Esse filme foi uma ótima surpresa considerando que, em seus 20 minutos iniciais, ficava somente pensando "O filme vai ser só isso? Eles andando e conhecendo lugares? Como vão encher 90 minutos com isso?" sendo que, logo em seguida, você percebe como essa longa parte inicial é essencial para você compreender a relação dos dois e sentir o mesmo sentimento de desespero, tristeza e abandono durante toda a espera na praia. É justamente por causa desse início que todo o filme ganha um senso de urgência, que mesmo sem falas você consegue perceber cada um dos pensamentos dos personagens e te dá vontade de querer ajudar. É lindo ver todo o controle que a produção tem em contar essa história, inserindo nos momentos certos os alívios, os romances, o drama.
Não sei se "Meu amigo robô" seria uma tradução certa ao filme já que em alguns momentos fica meio suspeita a relação deles.
Apesar do desconforto que o filme causa em certos momentos ao reviver fatos cruéis da vida das vítimas diante das próprias, mesmo desconforto expressado pelo ator em certo momento que chega a abandonar a cena, ainda assim o filme mostra a necessidade de tais momentos ao final. Se de início considerei que toda a questão beirava a tortura psicológica, à medida que as irmãs vão contando sua história você percebe que de fato elas superaram os traumas mas eles ainda doem, e por isso que ele parece crueldade porque, se fôssemos nós, jamais iríamos querer reviver uma dor tão forte.
E é com uma sucessão de plot twists, todos muito bem utilizados, que percebemos que tal dor não é nada perto dos últimos acontecimentos de suas vidas.
Confesso que jamais imaginei que as irmãs mais velhas tinham ingressado no ISIS e, em reviravoltas contínuas, ainda mostra que houve o casamento com um líder terrorista, que sua base foi bombardeada, que elas sobreviveram, foram presas, uma teve uma filha, as irmãs mais novas também estavam num fanatismo religioso que se encerrou com o tratamento psicológico em abrigo enquanto as mais velhas foram condenadas.
Não tem como acompanhar toda essa sucessão final sem ficar de boca aberta. Se fosse um filme de ficção ninguém acreditaria.
História cruel em um documentário que, de forma muito inteligente, retira do espectador qualquer ideia de que o pai "não fez mais do que sua obrigação" em lutar judicialmente pela punição aos estupradores da filha, mostrando o retrógrado pensamento do vilarejo, as ameaças, o sistema judicial indiano e as consequências que isso acarretaria para o seu próprio dia a dia. Ele deixa muito claro que a opção mais fácil e que costumeiramente era usada seria seguir a opinião do chefe da vila e, por isso, todo o esforço dispendido não pode ser encarado como "apenas sua obrigação", mas sim um ato de heroismo que tem que ser incentivado.
Tem um dos momentos mais lindos que já vi, ao mostrar a filha, após seu depoimento, sorrindo e com os olhos cheios de lágrimas, sendo visível como aquele momento lhe retirou um grande peso das costas.
Que figura fascinante que é Bobi Wine, tanto que mesmo com o documentário sendo bem lento pelo excesso de acontecimentos em sua primeira uma hora de duração, em que precisa explicar quem ele é, de onde veio, sua chegada na política e o contexto político de Uganda, ainda assim te prende na tela por querermos vê-lo andando por seu país e cantando suas músicas (que são muito boas).
Ainda, esse momento inicial lento sequer é dispensável já que é uma preparação necessária para as consequências da segunda hora, quando o filme toma uma agilidade maior.
Senti falta somente da demonstração de um pensamento mais profundo de Bobi Wine, a provocação para que ele ingressasse em uma discussão política, já que nas poucas vezes em que ele se manifesta tem um discurso bem interessante dos problemas sociais, idealista, mas sem abordar soluções.
Taí um filme que merece mais propaganda porque é um dos mais prazerosos de se acompanhar no Oscar. Tudo nele funciona: a trama que acompanha a mudança de menino a homem; os efeitos especiais; as cenas que, mesmo quando líricas, não são de difícil compreensão; o ritmo excelente; trilha sonora que casa com as cenas e a fotografia magnífica (principalmente na sequência do Sahara). É emocionante e, mesmo falando de da população Senegalesa e seu sonho de ir à Europa, é contada de uma forma que qualquer pessoa consegue se conectar.
Este é um daqueles que você consegue enxergar sendo "redescobertos" no futuro em uma edição Criterion.
Há muito tempo eu não tinha aquela sensação terrível de "Eu não acredito que esse filme vai terminar assim!", e sim, ele termina. É por obras assim que mesmo com o A24 sendo o único estúdio do cinema atual que investe em histórias fora do comum eu não consigo gostar das obras porque para cada obra prima existem outros dez filmes extremamente vazios lançados. E é bem isso o que acontece aqui: é um filme vazio, sem propósito. Mesmo sendo boa a ideia de mostrar o dia a dia de uma família que mora ao lado do campo de concentração, com o uso do som sendo muito interessante para mostrar como as pessoas se acostumam às maiores atrocidades se elas ficam contínuas, bem como o apego aos detalhes como por exemplo o irmão que tranca o outro em uma estufa e começa a fazer o barulho de gás, ainda assim é um filme que diz muito pouco para a suas quase duas horas.
Poderia ter utilizado desses detalhes em um filme mais profundo ou, se não tinha isso, que se transformasse em um curta experimental, mas é triste ver um filme sobre a Segunda Guerra e Campos de Concentração que não te faça sentir nada.
Confesso que, pelas críticas, imaginava que seria pior.
Seu ponto negativo é todo o segmento entre 10 e 30 minutos em que o documentário busca mostrar toda a crueldade do conflito, se utilizando de imagens de ferimentos, crianças mortas, cabeças ensanguentadas, dentre outros. Não que a guerra não seja isso, mas a forma como essas cenas são mostradas acabam adquirindo até mesmo um tom apelativo, baixo, e ao invés de você considerar que eram os Russos que estavam sendo cruéis, seu desprezo se transfere para o documentarista e ficamos falando "Cara, sai daí. Não precisa ficar dentro da sala de cirurgia. Deixa a família em paz". São compreensíveis as cenas já que, por se tratar de correspondente jornalista, buscava denunciar no próprio dia o que vinha acontecendo na Ucrânia a fim de ter uma resposta rápida das autoridades. No entanto, a forma como isso foi demonstrado no documentário acabou dando um tom sádico à história.
Por sorte, talvez por uma mudança de pensamento do diretor ou até pela própria continuidade do conflito, esse estilo se altera após a meia hora inicial, sendo tenso e brutal, sim, mas sem ser tão apelativo, adquirindo o tom certo entre o choque e a denúncia sem exposição excessiva das vítimas. A cena do parto da criança é uma das coisas mais tensas do cinema.
Não gostei tanto quanto esperava em razão de o filme, logo em seu momento inicial, acabar se dispersando um pouco em sua proposta.
Temos uma boa cena inicial em que Paulina diz que usará aquele momento para explicar ao marido quem ele foi, seguido de várias cenas de arquivo. Isso faz com que consideremos que este será o estilo do documentário, como forma de mostrar a alguém com Alzheimer tudo que ele fez de grandioso na vida.
No entanto, logo em seguida, o filme altera e passa a mostrar um tempo considerável da rotina da esposa no teatro, tirando o protagonismo que, até aquele momento, acreditava-se ser do marido e sua doença. Então nós, como espectador, passamos a ver que será mostrada, em realidade, a rotina do casal, o que não é verdade já que com 30 minutos de filme ele retorna a mostrar a vida do marido, mostrando imagens de reportagens que ele fez e perguntando se ele se recorda.
Essa alteração constante de foco na história em seus momentos iniciais, essenciais para que nos apeguemos aos personagens, fazem com que nós espectadores percamos o apego e fiquemos inseguros assistindo, mesmo com tudo se ajeitando após a meia hora inicial e se tornando cativante.
Não sei se é por estar chegando aos 30, mas esse é o exato tipo de filme que, se eu tivesse visto há uns cinco anos atrás, me irritaria profundamente, e agora eu acho maravilhoso.
Da mesma forma que Past Lives, também concorrente ao Oscar este ano, Dias perfeitos é um filme sobre a vida, o dia a dia, e me causou a mesma reação assistindo a ambos: pouco me importava se aconteceria alguma coisa ou não naquela história, eu só queria ver os personagens fazendo suas coisas do dia a dia da maneira mais deliciosa possível.
Chegou a um ponto em que de fato comecei a ver a minha própria vida retratada na tela, o sujeito que só quer saber de fazer seu trabalho, ouvir suas músicas (e até me assustei por serem as mesmas músicas que ouço) e ler seus livros antes de dormir, e qualquer coisa que interfira nessa rotina já é um incômodo.
Tanto que é justamente por esse ponto que ele peca próximo ao final: como o interessante do filme é ver ele seguindo sua rotina com toda a dedicação possível, vivendo o presente, ele se torna cansativo quando começa a colocar muitos elementos que fogem desse padrão nos últimos 20 minutos, como um dia de jornada exaustiva e beber junto com alguém.
Que filme incrível. Ele é tão bom, mas tão bom, que é uma das raras vezes que sequer consigo pensar no que escrever porque de fato ele te deixa sem palavras. Segue aquilo que eu mais gosto na arte em geral que é te provocar, te fazer sentir e entrar em conflito, e o filme todo é esse crescimento de emoções que vai te deixando sufocado porque todos os personagens, sem exceção, até mesmo os mais doces, tem momentos em que estão certos e momentos em que estão errados ao ponto de cometerem crimes, e você fica impassível nesse meio sem saber se quer bater em todo mundo para tomar um jeito ou tratar com delicadeza afinal não merecem sofrer o que sofrem.
Tenho pleno conhecimento de que já fui assistir ao filme com antipatia pelo Jon Batiste por ele ter levado o Grammy da Billie Eilish quando concorria pelo Happier Than Ever (e também sei que a culpa nem é do cara, mas do meu comportamento de fã), mas também sei reconhecer que os motivos de não ter gostado do documentário não tem nada a ver com isso.
Isso porque mesmo sendo um documentário você percebe que diversas situações ali estão sendo forçadas, e os próprios personagens mostram um desconforto em estar diante das câmeras, não aparentando a naturalidade necessária. É como se, por exemplo, diversas ligações e videochamadas fossem feitas unicamente para soltar uma frase de efeito ou para fazer um link com a cena seguinte e eles não querem se propor a isso, mas mesmo assim o fazem.
Os poucos momentos em que o filme mostra uma naturalidade é quando trata de todo os acontecimentos com a esposa, e criamos um apego tão grande com ela que queremos apenas vê-la em tela, pouco importando a sinfonia que era o mote principal para que o filme existisse, tanto que, quando a música realmente surge, o filme até fica cansativo e você tem vontade que ele se encerre logo, não tendo a menor curiosidade para saber como ficou o trabalho.
São coisas assim que me impressionam no cinema pelo seguinte: o filme é um clichezão do “self made man”, com as mesmas características do cara que sai do nada, passa dificuldades, desemprego, família com fome, trabalho massacrante mas sempre com um sorriso no rosto, etc. Você já sabe desde o início onde a história vai levar, quais são os pontos de virada, de expectativa não cumprida, onde o plano vai dar errado e onde vai dar certo e até as frases de efeito.
E mesmo assim chega no final e você se emociona, fica feliz pelo personagem, torce por ele, mesmo repetindo técnicas óbvias, por vezes sendo pedante e obviamente voltado para vender uma imagem de uma produto/empresa. É uma história deliciosa de assistir, ainda que não tenha um orçamento gigantesco e apresse seu filme para contar todo o necessário em cerca de 90 minutos a fim de não cansar seu espectador.
E se mesmo com tudo isso o filme funciona, não tem como dizer que ele é ruim.
Ele tem dois problemas bem sérios: o primeiro, que talvez seja mais grave, é que ele considera que o espectador sabe o suficiente sobre todo o desenrolar da Guerra do Yom Kippur, o que não é verdade. Com isso, em diversos momentos o filme fica confuso, tendo cenas em que os personagens lamentam as mortes, derrotas e emboscadas e, logo na cena seguinte, falam que venceram a guerra "por pouco". Como, se há menos de um minuto e com um corte abrupto todos estavam chorando em sua sala de guerra? De que forma essa vitória veio?
Ainda, assim, o filme é interessante de assistir pelos conflitos dramáticos entre os personagens, mas que poderia ser melhor se não fosse o seu segundo problema: Como ele assume que Golda foi uma figura controversa (termo utilizado pelo próprio filme no segmento final), ele fica receoso em abordá-la tanto como heroína quanto como vilã. E isso não significa que ele assume, por consequência, uma narrativa neutra, mas sim uma narrativa que evita tocar em determinados assuntos ou motivações, o que deixa o filme não somente incompleto mas causando uma distância do espectador à personagem.
É legal ver que, ao contrário dos muitos filmes atuais, ele intercala imagens do período e das pessoas reais com reconstituições por computador, o que dá um realismo maior, e é muito interessante os diversos usos que fazem da fumaça do cigarro, seja como para ilustrar a multidão de pensamentos na cabeça de Golda ou um "anjo da morte" que varre os campos de batalha.
Este foi uma grata surpresa. Mesmo sendo arrastado e por diversas vezes perdendo tempo ao buscar criar cenas de uma beleza poética (e que incomodam justamente por esta não ser a intenção do filme), o roteiro é tão bom que ainda assim é agradável de assistir, sendo uma crítica ferrenha aos ditadores e líderes, utilizando da figura de Pinochet como poderia ter utilizado várias outras (coisa que o próprio filme faz, mas que não cumpre dizer aqui para não dar spoiler), os sanguessugas.
É inevitável não lembrar de What We do In The Shadows, mas aqui com a paródia surgindo de uma maneira mais séria, quase como se buscasse escancarar a insanidade do nosso mundo. Você ri não porque ele deturpa o real, mas sim porque ele está mostrando quão bizarro é o real.
A melhor cena do filme, referente à inquisição feita por Carmen aos personagens enquanto estes riem contando as coisas mais absurdas, é algo de aplaudir de pé.
Eu amo musicais, mas com este aqui eu consegui sentir exatamente a mesma coisa que o público que não gosta do gênero sente. Isso porque as músicas não só não combinam com a história que está sendo contada, que é extremamente pesada principalmente em sua parte inicial, como também nada agregam ao contexto geral. Ao invés delas trazerem aquilo que não pode ser esboçado nos diálogos, repetem informações que o espectador já havia entendido em um gesto, uma fala ou uma carta, como por exemplo a sequência musical das "Calças de Cellie". Sim, são sequências visualmente bonitas mas, com exceção de "Hell No", todas elas te tiram da imersão sobre a história e por diversas vezes tive vontade de acelerar o filme pois já estava visível que elas não estravam trazendo nada de novo ao roteiro.
Afora isso, as atuações são boas, em especial a de Danielle Brooks, sendo merecida a indicação. Visualmente impecável, dando vontade de emoldurar diversos momentos, como por exemplo Shug chegando na canoa, mas de fato não precisava ser um musical.
Ele é propositalmente desconfortável e todos os seus elementos são criados para reforçar esse desconforto no espectador, como uma provocação constante afinal basicamente estamos vendo um ser humano, em seu estado puro, sendo moldado conforme o meio em que está inserido (e por isso as diversas discussões filosóficas que surgem no filme, ainda que não se aventurem em algo mais profundo, não são desnecessárias). Então é muito interessante ver que a música, de início, nunca consegue ser tocada sem uma nota destoante, como se tivesse algo errado e incompleto, tal qual a formação de Bella que ainda tem dificuldades para falar e andar, e somente quando essa formação se completa que a trilha se apresenta de forma perfeita (mas ainda assim assustadora, para mostrar como a situação em si é bizarra). Ele parte do elemento mais primordial do ser humano, o sexo, e a partir disso vai fazendo com que Bella descubra o mundo ao redor e como sua sociedade buscava formar de moldar esse instinto básico (desde casamentos forçados até a extração de clitóris). É basicamente uma aula de arte e filosofia.
Seu único ponto negativo, que nem creio que seja tão relevante assim, é que ele peca pelo excesso, nos fazendo chegar ao final do filme exaustos com a quantidade de informações mesmo ele sendo um filme bem enxuto, tendo somente as cenas necessárias para contar essa história (sim, até mesmo as dezenas cenas de sexo são necessárias, já que ele mostra a prática sob diversos pontos, desde a descoberta, o prazer pessoal e a recompensa até como forma de controle).
Não considero superior a A Favorita, mas ainda assim é excelente.
Tinha potencial para muito mais, mas faltou coragem de enfrentar seus temas. É certo que esta é uma das propostas do filme, não querer se comprometer em pintar a personagem de Julianne Moore como vítima ou vilã para que o próprio espectador tenha suas respostas. No entanto, acaba sendo tão esquivo ao abordar essa história, sendo subjetivo demais e nunca deixando seus personagens terem uma discussão profunda que no final o filme fica com uma impressão de vazio, como se muito tempo tivesse se passado sem nada de útil ser dito.
A trilha sonora, total novela mexicana, não auxilia em nada, junto de seus closes, parecendo um filme barato feito para a televisão (e que, mesmo com a personagem sendo uma atriz de TV, esse tipo de técnica não acrescentou em nada ao filme).
Vale muito pela atuação da Natalie Portman, que consegue transitar por vários mundos, e a do marido Joe (Charles Menton), que realmente passa a impressão de alguém que não cresceu e se encontra aprisionado.
Eu entendo a intenção, mas na prática não funcionou. É como se tivesse dois filmes que, apesar de compartilharem do mesmo objetivo, não conversassem entre si. É muito boa a ideia da crítica à própria cultura atual de reduzir histórias negras à sofrimentos, drogas e gravidez na adolescência. O tom de humor do filme é ótimo e dá para ver que a crítica atinge o objetivo quando mostra, em certo momento, até mesmo filmes premiados pela Academia, ao estilo “The Joke is on you”. E de igual modo também é boa a ideia da história mais dramática, do enfrentamento à vida normal de alguém sem emprego que precisa cuidar da mãe, dos confrontos familiares, das pequenas felicidades. No entanto, as duas histórias unidas tornam o filme desgastante, mesmo com excelentes momentos e discussões. Acaba pecando pelo excesso e seu final acaba sendo preguiçoso. Vale pela ideia de fazer as produções artísticas acordarem para não se tornarem uma Srta Morello.
É bem clichêzão, se apoiando em algumas técnicas fáceis para conseguir a simpatia do público, com a música crescendo e a pessoa idealista, sem recursos, que se propõe a uma grande obra apoiada apenas pela força de vontade após uma injustiça. Em alguns momentos inclusive tenta fazer referências ao Blaxploitation com closes rápidos e música animada, tal qual Spike Lee fez no final de Infiltrado na Klan, mas aqui sem efeito, deixando a concepção estranha e os personagens caricatos (principalmente Chris Rock, que não convence em momento algum).
No entanto, principalmente depois dos 40 minutos iniciais o filme passa até a ser agradável, até mesmo porque as atuações, que antes estavam sendo extremamente caricatas, se suavizam e você começa a acreditar e se envolver naquela história. Ainda apela para os clichês, claro, mas ao menos o contexto geral bom faz com que eles não atrapalhem tanto o andamento.
Eu assisti a versão original quando era criança e só me lembrava de dois detalhes: uma cena em que quebravam um dedo de um corpo congelado, e outra era o meu tio dizendo "Assisti esse filme no cinema com a sua vó. Ela vomitou no final".
Isso me veio à mente porque é visível, nesta versão, o cuidado que eles tomam o tempo todo para que o filme não se torne "gore", com exceção de uma única cena e que tem sua principal função amenizar todos os acontecimentos seguintes do filme. Outro cuidado é que a todo momento o filme busca mostrar um espírito de camaradagem, com um ajudando o outro, até mesmo fazendo massagens nos pés e mesmo nas discussões estas tem um clima mais ameno.
E esses dois pontos são, simultaneamente, bons e ruins para a história. Claro, é ótimo a retirada de qualquer aspecto nojento pois de fato os sobreviventes não tinham outra escolha. No entanto, o clima de camaradagem criado, ao invés de nos fazer conectar com a história e sentirmos cada morte nos afasta desses momentos, criando um pensamento de que estão morrendo por um "bem maior" e de que "foi um mal necessário".
Assim, o filme que, mesmo sendo interessante (e ao menos para mim não foi nada cansativo), perde muito do drama que poderia ter abordado, tornando-se um filme esquecível, mesmo tendo muita qualidade, pois deixa de lado a criação de momentos marcantes em prol de uma mensagem mais amena ao público.
Mesmo com vinte minutos iniciais bem pedantes repetindo a mesma mensagem de "Você tem que fazer algo da sua vida", "Não desista" e "Nunca é tarde para começar", algo que incomoda pela quantidade de vezes em pouco tempo em que essas ideias são mostradas (e que sequer são necessárias já que todo o restante do filme te mostra isso na prática sem te tratar como um idiota), é um filme bem agradável pois torcemos não só por Nyad, mas por toda a equipe a sua volta. Apesar dela ser protagonista de sua história, a recordista, a primeira a fazer o caminho, é a sua equipe que chama a atenção aqui e o roteiro é muito inteligente em não fazer com que nenhum desses personagens pareça supérfluo nessa história, com cada um tendo o tempo necessário de tela, mesmo que seja falando somente uma frase.
Trilha sonora incrível, tanto cantada quanto original, com o Desplat pegando umas referências de Carruagens de Fogo em algumas notas.
É um daqueles filmes que te faz se sentir bem após assistir.
Considero o Ridley Scott um dos diretores mais injustiçados do cinema pois normalmente seus filmes seguem o mesmo padrão: quando lançados são duramente criticados e, anos depois, são “redescobertos” e a opinião muda. E a culpa sequer é do filme, que continua lá, imutável, mas sim do público que saiu do filme dizendo “Eu esperava algo diferente”.
Sinceramente arrependido por não ter visto esse filme no cinema, principalmente pelas críticas a respeito do seu ritmo, Napoleão é um filme maravilhoso que segue um caminho fora do comum. Ele não está preocupado em contar todos os fatos históricos, em mostrar razões políticas, consequências ou fazer paralelos com o mundo atual. Sequer Abel Gance, com seu Napoleão de 5 horas, conseguiu contar uma história completa, visto que o filme teria uma continuação que jamais foi feita. Talvez o mais próximo que um dia o cinema consiga de realizar uma obra definitiva de Napoleão seja a adaptação do roteiro de Kubrick, que volta e meia ressurge em algum projeto (da última vez, Spielberg estava cotado para adaptá-lo em uma série da HBO).
Ele, na verdade, está preocupado em mostrar o caráter psicológico de Napoleão, e mostrar essa dualidade do sujeito que se utiliza das armas e da força militar para se provar e superar seus próprios problemas, seja a timidez, os problemas conjugais ou sexuais.
Psicologicamente o filme é muito preciso, e é visível como Joaquin Phoenix se dedicou a estudar esses pontos, criando um general que, poucas vezes, olha nos olhos dos seus comandados até tomar confiança próximo da metade final. Não creio que ele peca como construção de personagem. Ao contrário, seu mérito é não querer ser explicativo demais nessas mudanças.
Contando toda a sua história militar como um tabuleiro de xadrez, é bonito ver toda a ambientação criada, com Napoleão distante comandando suas peças, até sua queda final, como uma peça do tabuleiro sendo derrubada.
É impressionante o que esse filme consegue fazer, porque de fato ele proporciona uma experiência que não me recordo em outras produções.
Apesar de ter um dos inícios mais tediosos do cinema (de verdade, os primeiros 20 minutos são sofríveis e me questionei o porquê continuava assistindo já que os personagens não eram cativantes e não acontecia nada de interessante em suas vidas), a partir desse momento inicial, a partir das cenas em videochamada, a história muda de figura e você fica imerso naquela história, tanto que você se esquece do tempo.
Imersão sequer chega a ser o termo correto para descrevê-lo porque, ao longo de todo o filme, você não quer ver como os personagens irão terminar, você só quer VER, e ponto. Não interessa o que está acontecendo, o que estão falando ou as consequências, você se sente extremamente atraído por aquelas pessoas e a sua realidade a ponto de não conseguir desgrudar os olhos da tela. Você sente a tensão, apoia as decisões e de fato não se sente em nenhum momento enganado pelo final. É um dos filmes mais expressivos do cinema.
Ele é essencialmente um filme de roteiro, então mesmo tendo boas atuações, principalmente dos protagonistas Sandra e Samuel, seu foco é contar essa história e inserir algumas pistas para que o espectador, assim como os membros do júri, desconfiem da história que está sendo contada, criando um mistério ao estilo "Capitu traiu ou não traiu?".
Assim, segue um estilo bem parecido com o criado por Hitchcock em Agonia de Amor, se preocupando não em quem fez, mas principalmente em como aquilo aconteceu, inserindo informações que colocam as partes em descrédito e, mesmo quando toda a questão é "solucionada", ainda prossegue o filme um um tempo razoável para nos dar a sensação de que há algo errado.
E talvez este seja o ponto forte do filme: ele está a todo momento preocupado em, junto da história, te mostrar a estranheza daquele caso, com um desconforto constante que nunca vai embora, tirando da zona de conforto. Mesmo sendo desgastante (e isso não tem nada a ver com o ritmo, que é muito bom), ainda assim é um ótimo filme.
Meu Amigo Robô
4.0 86Esse filme foi uma ótima surpresa considerando que, em seus 20 minutos iniciais, ficava somente pensando "O filme vai ser só isso? Eles andando e conhecendo lugares? Como vão encher 90 minutos com isso?" sendo que, logo em seguida, você percebe como essa longa parte inicial é essencial para você compreender a relação dos dois e sentir o mesmo sentimento de desespero, tristeza e abandono durante toda a espera na praia. É justamente por causa desse início que todo o filme ganha um senso de urgência, que mesmo sem falas você consegue perceber cada um dos pensamentos dos personagens e te dá vontade de querer ajudar. É lindo ver todo o controle que a produção tem em contar essa história, inserindo nos momentos certos os alívios, os romances, o drama.
Não sei se "Meu amigo robô" seria uma tradução certa ao filme já que em alguns momentos fica meio suspeita a relação deles.
As 4 Filhas de Olfa
3.8 35 Assista AgoraApesar do desconforto que o filme causa em certos momentos ao reviver fatos cruéis da vida das vítimas diante das próprias, mesmo desconforto expressado pelo ator em certo momento que chega a abandonar a cena, ainda assim o filme mostra a necessidade de tais momentos ao final. Se de início considerei que toda a questão beirava a tortura psicológica, à medida que as irmãs vão contando sua história você percebe que de fato elas superaram os traumas mas eles ainda doem, e por isso que ele parece crueldade porque, se fôssemos nós, jamais iríamos querer reviver uma dor tão forte.
E é com uma sucessão de plot twists, todos muito bem utilizados, que percebemos que tal dor não é nada perto dos últimos acontecimentos de suas vidas.
Confesso que jamais imaginei que as irmãs mais velhas tinham ingressado no ISIS e, em reviravoltas contínuas, ainda mostra que houve o casamento com um líder terrorista, que sua base foi bombardeada, que elas sobreviveram, foram presas, uma teve uma filha, as irmãs mais novas também estavam num fanatismo religioso que se encerrou com o tratamento psicológico em abrigo enquanto as mais velhas foram condenadas.
Não tem como acompanhar toda essa sucessão final sem ficar de boca aberta. Se fosse um filme de ficção ninguém acreditaria.
Matar um Tigre
3.8 28 Assista AgoraHistória cruel em um documentário que, de forma muito inteligente, retira do espectador qualquer ideia de que o pai "não fez mais do que sua obrigação" em lutar judicialmente pela punição aos estupradores da filha, mostrando o retrógrado pensamento do vilarejo, as ameaças, o sistema judicial indiano e as consequências que isso acarretaria para o seu próprio dia a dia. Ele deixa muito claro que a opção mais fácil e que costumeiramente era usada seria seguir a opinião do chefe da vila e, por isso, todo o esforço dispendido não pode ser encarado como "apenas sua obrigação", mas sim um ato de heroismo que tem que ser incentivado.
Tem um dos momentos mais lindos que já vi, ao mostrar a filha, após seu depoimento, sorrindo e com os olhos cheios de lágrimas, sendo visível como aquele momento lhe retirou um grande peso das costas.
Bobi Wine: O Presidente Do Povo
3.6 26Que figura fascinante que é Bobi Wine, tanto que mesmo com o documentário sendo bem lento pelo excesso de acontecimentos em sua primeira uma hora de duração, em que precisa explicar quem ele é, de onde veio, sua chegada na política e o contexto político de Uganda, ainda assim te prende na tela por querermos vê-lo andando por seu país e cantando suas músicas (que são muito boas).
Ainda, esse momento inicial lento sequer é dispensável já que é uma preparação necessária para as consequências da segunda hora, quando o filme toma uma agilidade maior.
Senti falta somente da demonstração de um pensamento mais profundo de Bobi Wine, a provocação para que ele ingressasse em uma discussão política, já que nas poucas vezes em que ele se manifesta tem um discurso bem interessante dos problemas sociais, idealista, mas sem abordar soluções.
Eu, Capitão
4.0 70 Assista AgoraTaí um filme que merece mais propaganda porque é um dos mais prazerosos de se acompanhar no Oscar. Tudo nele funciona: a trama que acompanha a mudança de menino a homem; os efeitos especiais; as cenas que, mesmo quando líricas, não são de difícil compreensão; o ritmo excelente; trilha sonora que casa com as cenas e a fotografia magnífica (principalmente na sequência do Sahara). É emocionante e, mesmo falando de da população Senegalesa e seu sonho de ir à Europa, é contada de uma forma que qualquer pessoa consegue se conectar.
Este é um daqueles que você consegue enxergar sendo "redescobertos" no futuro em uma edição Criterion.
Zona de Interesse
3.6 594 Assista AgoraHá muito tempo eu não tinha aquela sensação terrível de "Eu não acredito que esse filme vai terminar assim!", e sim, ele termina. É por obras assim que mesmo com o A24 sendo o único estúdio do cinema atual que investe em histórias fora do comum eu não consigo gostar das obras porque para cada obra prima existem outros dez filmes extremamente vazios lançados. E é bem isso o que acontece aqui: é um filme vazio, sem propósito. Mesmo sendo boa a ideia de mostrar o dia a dia de uma família que mora ao lado do campo de concentração, com o uso do som sendo muito interessante para mostrar como as pessoas se acostumam às maiores atrocidades se elas ficam contínuas, bem como o apego aos detalhes como por exemplo o irmão que tranca o outro em uma estufa e começa a fazer o barulho de gás, ainda assim é um filme que diz muito pouco para a suas quase duas horas.
Poderia ter utilizado desses detalhes em um filme mais profundo ou, se não tinha isso, que se transformasse em um curta experimental, mas é triste ver um filme sobre a Segunda Guerra e Campos de Concentração que não te faça sentir nada.
20 Dias em Mariupol
3.9 57 Assista AgoraConfesso que, pelas críticas, imaginava que seria pior.
Seu ponto negativo é todo o segmento entre 10 e 30 minutos em que o documentário busca mostrar toda a crueldade do conflito, se utilizando de imagens de ferimentos, crianças mortas, cabeças ensanguentadas, dentre outros. Não que a guerra não seja isso, mas a forma como essas cenas são mostradas acabam adquirindo até mesmo um tom apelativo, baixo, e ao invés de você considerar que eram os Russos que estavam sendo cruéis, seu desprezo se transfere para o documentarista e ficamos falando "Cara, sai daí. Não precisa ficar dentro da sala de cirurgia. Deixa a família em paz". São compreensíveis as cenas já que, por se tratar de correspondente jornalista, buscava denunciar no próprio dia o que vinha acontecendo na Ucrânia a fim de ter uma resposta rápida das autoridades. No entanto, a forma como isso foi demonstrado no documentário acabou dando um tom sádico à história.
Por sorte, talvez por uma mudança de pensamento do diretor ou até pela própria continuidade do conflito, esse estilo se altera após a meia hora inicial, sendo tenso e brutal, sim, mas sem ser tão apelativo, adquirindo o tom certo entre o choque e a denúncia sem exposição excessiva das vítimas. A cena do parto da criança é uma das coisas mais tensas do cinema.
A Memória Infinita
4.0 43Não gostei tanto quanto esperava em razão de o filme, logo em seu momento inicial, acabar se dispersando um pouco em sua proposta.
Temos uma boa cena inicial em que Paulina diz que usará aquele momento para explicar ao marido quem ele foi, seguido de várias cenas de arquivo. Isso faz com que consideremos que este será o estilo do documentário, como forma de mostrar a alguém com Alzheimer tudo que ele fez de grandioso na vida.
No entanto, logo em seguida, o filme altera e passa a mostrar um tempo considerável da rotina da esposa no teatro, tirando o protagonismo que, até aquele momento, acreditava-se ser do marido e sua doença. Então nós, como espectador, passamos a ver que será mostrada, em realidade, a rotina do casal, o que não é verdade já que com 30 minutos de filme ele retorna a mostrar a vida do marido, mostrando imagens de reportagens que ele fez e perguntando se ele se recorda.
Essa alteração constante de foco na história em seus momentos iniciais, essenciais para que nos apeguemos aos personagens, fazem com que nós espectadores percamos o apego e fiquemos inseguros assistindo, mesmo com tudo se ajeitando após a meia hora inicial e se tornando cativante.
Dias Perfeitos
4.2 285 Assista AgoraNão sei se é por estar chegando aos 30, mas esse é o exato tipo de filme que, se eu tivesse visto há uns cinco anos atrás, me irritaria profundamente, e agora eu acho maravilhoso.
Da mesma forma que Past Lives, também concorrente ao Oscar este ano, Dias perfeitos é um filme sobre a vida, o dia a dia, e me causou a mesma reação assistindo a ambos: pouco me importava se aconteceria alguma coisa ou não naquela história, eu só queria ver os personagens fazendo suas coisas do dia a dia da maneira mais deliciosa possível.
Chegou a um ponto em que de fato comecei a ver a minha própria vida retratada na tela, o sujeito que só quer saber de fazer seu trabalho, ouvir suas músicas (e até me assustei por serem as mesmas músicas que ouço) e ler seus livros antes de dormir, e qualquer coisa que interfira nessa rotina já é um incômodo.
Tanto que é justamente por esse ponto que ele peca próximo ao final: como o interessante do filme é ver ele seguindo sua rotina com toda a dedicação possível, vivendo o presente, ele se torna cansativo quando começa a colocar muitos elementos que fogem desse padrão nos últimos 20 minutos, como um dia de jornada exaustiva e beber junto com alguém.
A Sala dos Professores
3.9 139 Assista AgoraQue filme incrível. Ele é tão bom, mas tão bom, que é uma das raras vezes que sequer consigo pensar no que escrever porque de fato ele te deixa sem palavras. Segue aquilo que eu mais gosto na arte em geral que é te provocar, te fazer sentir e entrar em conflito, e o filme todo é esse crescimento de emoções que vai te deixando sufocado porque todos os personagens, sem exceção, até mesmo os mais doces, tem momentos em que estão certos e momentos em que estão errados ao ponto de cometerem crimes, e você fica impassível nesse meio sem saber se quer bater em todo mundo para tomar um jeito ou tratar com delicadeza afinal não merecem sofrer o que sofrem.
Facilmente está no top 5 do Oscar esse ano.
Jon Batiste: American Symphony
3.3 25Tenho pleno conhecimento de que já fui assistir ao filme com antipatia pelo Jon Batiste por ele ter levado o Grammy da Billie Eilish quando concorria pelo Happier Than Ever (e também sei que a culpa nem é do cara, mas do meu comportamento de fã), mas também sei reconhecer que os motivos de não ter gostado do documentário não tem nada a ver com isso.
Isso porque mesmo sendo um documentário você percebe que diversas situações ali estão sendo forçadas, e os próprios personagens mostram um desconforto em estar diante das câmeras, não aparentando a naturalidade necessária. É como se, por exemplo, diversas ligações e videochamadas fossem feitas unicamente para soltar uma frase de efeito ou para fazer um link com a cena seguinte e eles não querem se propor a isso, mas mesmo assim o fazem.
Os poucos momentos em que o filme mostra uma naturalidade é quando trata de todo os acontecimentos com a esposa, e criamos um apego tão grande com ela que queremos apenas vê-la em tela, pouco importando a sinfonia que era o mote principal para que o filme existisse, tanto que, quando a música realmente surge, o filme até fica cansativo e você tem vontade que ele se encerre logo, não tendo a menor curiosidade para saber como ficou o trabalho.
Flamin' Hot: O Sabor que Mudou a História
3.3 64 Assista AgoraSão coisas assim que me impressionam no cinema pelo seguinte: o filme é um clichezão do “self made man”, com as mesmas características do cara que sai do nada, passa dificuldades, desemprego, família com fome, trabalho massacrante mas sempre com um sorriso no rosto, etc. Você já sabe desde o início onde a história vai levar, quais são os pontos de virada, de expectativa não cumprida, onde o plano vai dar errado e onde vai dar certo e até as frases de efeito.
E mesmo assim chega no final e você se emociona, fica feliz pelo personagem, torce por ele, mesmo repetindo técnicas óbvias, por vezes sendo pedante e obviamente voltado para vender uma imagem de uma produto/empresa. É uma história deliciosa de assistir, ainda que não tenha um orçamento gigantesco e apresse seu filme para contar todo o necessário em cerca de 90 minutos a fim de não cansar seu espectador.
E se mesmo com tudo isso o filme funciona, não tem como dizer que ele é ruim.
Golda: A Mulher De Uma Nação
3.0 64Ele tem dois problemas bem sérios: o primeiro, que talvez seja mais grave, é que ele considera que o espectador sabe o suficiente sobre todo o desenrolar da Guerra do Yom Kippur, o que não é verdade. Com isso, em diversos momentos o filme fica confuso, tendo cenas em que os personagens lamentam as mortes, derrotas e emboscadas e, logo na cena seguinte, falam que venceram a guerra "por pouco". Como, se há menos de um minuto e com um corte abrupto todos estavam chorando em sua sala de guerra? De que forma essa vitória veio?
Ainda, assim, o filme é interessante de assistir pelos conflitos dramáticos entre os personagens, mas que poderia ser melhor se não fosse o seu segundo problema: Como ele assume que Golda foi uma figura controversa (termo utilizado pelo próprio filme no segmento final), ele fica receoso em abordá-la tanto como heroína quanto como vilã. E isso não significa que ele assume, por consequência, uma narrativa neutra, mas sim uma narrativa que evita tocar em determinados assuntos ou motivações, o que deixa o filme não somente incompleto mas causando uma distância do espectador à personagem.
É legal ver que, ao contrário dos muitos filmes atuais, ele intercala imagens do período e das pessoas reais com reconstituições por computador, o que dá um realismo maior, e é muito interessante os diversos usos que fazem da fumaça do cigarro, seja como para ilustrar a multidão de pensamentos na cabeça de Golda ou um "anjo da morte" que varre os campos de batalha.
O Conde
3.2 95 Assista AgoraEste foi uma grata surpresa. Mesmo sendo arrastado e por diversas vezes perdendo tempo ao buscar criar cenas de uma beleza poética (e que incomodam justamente por esta não ser a intenção do filme), o roteiro é tão bom que ainda assim é agradável de assistir, sendo uma crítica ferrenha aos ditadores e líderes, utilizando da figura de Pinochet como poderia ter utilizado várias outras (coisa que o próprio filme faz, mas que não cumpre dizer aqui para não dar spoiler), os sanguessugas.
É inevitável não lembrar de What We do In The Shadows, mas aqui com a paródia surgindo de uma maneira mais séria, quase como se buscasse escancarar a insanidade do nosso mundo. Você ri não porque ele deturpa o real, mas sim porque ele está mostrando quão bizarro é o real.
A melhor cena do filme, referente à inquisição feita por Carmen aos personagens enquanto estes riem contando as coisas mais absurdas, é algo de aplaudir de pé.
A Cor Púrpura
3.5 102Eu amo musicais, mas com este aqui eu consegui sentir exatamente a mesma coisa que o público que não gosta do gênero sente. Isso porque as músicas não só não combinam com a história que está sendo contada, que é extremamente pesada principalmente em sua parte inicial, como também nada agregam ao contexto geral. Ao invés delas trazerem aquilo que não pode ser esboçado nos diálogos, repetem informações que o espectador já havia entendido em um gesto, uma fala ou uma carta, como por exemplo a sequência musical das "Calças de Cellie". Sim, são sequências visualmente bonitas mas, com exceção de "Hell No", todas elas te tiram da imersão sobre a história e por diversas vezes tive vontade de acelerar o filme pois já estava visível que elas não estravam trazendo nada de novo ao roteiro.
Afora isso, as atuações são boas, em especial a de Danielle Brooks, sendo merecida a indicação. Visualmente impecável, dando vontade de emoldurar diversos momentos, como por exemplo Shug chegando na canoa, mas de fato não precisava ser um musical.
Pobres Criaturas
4.1 1,2K Assista AgoraEle é propositalmente desconfortável e todos os seus elementos são criados para reforçar esse desconforto no espectador, como uma provocação constante afinal basicamente estamos vendo um ser humano, em seu estado puro, sendo moldado conforme o meio em que está inserido (e por isso as diversas discussões filosóficas que surgem no filme, ainda que não se aventurem em algo mais profundo, não são desnecessárias). Então é muito interessante ver que a música, de início, nunca consegue ser tocada sem uma nota destoante, como se tivesse algo errado e incompleto, tal qual a formação de Bella que ainda tem dificuldades para falar e andar, e somente quando essa formação se completa que a trilha se apresenta de forma perfeita (mas ainda assim assustadora, para mostrar como a situação em si é bizarra). Ele parte do elemento mais primordial do ser humano, o sexo, e a partir disso vai fazendo com que Bella descubra o mundo ao redor e como sua sociedade buscava formar de moldar esse instinto básico (desde casamentos forçados até a extração de clitóris). É basicamente uma aula de arte e filosofia.
Seu único ponto negativo, que nem creio que seja tão relevante assim, é que ele peca pelo excesso, nos fazendo chegar ao final do filme exaustos com a quantidade de informações mesmo ele sendo um filme bem enxuto, tendo somente as cenas necessárias para contar essa história (sim, até mesmo as dezenas cenas de sexo são necessárias, já que ele mostra a prática sob diversos pontos, desde a descoberta, o prazer pessoal e a recompensa até como forma de controle).
Não considero superior a A Favorita, mas ainda assim é excelente.
Segredos de um Escândalo
3.5 323 Assista AgoraTinha potencial para muito mais, mas faltou coragem de enfrentar seus temas. É certo que esta é uma das propostas do filme, não querer se comprometer em pintar a personagem de Julianne Moore como vítima ou vilã para que o próprio espectador tenha suas respostas. No entanto, acaba sendo tão esquivo ao abordar essa história, sendo subjetivo demais e nunca deixando seus personagens terem uma discussão profunda que no final o filme fica com uma impressão de vazio, como se muito tempo tivesse se passado sem nada de útil ser dito.
A trilha sonora, total novela mexicana, não auxilia em nada, junto de seus closes, parecendo um filme barato feito para a televisão (e que, mesmo com a personagem sendo uma atriz de TV, esse tipo de técnica não acrescentou em nada ao filme).
Vale muito pela atuação da Natalie Portman, que consegue transitar por vários mundos, e a do marido Joe (Charles Menton), que realmente passa a impressão de alguém que não cresceu e se encontra aprisionado.
Ficção Americana
3.8 376 Assista AgoraEu entendo a intenção, mas na prática não funcionou. É como se tivesse dois filmes que, apesar de compartilharem do mesmo objetivo, não conversassem entre si. É muito boa a ideia da crítica à própria cultura atual de reduzir histórias negras à sofrimentos, drogas e gravidez na adolescência. O tom de humor do filme é ótimo e dá para ver que a crítica atinge o objetivo quando mostra, em certo momento, até mesmo filmes premiados pela Academia, ao estilo “The Joke is on you”. E de igual modo também é boa a ideia da história mais dramática, do enfrentamento à vida normal de alguém sem emprego que precisa cuidar da mãe, dos confrontos familiares, das pequenas felicidades. No entanto, as duas histórias unidas tornam o filme desgastante, mesmo com excelentes momentos e discussões. Acaba pecando pelo excesso e seu final acaba sendo preguiçoso. Vale pela ideia de fazer as produções artísticas acordarem para não se tornarem uma Srta Morello.
Rustin
3.3 81 Assista AgoraÉ bem clichêzão, se apoiando em algumas técnicas fáceis para conseguir a simpatia do público, com a música crescendo e a pessoa idealista, sem recursos, que se propõe a uma grande obra apoiada apenas pela força de vontade após uma injustiça. Em alguns momentos inclusive tenta fazer referências ao Blaxploitation com closes rápidos e música animada, tal qual Spike Lee fez no final de Infiltrado na Klan, mas aqui sem efeito, deixando a concepção estranha e os personagens caricatos (principalmente Chris Rock, que não convence em momento algum).
No entanto, principalmente depois dos 40 minutos iniciais o filme passa até a ser agradável, até mesmo porque as atuações, que antes estavam sendo extremamente caricatas, se suavizam e você começa a acreditar e se envolver naquela história. Ainda apela para os clichês, claro, mas ao menos o contexto geral bom faz com que eles não atrapalhem tanto o andamento.
A Sociedade da Neve
4.2 720 Assista AgoraEu assisti a versão original quando era criança e só me lembrava de dois detalhes: uma cena em que quebravam um dedo de um corpo congelado, e outra era o meu tio dizendo "Assisti esse filme no cinema com a sua vó. Ela vomitou no final".
Isso me veio à mente porque é visível, nesta versão, o cuidado que eles tomam o tempo todo para que o filme não se torne "gore", com exceção de uma única cena e que tem sua principal função amenizar todos os acontecimentos seguintes do filme. Outro cuidado é que a todo momento o filme busca mostrar um espírito de camaradagem, com um ajudando o outro, até mesmo fazendo massagens nos pés e mesmo nas discussões estas tem um clima mais ameno.
E esses dois pontos são, simultaneamente, bons e ruins para a história. Claro, é ótimo a retirada de qualquer aspecto nojento pois de fato os sobreviventes não tinham outra escolha. No entanto, o clima de camaradagem criado, ao invés de nos fazer conectar com a história e sentirmos cada morte nos afasta desses momentos, criando um pensamento de que estão morrendo por um "bem maior" e de que "foi um mal necessário".
Assim, o filme que, mesmo sendo interessante (e ao menos para mim não foi nada cansativo), perde muito do drama que poderia ter abordado, tornando-se um filme esquecível, mesmo tendo muita qualidade, pois deixa de lado a criação de momentos marcantes em prol de uma mensagem mais amena ao público.
NYAD
3.7 153Mesmo com vinte minutos iniciais bem pedantes repetindo a mesma mensagem de "Você tem que fazer algo da sua vida", "Não desista" e "Nunca é tarde para começar", algo que incomoda pela quantidade de vezes em pouco tempo em que essas ideias são mostradas (e que sequer são necessárias já que todo o restante do filme te mostra isso na prática sem te tratar como um idiota), é um filme bem agradável pois torcemos não só por Nyad, mas por toda a equipe a sua volta. Apesar dela ser protagonista de sua história, a recordista, a primeira a fazer o caminho, é a sua equipe que chama a atenção aqui e o roteiro é muito inteligente em não fazer com que nenhum desses personagens pareça supérfluo nessa história, com cada um tendo o tempo necessário de tela, mesmo que seja falando somente uma frase.
Trilha sonora incrível, tanto cantada quanto original, com o Desplat pegando umas referências de Carruagens de Fogo em algumas notas.
É um daqueles filmes que te faz se sentir bem após assistir.
Napoleão
3.1 324 Assista AgoraConsidero o Ridley Scott um dos diretores mais injustiçados do cinema pois normalmente seus filmes seguem o mesmo padrão: quando lançados são duramente criticados e, anos depois, são “redescobertos” e a opinião muda. E a culpa sequer é do filme, que continua lá, imutável, mas sim do público que saiu do filme dizendo “Eu esperava algo diferente”.
Sinceramente arrependido por não ter visto esse filme no cinema, principalmente pelas críticas a respeito do seu ritmo, Napoleão é um filme maravilhoso que segue um caminho fora do comum. Ele não está preocupado em contar todos os fatos históricos, em mostrar razões políticas, consequências ou fazer paralelos com o mundo atual. Sequer Abel Gance, com seu Napoleão de 5 horas, conseguiu contar uma história completa, visto que o filme teria uma continuação que jamais foi feita. Talvez o mais próximo que um dia o cinema consiga de realizar uma obra definitiva de Napoleão seja a adaptação do roteiro de Kubrick, que volta e meia ressurge em algum projeto (da última vez, Spielberg estava cotado para adaptá-lo em uma série da HBO).
Ele, na verdade, está preocupado em mostrar o caráter psicológico de Napoleão, e mostrar essa dualidade do sujeito que se utiliza das armas e da força militar para se provar e superar seus próprios problemas, seja a timidez, os problemas conjugais ou sexuais.
Psicologicamente o filme é muito preciso, e é visível como Joaquin Phoenix se dedicou a estudar esses pontos, criando um general que, poucas vezes, olha nos olhos dos seus comandados até tomar confiança próximo da metade final. Não creio que ele peca como construção de personagem. Ao contrário, seu mérito é não querer ser explicativo demais nessas mudanças.
Contando toda a sua história militar como um tabuleiro de xadrez, é bonito ver toda a ambientação criada, com Napoleão distante comandando suas peças, até sua queda final, como uma peça do tabuleiro sendo derrubada.
Vidas Passadas
4.2 754 Assista AgoraÉ impressionante o que esse filme consegue fazer, porque de fato ele proporciona uma experiência que não me recordo em outras produções.
Apesar de ter um dos inícios mais tediosos do cinema (de verdade, os primeiros 20 minutos são sofríveis e me questionei o porquê continuava assistindo já que os personagens não eram cativantes e não acontecia nada de interessante em suas vidas), a partir desse momento inicial, a partir das cenas em videochamada, a história muda de figura e você fica imerso naquela história, tanto que você se esquece do tempo.
Imersão sequer chega a ser o termo correto para descrevê-lo porque, ao longo de todo o filme, você não quer ver como os personagens irão terminar, você só quer VER, e ponto. Não interessa o que está acontecendo, o que estão falando ou as consequências, você se sente extremamente atraído por aquelas pessoas e a sua realidade a ponto de não conseguir desgrudar os olhos da tela. Você sente a tensão, apoia as decisões e de fato não se sente em nenhum momento enganado pelo final. É um dos filmes mais expressivos do cinema.
Anatomia de uma Queda
4.0 809 Assista AgoraEle é essencialmente um filme de roteiro, então mesmo tendo boas atuações, principalmente dos protagonistas Sandra e Samuel, seu foco é contar essa história e inserir algumas pistas para que o espectador, assim como os membros do júri, desconfiem da história que está sendo contada, criando um mistério ao estilo "Capitu traiu ou não traiu?".
Assim, segue um estilo bem parecido com o criado por Hitchcock em Agonia de Amor, se preocupando não em quem fez, mas principalmente em como aquilo aconteceu, inserindo informações que colocam as partes em descrédito e, mesmo quando toda a questão é "solucionada", ainda prossegue o filme um um tempo razoável para nos dar a sensação de que há algo errado.
E talvez este seja o ponto forte do filme: ele está a todo momento preocupado em, junto da história, te mostrar a estranheza daquele caso, com um desconforto constante que nunca vai embora, tirando da zona de conforto. Mesmo sendo desgastante (e isso não tem nada a ver com o ritmo, que é muito bom), ainda assim é um ótimo filme.