quem tinha familiaridade, mas por alguma razão sempre posterguei de ver esta pequena obra prima (pequena pela duração). Um drama com verniz de comédia magistralmente equilibrado, e que exercício excepcional de economia narrativa.
Castelo de Areia
3.9 4Gostei mais da construção que da sua conclusão, que se estende demais e pesa um tom mais melodramático. Mas no geral é bom filme.
Belle
3.6 56Explosão visual inicial impressiona, mas rapidamente se torna repetitiva e cansativa. O filme procura tocar em temas delicados como luto, abuso infantil, e a necessidade de empatia e ação frente a essas questões. Mas o roteiro é tão raso e mal escrito. A resolução final revela uma visão simplista do problema - a cena do resgate é vergonhosa de tão risível. A referência a 'A Bela e a Fera' não é lá muito elaborada, e as canções são qualquer nota. Surpreendentemente o filme sequer questiona seriamente as questões éticas e sociais do mundo virtual, tendo uma visão muito complacente sobre o tema. De longe o pior filme do Hosoda.
Mangue Bit
2.5 12015? É o mesmo filme apresentado no Festival do Rio e na Mostra Tiradentes? Acho que foi iniciado em 2015, mas finalizado ano passado.
Achei o filme muito quadrado em seu didatismo e formalismo. Não diz nada além do que já se sabia, não perpassa o óbvio. Vale por alguns pequenos trechos quando seus personagens (Fred, Karina Buhr, Lucio Maia, Otto, entre outros) fazem um retrospecto daquele momento. Para quem viveu a época e o lugar, como eu, pode trazer muita nostalgia, felicidade e melancolia também. Isso, no entanto, é fruto mais da minha própria experiência que mérito do filme.
That Day, on the Beach
4.2 9A princípio estava incomodado pelas atuações e situações um tanto amadoras ou afetadas, mas o filme cresce demais depois do preâmbulo em um mosaico de imagens e impressões das memórias montadas em sentido não cronológico, mas que parecem fazer sentido desse modo, tais como as nossas próprias memórias e fluxos de pensamento não seguem necessariamente uma ordem neste sentido.
A Felicidade das Coisas
3.4 20 Assista AgoraLembra um pouco O Som ao Redor do KMF, no sentido dos limites dados pela sociedade à ocupação de espaços (não apenas físicos). Alguns ainda conseguem negociar essa ocupação de espaço, como o pescador que invade constantemente a casa de veraneio, mas a maioria encontra resistências, tais como as crianças de baixa renda no clube, ou o menino que ultrapassa os limites da área do pedalinho. O buraco no quintal à espera da piscina é a personificação das ausências e frustrações, mas também a piscina é parte da quase ocupação dessa ausência, o repositório dos desejos de felicidade que só pode ser completada com a água, o elemento primordial da gestação da vida (o peixe, a criança que ainda irá nascer). Lindo filme.
Redimida
3.9 5Existe alguma cópia boa deste filme? As que vi até agora estão em péssima qualidade.
Toda Luz em Todo Lugar
3.9 1Documentário que permeia vários aspectos do olhar como parâmetro de perspectivas e controle de narrativas. O tema central é que o olhar de uma câmera pode dizer mais sobre o que está fora do frame do que sobre o que está dentro dele. A respeito disso há o uso de uma recorrente corte de um grupo de pessoas a observar um eclipse, que por natureza é um fenômeno no qual o sol, a fonte primária da luz necessária a criação de imagens, é encoberto pela estrutura lunar.
Mães Paralelas
3.7 411CONTÉM SPOILERS
A trama é previsível, mas não vejo problema nenhum nisso. O suspense aqui é quase puro estilo. Acho mais importante dar atenção ao subtexto que dialoga ancestralidade com posteridade, a relação entre a história pessoal com a coletiva e as escolhas que fazemos quando temos a exclusividade da informação. Sobre isso, em certo momento da trama, ciente que tem informações que podem mudar radicalmente sua relação com seus pares, Janis (Penélope Cruz) titubeia em relação ao que fazer com esse poder. Sabemos desde o início que sua luta e objetivo nunca foi ser mãe, mas sim libertar seu vilarejo de um véu de desconhecimento em relação aos corpos de seus familiares mortos durante a Guerra Civil Espanhola. Paradoxalmente, na esfera pessoal, já afeiçoada a menina, acaba inicialmente agindo como o governo ditatorial franquista agiu em relação aos seus crimes: omitindo a informação como se a vida pudesse seguir com a dor daqueles que ficaram. Os parentes das vítimas podem até não terem consciência desses crimes, como Ana (Milena Smit), simbolicamente a representar uma juventude ignorante, ainda que não por culpa sua, desconhecia o paradeiro da filha ou como muitos desconheciam a tragédia dos internatos indígenas no Canadá, que acabou eclodindo em revolta diante das revelações de abusos e mortes de crianças pelo governo e igreja católica, para contextualizar com fatos recentes.
O Crime do Sr. Lange
3.6 8Jacques Renoir, a partir de uma história original de Jean Castanier adaptado por Jacques Prévert, coloca o espectador em cheque com questões políticas e morais bem controversas, magistralmente acalentadas por uma montagem ágil e tom humorístico. Jules Berry, como o patrão canalha, está fenomenal, assim como Florelle como no papel de Valentine, uma mulher forte e independente, algo bem raro de se ver na época.
Medusa
3.4 52 Assista AgoraMelhor longa ficção no Festival do Rio
As Três Coroas do Marinheiro
3.9 7Para entender os motivos desse filme é necessário se conectar com a trajetória de expatriação do artista chileno, ele próprio filho de marinheiro, mas não necessariamente obrigatório para se conectar com o sentimento de não-pertencimento, elemento comum da mitologia marítima. Cinematografia fascinante, com uso de muito deep focus e outros recursos, que contribui em muito à construção desta obra alegórica, polissêmica e surrealista.
Cowboy Bebop (1ª Temporada)
3.2 111Definitivamente não dá para tentar replicar a estética e linguagem do anime/manga em live-action. Não sem alterar a dinâmica e narrativa na adaptação. Além disso, fazer uma obra diferente do material original pode irritar os fãs que não entendem essa dinâmica diferente entre as mídias. Problemático. A adaptação falha em tentar reproduzir o que o anime tem de melhor, a união de seres com passados traumáticos tentando tocar a vida pra frente onde o passado dita seus atos, mas não fazem do vocabulário para uma conexão. Tenta compensar isso com a repetição de signos e elementos do material original, incluído aqui a famosa abertura ao som da música de Yoko Kanno, mas não é o suficiente para convencer em seus 10 episódios.
Radiografia de uma Família
3.3 2A diretora, Firouzeh Khosrovani, acerta ao fazer um paralelo da trajetória do país com a história da família, produzindo um retrato da cisão em nível amplo e estrito. Geralmente não gosto de documentários com encenações/reconstituições, mas esse faz todo sentido que seja assim, mesmo que talvez não corresponda fielmente ao que aconteceu de fato. Afinal, trata-se de recuperação de memórias, e estas pode ser voláteis ou ilusórias. Mas fazer esse exercício, no caso a partir de fotos de família, leva a entender ou pelo menos exorcizar esse passado. Gostei como os capítulos, se assim podermos classificar, pautam o filme com figurações espaciais da residência do casal, modificando-se de acordo com as mudanças na sua relação. Algo simples, nada revolucionário, mas efetivo e elegante.
Twin Peaks (3ª Temporada)
4.4 622 Assista AgoraTudo que Dark queria ser, mas não conseguiu.
A Deusa
4.0 6Mais um bom filme surgido do "Cinema Paralelo" indiano. Satyajit Ray preza pela economia de planos e falas, focando no essencial para o discurso. Já no início, por exemplo, nos é mostrado as duas forças que pautarão o conflito: o patriarca Kalikinkar Roy (Chhabi Biswas) em uma cerimônia religiosa ao som de música tradicional indiana, contraposto pelo filho Umaprasad (Soumitra Chatterjee) a assistir uma queima de fogos ao som de uma música ocidental ("Colonel Bogey March") - uma anacronia, já que a música em questão foi composta alguns anos após a época na qual se passa o filme (séc. XIX). A personagem principal, no entanto, é Doyamoyee (Sharmila Tagore), que pouco fala depois de sua "transformação" na reencarnação da deusa Kali. Sua interpretação nesta segunda metade, denotando tanto dúvida quanto medo, é magnificamente executada por micro expressões, como na cena de seu reencontro inesperado com o marido Umaprasad. A própria Sharmila Tagore considera este seu melhor trabalho com o diretor.
Inspirado em um conto de Prabhat Kumar Mukhopadhyay, o filme trata tanto do choque entre valores religiosos ortodoxos com o racionalismo científico, o tradicional frente ao moderno, ou o oriental frente ao ocidental, como também da figura feminina neste processo, quase sempre vista como símbolo ou objeto (paralelo aqui com a figura de argila da deusa que abre e fecha o filme) que como uma partícipe da construção de um diálogo. Isto é, da deusa Kali todos pedem e suplicam, mas ninguém, fora o marido e a cunhada - esta, no entanto, por interesses próprios - pedem a opinião da adolescente que supostamente incorpora a figura divina. Doya aparece na cena final com um olhar perturbado, o kohl a escorrer de seus olhos, manchando a face, e o desejo concreto de desaparecer do fanatismo dos velhos, mas também de não esperar pela boa vontade de figuras masculinas, supostamente iluminadas pelo conhecimento moderno ocidental. Satyajit parece dizer que a mulher deve construir seu próprio caminho, ainda que o destino final dessa jornada possa ser incerto. Diferente de outras obras do mesmo diretor relativas ao mesmo tema, Devi nos deixa com um gosto um tanto amargo ao final por essa incerteza.
Visto na versão restaurada em alta definição.