Fiquei receoso ao perceber que o filme "Silence" não havia sido lembrado no Oscar em vários quesitos técnicos - não que a Academia seja um padrão de qualidade sempre-, mas sim pelo histórico do diretor na competição. Após rever, maturar algumas coisas, notei que Scorsese apesar dos problemas que encontrou pelo caminho para bancar esse projeto idealizado durante 10 anos, fez uma obra que há muito ele buscava de uma maneira totalmente oposta do esperado, subvertendo até às expectativas de seu mais fiel público. Resultado: o cineasta não só conseguiu fazer um lindo trabalho, mas foi além do imaginado! Ele fez um épico bem intimista, transcendendo o próprio padrão Hollywoodiano do qual sempre fez parte, transformando o filme em uma experiência única e que foge de qualquer convencionalismo mercadológico "Made in USA". De uma forma corajosa, se redefinindo de maneira imersiva e com um forte cunho autoral, filosoficamente o diretor se depurou e acabou por nos brindar mais uma vez com uma colossal e tocante Obra-prima. Acredito que toda essa saga do autor atrás de seu sonho tenha valido a pena, afinal como já diria um ditado oriental: "A flor perfeita é rara! Pode se passar a vida esperando, e ainda assim não seria um desperdício..."
Impressionante direção de Nichols que soube usar bem de tudo que dispunha, todas suas características, nos entregando com isso, talvez, seu melhor trabalho até o momento. Emula bem à época e toda sua atmosfera, pontua de forma precisa à trilha com o desenvolvimento da trama - em especial em seus ápices -, emprega um ritmo que não oscila, contando ainda com uma linda fotografia. As personagens dizem muito mais em suas intenções/olhares/gestos que nas palavras em si, expondo os sentimentos de dentro pra fora, foge de diálogos histriônicos e mantém-se equilibrado(a) o tempo todo. O filme em primeira instância parece 'simples' e no entanto é extremamente complexo, e é aí onde reside seu real triunfo. Uma verdadeira pérola.
- "Na modorra das tardes vadias da fazenda, era num sítio, lá no bosque, que eu escapava aos olhos apreensivos da família. Amainava a febre dos meus pés na terra úmida, cobria meu corpo de folhas e, deitado à sombra, eu dormia na postura quieta de uma planta enferma, vergada ao peso de um botão vermelho. Não eram duendes aqueles troncos todos ao meu redor velando em silêncio e cheios de paciência o meu sono adolescente? Que urnas tão antigas eram essas liberando as vozes protetoras que me chamavam da varanda? De que adiantavam aqueles gritos se mensageiros mais velozes, mais ativos, montavam melhor o vento, corrompendo os fios da atmosfera? Meu sono, quando maduro, seria colhido com a volúpia religiosa com que se colhe um pomo. E me lembrei que a gente sempre ouvia nos sermões do pai que os olhos são a candeia do corpo. E, se eles eram bons, é porque o corpo tinha luz. E se os olhos não eram limpos é que eles revelavam um corpo tenebroso. - As venezianas...Por que as venezianas estão fechadas? - Não se constranja, meu irmão. Encontre logo a voz solene que você procura. Pergunte logo o que acontece comigo desde sempre. Me desconforme depressa a cara! E quebre contra os olhos a velha louça lá de casa. Eram esses os nossos lugares à mesa na hora das refeições ou na hora dos sermões: O pai à cabeceira; à sua direita, por ordem de idade, vinham primeiro Pedro, seguido de Rosa, Zuleika e Huda; à sua esquerda vinha a mãe, em seguida eu, Ana e Lula, o caçula. O galho da direita era um desenvolvimento espontâneo do tronco, desde as suas raízes. Já o da esquerda trazia o estigma de uma cicatriz, como se a mãe, que era por onde começava o segundo galho, fosse uma anomalia, uma protuberância mórbida, pela carga de afeto."
"O que é um fantasma? Uma tragédia condenada a repetir-se vezes sem conta? Um instante de dor, talvez. Algo morto que parece estar vivo. Uma emoção, suspendida no tempo. Como uma fotografia desfocada. Como um inseto preso em âmbar."
Mais uma vez o brilhante e nada convencional cinema do malaio Tsai Ming-Liang me fez parar, pensar e refletir através de sua arte. O filme não é longo, acredito que talvez até se categorize como um média-metragem, no entanto, acompanhar o percurso do monge andando em "slow motion", questiona até mesmo o conceito de "tempo" em nosso cotidiano. Há medida que a trama se desenrolou com sua cadência lenta, me peguei louco querendo que o filme acaba-se, talvez até por um imediatismo cultural, algo que lógico, só acrescenta quando decidimos parar para pensar sobre o que estamos vendo e nos questionamos de onde vêm tais ânsias? Por quê de tanta pressa sempre? É interessante notar que os marselheses tão absortos em suas questões, sequer se dão conta da performance que lhes permeia, assim talvez como nós ocidentais por andarmos tão acossados, frequentemente deixamos de nos importar ou mesmo perceber tantas raridades do dia a dia. "Jornada ao Oeste" foi talvez, à obra relativamente mais longa e enriquecedora que já pude presenciar em um filme desa década. Dado certa altura, decidi embarcar na experiência, exercitei deixar minhas aflições de lado e contemplar verdadeiramente algo de bem significativo, minuto pós minuto... Um exercício único, que marca e transcende quem decide se aventurar nessa jornada. Uma obra que atinge o âmago do "questionar" sem ser raso, utilizando apenas o poder imagético. Ah, lógico, o filme exige colaboração do espectador; ou vice-versa sei lá, afinal, até mesmo o ritmo do "nosso caminhar" pode ser encarado de forma relativa...
"Um oásis de horror em meio a um deserto de tédio." Charles Baudelaire
É sempre impressionante notar em quais lugares e situações a arte pode florescer como um acalento da alma. Entre fuzis, sangue, tristeza, ódio, um dedilhar de cordas pode fazer uma grande diferença, trazendo consigo um um pouco de esperança e sobretudo beleza. São em situações críticas de extrema brutalidade que homem aqui e ali vomita de dentro de si uma rara sutileza como se pedisse socorro do seu ofício de odiar e guerrear. Tendo a guerra e toda sua consequente barbárie como pano de fundo é tocante observar que um único acorde pode suscitar um abaixar de espadas, um instante de pureza. Aqui entre o desejo de soldados que almejam ter um final como os cavalos os cavalos árabes que morrem olhando pro céu, entre lágrimas, clamores e brutalidade você encontrará música; e com isso quem sabe, observará que o canto é um lamento do espírito. Nós cantamos quando sentimos saudades de algo ainda por decifrar.
Guardiões da Galáxia - foi o mais arrojado e meu preferido do estúdio. Homem Formiga - Sim! Eu sou um dos poucos que amam esse filme - por sua ousadia visual, seu estilismo bem original e por sua coragem. Capitão América: Guerra Civil - emula uma série de fatores - um monte de personagens que são amarrados em um roteiro esmerado em um o tom é certo que tateia entre o cômico e o 'sombrio' - proporcionando assim entretenimento e diversão de primeira para um público que pode ir de A a Z. Sendo lúcido, todo esse agregado de valores em um resultado final tornem este o melhor filme da Marvel até agora.
Desde que Hitler e toda sua cúpula, Goebbels/ Himmler/Göring e aquéns perpetuaram mundo afora sua barbárie desmedida na Segunda Grande Guerra o mundo se viu assombrado. Tomadas as devidas proporções sempre nos vimos sobre as garras do pior que nossa espécie pode ensejar, passados Perón, Pinochet, Mussolini e tantos outros achávamos que não seriamos mais vítimas das armadilhas passadas, porém fomos obrigados à presenciar Slobodan e tantos outros que mesmo diante de tantos avanços insistem em repetir episódios tão macabros sobre novas máscaras e transvestidos com outros nomes e outras ideologias. Não faz muito tempo nos vimos ajoelhados com aquela refugiada criança em uma praia turca. Naquele dia, todos fomos enterrados naquela encosta praieira. O novo filme húngaro ganhador do Oscar de Melhor filme estrangeiro suscita em nós tudo àquilo do qual queremos esquecer mas não devemos. O iniciante diretor László Nemes nos entrega uma preciosa obra ministrada com maestria. A sinopse já nos entrega que o filme se dá em um campo de concentração onde a personagem Saul encontra o corpo de seu filho e quer apenas o direito de enterrá-lo segundo as tradições judaicas. László Nemes coloca tudo em evidência porém desfoca imagens e situações subsequentes através do Deep Focus sublimando com isso que horror borrado seja completado pelo espectador. Sua narrativa não utiliza nenhum subterfúgio de trilha sonora exatamente para nos remeter há uma crueza constante. Sua câmera não tenciona parar justamente buscando nos levar à exaustão. Em determinado ponto da trama vários pontos são colocados em xeque só que isso já não mais importa, saber ou não à veracidade da relação de Saul com seu suposto filho não é mais o mote central. Ali onde jaz o horror da guerra é necessário uma esperança do qual se agarrar. Por fim em um clímax devastador, Saul vê a esperança no seu algoz personificado em uma criança que naquele acontecimento representava toda a antítese de sua fuga e que no entanto não deixou por sua vez de ser uma criança fugitiva, acuada... Exercícios ainda que duros como esse nunca serão demais, jamais serão datados, um filme como esse expõe nossas chagas ao sol. Ao fim nos traz uma reflexão de nossa condição e de nossos paradoxos; sabemos que nossa raça é capaz de feitos incríveis como até mesmo mandar um homem para a Lua, porém, até hoje não conseguimos controlar nossos corações...
Dono com certeza de um dos maiores roteiros já feitos, somado há isso a direção imprimida por Polanski com sua maestria e elegância fazem dessa obra um marco sem precedentes. O elenco caminha em perfeita harmonia. Faye Dunaway se apresenta no começo como uma "femme fatale" fria, porém com o decorrer da trama podemos enfim compreender sua inicial apatia exposta principalmente em sua expressão "poker face", assim por consequência conseguimos entender sua gélida figura que carrega dentro de si demônios e silêncios infindáveis. Como de costume e marca registrada de Polanski, o filme tem uma aura que te traga pra dentro da trama ou te leva onde bem quer gerando com isso um misto de emoções e surpresas. Mesmo que histriônica tal obra acerta um limiar que tantas outras obras minguaram buscando encontrar. Em suma, a obra pode não ser perfeita para muitos, porém dentro do gênero ela acerta na exatidão em ser ousada sem se perder, resultando portanto em um sutil equilíbrio raro de se ver. No fim entendemos que Chinatown sempre foi um caminho sem volta impossível de fugir.
Pra quem gosta de Antonioni, Hitchcock, referências à lá Tarantino e metalinguagem, tal filme se faz obrigatório. Aqui De Palma atinge seu ápice. Desde o título que faz clara referência à Blow-Up, o diretor emula filmes de diversos gêneros e mestres, mesclando toda forma e conteúdo em um filme exuberante. Flerta com "Rashomon" do gigante Kurosawa, traz para si claras referências de Psicose e Vertigo para compôr assim talvez sua Obra-prima. Se o termo Blow-Up é designado enquanto técnica fotográfica, Blow-Out é uma técnica de captação sonora. Cheio de planos-sequências exuberantes, o filme é um ode de amor ao cinema. Uma aula de edição e mixagem de som. Fora termos técnicos por mim citados, o filme não é complexo nem mesmo maçante. A narrativa é didática e consegue nos envolver do início ao fim como nos áureos filmes de Fincher. É uma história investigativa, misteriosa, instigante, dona de um roteiro brilhante e um desfecho genial. Aos amantes da sétima arte, recomendo fortemente. Uma verdadeira aula de cinema em vários sentidos.
Quando começaram as gravações do filme o elenco perguntou a Kurosawa "o que é isso? Do que se trata?" O diretor prontamente respondeu: " é um reflexo da vida, e a vida nem sempre têm significados claros." Kurosawa vivia pressionado pelo estúdio pelo alto custo de suas produções, afinal fazia filmes asiáticos inspirados em Shakespeare, Dostoiévski, nos Westerns de John Ford e toda essa mescla colossal acabava extrapolando os valores dispostos pelos estúdios japoneses que não dispunham de um orçamento Hollywoodiano. Assim, Akira decidiu que sua próxima obra seria mais minimalista, seria baseada na fusão de 2 contos populares e se daria em um único cenário. Meses adentro elaborando Storyboards de um lirismo artístico invejável, o templo "Rashomon" fora construído o elenco escolhido e as filmagens teriam início, o que mundo e toda à equipe envolvida no projeto desconheciam é que aquele filme mudaria a história do cinema para sempre.
Kurosawa declara em sua biografia que salgou toda a floresta pois as lesmas eram muito incomodas e um verdadeiro empecilho estético, espalhou espelhos adentro da relva para captar a iluminação natural que tanto exigia, afinal a noção da passagem de tempo aqui é demonstrada em sombras e através do vento. Tingiu com tinta preta a água da produção para que a chuva torrencial se destaca-se como queria, pois no fim da película almejava fazer com que a visão de um céu limpo fosse um símbolo esperança,com isso, sem querer, pela primeira vez na história da Sétima Arte, o Sol foi filmado em sua totalidade fazendo com isso algo histórico. Kazuo Miyagawa diretor de fotografia após toda essa odisseia ainda aguardou por duas semanas para captar um único fleche de luz na cena em que a Gueixa deixa seu rosto transparecer para Toshiro Mifune, que por sua vez interpreta um samurai que é baseado em uma lenda oriental, por isso todos seus trejeitos bufonescos que destoam do resto do desempenho do elenco são milimetricamente intencionais. Nessa história, nosso papel é o de júri, nós como espectadores não fazemos nada além de ouvir diversas versões de um mesmo acontecimento. Kurosawa não conhecia Cidadão Kane quando pensou nessa narrativa repleta de flashbacks, por uma questão claramente meridional. Sem que o diretor tivesse conhecimento, o estúdio enviou seu filme para o festival de Veneza onde conquistou o Leão de Ouro. Com tamanha exposição e tamanha grandeza, a Academia do Oscar decidiu criar a premiação para filmes estrangeiros, sendo Rashomon o responsável e primeiro vitorioso com isso.
O mundo agora conhecia Kurosawa e seus feitos que por muito tempo permaneceram escondidos. Rashomon por sinal, se tornou uma terminologia para designar o efeito de várias versões sobre um mesmo fato, sendo utilizado não só no cinema como até na psicologia. Ilustrando rapidamente, o último filme de Fincher, "Garota Exemplar", faz uso do "efeito Rashomon" em sua trama. Herzog já declarou que esse é o filme perfeito. Se é perfeito, não sei. Mas é um dos maiores ápices cinematográficos que se tem notícia.
Por fim, li certa vez uma declaração de Kurosawa em relação a um grande diretor indiano, onde poeticamente disse: “Não ter visto o cinema de (Satyajit) Ray significa existir no mundo sem ver o sol ou a lua.” Se me permitem, faço o inverso, hoje digo aos amantes da Sétima Arte: Não conhecer o cinema de Kurosawa significa existir no mundo sem nunca ter se deslumbrado com o brilho das estrelas.
"Fiz de mim o que não soube E o que podia fazer de mim não o fiz. O dominó que vesti era errado. Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me. Quando quis tirar a máscara, Estava pegada à cara. Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido." TABACARIA- Álvaro de Campos ( Fernando Pessoa)
Assim que decidi escrever sobre esse filme logo me veio à citação acima por considerá-la uma bela metáfora de toda a essência da obra em questão, por isso deixarei aqui na minha breve caligrafia não só minhas impressões mas também uma depuração individual. Em uma breve contextualização o filme se dá em um templo flutuante situado em um lago. Neste lugar habita um velho monge que quer transmitir seus conhecimentos à seu discípulo lhe mostrando que ele carregará o peso das consequências de seus atos para sempre se não houver um "despertar" verdadeiro do próprio. Sabemos que sol consola nossas chagas porém não as cura, isso, só o tempo pode fazer. Sobrevivemos no limiar de nossa existência e tudo àquilo que nos permeia, por vezes andando na corda-bamba outras tantas dentro do que denominamos de felicidade, buscando sempre um sentido "além". Nossa busca por um "Nirvana" continua sempre presente como meta a ser atingida mesmo que esse "estado de espírito pleno" seja verdadeiro ou não. Adoramos o insubstancial mesmo apegados à matéria. Provamos de dessabores, aromas e ainda assim almejamos transformar o imaterial em "coisa concreta". Tentamos engarrafar momentos em fotografias mesmo sabendo que eles já estão eternizados na mente. Nosso "Karma" se resume em uma tentativa constante de buscar um limbo e muitas vezes nos esquecemos que o tempo é relativo e no fim das contas que cada amanhecer já foi eternizado. Dentro de nossa megalomania perdemos tanto de nossos minimalismos... Segundo Hermann Hesse em seu livro "Sidarta", a vida é como o movimento de um rio, é constante, renovável, cíclica , imortal. Talvez nesse simples pensamento esteja residido o significado de equilíbrio. Afinal precisamos realmente de uma resposta? Ou será que todos esses questionamentos estão respondidos e habitam dentro de nós? Não, não serei eu que cravará algo como verdadeiro. Essa busca é individual, singular, mutável, única. Desculpem se soarei egoísta porém creio que em minha jornada cabe apenas à mim descobrir como preencher minhas lacunas vazias. Acredito dentro de minha individualidade que viver de forma equilibrada é estar em constante sintonia com todos e mesmo com o instante. Tento aceitar com simplicidade tudo que me é imposto! Mesmo o desconhecido, a dor de cada lágrima só afirma há mim que estou vivo! Penso que somos todos colecionadores eu ao menos sei com certeza que sou. Coleciono amores, vitórias, momentos, desamores e também cicatrizes.
Se existe algo que Bergman não falhou foi em nos deixar bem claro que ninguém engana a morte. Podemos adiá-la porém não fugir de nosso destino. Segue o diálogo da ceifadora e do homem na obra:
- Talvez eu a ame. - Talvez você a ame. Vou dizer-lhe uma coisa idiota, amor é uma palavra para luxúria, mais luxúria, trapaça, falsidade e comportamentos idiotas. - Bem, mas isso machuca de qualquer maneira. - O amor é a mais negra das pestes, mas ninguém morre de amor, e quase sempre passa. - O meu não passa. - É claro que passa. Raramente um par de idiotas morre de amor. Se tudo é imperfeito nesse mundo imperfeito então o amor é perfeito nessa perfeita imperfeição. - Que animador. Toda essa conversa e você acredita nas suas tolices. - Quem disse que eu acredito? Sou um sábio. Peça meu conselho e terá em dobro.
O grande sonho/projeto que Leone perseguiu por muito tempo permanece tão vivo no cinema que classificar a dimensão do filme seria uma besteira. O diretor gastou 10 anos pesquisando registros históricos e costumes de uma época, se inspirando na arte de "Degas" ou mesmo na minuciosa exploração das locações nova-iorquinas, compôs um épico atemporal que cativou o mundo. A soberba trilha de seu genial parceiro o maestro Morricone foge as palavras. O elenco é fantástico, a montagem estupenda, tudo aqui é grande. Com esse belo retrato nostálgico de um povo, Leone e cia foram além de esculpir um filme, eles transformaram sonhos e aspirações infantis em uma ópera imagética singular.
Sou fã do Tarantino assumido, acho ele genial, Pulp Fiction é um de meus filmes favoritos, adoro Cães de Aluguel, amo a miscelânea de elementos e referências que ele faz em Kill Bill, acho Jackie Brown um filme subestimado, vejo À Prova de Morte sendo bem mal incompreendido por alguns, considero Bastardos Inglórios uma obra-prima, Django sempre cai um pouco há cada revisão. Achei os 8 Odiados bom, OK! Não achei uma "masterpiece". E vou tentar fazer uma análise fria aqui do que me incomodou no filme, lembrando essa é apenas minha opinião.
PONTOS POSITIVOS:Eu me diverti, ri em determinadas partes afinal os diálogos são afiados e bons. O filme começa com uma imagem até emblemática que quando a câmera vai se abrindo faz da dualidade do símbolo genial, daí pensei lá vem coisa foda daí. A trilha do Ennio Morricone é sempre um ponto positivo, muito boa e bem acertada. Os atores estão bem, o elenco é incrível e reconheço toda a crítica social do filme em relação ao seu próprio país quando bem executada.
PONTOS NEGATIVOS: O primeiro arco do filme é fantástico e te aguça à querer mais e mais no entanto do segundo arco pra frente existem coisas que me incomodaram demais suplantando até os pontos que eu havia achado geniais. O ritmo destoa muito, e se faz arrastado em certos momentos e um cara do quilate do Taranta poderia cortar algumas gorduras e ser mais incisivo aqui. Eu amo filmes que tenham uma pegada "trash" desde que eu encare isso como a proposta da obra e que faça jus ao contexto, por exemplo, adoro "Planeta Terror" do Robert Rodriguez, só que em "8 Odiados" existe uma escatologia em certas cenas que não dialogaram comigo, justamente por achá-las forçadas demais em certos pontos. Achei o filme de uma claustrofobia incomoda demais. É como se a trama largasse em primeiro há 100 por hora porém freia bruscamente no meio do caminho. Entendo que talvez ele tenha premeditado uma virada no tabuleiro das expectativas atrás de uma boa quebra, porém achei frustrante, não funcionou comigo. Sabemos que para fazer um filme na pegada "Rashomon" deve ser feito de modo meticuloso, algo que ele já fez muito bem inclusive em Cães de Aluguel. Não acho que ele se repete aqui, afinal ele tem uma marca definida, porém acho que ele tem confiado demais em velhos jargões que o elevaram onde ele está e que em excesso acabam atrapalhando o andar da carruagem. Ele (Tarantino), é mestre em fazer piadas inteligentes com significados dúbios e até profundos se analisados a fundo, só que aqui, alguns posicionamentos dele mesmo sobre as incoerências de seu país as vezes soam artificiais te deixando perdido por não conseguir captar se ele realmente quer chegar em algum lugar com isso ou se é mera provocação que não levará à nada.Exemplo: de cara ele já solta uma provocação direta entre a rusga dele e do Spike Lee em Django. Isso funciona? Sim funciona. Pode ser contestado? Sim pode ser contestado. E nós sabemos que assim como Spike o "queixada" também não tem papas na língua e não me surpreenderia se tal piada houvesse sido feita apenas por sua mera diversão.
Por fim, como fã dele, espero que ele se depure de alguma outra forma que não essa. Temo que ele esteja indo assim como Guillermo del Toro para o mesmo nicho que Tim Burton se enfiou. Essa é apenas minha opinião. Vida que segue e seu sigo fã do Taranta apesar dos pesares.
Educação Sentimental
3.4 32" Um filme, uma película, isto hoje tem um valor arqueológico, estará em breve no museu das sensibilidades perdidas".
Silêncio
3.8 576Fiquei receoso ao perceber que o filme "Silence" não havia sido lembrado no Oscar em vários quesitos técnicos - não que a Academia seja um padrão de qualidade sempre-, mas sim pelo histórico do diretor na competição. Após rever, maturar algumas coisas, notei que Scorsese apesar dos problemas que encontrou pelo caminho para bancar esse projeto idealizado durante 10 anos, fez uma obra que há muito ele buscava de uma maneira totalmente oposta do esperado, subvertendo até às expectativas de seu mais fiel público. Resultado: o cineasta não só conseguiu fazer um lindo trabalho, mas foi além do imaginado! Ele fez um épico bem intimista, transcendendo o próprio padrão Hollywoodiano do qual sempre fez parte, transformando o filme em uma experiência única e que foge de qualquer convencionalismo mercadológico "Made in USA". De uma forma corajosa, se redefinindo de maneira imersiva e com um forte cunho autoral, filosoficamente o diretor se depurou e acabou por nos brindar mais uma vez com uma colossal e tocante Obra-prima. Acredito que toda essa saga do autor atrás de seu sonho tenha valido a pena, afinal como já diria um ditado oriental: "A flor perfeita é rara! Pode se passar a vida esperando, e ainda assim não seria um desperdício..."
Quando Éramos Reis
4.3 30O atleta mais icônico do mundo!!
Loving: Uma História de Amor
3.7 292 Assista AgoraImpressionante direção de Nichols que soube usar bem de tudo que dispunha, todas suas características, nos entregando com isso, talvez, seu melhor trabalho até o momento. Emula bem à época e toda sua atmosfera, pontua de forma precisa à trilha com o desenvolvimento da trama - em especial em seus ápices -, emprega um ritmo que não oscila, contando ainda com uma linda fotografia.
As personagens dizem muito mais em suas intenções/olhares/gestos que nas palavras em si, expondo os sentimentos de dentro pra fora, foge de diálogos histriônicos e mantém-se equilibrado(a) o tempo todo. O filme em primeira instância parece 'simples' e no entanto é extremamente complexo, e é aí onde reside seu real triunfo.
Uma verdadeira pérola.
Lavoura Arcaica
4.2 381 Assista Agora- "Na modorra das tardes vadias da fazenda, era num sítio, lá no bosque, que eu escapava aos olhos apreensivos da família. Amainava a febre dos meus pés na terra úmida, cobria meu corpo de folhas e, deitado à sombra, eu dormia na postura quieta de uma planta enferma, vergada ao peso de um botão vermelho. Não eram duendes aqueles troncos todos ao meu redor velando em silêncio e cheios de paciência o meu sono adolescente? Que urnas tão antigas eram essas liberando as vozes protetoras que me chamavam da varanda?
De que adiantavam aqueles gritos se mensageiros mais velozes, mais ativos, montavam melhor o vento, corrompendo os fios da atmosfera? Meu sono, quando maduro, seria colhido com a volúpia religiosa com que se colhe um pomo. E me lembrei que a gente sempre ouvia nos sermões do pai que os olhos são a candeia do corpo. E, se eles eram bons, é porque o corpo tinha luz. E se os olhos não eram limpos é que eles revelavam um corpo tenebroso.
- As venezianas...Por que as venezianas estão fechadas?
- Não se constranja, meu irmão. Encontre logo a voz solene que você procura. Pergunte logo o que acontece comigo desde sempre. Me desconforme depressa a cara! E quebre contra os olhos a velha louça lá de casa.
Eram esses os nossos lugares à mesa na hora das refeições ou na hora dos sermões: O pai à cabeceira; à sua direita, por ordem de idade, vinham primeiro Pedro, seguido de Rosa, Zuleika e Huda; à sua esquerda vinha a mãe, em seguida eu, Ana e Lula, o caçula. O galho da direita era um desenvolvimento espontâneo do tronco, desde as suas raízes. Já o da esquerda trazia o estigma de uma cicatriz, como se a mãe, que era por onde começava o segundo galho, fosse uma anomalia, uma protuberância mórbida, pela carga de afeto."
A Espinha do Diabo
3.8 350 Assista Agora"O que é um fantasma? Uma tragédia condenada a repetir-se vezes sem conta? Um instante de dor, talvez. Algo morto que parece estar vivo. Uma emoção, suspendida no tempo. Como uma fotografia desfocada. Como um inseto preso em âmbar."
Disparo para Matar
3.7 15"O que acontece quando os ovos da cobra abrem dentro do seu corpo? Os filhotes comem as suas entranhas por dentro."
Jornada ao Oeste
3.8 20Mais uma vez o brilhante e nada convencional cinema do malaio Tsai Ming-Liang me fez parar, pensar e refletir através de sua arte.
O filme não é longo, acredito que talvez até se categorize como um média-metragem, no entanto, acompanhar o percurso do monge andando em "slow motion", questiona até mesmo o conceito de "tempo" em nosso cotidiano.
Há medida que a trama se desenrolou com sua cadência lenta, me peguei louco querendo que o filme acaba-se, talvez até por um imediatismo cultural, algo que lógico, só acrescenta quando decidimos parar para pensar sobre o que estamos vendo e nos questionamos de onde vêm tais ânsias? Por quê de tanta pressa sempre?
É interessante notar que os marselheses tão absortos em suas questões, sequer se dão conta da performance que lhes permeia, assim talvez como nós ocidentais por andarmos tão acossados, frequentemente deixamos de nos importar ou mesmo perceber tantas raridades do dia a dia. "Jornada ao Oeste" foi talvez, à obra relativamente mais longa e enriquecedora que já pude presenciar em um filme desa década. Dado certa altura, decidi embarcar na experiência, exercitei deixar minhas aflições de lado e contemplar verdadeiramente algo de bem significativo, minuto pós minuto...
Um exercício único, que marca e transcende quem decide se aventurar nessa jornada. Uma obra que atinge o âmago do "questionar" sem ser raso, utilizando apenas o poder imagético. Ah, lógico, o filme exige colaboração do espectador; ou vice-versa sei lá, afinal, até mesmo o ritmo do "nosso caminhar" pode ser encarado de forma relativa...
Nada de Mau Pode Acontecer
3.8 100Oloko que Pancada!!
Esquadrão Suicida
2.8 4,0K Assista AgoraQUERIA TER DESVISTO.
A Harpa da Birmânia
4.3 35"Um oásis de horror em meio a um deserto de tédio."
Charles Baudelaire
É sempre impressionante notar em quais lugares e situações a arte pode florescer como um acalento da alma. Entre fuzis, sangue, tristeza, ódio, um dedilhar de cordas pode fazer uma grande diferença, trazendo consigo um um pouco de esperança e sobretudo beleza. São em situações críticas de extrema brutalidade que homem aqui e ali vomita de dentro de si uma rara sutileza como se pedisse socorro do seu ofício de odiar e guerrear. Tendo a guerra e toda sua consequente barbárie como pano de fundo é tocante observar que um único acorde pode suscitar um abaixar de espadas, um instante de pureza.
Aqui entre o desejo de soldados que almejam ter um final como os cavalos os cavalos árabes que morrem olhando pro céu, entre lágrimas, clamores e brutalidade você encontrará música; e com isso quem sabe, observará que o canto é um lamento do espírito. Nós cantamos quando sentimos saudades de algo ainda por decifrar.
Babar, Rei dos Elefantes
3.6 4Caraca eu tinha o VHS disso! Tô ficando velho. hehe
Sword of the Stranger
4.2 69 Assista AgoraAchei bem massa, porém enxerguei os personagens bem clichês e uma trama que não se destaca.
Já as cenas de luta são fantásticas.
Capitão América: Guerra Civil
3.9 2,4K Assista AgoraGuardiões da Galáxia - foi o mais arrojado e meu preferido do estúdio.
Homem Formiga - Sim! Eu sou um dos poucos que amam esse filme - por sua ousadia visual, seu estilismo bem original e por sua coragem.
Capitão América: Guerra Civil - emula uma série de fatores - um monte de personagens que são amarrados em um roteiro esmerado em um o tom é certo que tateia entre o cômico e o 'sombrio' - proporcionando assim entretenimento e diversão de primeira para um público que pode ir de A a Z. Sendo lúcido, todo esse agregado de valores em um resultado final tornem este o melhor filme da Marvel até agora.
O Filho de Saul
3.7 254 Assista AgoraDesde que Hitler e toda sua cúpula, Goebbels/ Himmler/Göring e aquéns perpetuaram mundo afora sua barbárie desmedida na Segunda Grande Guerra o mundo se viu assombrado. Tomadas as devidas proporções sempre nos vimos sobre as garras do pior que nossa espécie pode ensejar, passados Perón, Pinochet, Mussolini e tantos outros achávamos que não seriamos mais vítimas das armadilhas passadas, porém fomos obrigados à presenciar Slobodan e tantos outros que mesmo diante de tantos avanços insistem em repetir episódios tão macabros sobre novas máscaras e transvestidos com outros nomes e outras ideologias.
Não faz muito tempo nos vimos ajoelhados com aquela refugiada criança em uma praia turca. Naquele dia, todos fomos enterrados naquela encosta praieira.
O novo filme húngaro ganhador do Oscar de Melhor filme estrangeiro suscita em nós tudo àquilo do qual queremos esquecer mas não devemos.
O iniciante diretor László Nemes nos entrega uma preciosa obra ministrada com maestria.
A sinopse já nos entrega que o filme se dá em um campo de concentração onde a personagem Saul encontra o corpo de seu filho e quer apenas o direito de enterrá-lo segundo as tradições judaicas. László Nemes coloca tudo em evidência porém desfoca imagens e situações subsequentes através do Deep Focus sublimando com isso que horror borrado seja completado pelo espectador. Sua narrativa não utiliza nenhum subterfúgio de trilha sonora exatamente para nos remeter há uma crueza constante. Sua câmera não tenciona parar justamente buscando nos levar à exaustão.
Em determinado ponto da trama vários pontos são colocados em xeque só que isso já não mais importa, saber ou não à veracidade da relação de Saul com seu suposto filho não é mais o mote central. Ali onde jaz o horror da guerra é necessário uma esperança do qual se agarrar.
Por fim em um clímax devastador, Saul vê a esperança no seu algoz personificado em uma criança que naquele acontecimento representava toda a antítese de sua fuga e que no entanto não deixou por sua vez de ser uma criança fugitiva, acuada...
Exercícios ainda que duros como esse nunca serão demais, jamais serão datados, um filme como esse expõe nossas chagas ao sol. Ao fim nos traz uma reflexão de nossa condição e de nossos paradoxos; sabemos que nossa raça é capaz de feitos incríveis como até mesmo mandar um homem para a Lua, porém, até hoje não conseguimos controlar nossos corações...
Chinatown
4.1 635 Assista AgoraDono com certeza de um dos maiores roteiros já feitos, somado há isso a direção imprimida por Polanski com sua maestria e elegância fazem dessa obra um marco sem precedentes. O elenco caminha em perfeita harmonia. Faye Dunaway se apresenta no começo como uma "femme fatale" fria, porém com o decorrer da trama podemos enfim compreender sua inicial apatia exposta principalmente em sua expressão "poker face", assim por consequência conseguimos entender sua gélida figura que carrega dentro de si demônios e silêncios infindáveis. Como de costume e marca registrada de Polanski, o filme tem uma aura que te traga pra dentro da trama ou te leva onde bem quer gerando com isso um misto de emoções e surpresas. Mesmo que histriônica tal obra acerta um limiar que tantas outras obras minguaram buscando encontrar. Em suma, a obra pode não ser perfeita para muitos, porém dentro do gênero ela acerta na exatidão em ser ousada sem se perder, resultando portanto em um sutil equilíbrio raro de se ver. No fim entendemos que Chinatown sempre foi um caminho sem volta impossível de fugir.
Um Tiro na Noite
3.9 236 Assista AgoraPra quem gosta de Antonioni, Hitchcock, referências à lá Tarantino e metalinguagem, tal filme se faz obrigatório.
Aqui De Palma atinge seu ápice.
Desde o título que faz clara referência à Blow-Up, o diretor emula filmes de diversos gêneros e mestres, mesclando toda forma e conteúdo em um filme exuberante. Flerta com "Rashomon" do gigante Kurosawa, traz para si claras referências de Psicose e Vertigo para compôr assim talvez sua Obra-prima.
Se o termo Blow-Up é designado enquanto técnica fotográfica, Blow-Out é uma técnica de captação sonora. Cheio de planos-sequências exuberantes, o filme é um ode de amor ao cinema. Uma aula de edição e mixagem de som. Fora termos técnicos por mim citados, o filme não é complexo nem mesmo maçante. A narrativa é didática e consegue nos envolver do início ao fim como nos áureos filmes de Fincher. É uma história investigativa, misteriosa, instigante, dona de um roteiro brilhante e um desfecho genial.
Aos amantes da sétima arte, recomendo fortemente.
Uma verdadeira aula de cinema em vários sentidos.
Rashomon
4.4 301 Assista AgoraQuando começaram as gravações do filme o elenco perguntou a Kurosawa "o que é isso? Do que se trata?" O diretor prontamente respondeu: " é um reflexo da vida, e a vida nem sempre têm significados claros."
Kurosawa vivia pressionado pelo estúdio pelo alto custo de suas produções, afinal fazia filmes asiáticos inspirados em Shakespeare, Dostoiévski, nos Westerns de John Ford e toda essa mescla colossal acabava extrapolando os valores dispostos pelos estúdios japoneses que não dispunham de um orçamento Hollywoodiano.
Assim, Akira decidiu que sua próxima obra seria mais minimalista, seria baseada na fusão de 2 contos populares e se daria em um único cenário.
Meses adentro elaborando Storyboards de um lirismo artístico invejável, o templo "Rashomon" fora construído o elenco escolhido e as filmagens teriam início, o que mundo e toda à equipe envolvida no projeto desconheciam é que aquele filme mudaria a história do cinema para sempre.
Kurosawa declara em sua biografia que salgou toda a floresta pois as lesmas eram muito incomodas e um verdadeiro empecilho estético, espalhou espelhos adentro da relva para captar a iluminação natural que tanto exigia, afinal a noção da passagem de tempo aqui é demonstrada em sombras e através do vento. Tingiu com tinta preta a água da produção para que a chuva torrencial se destaca-se como queria, pois no fim da película almejava fazer com que a visão de um céu limpo fosse um símbolo esperança,com isso, sem querer, pela primeira vez na história da Sétima Arte, o Sol foi filmado em sua totalidade fazendo com isso algo histórico.
Kazuo Miyagawa diretor de fotografia após toda essa odisseia ainda aguardou por duas semanas para captar um único fleche de luz na cena em que a Gueixa deixa seu rosto transparecer para Toshiro Mifune, que por sua vez interpreta um samurai que é baseado em uma lenda oriental, por isso todos seus trejeitos bufonescos que destoam do resto do desempenho do elenco são milimetricamente intencionais.
Nessa história, nosso papel é o de júri, nós como espectadores não fazemos nada além de ouvir diversas versões de um mesmo acontecimento. Kurosawa não conhecia Cidadão Kane quando pensou nessa narrativa repleta de flashbacks, por uma questão claramente meridional.
Sem que o diretor tivesse conhecimento, o estúdio enviou seu filme para o festival de Veneza onde conquistou o Leão de Ouro. Com tamanha exposição e tamanha grandeza, a Academia do Oscar decidiu criar a premiação para filmes estrangeiros, sendo Rashomon o responsável e primeiro vitorioso com isso.
O mundo agora conhecia Kurosawa e seus feitos que por muito tempo permaneceram escondidos. Rashomon por sinal, se tornou uma terminologia para designar o efeito de várias versões sobre um mesmo fato, sendo utilizado não só no cinema como até na psicologia. Ilustrando rapidamente, o último filme de Fincher, "Garota Exemplar", faz uso do "efeito Rashomon" em sua trama.
Herzog já declarou que esse é o filme perfeito. Se é perfeito, não sei. Mas é um dos maiores ápices cinematográficos que se tem notícia.
Por fim, li certa vez uma declaração de Kurosawa em relação a um grande diretor indiano, onde poeticamente disse: “Não ter visto o cinema de (Satyajit) Ray significa existir no mundo sem ver o sol ou a lua.”
Se me permitem, faço o inverso, hoje digo aos amantes da Sétima Arte: Não conhecer o cinema de Kurosawa significa existir no mundo sem nunca ter se deslumbrado com o brilho das estrelas.
Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera
4.3 377"Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido."
TABACARIA- Álvaro de Campos ( Fernando Pessoa)
Assim que decidi escrever sobre esse filme logo me veio à citação acima por considerá-la uma bela metáfora de toda a essência da obra em questão, por isso deixarei aqui na minha breve caligrafia não só minhas impressões mas também uma depuração individual.
Em uma breve contextualização o filme se dá em um templo flutuante situado em um lago. Neste lugar habita um velho monge que quer transmitir seus conhecimentos à seu discípulo lhe mostrando que ele carregará o peso das consequências de seus atos para sempre se não houver um "despertar" verdadeiro do próprio.
Sabemos que sol consola nossas chagas porém não as cura, isso, só o tempo pode fazer.
Sobrevivemos no limiar de nossa existência e tudo àquilo que nos permeia, por vezes andando na corda-bamba outras tantas dentro do que denominamos de felicidade, buscando sempre um sentido "além". Nossa busca por um "Nirvana" continua sempre presente como meta a ser atingida mesmo que esse "estado de espírito pleno" seja verdadeiro ou não. Adoramos o insubstancial mesmo apegados à matéria. Provamos de dessabores, aromas e ainda assim almejamos transformar o imaterial em "coisa concreta". Tentamos engarrafar momentos em fotografias mesmo sabendo que eles já estão eternizados na mente. Nosso "Karma" se resume em uma tentativa constante de buscar um limbo e muitas vezes nos esquecemos que o tempo é relativo e no fim das contas que cada amanhecer já foi eternizado. Dentro de nossa megalomania perdemos tanto de nossos minimalismos...
Segundo Hermann Hesse em seu livro "Sidarta", a vida é como o movimento de um rio, é constante, renovável, cíclica , imortal.
Talvez nesse simples pensamento esteja residido o significado de equilíbrio.
Afinal precisamos realmente de uma resposta? Ou será que todos esses questionamentos estão respondidos e habitam dentro de nós? Não, não serei eu que cravará algo como verdadeiro. Essa busca é individual, singular, mutável, única. Desculpem se soarei egoísta porém creio que em minha jornada cabe apenas à mim descobrir como preencher minhas lacunas vazias.
Acredito dentro de minha individualidade que viver de forma equilibrada é estar em constante sintonia com todos e mesmo com o instante. Tento aceitar com simplicidade tudo que me é imposto! Mesmo o desconhecido, a dor de cada lágrima só afirma há mim que estou vivo! Penso que somos todos colecionadores eu ao menos sei com certeza que sou.
Coleciono amores, vitórias, momentos, desamores e também cicatrizes.
O Mar de Árvores
3.3 92 Assista AgoraEsperando esse filme deixar de ser lenda...
Ave, César!
3.2 311 Assista AgoraObra-Prima! Agora só falta eu ver o filme.
O Sétimo Selo
4.4 1,0KSe existe algo que Bergman não falhou foi em nos deixar bem claro que ninguém engana a morte. Podemos adiá-la porém não fugir de nosso destino.
Segue o diálogo da ceifadora e do homem na obra:
- Talvez eu a ame.
- Talvez você a ame. Vou dizer-lhe uma coisa idiota, amor é uma palavra para luxúria, mais luxúria, trapaça, falsidade e comportamentos idiotas.
- Bem, mas isso machuca de qualquer maneira.
- O amor é a mais negra das pestes, mas ninguém morre de amor, e quase sempre passa.
- O meu não passa.
- É claro que passa. Raramente um par de idiotas morre de amor. Se tudo é imperfeito nesse mundo imperfeito então o amor é perfeito nessa perfeita imperfeição.
- Que animador. Toda essa conversa e você acredita nas suas tolices.
- Quem disse que eu acredito? Sou um sábio. Peça meu conselho e terá em dobro.
Era uma Vez na América
4.3 530 Assista AgoraO grande sonho/projeto que Leone perseguiu por muito tempo permanece tão vivo no cinema que classificar a dimensão do filme seria uma besteira.
O diretor gastou 10 anos pesquisando registros históricos e costumes de uma época, se inspirando na arte de "Degas" ou mesmo na minuciosa exploração das locações nova-iorquinas, compôs um épico atemporal que cativou o mundo.
A soberba trilha de seu genial parceiro o maestro Morricone foge as palavras.
O elenco é fantástico, a montagem estupenda, tudo aqui é grande.
Com esse belo retrato nostálgico de um povo, Leone e cia foram além de esculpir um filme, eles transformaram sonhos e aspirações infantis em uma ópera imagética singular.
Os Oito Odiados
4.1 2,4K Assista AgoraSou fã do Tarantino assumido, acho ele genial, Pulp Fiction é um de meus filmes favoritos, adoro Cães de Aluguel, amo a miscelânea de elementos e referências que ele faz em Kill Bill, acho Jackie Brown um filme subestimado, vejo À Prova de Morte sendo bem mal incompreendido por alguns, considero Bastardos Inglórios uma obra-prima, Django sempre cai um pouco há cada revisão. Achei os 8 Odiados bom, OK! Não achei uma "masterpiece".
E vou tentar fazer uma análise fria aqui do que me incomodou no filme, lembrando essa é apenas minha opinião.
PONTOS POSITIVOS:Eu me diverti, ri em determinadas partes afinal os diálogos são afiados e bons. O filme começa com uma imagem até emblemática que quando a câmera vai se abrindo faz da dualidade do símbolo genial, daí pensei lá vem coisa foda daí. A trilha do Ennio Morricone é sempre um ponto positivo, muito boa e bem acertada. Os atores estão bem, o elenco é incrível e reconheço toda a crítica social do filme em relação ao seu próprio país quando bem executada.
PONTOS NEGATIVOS: O primeiro arco do filme é fantástico e te aguça à querer mais e mais no entanto do segundo arco pra frente existem coisas que me incomodaram demais suplantando até os pontos que eu havia achado geniais. O ritmo destoa muito, e se faz arrastado em certos momentos e um cara do quilate do Taranta poderia cortar algumas gorduras e ser mais incisivo aqui. Eu amo filmes que tenham uma pegada "trash" desde que eu encare isso como a proposta da obra e que faça jus ao contexto, por exemplo, adoro "Planeta Terror" do Robert Rodriguez, só que em "8 Odiados" existe uma escatologia em certas cenas que não dialogaram comigo, justamente por achá-las forçadas demais em certos pontos. Achei o filme de uma claustrofobia incomoda demais. É como se a trama largasse em primeiro há 100 por hora porém freia bruscamente no meio do caminho. Entendo que talvez ele tenha premeditado uma virada no tabuleiro das expectativas atrás de uma boa quebra, porém achei frustrante, não funcionou comigo. Sabemos que para fazer um filme na pegada "Rashomon" deve ser feito de modo meticuloso, algo que ele já fez muito bem inclusive em Cães de Aluguel. Não acho que ele se repete aqui, afinal ele tem uma marca definida, porém acho que ele tem confiado demais em velhos jargões que o elevaram onde ele está e que em excesso acabam atrapalhando o andar da carruagem. Ele (Tarantino), é mestre em fazer piadas inteligentes com significados dúbios e até profundos se analisados a fundo, só que aqui, alguns posicionamentos dele mesmo sobre as incoerências de seu país as vezes soam artificiais te deixando perdido por não conseguir captar se ele realmente quer chegar em algum lugar com isso ou se é mera provocação que não levará à nada.Exemplo: de cara ele já solta uma provocação direta entre a rusga dele e do Spike Lee em Django. Isso funciona? Sim funciona. Pode ser contestado? Sim pode ser contestado. E nós sabemos que assim como Spike o "queixada" também não tem papas na língua e não me surpreenderia se tal piada houvesse sido feita apenas por sua mera diversão.
Por fim, como fã dele, espero que ele se depure de alguma outra forma que não essa. Temo que ele esteja indo assim como Guillermo del Toro para o mesmo nicho que Tim Burton se enfiou. Essa é apenas minha opinião. Vida que segue e seu sigo fã do Taranta apesar dos pesares.