Susan Sontag deveria estar numa bad trip lesbo-sádica para considerar genial este autor, tendo em vista esta obra, principalmente, não sei as outras, mas sendo um longa, esta assume uma importância representativa. Trata-se de um delírio misógino hospitalar que expõe gratuitamente o corpo feminino em toda sua potencialidade escatológica de situações animalescas (menstruação, micção, tortura, devir leoa domada, etc.). A meu ver, existe uma indulgência crítica absurda com esse autor, que merece sim o limbo estético que amarga. E essa recepção negativa não tem nada a ver com um choque moralista da minha parte, mas sim com uma crítica a um paradigma contemporâneo degradante que desloca toda a fruição da obra em seus elementos intrínsecos a um excesso de mediação e preocupação com as questões externas que ela provoca. E mesmo partindo desse paradigma, a obra não consegue uma consistência que a transcenda nem apresenta em si estímulos e não comporta questões de relevo que possam evocar mitos e taras (o contraste genital feminino-masculino e sua posição no mundo natural, o útero-oceano, a vagina-peixe, o falo-hockey, o falo-salto-alto) nem despertam, nem confrontam ideologias que confirmam posições sociais para alguns entusiastas poderem apenas sublinhar a posição da obra no rol do cinema experimental, video arte ou aproxima-la de obras de artistas da performance/ body art. É uma versão degradada de um combo que mistura stalker/ilsa/sweet movie em um campo de concentração experimental para degradar e fetichizar o corpo feminino. Nem o alto contraste fotográfico salva esse filme. Um embuste.
"O que me fascinou na primeira vez que vi uma axolote, foi sua imobilidade completa...e eu logo acreditei ter entendido o seu desejo secreto: Negar o espaço e o tempo, em uma quietude indiferente. Elas pareciam estar espionando algo, algum reino remoto já há muito extinto, um tempo de distanciamento e de uma liberdade absolutos...em que o mundo pertencia aos axolotes."
É mais um filme louco de Carmelo Bene, este uma adaptação de Hamlet visualmente exuberante na cenografia, datado com muita misoginia sexista de velho italiano tarado, mas apresenta uma proposta interessante de cinema ensaístico com paralelos freudianos do complexo de Épipo, flertando com metalinguagem teatral e múltiplas referências, até com a Ofelia de Millais
A forma como o filme é conduzida dá a entender que planeja uma reconstituição contemplativa dos últimos dias de Benjamin, partindo-se de uma deambulação incessante e alguns momentos concentrados de pensamentos do autor, mas Benjamin acaba sendo um pretexto para uma instalação voyeurística dos percursos de um personagem exilado nos montes Pireneus. O diretor aprofunda um Benjamin melancólico e inexpressivo e antevê a desolação suicida do autor e, de um certo modo, fiel ao seu pensamento, incrustando-o na paisagem da fronteira espacial, metáfora da margem historiográfica que Benjamin refletia, avesso a um atravessamento revolucionário (evocando em algum momento, Auguste Blanqui, uma inspiração das Comunas de Paris). A inviabilidade da existência do autor no exílio fica evidente na condução do filme, onde os grandes momentos de vivacidade e arroubos filosóficos são realizados em interiores (na biblioteca, no esconderijo) e reservando ao exterior uma natureza muda e desinteressante. Atendo-se aos elementos intrínsecos ao filme, quem não conhece a obra do filósofo, não se sentirá encorajado a fazê-lo, é um filme para iniciados em seu destino desolador.
Um dos filmes mais complexos dramaticamente de Kaurismaki. Intromete-se na pauta do exílio interior/exterior para proporcionar uma reflexão e situações extremamente ricas de afeto e envolvimento num recomeço da vida. Podem me chamar de sádico ou doente, mas a cena inicial da surra foi absolutamente genial e precisa para introduzir o exílio do personagem, particularmente na concepção de Kaurismaki dos requintes de crueldade para os personagens: a inserção da máscara de soldador, como referência e pista do passado do personagem, assim como da música, dá início a uma epopeia em busca de si mesmo e sua reinvenção. A cena da libertação do hospital, se já não fosse suficiente a violência do episódio da surra, choca em sua erupção de vida de um rosto desfigurado. Aqui, como no último filme, O outro lado da esperança, os marginais e a classe operária se vingam dos agressores, em busca de redenção.
Meu favorito da fase mais recente de Kaurismaki. Aqui ele equilibra o teor dramático de verossimilhança, nem pesa demais como em A Garota da Fábrica, nem amolece e enternece demais como em O Porto. Não há um final feliz aqui, mas sim final provável dentro das circunstâncias de um personagem inexpressivo, que não consegue organizar seus afetos ou emoções, que prefere um sofrimento absurdo para poupar o ente amado e não enxergar quem se importa com ele de fato. O uso das cores saturadas no filme contrasta com o monossilabismo e a inexpressividade do vigilante.
O escritor Marcel Marx de La Vie De Bohème está de volta nesse filme relativamente recente de Kaurismaki, o qual, como lhe é de costume, quase sempre arranja uma solução otimista de modo abrupto como estratagema para contornar o sofrimento dos personagens. Neste ele apelou para o regime dos milagres e de um humanismo esperançoso que invade os personagens mais desumanizados, um policial. Mas Kaurismaki também é exagero em grande parte de sua obra, se a desolação transborda em A Garota da Fábrica, aqui ela poupa demasiadamente a personagem de Kati Outinem e as perdas de Marcel Marx no longa anterior. A fotografia deste filme é suntuosa.
Contando com o próprio Jean Cocteau para a adaptação do romance, consegue, dentro dos méritos do imaginário do próprio Franju, uma das sequências mais surrealistas do pesadelo da guerra, o cavalo em chamas e outras imagens que atormentam a sanidade do espectador e que só iguala ao horror onírico de Vá e Veja de Klimov.
É uma trama demasiadamente humana, em sua narrativa de hesitações perpetuadas por um casal que absorve o personagem solitário de Simon, sobre o pano de fundo de uma paisagem tarkovskianamente bucólica (a igreja do padre enterrado na parede, o lago, a casa dos pais com suas conservas e compotas). Viktor é um personagem que carece da presença de Simon para descontar sua frustração com a infertilidade que afronta o casal, assim como Maria usa Simon para compensar as agressões de Viktor, a qual é naturalizada pela própria, intuindo uma razão para manter esse jogo que é extrapolado a um terceiro que adentra a conjugalidade dos dois. O que tem em um comum os três personagens? o medo da solidão e o apego às relações mais hostis como se fossem a única perspectiva possível que lhes resgata a humanidade (conforme disse Simon: eu apenas sinto, não disse que preciso estar contente).
"Quem, nós ? Existem mil maneiras de se sentir fora do direito comum. A maneira mais radical de questionar a moralidade, a ordem social aceita, é sempre a que se enraíza na noite do corpo: a heterodoxia sexual. Mas este romance é acima de tudo uma história de amor, tão simples e terrível quanto qualquer outra história de amor. Um pouco mais difícil, só isso." -- Jean-Louis Bory, La Peau des zèbres.
Impressionado como o cinema taiwanês consegue extrair tanta singeleza da precariedade, o bonecão do filho, a concha com o desenho do buda, a menina tímida e os caras da panela de pressão e a contemplação de uma maçã. Tem uma leveza de pluma na tenra infância, como se fosse um filme juvenil ou um desenho animado com alguma complexidade pé no chão que passava na TV Cultura.
Moral da história: os índios fazem as viagens ao pré-ser, sossegados, sem o fanatismo pela ciência e isentos do fanatismo pela vida doméstica e do amor romântico.
Genial. Uma curiosidade: o retrato que Klaus retira da parede é de Urho Kekkonen, presidente da Finlândia no período 1956–82. Este retrato também aparece no longa sucessor, Ariel 1988, o personagem de Taisto realiza a ação oposta, pendura-o na parede do abrigo.
“Meu bom cão, meu cachorrinho, querido Totó, chegue- se e venha respirar um excelente perfume comprado no melhor perfumista da cidade.” E o cão, agitando a cauda, o que é, creio eu, nesses pobres seres, o sinal correspondente a um sorriso ou riso, aproximou-se e pousou curiosamente seu focinho úmido sobre o frasco destampado; em seguida, recuando subitamente, com medo, latiu contra mim como se me reprovasse. “Ah! miserável cão, se eu tivesse lhe oferecido um pacote de excrementos, você o teria farejado com prazer e talvez até devorado. Assim você mesmo, indigno companheiro de minha triste vida, você se parece com o público a quem não se pode jamais presentear com perfumes delicados que o exasperam mas com sujeiras cuidadosamente escolhidas.”
(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos poemas e prosa. Rio de Janeiro, José Olympio, 1950 – trad. Aurélio Buarque de Hollanda. p. 25)
A estrutura narrativa, a fotografia e o retrato desolador dos camponeses em Raiva lembrou-me o Cavalo de Turim, de Béla Tarr, ao começar de trás para frente, com a monotonia do preto e branco com várias sequência da rotina de refeição, os planos gerais de paisagem e a precariedade da subsistência camponesa. O contexto retratado no filme pode associar um sul português ao sertão brasileiro do Cinema Novo (Vidas secas, especialmente) que reforça um naturalismo das interpretações e das paisagens opressivas.
Mastroianni arrebatador na discussão de Mersault com o promotor cristão e o capelão; a paisagem sonora da flauta do árabe no cárcere é perturbadora como a presença do sol no livro (e no filme).
Um conto de fadas surrealista ou um olhar expandido de criança que produz um mundo encantado dos adultos. É como se sentir um intruso bem acolhido nas visitas esporádicas na casa de uma avó num recanto bucólico ou estranhar e perceber um mundo infinito de possibilidades imaginárias no lar, um eterno retorno ao surpreendimento do costumeiro, depois do exílio no mundo dos adultos. O unicórnio, o rato e Lily são presenças forasteiras no mundo rotineiro de uma fazenda, assim como a guerra é um pesadelo para a rotina dos adultos. As crianças, os animais, a senhora bruxa dos olhos esbugalhados e os irmãos representam aquela família que você não vê há muito tempo enquanto a guerra acontece lá fora.
Um filme de gênero repleto de obviedades falocêntricas (o mocinho tem uma mocinha à espera, os garotos do fundão vão atrás de aventura e são o ideal de masculinidade e humilham os freaks) que ensina a não subestimar os freaks (a gangue do Snow, o japonês) e é visualmente esplendoroso, especialmente Grace Jones como Katrina.
Genial e hitchcockiano - os gatos foram treinados por Ray Berwick, responsável também pelos animais de "Os Pássaros" de Alfred Hitchcock e tem o mesmo roteirista foi de psicose, Joseph Stefano.
Um deleite visual, musical, coreográfico a cada quadro e sequência. A partir da narrativa de Jakob Von Gunten, os Irmãos Fray organizaram uma encenação coreográfica e musical, um espetáculo para a trama de Robert Walser na qual se inspira, sem reproduzi-la, mas antes uma deriva poética partindo do motivo do Instituto dos irmãos Benjamenta, como uma escola de empregados que ensina a servidão e o êxodo rural do personagem de Jakob como uma transgressão e uma iluminação para a vida liberta a ponto de fechar o instituto. Diferentemente do diário do personagem no livro de Walser, que é uma apologia ao mundo das mesquinharias e do servilismo, o filme prefere dar vazão ao acaso, ao que não se controla, às consequências que divergem dos atos e intencionalidades dos personagens (o culto e o ensino da servidão). O filme prefere apanhar das beiradas e sugestões do livro, direcionado o norte da narrativa na corporalidade dos atores em dança frequente, nos flertes e na sedução constante entre os irmãos e Jakob. Acaba sendo como um filme de David Lynch feito para ser um espetáculo de dança conduzido por Maya Deren e Pina Bausch em diversos momentos satisfatórios que sobram no filme (que deixa claro a infidelidade ao texto de Walser logo na apresentação, referindo à inspiração em vários textos dele e não só a Jakob Von Gunten).
Divagações autistas sobre a cova/queda num buraco, que derivam nos temas recorrentes da religião, da guerra e da morte: se sua canção é tão bonita quanto suas penas, você é uma fênix.
Barreira
3.7 2encontros e desencontros entre um sabre e um bonde
Pentimento
3.0 4Susan Sontag deveria estar numa bad trip lesbo-sádica para considerar genial este autor, tendo em vista esta obra, principalmente, não sei as outras, mas sendo um longa, esta assume uma importância representativa. Trata-se de um delírio misógino hospitalar que expõe gratuitamente o corpo feminino em toda sua potencialidade escatológica de situações animalescas (menstruação, micção, tortura, devir leoa domada, etc.). A meu ver, existe uma indulgência crítica absurda com esse autor, que merece sim o limbo estético que amarga. E essa recepção negativa não tem nada a ver com um choque moralista da minha parte, mas sim com uma crítica a um paradigma contemporâneo degradante que desloca toda a fruição da obra em seus elementos intrínsecos a um excesso de mediação e preocupação com as questões externas que ela provoca. E mesmo partindo desse paradigma, a obra não consegue uma consistência que a transcenda nem apresenta em si estímulos e não comporta questões de relevo que possam evocar mitos e taras (o contraste genital feminino-masculino e sua posição no mundo natural, o útero-oceano, a vagina-peixe, o falo-hockey, o falo-salto-alto) nem despertam, nem confrontam ideologias que confirmam posições sociais para alguns entusiastas poderem apenas sublinhar a posição da obra no rol do cinema experimental, video arte ou aproxima-la de obras de artistas da performance/ body art. É uma versão degradada de um combo que mistura stalker/ilsa/sweet movie em um campo de concentração experimental para degradar e fetichizar o corpo feminino. Nem o alto contraste fotográfico salva esse filme. Um embuste.
A Cidade Branca
4.0 12"O que me fascinou na primeira vez que vi uma axolote, foi sua imobilidade completa...e eu logo acreditei ter entendido o seu desejo secreto: Negar o espaço e o tempo, em uma
quietude indiferente. Elas pareciam estar espionando algo, algum reino remoto já há muito extinto, um tempo de distanciamento e de uma liberdade absolutos...em que o mundo pertencia aos axolotes."
Baba Aziz - O Príncipe Que Contemplava Sua Alma
4.2 25Um festival dervish que te reserva um palácio num poema de átomos do deserto.
Un Amleto di meno
4.1 2É mais um filme louco de Carmelo Bene, este uma adaptação de Hamlet visualmente exuberante na cenografia, datado com muita misoginia sexista de velho italiano tarado, mas apresenta uma proposta interessante de cinema ensaístico com paralelos freudianos do complexo de Épipo, flertando com metalinguagem teatral e múltiplas referências, até com a Ofelia de Millais
Os Indesejados da Europa
2.9 4A forma como o filme é conduzida dá a entender que planeja uma reconstituição contemplativa dos últimos dias de Benjamin, partindo-se de uma deambulação incessante e alguns momentos concentrados de pensamentos do autor, mas Benjamin acaba sendo um pretexto para uma instalação voyeurística dos percursos de um personagem exilado nos montes Pireneus. O diretor aprofunda um Benjamin melancólico e inexpressivo e antevê a desolação suicida do autor e, de um certo modo, fiel ao seu pensamento, incrustando-o na paisagem da fronteira espacial, metáfora da margem historiográfica que Benjamin refletia, avesso a um atravessamento revolucionário (evocando em algum momento, Auguste Blanqui, uma inspiração das Comunas de Paris). A inviabilidade da existência do autor no exílio fica evidente na condução do filme, onde os grandes momentos de vivacidade e arroubos filosóficos são realizados em interiores (na biblioteca, no esconderijo) e reservando ao exterior uma natureza muda e desinteressante. Atendo-se aos elementos intrínsecos ao filme, quem não conhece a obra do filósofo, não se sentirá encorajado a fazê-lo, é um filme para iniciados em seu destino desolador.
O Homem Sem Passado
3.8 46Um dos filmes mais complexos dramaticamente de Kaurismaki. Intromete-se na pauta do exílio interior/exterior para proporcionar uma reflexão e situações extremamente ricas de afeto e envolvimento num recomeço da vida. Podem me chamar de sádico ou doente, mas a cena inicial da surra foi absolutamente genial e precisa para introduzir o exílio do personagem, particularmente na concepção de Kaurismaki dos requintes de crueldade para os personagens: a inserção da máscara de soldador, como referência e pista do passado do personagem, assim como da música, dá início a uma epopeia em busca de si mesmo e sua reinvenção. A cena da libertação do hospital, se já não fosse suficiente a violência do episódio da surra, choca em sua erupção de vida de um rosto desfigurado. Aqui, como no último filme, O outro lado da esperança, os marginais e a classe operária se vingam dos agressores, em busca de redenção.
Luzes na Escuridão
3.4 25 Assista AgoraMeu favorito da fase mais recente de Kaurismaki. Aqui ele equilibra o teor dramático de verossimilhança, nem pesa demais como em A Garota da Fábrica, nem amolece e enternece demais como em O Porto. Não há um final feliz aqui, mas sim final provável dentro das circunstâncias de um personagem inexpressivo, que não consegue organizar seus afetos ou emoções, que prefere um sofrimento absurdo para poupar o ente amado e não enxergar quem se importa com ele de fato. O uso das cores saturadas no filme contrasta com o monossilabismo e a inexpressividade do vigilante.
O Porto
3.6 104 Assista AgoraO escritor Marcel Marx de La Vie De Bohème está de volta nesse filme relativamente recente de Kaurismaki, o qual, como lhe é de costume, quase sempre arranja uma solução otimista de modo abrupto como estratagema para contornar o sofrimento dos personagens. Neste ele apelou para o regime dos milagres e de um humanismo esperançoso que invade os personagens mais desumanizados, um policial. Mas Kaurismaki também é exagero em grande parte de sua obra, se a desolação transborda em A Garota da Fábrica, aqui ela poupa demasiadamente a personagem de Kati Outinem e as perdas de Marcel Marx no longa anterior. A fotografia deste filme é suntuosa.
Thomas l'imposteur
4.2 1Contando com o próprio Jean Cocteau para a adaptação do romance, consegue, dentro dos méritos do imaginário do próprio Franju, uma das sequências mais surrealistas do pesadelo da guerra, o cavalo em chamas e outras imagens que atormentam a sanidade do espectador e que só iguala ao horror onírico de Vá e Veja de Klimov.
Neha
3.0 1É uma trama demasiadamente humana, em sua narrativa de hesitações perpetuadas por um casal que absorve o personagem solitário de Simon, sobre o pano de fundo de uma paisagem tarkovskianamente bucólica (a igreja do padre enterrado na parede, o lago, a casa dos pais com suas conservas e compotas). Viktor é um personagem que carece da presença de Simon para descontar sua frustração com a infertilidade que afronta o casal, assim como Maria usa Simon para compensar as agressões de Viktor, a qual é naturalizada pela própria, intuindo uma razão para manter esse jogo que é extrapolado a um terceiro que adentra a conjugalidade dos dois. O que tem em um comum os três personagens? o medo da solidão e o apego às relações mais hostis como se fossem a única perspectiva possível que lhes resgata a humanidade (conforme disse Simon: eu apenas sinto, não disse que preciso estar contente).
Le Sexe des Anges
3.7 1"Quem, nós ? Existem mil maneiras de se sentir fora do direito comum. A maneira mais radical de questionar a moralidade, a ordem social aceita, é sempre a que se enraíza na noite do corpo: a heterodoxia sexual.
Mas este romance é acima de tudo uma história de amor, tão simples e terrível quanto qualquer outra história de amor. Um pouco mais difícil, só isso." -- Jean-Louis Bory, La Peau des zèbres.
O Homem Sanduíche
4.0 4Impressionado como o cinema taiwanês consegue extrair tanta singeleza da precariedade, o bonecão do filho, a concha com o desenho do buda, a menina tímida e os caras da panela de pressão e a contemplação de uma maçã. Tem uma leveza de pluma na tenra infância, como se fosse um filme juvenil ou um desenho animado com alguma complexidade pé no chão que passava na TV Cultura.
Ondas Invisíveis
3.5 4"o mar não me julga"
Viagens Alucinantes
3.7 186Moral da história: os índios fazem as viagens ao pré-ser, sossegados, sem o fanatismo pela ciência e isentos do fanatismo pela vida doméstica e do amor romântico.
Hamlet Vai à Luta
3.8 12 Assista AgoraGenial. Uma curiosidade: o retrato que Klaus retira da parede é de Urho Kekkonen, presidente da Finlândia no período 1956–82. Este retrato também aparece no longa sucessor, Ariel 1988, o personagem de Taisto realiza a ação oposta, pendura-o na parede do abrigo.
La Vie De Bohème
4.1 14 Assista AgoraO CÃO E O FRASCO
“Meu bom cão, meu cachorrinho, querido Totó, chegue- se e venha respirar um excelente perfume comprado no melhor perfumista da cidade.”
E o cão, agitando a cauda, o que é, creio eu, nesses pobres seres, o sinal correspondente a um sorriso ou riso, aproximou-se e pousou curiosamente seu focinho úmido sobre o frasco destampado; em seguida, recuando subitamente, com medo, latiu contra mim como se me reprovasse.
“Ah! miserável cão, se eu tivesse lhe oferecido um pacote de excrementos, você o teria farejado com prazer e talvez até devorado. Assim você mesmo, indigno companheiro de minha triste vida, você se parece com o público a quem não se pode jamais presentear com perfumes delicados que o exasperam mas com sujeiras cuidadosamente escolhidas.”
(BAUDELAIRE, Charles. Pequenos poemas e prosa. Rio de Janeiro, José Olympio, 1950 – trad. Aurélio Buarque de Hollanda. p. 25)
Raiva
3.2 14A estrutura narrativa, a fotografia e o retrato desolador dos camponeses em Raiva lembrou-me o Cavalo de Turim, de Béla Tarr, ao começar de trás para frente, com a monotonia do preto e branco com várias sequência da rotina de refeição, os planos gerais de paisagem e a precariedade da subsistência camponesa. O contexto retratado no filme pode associar um sul português ao sertão brasileiro do Cinema Novo (Vidas secas, especialmente) que reforça um naturalismo das interpretações e das paisagens opressivas.
O Estrangeiro
3.8 49Mastroianni arrebatador na discussão de Mersault com o promotor cristão e o capelão; a paisagem sonora da flauta do árabe no cárcere é perturbadora como a presença do sol no livro (e no filme).
Lua Negra
3.5 54 Assista AgoraUm conto de fadas surrealista ou um olhar expandido de criança que produz um mundo encantado dos adultos. É como se sentir um intruso bem acolhido nas visitas esporádicas na casa de uma avó num recanto bucólico ou estranhar e perceber um mundo infinito de possibilidades imaginárias no lar, um eterno retorno ao surpreendimento do costumeiro, depois do exílio no mundo dos adultos. O unicórnio, o rato e Lily são presenças forasteiras no mundo rotineiro de uma fazenda, assim como a guerra é um pesadelo para a rotina dos adultos. As crianças, os animais, a senhora bruxa dos olhos esbugalhados e os irmãos representam aquela família que você não vê há muito tempo enquanto a guerra acontece lá fora.
Vamp: A Noite dos Vampiros
3.1 63 Assista AgoraUm filme de gênero repleto de obviedades falocêntricas (o mocinho tem uma mocinha à espera, os garotos do fundão vão atrás de aventura e são o ideal de masculinidade e humilham os freaks) que ensina a não subestimar os freaks (a gangue do Snow, o japonês) e é visualmente esplendoroso, especialmente Grace Jones como Katrina.
Os Felinos
3.5 9Genial e hitchcockiano - os gatos foram treinados por Ray Berwick, responsável também pelos animais de "Os Pássaros" de Alfred Hitchcock e tem o mesmo roteirista foi de psicose, Joseph Stefano.
Instituto Benjamenta ou Este Sonho que as Pessoas Chamam de …
3.9 6Um deleite visual, musical, coreográfico a cada quadro e sequência. A partir da narrativa de Jakob Von Gunten, os Irmãos Fray organizaram uma encenação coreográfica e musical, um espetáculo para a trama de Robert Walser na qual se inspira, sem reproduzi-la, mas antes uma deriva poética partindo do motivo do Instituto dos irmãos Benjamenta, como uma escola de empregados que ensina a servidão e o êxodo rural do personagem de Jakob como uma transgressão e uma iluminação para a vida liberta a ponto de fechar o instituto. Diferentemente do diário do personagem no livro de Walser, que é uma apologia ao mundo das mesquinharias e do servilismo, o filme prefere dar vazão ao acaso, ao que não se controla, às consequências que divergem dos atos e intencionalidades dos personagens (o culto e o ensino da servidão). O filme prefere apanhar das beiradas e sugestões do livro, direcionado o norte da narrativa na corporalidade dos atores em dança frequente, nos flertes e na sedução constante entre os irmãos e Jakob. Acaba sendo como um filme de David Lynch feito para ser um espetáculo de dança conduzido por Maya Deren e Pina Bausch em diversos momentos satisfatórios que sobram no filme (que deixa claro a infidelidade ao texto de Walser logo na apresentação, referindo à inspiração em vários textos dele e não só a Jakob Von Gunten).
O Mínimo Gesto
3.6 4Divagações autistas sobre a cova/queda num buraco, que derivam nos temas recorrentes da religião, da guerra e da morte: se sua canção é tão bonita quanto suas penas, você é uma fênix.