A premissa de "The Square - A Arte da Discórdia" é curiosa e bizarramente provocativa. Isso porque o assunto principal trabalha o conceito de arte contemporânea. Como a definição dessa arte causa certa polêmica, quase tudo neste filme sueco confronta e convida o espectador a refletir sobre detalhes que podem divergir sobre o que é ou não arte.
A narrativa foca na vida de um gerente de museu na Suécia que deve lidar com duas situações: uma é de âmbito profissional, ao promover uma nova exposição vai dar o que falar; e a outra é pessoal, em que arquiteta um plano para resgatar seu celular e sua carteira, furtados na rua quando estava a caminho do trabalho. Ao tentar conciliar as duas circunstâncias, ele se atrapalha demais em ambas e tudo foge do seu controle causando diversas consequências infelizes.
O roteiro utiliza metáforas interessantes (algumas com humor rasteiro) para discutir o tema. Assim como certas manifestações podem ser artisticamente eloquentes para uns e significar nada para outros, pequenas ações podem ser soluções de problemas para uns ou ser a gota d'água para provocar a ira em outros. Com isso, a todo momento, há várias interferências na maioria das cenas que provocam o espectador, seja uma criança chorando em um lugar que ela não deveria estar, ou a presença de um macaco na hora do sexo ou até da 'encarnação' primata de um homem em um jantar de gala.
É curioso que a narrativa não se preocupa com determinadas linhas lógicas. Isso parece ser intencional por parte do roteiro, afinal de contas, estamos diante de constantes alegorias e analogias que convergem para uma representação da concepção e recepção de arte contemporânea. O interessante é o sentimento de revolta que a tal arte causa em alguns personagens, o que pode ser entendido como uma crítica da glamorização de coisas fúteis, o que se encaixa perfeitamente com o subtítulo que o longa recebeu no Brasil, 'a arte da discórdia'.
O filme, de direção sensível de Ruben Östlund ("Força Maior"), que também assina o roteiro, possui uma extensa duração (2h30m) e não parece estar preocupado em dinamizar o desenvolvimento de situações. Proposital ou não, isso o torna cansativo ainda que tenha uma edição de poucos cortes eficiente e uma boa fotografia que utiliza câmeras estáticas (algumas com movimentos suaves) que valoriza as interpretações dos atores em cena.
Contudo, assim como qualquer obra classificada como arte, cabe ao espectador interpretar se as manifestações textuais e visuais de "The Square - A Arte da Discórdia" possuem ou não teores artísticos.
Histórias reais adaptadas para o cinema atiçam a curiosidade do espectador sobre acontecimentos pouco conhecidos. Quando esses fatos envolvem alguma realeza, os filmes costumam ser interessantes, principalmente por retratarem a beleza monarca, os costumes e os comportamentos de determinadas épocas.
Em “Victoria e Abdul: O Confidente da Rainha” não é diferente. O longa, dirigido por Stephen Frears, é baseado em eventos verídicos escritos por Abdul Karim (e resgatado um século depois pela jornalista Shrabani Basu), um carismático indiano que foi convidado para participar do Jubileu de Ouro da Rainha britânica Victoria (50 anos de reinado), em 1887. O jovem, com a tarefa de entregar uma medalha comemorativa do seu país para sua governante (na época, a Índia ainda fazia parte do Império Britânico), chama a atenção da Imperatriz com quem vive uma bela amizade.
É curioso observar que a atriz Judi Dench interpreta a Rainha Victoria pela segunda vez. Anteriormente, ela viveu a mesma personagem em “Sua Majestade, Mrs. Brown”, de 1997. Dench, inclusive, é uma expert em representar majestades no cinema. Não é a toa que seu desempenho como Rainha Elizabeth lhe rendeu o Oscar de melhor atriz coadjuvante por “Shakespeare Apaixonado” (1999).
Judi Dench, que tem performance irretocável, nos entrega uma Victoria de 81 anos passando por um drama existencial. Amarga, ranzinza e cansada do seu dia-a-dia, ela economiza gestos, fala pouco e se comunica com fortes olhares (que dizem tudo). A inocência e a curiosidade de Abdul despertou nela um interesse improvável de conhecê-lo. Com isso, ela ganhou uma sobrevida espiritual em seus últimos dias ao desabafar angústias, compartilhar ensinamentos e estreitar as diferenças culturais e religiosas.
Abdul, por sua vez, de atuação serena de Ali Fazal, se mostrou uma pessoa inteligente, culta, respeitosa e confiável. Sua presença constante ao lado da Rainha como um confidente intrigou e incomodou todos os palacianos, principalmente por ser um muçulmano e, também, por ter sido capaz de renovar o ânimo de Victoria que passou a ver o mundo de uma maneira diferente.
Todo esse relacionamento é dirigido de forma sensível, sóbrio e levemente bem humorado por Stephen Frears ("Philomena"). Além dos belíssimos figurinos e cenários impecáveis, o filme ainda se destaca por ter um roteiro equilibrado (escrito por Lee Hall) que contextualiza assuntos sociopolíticos do passado que ainda são amplamente criticados nos dias de hoje, como o preço do poder, o racismo e a intolerância.
“Victoria e Abdul: O Confidente da Rainha” é mais um exemplar que levanta a bandeira da diversidade. O longa merece ser apreciado, não só por sua beleza ou por seu conteúdo crítico, mas por seu exercício de contrapontos entre duas personalidades que possuem status distintos e diplomacias admiravelmente próximas.
Há pouco mais de dois anos, o premiado "Spotlight - Segredos Revelados" trouxe à tona a polêmica história baseada em fatos reais veiculada pelo jornal Boston Globe sobre a pedofilia praticada por padres da Igreja Católica. O excessivo tom documental fez o longa ser interessante por seu conteúdo, porém pouco comovente. "The Post - A guerra secreta" trilha um caminho mais espinhoso e faz o que o filme de 2015 não fez: nos entrega um produto mais emocionante e de execução mais criativa.
A narrativa, também inspirada em acontecimentos verídicos, apresenta um escândalo que envolveu quatro mandatos presidenciais dos Estados Unidos a respeito da participação norte-americana na Guerra do Vietnã. Na ocasião, o jornal The Washington Post publicou informações militares sigilosas em 1971, vazadas pelo funcionário do Pentágono Daniel Ellsberg, o que revelou a canalhice dos governantes em ações fúteis naquele país ao sacrificarem soldados em uma guerra perdida (que eles diziam que estava ganha). Isso gerou, inicialmente, uma batalha editorial com The New York Times, que publicou primeiro uma parte desses papéis, seguida por obstáculos jurídicos entre os jornalistas e o Governo.
É curioso vermos uma empresa jornalística comandada por uma mulher, Kay Graham, a primeira mandatária do segmento. Após uma importante introdução sobre o vazamento de informações, o filme foca na figura frágil e vulnerável de Graham, interpretada com a genialidade de sempre de Meryl Streep, e na sua 'falta de voz' em um ambiente dominado por homens. Aos poucos, ela divide a tela com o editor Ben Bradlee, vivido pelo ótimo Tom Hanks, com quem trava bons diálogos sobre publicar ou não o tal polêmico material. À medida que o longa avança, a participação de Graham na trama ganha contornos emblemáticos de uma mulher que descobre a força que tem e é contemplada por sua decisão
(uma das cenas finais após um julgamento em que ela desce as escadas do tribunal e é admirada por outras mulheres é de arrepiar)
.
"The Post - A guerra secreta" possui um primeiro ato arrastado. Muitos personagens são apresentados e poucos são desenvolvidos de fato (o jornalista interpretado pelo ótimo Bob Odenkirk, que tem certa importância no enredo, poderia ser mais bem aprofundado). Há determinados momentos que o roteiro se perde no ‘lá e cá’ e a edição fica confusa por causa desse excesso de figuras. Entretanto, o filme engrena no segundo ato quando surge o tal material secreto. Com isso, o longa ganha traços de suspense (a trilha sonora de John Williams contribui bem para isso) e um excelente ritmo ao mostrar os bastidores da produção de um jornal, desde a fabricação do mesmo no parque gráfico, no empenho dos jornalistas na redação no exercício da profissão até suas expectativas sobre a repercussão da publicação.
Esse retrato jornalístico foi trabalhado de maneira sóbria, emocionante e criativa pelo cineasta Steven Spielberg. O diretor usa e abusa de enquadramentos e movimentos de câmera pouco usuais. Um dos exemplos é o traveling circular em ângulo plongée dentro de uma sala fechada no momento decisivo de Kay Graham, que se sente encurralada, que é espetacular. Além de homenagear o bom jornalismo ao exaltar a liberdade de imprensa, Spielberg contextualiza os acontecimentos, seja para valorizar o empoderamento feminino (que está em uma crescente já não é de hoje) ou criticar a atual política norte-americana ou simplesmente para nos mostrar o quão semelhante é a forma de governabilidade entre o passado e o presente (mudam as peças, mas o sistema continua o mesmo).
principalmente por fazer um gancho para o caso Watergate, que derrubou o presidente Nixon no início da década de 70. Falando nisso, vale até uma espiada no excelente clássico “Todos os Homens do Presidente” (1976), de Alan J. Pakula e protagonizado por Robert Redford e Dustin Hoffman, que trata desse tema
. Enfim, "The Post - A guerra secreta" é um prato cheio para os amantes do jornalismo, sem falar nas frases inspiradoras como ‘a melhor maneira de exercer o direito de publicar é publicando’ e ‘um jornal deve trabalhar para os governados e não para o Governo’ que vão deixar muitos jornalistas orgulhosos.
"O destino de uma nação", dirigido por Joe Wright ("Orgulho e Preconceito"), conta uma parte da história política de Winston Churchill, o Primeiro Ministro da Grã-Bretanha que tentou costurar um tratado de paz com a Alemanha Nazista de Hitler em plena Segunda Guerra Mundial. Além disso, ele também foi o responsável ao iniciar a Operação Dínamo, que resgatou mais de 300 mil soldados britânicos na praia de Dunkirk, na França.
A competência técnica da produção é de cair o queixo, principalmente no que diz respeito a reconstituição de época, com ótimos figurinos e cenários, na direção criativa de Joe Wright e na espetacular fotografia de Bruno Delbonnel. Delbonnel, inclusive, faz interessantes contrastes entre luz e sombra, enquadramentos de câmera que transpiram algum lirismo (ao retratar o encurralamento do protagonista) e muitos planos isométricos que fazem os espectadores se deslumbrarem com os ambientes melancólicos da Grã-Bretanha.
O grande destaque, no entanto, é a atuação monstruosa de Gary Oldman. Embora esteja embaixo de muita maquiagem (que por sinal é excelente), o ator trabalha a caracterização de Winston Churchill de uma forma incrível! Os trejeitos, o sotaque, o comportamento, o modo de andar e falar estão impecáveis. Oldman faz o personagem ser verossímil mesmo não tendo um desenvolvimento prévio sobre sua forte personalidade.
Entretanto, nem tudo são flores. "O destino de uma nação" possui um roteiro confuso. Ainda que tenha alguns bons diálogos e discursos emblemáticos pontuais, o texto que precede as principais decisões do personagem é frágil. Falta uma inspiração melhor do roteiro para construir uma ideologia coerente e convincente. Pelo menos, houve coesão na introdução do clímax, em que vemos a veia populista de Churchill aflorar na narrativa de maneira notável.
O curioso é que "O destino de uma nação" foi lançado alguns meses depois de "Dunkirk", de Christopher Nolan. Ambas as produções estão no mesmo cenário. Enquanto uma apresenta os bastidores das decisões políticas da Grã-Bretanha na Segunda Guerra Mundial, a outra está na frente de batalha mostrando o drama dos soldados britânicos encurralados na França a espera de resgate. O legal é que um filme complementa o outro mesmo sendo de gêneros diferentes.
“O Touro Ferdinando”, animação da Blue Sky dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha (“A Era do Gelo” e “Rio”), traz um carismático protagonista que detesta desavenças e adora cheirar flores e ser amável com o próximo. Ao fugir de uma fazenda especializada na criação de touros, Ferdinando encontra afeto na família de uma garotinha, humana com quem vive uma grande amizade. Depois de crescer e se tornar um touro imenso, sem querer, Ferdinando causa alguns problemas que o faz retornar para o local em que nasceu onde irá reviver imbróglios de seu passado.
O longa é baseado no conto “The Story of Ferdinand” publicado em 1936 pelo autor norte-americano Munro Leaf. Curiosamente, é a mesma fonte de inspiração do curta “Ferdinando, o Touro” premiado pelo Oscar que a Disney lançou em 1938.
O roteiro discute as famosas questões sobre valores familiares, a importância da amizade e faz uma crítica à intolerância, que irá confrontar o protagonista durante toda a trama. A narrativa trabalha bem esses assuntos no primeiro ato, que também é a parte mais criativa e divertida do filme, ao equilibrar boas piadas textuais com ótimo humor situacional.
A partir do segundo ato, o roteiro se mostra frágil no desenvolvimento de algumas situações e de personagens secundários. Com isso, a produção se arrasta em furos, na previsibilidade das ações e em gags exageradamente infantis, comicidade que poderá agradar a criançada, mas nem tanto aos adultos.
O visual caricaturado diverte, porém não impressiona já que sua estética carece de texturas que poderiam contribuir para a beleza do longa (tudo é muito liso e de aparência borrachuda). No fim, ainda que não tenha tanta profundidade dramática, “O Touro Ferdinando” consegue entreter e transmitir sua bela mensagem que inclui, também, uma apreciação a favor da defesa dos animais em touradas.
A ideia de "Viva - A vida é uma festa", animação da Pixar assinada por Lee Unkrich ("Toy Story 3" e "Procurando Nemo"), não é novidade. Sua premissa é bem parecida com "Festa no Céu" (2014). No entanto, os longas do estúdio, famosos por discutirem valores familiares, ainda surpreendem por serem eficientes pelo equilíbrio narrativo e pelo desenvolvimento da emoção. Aqui, não é diferente.
Na história, o jovem Miguel padece com a reprovação constante de seus parentes por desejar ser músico. O motivo? Foi por causa da música, que fez sua família sofrer no passado devido ao desaparecimento do tataravô. Ao perceber que essa arte está em seu sangue, o garoto acredita que um famoso musicista do passado seja o responsável por fazê-lo gostar de música. É aí que sua épica jornada à procura do tataravô se inicia, quando a magia do Dia dos Mortos o transporta para o 'outro lado'.
A produção, visualmente deslumbrante, adentra no universo multicolorido da cultura mexicana para valorizar o folclore local e transmitir a importância do registro e da preservação de lembranças. Para isso, o roteiro coloca o protagonista no Dia dos Mortos, período em que os mexicanos festejam e homenageiam a memória dos antepassados ou daquelas pessoas queridas que já faleceram e que foram importantes em vida.
O que se destaca em "Viva - A vida é uma festa" é o trabalho de extrair a essência de assuntos complexos e adaptá-la em uma obra que transpira simplicidade e sensibilidade sem perder profundidade. Talvez, por isso, os filmes da Pixar agradam a pessoas de todas as idades. Como o filme entreg diversas camadas de reflexões, cada um absorve as lições à sua maneira, sejam elas mais diretas e metafóricas aos adultos ou subliminares e lúdicas para as crianças.
A atmosfera sempre angelical, o humor rasteiro, a boa caracterização latina (das ruas e casebres), o visual divertidamente caricato e a maneira singela como os personagens são desenvolvidos contagiam o público. Toda essa harmonia culmina, não só no debate saudável dos temas, mas em emoções genuínas. Tente não lacrimejar no arrepiante clímax!
“A Guerra dos Sexos”, dirigido pela dupla Jonathan Dayton e Valerie Faris ("Pequena Miss Sunshine"), e protagonizado por Emma Stone e Steve Carell, aproveita o ápice do ‘girl power’ para contar a história de um famoso jogo amistoso de tênis entre o ex-campeão Bobby Riggs e a campeã mundial Billie Jean King. O episódio esportivo foi um dos mais assistidos na televisão na década de 70. Essa dramatização surge, hoje, como uma crítica a desigualdade entre os sexos, em que, muitas vezes, o homem é mais valorizado financeiramente que a mulher ao executar o mesmo trabalho. Os detalhes históricos que antecedem o evento, assim como as articulações e a retratação dos bastidores, são interessantes. Entretanto, o roteiro gasta muito tempo em subtramas sobre a vida dos protagonistas e isso faz com que o longa se arraste em alguns momentos. Destaque para a atuação de Stone, a reconstituição de época e o clímax (a tal partida de tênis) bem coreografado.
"A Origem do Dragão" é mais um filme que retrata a vida do lendário Bruce Lee. Aqui, no entanto, discorre sobre um curioso episódio em sua carreira antes se tornar um astro em Hollywood.
Já estabelecido nos Estados Unidos e com uma academia para ensinar o Kung Fu em uma comunidade local na cidade de São Francisco, Lee recebe a visita do mestre chinês Wong Jack Man. O intuito de Man em ir à Califórnia é para conhecer a pessoa que estaria proliferando de forma errônea os conceitos da arte marcial. Esse encontro culmina em uma luta com poucas testemunhas que se tornou um dos confrontos mais emblemáticos na carreira de Lee.
Um dos problemas de "A Origem do Dragão" é que Bruce Lee (que está arrogante) é quase um coadjuvante e sua participação, assim como a presença 'zen' de Wong Jack Man, só tem relevância na trama para atender a um pedido de um pupilo. Esse aluno é o responsável por planejar a tal luta apenas para tentar libertar seu interesse amoroso da máfia chinesa, em Chinatown.
Por mais que o longa seja inspirado em fatos reais, o argumento para o tal embate soa deslocado na trama. Além disso, o roteiro sofre com a indefinição de foco e a narrativa dá mais ênfase nas subtramas que contornam a grande luta. As ações desses pequenos acontecimentos até contribuem para a contextualização da história, mas são praticamente irrelevantes para o que realmente interessa.
Apesar de tudo, "A Origem do Dragão" tem bom ritmo e executa bem o tal confronto em uma sequência com poucos cortes de câmera e com coreografia convincente. É a melhor parte do filme em que estilos diferentes de Kung Fu se colidem para ensinar a ambos os lutadores importantes lições. É o único momento em que a filosofia da arte marcial é discutida com alguma profundidade, mesmo que seja da maneira silenciosa e com entreolhares que dizem tudo. O terceiro ato, embora seja divertido em termos de brigas, não supera o sentimento de frustração de uma produção que não explora o potencial temático que tem.
Embora tenha Jackie Chan como protagonista, "O estrangeiro" está longe de ter a irreverência costumeira do ator em filmes de ação. Aqui, Chan entrega uma performance dramática notável em um longa que possui bom elenco (há a boa presença de Pierce Brosnan) e boa direção de Martin Campbell, mas derrapa em um roteiro frágil que desperdiça premissas interessantes.
A trama começa de maneira intensa com um ataque terrorista na Inglaterra que mata a filha de Quan (Chan), dono de um típico restaurante chinês em Londres. Apesar da falta de informações e da dificuldade das autoridades em achar os culpados, Quan desconfia que um político (Liam Hennessy - interpretado por Brosnan) está relacionado ao atentado e o inferniza até que os nomes dos responsáveis pelo incidente sejam revelados.
O roteiro sugere duas linhas narrativas: a convencional busca por vingança e uma promissora (só que não) conspiração política. Entretanto, há uma fragilidade em aliar os enredos e isso gera furos, soluções repentinas (ou Deus ex machina) e situações mal desenvolvidas que investem em argumentos inconvincentes para dar seguimento na história.
Entendemos as motivações de Quan, principalmente por seu passado recente. No entanto, ele revela ser um 'super soldado'! Há pouquíssimas explicações sobre sua trajetória para ser o que é, o que prejudica seu desenvolvimento. Se desligarmos o cérebro, nem vamos importar tanto por Quan ser um mago da esperteza e um especialista em artes marciais (é o típico clichê de orientais no cinema ocidental).
Assim, também, é a situação de Liam, que infantilmente revela fazer parte de uma organização (em que todos sabem a procedência e 'ninguém faz nada') e acaba pagando um alto preço apenas por ter alguma associação com ela. Ele é um 'quase vilão' que opta por decisões inconsequêntes e não se esforça para tentar resolver o problema de forma racional.
O destaque de "O estrangeiro" é a competente atuação de Jackie Chan. Seu semblante frio e depressivo nos faz acreditar em seu drama criando consentimento e empatia do espectador para com seu personagem. Suas cenas de ação, embora merecesse uma edição melhor, são bem coreografadas e tem bom ritmo, ainda que não tenha o humor peculiar de seus filmes. Enfim, por Jackie Chan vale uma espiada.
“Me chame pelo seu nome” coloca o delicado tema sobre homossexualidade no verão de uma Itália dos anos 80 ao falar sobre as descobertas, o primeiro amor, as amizades e as preferências sexuais do único filho adolescente de uma família americana que mora na região. Tudo é filmado de forma lenta e sensível para que o espectador sinta, não apenas empatia com os personagens (em especial sob o ponto de vista de Elio), mas que tenha envolvimento com a ótima ambientação ao revisitar o calor e a rotina da época. Embora tenha uma trama previsível e algumas cenas que poderiam ser mais bem sugeridas (ainda que sejam metáforas importantes para desenvolver as personalidades, o romance e os rumos dramáticos dos protagonistas), o filme ganha sensualidade a partir de seu segundo ato e um belo e emocionante clímax em seu desfecho. Destaque para as atuações de Timothée Chalamet e Armie Hammer.
“Lady Bird - A Hora de Voar” apresenta a típica história de uma adolescente que está prestes a se tornar uma pessoa adulta. O filme dramatiza as peculiaridades dessa transição enfrentadas pela personalidade título, como a rebeldia, a vida sexual, a fase escolar e sua imaturidade (de achar que já pode ser responsável por tudo que decide ou acontece em sua vida). O roteiro ainda traz interessantes discussões familiares, em especial no convívio sufocante entre a protagonista e a mãe. Embora tenha um segundo ato um pouco arrastado, as situações retratadas são bem dirigidas e roteirizadas pela atriz Greta Gerwig (atuou em "Mulheres do Século XX"). Além disso, as tais confusões em que a protagonista se mete e as lições que ela absorve são de fácil identificação, o que colabora para o sucesso do longa. Destaque para a atuação de Saoirse Ronan ("Brooklyn").
“Três anúncios para um crime” é um longa que fala sobre injustiça, vingança, impunidade e, sobretudo, disserta sobre atitudes inconsequentes que acarretam em um efeito dominó de problemas em uma pequena cidade nos Estados Unidos. Inspirado em fatos reais, de uma mãe que coloca mensagens de indignação em outdoors contra a polícia local que não conseguiu apontar o responsável pela morte da filha, o filme possui um roteiro com excelentes diálogos e um humor mordaz rasteiro que nos remete ao estilo cinematográfico dos irmãos Cohen. Aliás, não só a veia tragicômica lembra os cineastas, a direção de Martin McDonagh ("Sete Psicopatas e um Shih Tzu") também parece se inspirar neles, principalmente pela maneira excêntrica ao desenvolver os personagens, pela violência e pelos movimentos, cortes e enquadramentos de câmera. Destaque para as atuações de Frances McDormand e do coadjuvante Sam Rockwell.
Não é de hoje que a homossexualidade é um tema polêmico. Na verdade, é um grande tabu a ser quebrado. Aos poucos, a sociedade se adapta com o assunto, mas ainda há muito preconceito com essas pessoas que querem ter direitos e serem respeitadas. É justamente isso que trata o bom longa chileno "Uma Mulher Fantástica".
A narrativa gira em torno de Marina (Daniela Vega), uma transexual que tem dificuldades em lidar com a morte do amante. Ela busca, apenas, o direito de chorar a morte do seu companheiro, mas é atrapalhada pela intolerância da família do falecido.
O roteiro não perde tempo com clichês sobre barreiras no relacionamento e logo mostra a estabilidade amorosa do casal. O que interessa, de fato, é a reviravolta na vida de Marina sobre uma realidade que ela acreditava ter superado. De um dia para o outro, ela vai do céu ao inferno: é amada sem discriminação por um homem que a via como uma 'mulher fantástica' e, depois, é odiada por sua condição de gênero.
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"Eu, Tonya" é dirigido por Craig Gillespie e protagonizado por Margot Robbie, Allison Janney e Sebastian Stan. O filme é inspirado na vida e carreira de Tonya Harding, a primeira mulher americana na patinação artística a completar a manobra 'Axel triplo' em grandes competições.
O principal acontecimento do enredo é o ataque planejado pelo marido de Harding a sua colega Nancy Kerrigan, na tentativa de ser a número um na modalidade. Dificuldades, fama, glória e decadência, todos os clichês sobre feitos esportistas estão aqui. No entanto, o que faz de "Eu, Tonya" ser interessante é a vida conturbada da protagonista que foi criada por uma mãe ranzinza, boca suja e grosseira e, depois, se casou com um homem que a agredia.
Apesar de o tal plano ter sido narrado de uma maneira um pouco confusa, há vários pontos positivos na produção: o ótimo humor mordaz do roteiro que brinca com a inconsequência das ações dos personagens; a edição criativa (com suas idas e vindas no tempo); a quebra da quarta parede que contribui com a irreverência do filme e a boa fotografia que se destaca pelos vários 'mini planos sequências' sobretudo nas performances convincentes de Robbie na patinação.
A direção de Gillespie é assertiva ao optar pelo gênero da tragicomédia e pela forma com que conta a história. O formato por meio de flashbacks oriundos de pseudo entrevistas, além de manter a atmosfera descontraída, nos contagia para sabermos os novos fatos que estão por vir. Destaque para as atuações poderosas de Margot Robbie e de Allison Janney.
"Extraordinário" é, de fato, extraordinário! O filme, inspirado em romance escrito por R.J. Palacio, em 2012, é moralista sem ser apelativo, é melodramático sem ser exagerado e é emocionante sem ser piegas.
A narrativa fala do garoto August Pullman ou Auggie, que possui o rosto deformado por dezenas de cirurgias ao ter nascido com uma desordem craniofacial congênita. Aos 10 anos de idade, ele é uma criança inteligente e saudável que encara a vida escolar pela primeira vez, onde sofre preconceitos e, o termo que está na moda, bullying.
"Extraordinário" é um estudo das relações humanas focado na amizade e na família. Há a inevitável presença do bullying, que acaba se tornando pano de fundo à medida que a trama se aprofunda nos laços que o garoto faz com as pessoas ao seu redor.
A estrutura e a linguagem do filme são simples e o roteiro de Steve Conrad provoca o espectador de maneira sensível sem ser cruel, mas sempre com impacto. O triunfo narrativo não fica apenas focalizado na dramaticidade do garoto perante a intolerância e na sua visão lúdica e bem humorada do mundo (há uma bela homenagem a "Star Wars"). A empatia pela situação de Auggie vem das pessoas que o cercam.
Todas as subtramas, separadas por capítulos, surgem em momentos pontuais e convergem para a construção da 'lição de vida'. É fácil nos identificarmos com a carência da compreensiva irmã de Auggie; com o arrependimento do amigo ao 'dizer bobagens' pelas costas, pela luta da mãe que dedica sua vida para cuidar de Auggie e, até mesmo, com o comportamento da cachorrinha de estimação que só está ali para valorizar o conceito de amor e de amizade.
Tudo se interliga ao garoto de forma sensível e edificante e faz com que ele ganhe forças para encarar o mundo sem esconder seu rosto em um capacete de astronauta e sem ocultar sua personalidade. O respeito não se conquista pela aparência, mas com o coração, e essa vitória é representada por uma cena à beira de um lago genuinamente comovente que transmite o alívio de Auggie ao atingir um grande objetivo.
"Extraordinário" é um pouco previsível, é verdade, mas isso não tira o mérito de ser redondinho e emocionalmente inspirador. As lágrimas e os bons arrepios, aqui, se devem a uma direção delicada de Stephen Chbosky ("As Vantagens de Ser Invisível") e, sobretudo, das boas atuações do elenco, em especial de Jacob Tremblay, que apareceu no elogiado "O Quarto de Jack". Dê um Oscar a esse garoto!
O Brasil sabe fazer cinema. O problema da maioria das produções é que elas se alienam ao formato televisivo que está entranhado em nossa cultura. Isso gera uma acomodação que faz travar o crescimento da Sétima Arte por aqui.
Claro, houveram grandes avanços, principalmente após o período da Retomada, mas ainda somos um país das novelas e dos produtos para a TV. Os momentos de sucessos críticos e financeiros (ou apenas financeiro) do cinema tupiniquim, sem considerar a novela editada para o cinema "Os Dez Mandamentos", se resumem na 'fome' do sertão, na 'cosmética' da favela, nas comédias pastelonas e na corrupção policial.
"Bingo: O Rei das Manhãs" é uma prova de que temos um grande potencial cinematográfico a ser explorado. Em meio a discussão iniciada acima, o curioso é que o filme se baseia em um produto da televisão para ter algum êxito no cinema.
"Bingo" é inspirado na vida de Arlindo Barreto, figura que interpretou a versão brasileira do palhaço Bozo, criado pelo americano Alan W. Livingston, em 1946, e sucesso em mais de 40 países. Aqui, Bozo teve um programa infantil de grande audiência nas manhãs no SBT que durou de 1982 a 1992.
A narrativa é como se fosse uma decolagem de um avião: começa baixo, sem muita pretensão e com alguma ironia; no entanto, à medida que alça voos mais altos, a história ganha uma profundidade interessante e uma dramaticidade ímpar, especialmente a partir do segundo ato. O preço da fama, drogas, corporativismo e relação paternal são assuntos comuns, mas bem trabalhados aqui.
A segurança da direção do estreante Daniel Rezende e o talento de Vladimir Brichta impressionam. Rezende, inclusive, é montador e já foi indicado ao Oscar de Melhor Edição por "Cidade de Deus", de Fernando Meirelles, em 2002. "Bingo" é um respiro de criatividade, nostalgia, estética e ousadia técnica, principalmente pela belíssima fotografia.
A DC Comics sofreu com críticas e reclamações de fãs que clamavam ver nas telonas a reunião dos super-heróis mais famosos de seus quadrinhos. A pressão aumentava à medida que a rival (Marvel) lucrava rios de dinheiro com filmes divertidos, bem realizados e que faziam conexões que resultaram em um universo compartilhado. A parceria com o estúdio Warner (detentor dos direitos dos heróis para o cinema), que só tinha olhos para a trilogia fechada de Batman de Christopher Nolan, fez o sonho virar realidade, porém, de forma tardia.
O cineasta Zack Snyder foi escalado pela Warner/DC Comics para iniciar uma série de longas sobre os icônicos heróis da editora. O diferencial para essa criação de universo era investir na pegada realista e sombria, peculiar dos quadrinhos, algo completamente oposto da Marvel/Disney no cinema. O resultado me agradou muito quando surgiu "O Homem de Aço" (2013), mas não agradou uma pequena parte da crítica que estava acostumada com os produtos bem humorados e simpáticos da concorrência. Nessa altura do campeonato, o placar era de 7 a 1 para a Marvel e uma vantagem de 5 anos na produção ininterrupta de longas de super-heróis: "Homem de Ferro" (2008), "O Incrível Hulk" (2008), "Homem de Ferro 2" (2010), "Thor" (2011), "Capitão América - O Primeiro Vingador" (2011), "Os Vingadores" (2012) e "Homem de Ferro 3" (2013) x "O Homem de Aço".
De 2013 em diante, houve um hiato de 3 anos sem produtos da Warner/DC Comics e isso fez a Marvel ampliar ainda mais o placar: 12 a 1. Após a terceira parte de "Homem de Ferro", vieram "Thor - Mundo Sombrio" (2013), "Capitão América - Soldado Invernal" (2014), "Guardiões da Galáxia" (2014), "Vingadores - Era de Ultron" (2015) e "Homem-Formiga" (2015).
O ditado 'a pressa é a inimiga da perfeição' retrata bem o que foi "Batman vs Superman: A Origem da Justiça" (2016). A vagarosidade da Warner/DC Comics em prosseguir com seu universo cinematográfico fez a produção de "BvS" ser acelerada. Isso rendeu uma série de problemas, tanto no quesito técnico como em divergências criativas. Paralelamente, a Marvel estava a todo vapor e já havia feito dois "Vingadores", aventuras similares ao "Liga da Justiça", que estava por vir. Além disso, o diretor por trás do projeto DC Comics nos cinemas, Zack Snyder, começou a ser contestado por: a) não entender a essência que os fãs ou os críticos mais fervorosos desejavam ver; b) não conseguir trabalhar na duração (150 minutos) e no tom ideal cobiçados pelos produtores.
O resultado de "BvS" foi bom nas bilheterias (US$ 872 milhões), mas estava longe da meta bilionária estipulada pelos produtores. E quem pagou o pato foi Zack Snyder com sua substância realista e tenebrosa que contornou a atmosfera na briga entre Batman e Superman. No mesmo ano, uma guinada expressiva aconteceu em outro filme da Warner/DC Comics.
Após o insucesso crítico de "BvS" (a versão estendida é bem melhor que a versão de cinema), "Esquadrão Suicida", dirigido por David Ayer, passou por processos de reedição e refilmagens de última hora para ficar menos nebuloso e mais irônico. Foi uma idéia adotada pelos produtores para se aproximar da leveza dos produtos da concorrência. Isso comprometeu o resultado final do longa tornando-o desorganizado e de execução ruim, o que culminou no segundo fracasso crítico. No entanto, os US$ 745 milhões na bilheteria mundial de um filme sobre os personagens da prateleira debaixo da DC agradaram aos produtores.
Em meio a um turbilhão de apreciações negativas, muitos diziam que o futuro do projeto cinematográfico da Warner/DC Comics dependia do sucesso de "Mulher-Maravilha" (2017). Finalmente, um resultado mais que positivo! O filme dirigido por Patty Jenkins agradou a maioria dos espectadores. A atmosfera mais leve e sua energia emblemática deram um novo fôlego para a construção do tão esperado "Liga da Justiça" que é bom, porém repleto de problemas.
"Liga da Justiça" começa após a trama de "BvS". Na eminência de uma ameaça global, Bruce Wayne vai atrás dos meta-humanos no intuito de formar uma equipe capaz de derrotar o Lobo da Estepe, um alienígena com pretensões apocalípticas que está à procura das três caixas maternas escondidas na Terra (uma está com as Amazonas, a outra com os Atlantis e a última com os humanos). As tais caixas são computadores vivos criados com a tecnologia dos Novos Deuses, grupo celestial da Quarta Dimensão, e possuem poderes infinitos que podem satisfazer qualquer necessidade de quem as usa. A união das três caixas as torna a arma mais poderosa do universo.
Zack Snyder, novamente na direção e também ajudando no roteiro, já não estava com a mão pesada de "BvS" e parecia ter colocado o trem de volta aos trilhos com um pouco mais de leveza. Mas... eis que surge uma nova reviravolta na produção. Faltando pouco mais de 3 meses para o lançamento do longa, Snyder se afasta do cargo devido a uma tragédia familiar (suicídio da filha). E a correria, novamente, entrou em cena, o que obrigou os produtores a contratarem outro diretor. Quem? O 'marvete' Joss Whedon, que assinou a direção dos dois primeiros e bem sucedidos "Vingadores".
O sentimento de que haveria uma volta por cima acabou ficando na incerteza de dias melhores. Com o nome forte de fora do projeto, era o momento exato de outros mandatários mudarem a cara de "Liga da Justiça" para algo que muitos na Warner queriam: a adequação do filme para atender as exigências do mercado e para se aproximar da concorrência. O ditado citado no quarto parágrafo desse texto também pode ser enquadrado aqui devido à falta de tempo para dar um acabamento melhor ao longa.
Whedon fez algo parecido ao que havia acontecido com "Esquadrão Suicida", e isso é notório: introduziu piadas, infantilizou a essência da narrativa colocando mais cores e humanismo, escreveu novas cenas e fez diversos cortes na história (e, também na duração!). Curiosamente, quando as novas cenas foram gravadas, Henry Cavill, que interpreta o Superman, já estava com o visual diferente. O ator estava com um bigode que não podia ser tirado em função de força contratual com o estúdio Paramount, a qual estava com Cavill filmando "Missão: Impossível 6". A solução foi raspar digitalmente o bigode na pós-produção.
Felizmente, o resultado foi o oposto com "Esquadrão Suicida". Entretanto, ainda há diversas linhas tortas, como os vários momentos de humor que ficaram deslocados, o tom maniqueísta trabalhado de forma convencional, a falta de um senso de ameaça (o prenúncio é global e ninguém se preocupa com isso) além do fraco desenvolvimento do vilão. Lobo da Estepe é caricato e artificial ao extremo. Seus motivos para ser temido são os mais rasos possíveis. Além disso, o personagem tem uma apresentação confusa, é totalmente feito em CGI ruim (efeitos visuais) e sua falta de naturalidade não o faz ser amedrontador.
Outra carência importante em "Liga da Justiça" é a emoção. Há momentos que deveriam nos deixar arrepiados e contagiados, mas faltou o empurrãozinho da trilha sonora para que isso acontecesse. A trilha, de Danny Elfman, não é ruim e está em harmonia com a maioria das situações do filme ao reciclar acordes de Hans Zimmer, responsável pela trilha de "O Homem de Aço" e "BvS", e de resgatar a música tema de "Mulher-Maravilha", de Junkie XL. No entanto, é uma pena que Elfman execute apenas as primeiras notas musicais dos clássicos temas de Batman (que é dele) e Superman (de John Willians) e não dá sequência nas canções quando deveria. Isso fez o longa perder a oportunidade de ser emblemático. Porra, Danny!
Por outro lado, há vários elogios a tecer sobre "Liga da Justiça". Snyder demonstra, novamente, que tem uma concepção estética interessante, domínio de câmera e coerência textual ao conectar ideias convincentes que dão andamento na história (salvo algumas soluções repentinas que ficaram com a sensação de que sofreram cortes de Whedon). Há, também, um equilíbrio na apresentação e na interação dos protagonistas. Todos possuem tempos de tela pontuais e boa química em cena. Além disso, o roteiro é sucinto ao abordar a origem daqueles personagens que ainda não tiveram espaço no universo cinematográfico, como Flash, Aquaman e Cyborg. Este último, interpretado por Ray Fisher, que é meio homem e meio máquina, merecia uma abordagem mais aprofundada, já que ele não sabe do que é capaz com o poder que tem e é o herói chave para a grande reviravolta da trama.
O Flash, por sua vez, foi o único herói que ficou um tanto quanto esquisito. Embora seja o alívio cômico por causa de sua ingenuidade e inexperiência, características bem encenadas pelo ator Ezra Miller, seu jeito de correr ficou estranho e pouco natural. Ele deixa um rastro de raios e tudo fica meio embaçado e visualmente confuso quando está em câmera lenta (deveria ser o contrário disso). É inevitável a comparação, mas a solução visual para as cenas de ação do Mercúrio, de os "X-Men", é mais clean e espetacular.
Como a atmosfera está mais amena, Ben Affleck faz um Batman mais camarada, menos carrancudo e até tem certa ironia em algumas falas. Mesmo assim, nunca deixa de ser egocêntrico. Gal Gadot, sempre carismática, repete a imponência de Diana Prince assim como Henry Cavill, que só aparece no final do segundo ato, demonstra boa presença de tela ao se impor como um Superman ainda mais poderoso.
E o Aquaman? Jason Momoa está estiloso e 'bad boy' como o Rei dos Mares. Ele tem bons diálogos, mas é apresentado de maneira rasa. Talvez seja proposital para nos deixar ansiosos com seu filme solo em 2018. Momoa, inclusive, revelou um easter-egg bacana dito por Snyder a respeito de uma cena de "O Homem de Aço". Quando Clark apareceu flutuando desacordado no oceano após salvar pessoas em uma plataforma de petróleo em chamas, foi o Aquaman quem o salvou.
Enfim, "Liga da Justiça" tem bom ritmo, é mais leve, objetivo, bem-humorado, a química entre os heróis funciona, tem cenas de ação legais (mas nada memorável) e algumas referências aos filmes anteriores e aos quadrinhos que vão divertir o público. Atente para uma cena entre os créditos finais e outra após os créditos, que é mais importante e deixa uma ponta para continuação. Ouvi um comentário de uma pessoa, da qual não lembro o nome, que se encaixou com perfeição sobre o que é "Liga da Justiça": 'não é o filme que merecíamos, mas era o que precisávamos'. Que venham os próximos!
"A vilã" é um respiro do gênero ação fora de Hollywood. São poucos os longas que se preocupam em apresentar tais cenas com engenhosidade. Há a utilização da técnica ‘POV’ (Ponto de Vista), movimentos ágeis de câmera e vários (falsos) planos sequências que espetacularizam a pancadaria. É uma mistura da inteligência de "Nikita", da esperteza de "Hardcore: Missão Extrema" com a sanguinolência de "Oldboy". Entretanto, é uma pena que essa produção sul coreana não tenha tanta qualidade ao dialogar com o gênero drama. O enredo, que parece intrigante, é frágil e o roteiro perde o foco no desenvolvimento dos personagens após o bom primeiro ato. Isso faz com que as reviravoltas se tornem confusas e a dramaticidade seja pouco convincente.
Filmes sobre ameaça de tubarão - ou derivados disso - já foram amplamente produzidos pelo cinema. No entanto, poucos conseguiram a façanha de serem realmente bons, proeza conquistada por "47 metros para baixo". Embora tenha uma premissa convencional (duas irmãs ficam presas em uma gaiola subaquática no fundo do mar), o longa se sobressai ao trabalhar os clichês do gênero com criatividade desenvolvendo as circunstâncias sem nenhuma pressa. Inclusive, o ritmo compassado, aliado com as situações vividas pelas protagonistas (contagem regressiva para a falta de ar, ambiente hostil e a ameaça quase invisível de tubarões), valoriza o ótimo terror psicológico construído pelo diretor Johannes Roberts. Claro, não faltam jump scares eficientes e diversos momentos 'tudo que está ruim pode piorar'.
"Stratton - Forças especiais" é um longa de ação que aparenta ter alguma qualidade. As presenças do diretor Simon West, que conhece do assunto, e do elenco acima da média (Connie Nielsen e Dominic Cooper, por exemplo) chamam a atenção. Entretanto, a sensação de coisa boa fica apenas na aparência. O roteiro possui um mote clichê (espionagem e terrorismo) e é mal escrito. Não há uma situação bem desenvolvida e todas apresentam soluções previsíveis e repentinas que subestimam a inteligência do espectador. Além disso, não há criatividade nas cenas de ação, que parecem forçadas, e o ritmo 'gato-e-rato' surge sem emoção. Sem falar da fraca edição que extermina com a sensação de verossimilhança. Decepcionante!
"Blade Runner - O Caçador de Andróides", de 1982, dirigido por Ridley Scott, marcou uma geração, tanto no conceito antropológico como cinematográfico. O curioso é que o filme foi fracasso de bilheteria (estreou na mesma semana de "E.T.", de Steven Spielberg) e obteve status de cult graças ao home vídeo, que aproximou o longa das pessoas e fez a obra ganhar a devida importância.
A produção de "Blade Runner" foi uma das mais conturbadas e repleta de intromissões de produtores. Isso, querendo ou não, também fez alavancar o interesse do público por causa de várias edições do filme que foram relançadas no decorrer dos anos. A última delas foi em 2007, em que Scott lançou a versão 'The Final Cut', sugerindo que o protagonista Rick Deckard fosse um replicante.
Quando surgiu a notícia de um novo "Blade Runner", os fãs ficaram apreensivos, principalmente por estar na moda a produção de reboots e refilmagens. Alterar a história original, baseada no romance "Andróides sonham com ovelhas?", de Phillip K. Dick, seria a mesma coisa que mexer em um vespeiro. A boa notícia é que o novo "Blade Runner" é, de fato, uma continuação e o mesmo não transgride em nada as riquezas temáticas do clássico, que seguem intactas.
Outra notícia que agradou ao público foi o fato de Ridley Scott, que dirigiu o original, não ser o diretor "Blade Runner 2049". Recentemente, ele decepcionou boa parte da crítica ao retomar o universo Alien que criou com "Prometheus" e "Alien Covenant". Aqui, o cineasta assina como produtor executivo. E nada melhor que passar o bastão da direção para uma figura em ascensão e com requisito para comandar a sequência do clássico: o canadense Denis Villeneuve, que fez os elogiados "A chegada" (2016), "Sicário - Terra de Ninguém" (2015), "Os suspeitos" (2013), "O homem duplicado" (2013) e "Incêndios" (2010).
O estilo mais lento de Villeneuve em contar boas histórias foi o encaixe perfeito. O grande acerto foi, acima de tudo, capturar a essência do longa de 1982 com excelência. Daí em diante, tudo que foi feito seguia o 'padrão Blade Runner', como a atmosfera noir fria e sombria ambientada em um futuro distópico. Assim também são os cenários, os figurinos, o tom contemplativo e toda a futurologia que obedece a concepção original. Alguns detalhes tecnológicos foram melhorados, o que significa uma evolução por se tratar do hiato de 35 anos após os eventos do clássico.
Assim como no antecessor, há um ritmo mais vagaroso, um protagonista introspectivo em busca de algo mais, uma trilha sonora semelhante (está mais para uma homenagem de Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch ao ótimo Vangelis, responsável pela trilha original) e um mote que prolonga a discussão feita em 1982, de o replicante ser mais humano (ou tentar ser mais humano) que o próprio ser humano. Claro, por se tratar de uma continuação, nota-se, também, uma evolução narrativa e a apresentação de novas características do bom roteiro de Hampton Fancher e Michael Green.
Aqui, a discussão sobre humanidade é mais abrangente e trabalhada de forma mais aguda, pouco importa se você é ou não humano para possuir ou compartilhar tal conceito. Observe a relevância da personagem da atriz Ana de Armas que interpreta Joi, um programa de computador criado com a intenção de proporcionar humanidade ao protagonista (qualquer semelhança com "Ela", de Spike Jonze, é pura coincidência). Tudo isso fará o espectador conectar as histórias de ambos os longas e refletir sobre o rumo dos acontecimentos, especialmente após o plot twist do segundo ato.
Falando sobre a narrativa, é difícil escrever uma sinopse de "Blade Runner 2049" sem contar spoilers, pois o que for escrito poderá impactar diretamente no entendimento ao clássico. Uma das únicas diferenças aqui é que a premissa foge da polêmica ideia de que Deckard seja um andróide. Se no anterior a narrativa se desenrola a partir do olhar de um ser humano, aqui o ponto de vista é de um replicante. Na trama, acompanhamos o oficial K (em ótima atuação de Ryan Gosling) que descobre um segredo que pode deixar toda a humanidade ameaçada. Tal sigilo está ligado ao ex-agente Rick Deckard (em boa aparição de Harrison Ford), desaparecido há 30 anos.
O filme é um deleite visual. A edição com cortes sutis e a fotografia hipnótica de Roger Deakins, que valoriza o feixe de luz nos ambientes escuros, proporcionam tempo ao espectador para apreciar a plasticidade das cenas e visualizar todos os detalhes da mise en scene. Além disso, a cinematografia é tão minuciosa que se torna uma importante ferramenta da narrativa para contar a história ao espectador mesmo quando o silêncio impera em determinadas sequências. Isso tudo contribui para a direção sensível de Villeneuve que faz um dos melhores trabalhos técnicos de 2017.
"Blade Runner 2049" não tem a pretensão de ser melhor que o clássico. O filme tem lá o sua singularidade, porém sofre com o desgaste do tema amplamente trabalhado nos últimos 30 anos e faz com que sua narrativa não seja tão impactante como no longa icônico de 1982. Isso, no entanto, não diminui a virtude da produção que imprime qualidade em todos os aspectos sem desrespeitar o legado do original.
Maior e melhor. Essa é uma 'regra' básica se tratando de continuações, principalmente aquelas produzidas por Hollywood. No entanto, nem todas as sequências obedecem essa cartilha e se tornam maiores, mas, muitas vezes, piores. O fato de aumentar a história é uma forma natural de dar seguimento à narrativa e de engrandecer o espetáculo, afinal de contas, o espectador espera ver , em uma escala mais perigosa, aquilo que consagrou a produção original. Além disso, o público também espera uma renovação do 'fator surpresa' em um segundo filme para seguir contemplando determinados universos.
O maior exemplo disso é "O exterminador do futuro 2 - O julgamento final" (1991). O filme de James Cameron anabolizou o fator ameaça, engrandeceu as cenas de ação, ampliou a qualidade dos efeitos visuais e é considerado por muitos um longa superior ao antecessor. Qual foi o mérito disso? O cuidado técnico e narrativo em esticar uma história inserindo mais 'fatores surpresas' e mantendo a coerência em tudo para conquistar o espectador. Claro, uma boa dose de criatividade também é importante para que o 'mais do mesmo' tenha um ar de originalidade.
"Kingsman - Serviço secreto", baseado na história em quadrinhos de Mark Millar, surpreendeu a todos em 2014 ao homenagear longas de espionagem de maneira absurdamente divertida. A criatividade foi peça fundamental na direção de Matthew Vaughn. Ele estilizou a violência, trabalhou a galhofa de forma bem humorada sem perder a elegância e espetacularizou as sequências de ação com muita câmera lenta, tecnologia e movimentos de câmera engenhosos. "Kingsman - Serviço secreto" é um filme ousadamente 'cool' e, certamente, estará em muitos top 10 dos melhores exemplares do gênero dos últimos anos.
Com o sucesso do longa, Matthew Vaughn, que dirige, roteiriza e produz, procurou manter o padrão visual e seguir a tradicional cartilha, mas esbarrou na ambição e na pressa (para faturar alguns trocados a mais), suas principais inimigas para a imperfeição de "Kingsman - O círculo dourado". Tudo aqui é maior: a ameaça, as cenas de ação, o elenco é mais inchado (há uma participação hilária de Elton John), há mais efeitos visuais (de boa qualidade, diga-se de passagem), a dificuldade de resolver os problemas e... as derrapadas do roteiro.
Na trama, após as bases da Kingsman serem destruídas, Eggsy e Merlin viajam aos Estados Unidos em busca de ajuda e descobrem a existência da Statesman, a versão americana da organização de espionagem. Ambas as entidades tem um único objetivo, capturar a vilã Poppy, a maior traficante de drogas da atualidade que pretende forçar o mundo a legalizar suas drogas.
Embora tenha uma premissa divertida, o longa é extremamente mal escrito. A maioria dos argumentos para se criar coerência narrativa é frágil. Isso gera uma série de furos e faz com que o exagero não fique tão plausível dentro da proposta do filme. Além disso, o humor surge deslocado em alguns momentos e as tentativas de inserir 'fatores surpresas' mais atrapalham do que surpreendem. Por exemplo, a descoberta de outra super organização secreta ou a aparição de novas engenhocas tecnológicas, 'ok' como elementos inesperados, mas a forma como Harry 'retorna dos mortos' é difícil de engolir e se torna inverossímil.
Vaughn parece estar no piloto automático e nos entrega um produto menos contagiante e repleto de auto-sátiras e situações pouco inspiradas. As cenas de ação não empolgam como deveriam, a não ser duas delas que merecem destaque, a perseguição na abertura do filme e a pancadaria final filmada em um plano sequência clichê, porém sensacional.
Quando o deboche em excesso se sobressai à caricatura ele vira um problema de equilíbrio. Isso define os deméritos de "Kingsman - O círculo dourado" que é uma aventura mediana de sessão da tarde e completamente esquecível.
É difícil encontrar filmes que retratam, de maneira crua, os dramas vividos por pessoas nas áreas de conflitos entre guerrilheiros nos países africanos. Em “A última fronteira”, dirigido por Sean Penn e inspirado em fatos reais, dois médicos voluntários (com boas atuações de Charlize Theron e Javier Bardem) vivem um romance na África ao mesmo tempo em que precisam salvar a vida de inocentes que são vitimas da guerra.
A crueza, a tristeza e o realismo em retratar a miséria e a violência são perturbadores, méritos da eficiência técnica da fotografia e da maquiagem. Isso tudo favorece a construção de cenas extremamente tensas, impactantes e bem produzidas.
Por outro lado, é uma pena que o roteiro não consiga ter a mesma efetividade. A narrativa, contada em flashbacks, poderia ser mais enxuta e com temas mais equilibrados. As tragédias, mesmo sendo panos de fundo, são mais interessantes que o relacionamento pouco empolgante entre os médicos.
A química entre os atores funciona, mas falta mais essência amorosa para que a empatia entre público e protagonistas seja melhor e mais intensa. Quando o surpreendente terceiro ato termina, a emoção já não é tão genuína como deveria ser.
No fim, o foco da comoção, de fato, acaba sendo o terrível cenário de guerra que afronta os países da África e que deixará o espectador impressionado pelo realismo.
Inspirado na HQ The Coldest City, de Antony Johnston, “Atômica” é um eficiente thriller de espionagem ambientado em Berlim, em plena Guerra Fria. A trama, repleta de flashbacks, acompanha uma agente britânica (a ótima e imponente Charlize Theron) que deve investigar o assassinato de um oficial e recuperar uma lista perdida de agentes duplos.
A direção é de David Leitch, um dos co-diretores de “De volta ao jogo”. Inclusive, é deste longa que o cineasta se inspira para proporcionar boas e violentas cenas de ação (há um longo plano sequência que é sensacional).
Muita perseguição e lutas são coreografadas e editadas de maneira brilhante. Outro destaque é a excelente seleção de hits oitentistas da trilha sonora que tem encaixe pontual na narrativa.
A fotografia, de tons acinzentados quase monocromáticos, cria uma atmosfera noir interessante. Além disso, luzes neons nas cores azul e vermelho embelezam o filme em cenas de sensualidade da protagonista e, também, fazem referência aos países envolvidos na Guerra Fria.
Um dos poucos pontos de irregularidade na produção é o roteiro, que possui excesso de diálogos entre uma ação e outra. Isso acaba quebrando o empolgante ritmo ‘gato-e-rato’ em alguns momentos. No geral, é um excelente exemplar do gênero.
The Square - A Arte da Discórdia
3.6 318 Assista AgoraA premissa de "The Square - A Arte da Discórdia" é curiosa e bizarramente provocativa. Isso porque o assunto principal trabalha o conceito de arte contemporânea. Como a definição dessa arte causa certa polêmica, quase tudo neste filme sueco confronta e convida o espectador a refletir sobre detalhes que podem divergir sobre o que é ou não arte.
A narrativa foca na vida de um gerente de museu na Suécia que deve lidar com duas situações: uma é de âmbito profissional, ao promover uma nova exposição vai dar o que falar; e a outra é pessoal, em que arquiteta um plano para resgatar seu celular e sua carteira, furtados na rua quando estava a caminho do trabalho. Ao tentar conciliar as duas circunstâncias, ele se atrapalha demais em ambas e tudo foge do seu controle causando diversas consequências infelizes.
O roteiro utiliza metáforas interessantes (algumas com humor rasteiro) para discutir o tema. Assim como certas manifestações podem ser artisticamente eloquentes para uns e significar nada para outros, pequenas ações podem ser soluções de problemas para uns ou ser a gota d'água para provocar a ira em outros. Com isso, a todo momento, há várias interferências na maioria das cenas que provocam o espectador, seja uma criança chorando em um lugar que ela não deveria estar, ou a presença de um macaco na hora do sexo ou até da 'encarnação' primata de um homem em um jantar de gala.
É curioso que a narrativa não se preocupa com determinadas linhas lógicas. Isso parece ser intencional por parte do roteiro, afinal de contas, estamos diante de constantes alegorias e analogias que convergem para uma representação da concepção e recepção de arte contemporânea. O interessante é o sentimento de revolta que a tal arte causa em alguns personagens, o que pode ser entendido como uma crítica da glamorização de coisas fúteis, o que se encaixa perfeitamente com o subtítulo que o longa recebeu no Brasil, 'a arte da discórdia'.
O filme, de direção sensível de Ruben Östlund ("Força Maior"), que também assina o roteiro, possui uma extensa duração (2h30m) e não parece estar preocupado em dinamizar o desenvolvimento de situações. Proposital ou não, isso o torna cansativo ainda que tenha uma edição de poucos cortes eficiente e uma boa fotografia que utiliza câmeras estáticas (algumas com movimentos suaves) que valoriza as interpretações dos atores em cena.
Contudo, assim como qualquer obra classificada como arte, cabe ao espectador interpretar se as manifestações textuais e visuais de "The Square - A Arte da Discórdia" possuem ou não teores artísticos.
Victoria e Abdul: O Confidente da Rainha
3.5 169 Assista AgoraHistórias reais adaptadas para o cinema atiçam a curiosidade do espectador sobre acontecimentos pouco conhecidos. Quando esses fatos envolvem alguma realeza, os filmes costumam ser interessantes, principalmente por retratarem a beleza monarca, os costumes e os comportamentos de determinadas épocas.
Em “Victoria e Abdul: O Confidente da Rainha” não é diferente. O longa, dirigido por Stephen Frears, é baseado em eventos verídicos escritos por Abdul Karim (e resgatado um século depois pela jornalista Shrabani Basu), um carismático indiano que foi convidado para participar do Jubileu de Ouro da Rainha britânica Victoria (50 anos de reinado), em 1887. O jovem, com a tarefa de entregar uma medalha comemorativa do seu país para sua governante (na época, a Índia ainda fazia parte do Império Britânico), chama a atenção da Imperatriz com quem vive uma bela amizade.
É curioso observar que a atriz Judi Dench interpreta a Rainha Victoria pela segunda vez. Anteriormente, ela viveu a mesma personagem em “Sua Majestade, Mrs. Brown”, de 1997. Dench, inclusive, é uma expert em representar majestades no cinema. Não é a toa que seu desempenho como Rainha Elizabeth lhe rendeu o Oscar de melhor atriz coadjuvante por “Shakespeare Apaixonado” (1999).
Judi Dench, que tem performance irretocável, nos entrega uma Victoria de 81 anos passando por um drama existencial. Amarga, ranzinza e cansada do seu dia-a-dia, ela economiza gestos, fala pouco e se comunica com fortes olhares (que dizem tudo). A inocência e a curiosidade de Abdul despertou nela um interesse improvável de conhecê-lo. Com isso, ela ganhou uma sobrevida espiritual em seus últimos dias ao desabafar angústias, compartilhar ensinamentos e estreitar as diferenças culturais e religiosas.
Abdul, por sua vez, de atuação serena de Ali Fazal, se mostrou uma pessoa inteligente, culta, respeitosa e confiável. Sua presença constante ao lado da Rainha como um confidente intrigou e incomodou todos os palacianos, principalmente por ser um muçulmano e, também, por ter sido capaz de renovar o ânimo de Victoria que passou a ver o mundo de uma maneira diferente.
Todo esse relacionamento é dirigido de forma sensível, sóbrio e levemente bem humorado por Stephen Frears ("Philomena"). Além dos belíssimos figurinos e cenários impecáveis, o filme ainda se destaca por ter um roteiro equilibrado (escrito por Lee Hall) que contextualiza assuntos sociopolíticos do passado que ainda são amplamente criticados nos dias de hoje, como o preço do poder, o racismo e a intolerância.
“Victoria e Abdul: O Confidente da Rainha” é mais um exemplar que levanta a bandeira da diversidade. O longa merece ser apreciado, não só por sua beleza ou por seu conteúdo crítico, mas por seu exercício de contrapontos entre duas personalidades que possuem status distintos e diplomacias admiravelmente próximas.
The Post: A Guerra Secreta
3.5 607 Assista AgoraHá pouco mais de dois anos, o premiado "Spotlight - Segredos Revelados" trouxe à tona a polêmica história baseada em fatos reais veiculada pelo jornal Boston Globe sobre a pedofilia praticada por padres da Igreja Católica. O excessivo tom documental fez o longa ser interessante por seu conteúdo, porém pouco comovente. "The Post - A guerra secreta" trilha um caminho mais espinhoso e faz o que o filme de 2015 não fez: nos entrega um produto mais emocionante e de execução mais criativa.
A narrativa, também inspirada em acontecimentos verídicos, apresenta um escândalo que envolveu quatro mandatos presidenciais dos Estados Unidos a respeito da participação norte-americana na Guerra do Vietnã. Na ocasião, o jornal The Washington Post publicou informações militares sigilosas em 1971, vazadas pelo funcionário do Pentágono Daniel Ellsberg, o que revelou a canalhice dos governantes em ações fúteis naquele país ao sacrificarem soldados em uma guerra perdida (que eles diziam que estava ganha). Isso gerou, inicialmente, uma batalha editorial com The New York Times, que publicou primeiro uma parte desses papéis, seguida por obstáculos jurídicos entre os jornalistas e o Governo.
É curioso vermos uma empresa jornalística comandada por uma mulher, Kay Graham, a primeira mandatária do segmento. Após uma importante introdução sobre o vazamento de informações, o filme foca na figura frágil e vulnerável de Graham, interpretada com a genialidade de sempre de Meryl Streep, e na sua 'falta de voz' em um ambiente dominado por homens. Aos poucos, ela divide a tela com o editor Ben Bradlee, vivido pelo ótimo Tom Hanks, com quem trava bons diálogos sobre publicar ou não o tal polêmico material. À medida que o longa avança, a participação de Graham na trama ganha contornos emblemáticos de uma mulher que descobre a força que tem e é contemplada por sua decisão
(uma das cenas finais após um julgamento em que ela desce as escadas do tribunal e é admirada por outras mulheres é de arrepiar)
"The Post - A guerra secreta" possui um primeiro ato arrastado. Muitos personagens são apresentados e poucos são desenvolvidos de fato (o jornalista interpretado pelo ótimo Bob Odenkirk, que tem certa importância no enredo, poderia ser mais bem aprofundado). Há determinados momentos que o roteiro se perde no ‘lá e cá’ e a edição fica confusa por causa desse excesso de figuras. Entretanto, o filme engrena no segundo ato quando surge o tal material secreto. Com isso, o longa ganha traços de suspense (a trilha sonora de John Williams contribui bem para isso) e um excelente ritmo ao mostrar os bastidores da produção de um jornal, desde a fabricação do mesmo no parque gráfico, no empenho dos jornalistas na redação no exercício da profissão até suas expectativas sobre a repercussão da publicação.
Esse retrato jornalístico foi trabalhado de maneira sóbria, emocionante e criativa pelo cineasta Steven Spielberg. O diretor usa e abusa de enquadramentos e movimentos de câmera pouco usuais. Um dos exemplos é o traveling circular em ângulo plongée dentro de uma sala fechada no momento decisivo de Kay Graham, que se sente encurralada, que é espetacular. Além de homenagear o bom jornalismo ao exaltar a liberdade de imprensa, Spielberg contextualiza os acontecimentos, seja para valorizar o empoderamento feminino (que está em uma crescente já não é de hoje) ou criticar a atual política norte-americana ou simplesmente para nos mostrar o quão semelhante é a forma de governabilidade entre o passado e o presente (mudam as peças, mas o sistema continua o mesmo).
O desfecho é ainda mais interessante,
principalmente por fazer um gancho para o caso Watergate, que derrubou o presidente Nixon no início da década de 70. Falando nisso, vale até uma espiada no excelente clássico “Todos os Homens do Presidente” (1976), de Alan J. Pakula e protagonizado por Robert Redford e Dustin Hoffman, que trata desse tema
O Destino de Uma Nação
3.7 723 Assista Agora"O destino de uma nação", dirigido por Joe Wright ("Orgulho e Preconceito"), conta uma parte da história política de Winston Churchill, o Primeiro Ministro da Grã-Bretanha que tentou costurar um tratado de paz com a Alemanha Nazista de Hitler em plena Segunda Guerra Mundial. Além disso, ele também foi o responsável ao iniciar a Operação Dínamo, que resgatou mais de 300 mil soldados britânicos na praia de Dunkirk, na França.
A competência técnica da produção é de cair o queixo, principalmente no que diz respeito a reconstituição de época, com ótimos figurinos e cenários, na direção criativa de Joe Wright e na espetacular fotografia de Bruno Delbonnel. Delbonnel, inclusive, faz interessantes contrastes entre luz e sombra, enquadramentos de câmera que transpiram algum lirismo (ao retratar o encurralamento do protagonista) e muitos planos isométricos que fazem os espectadores se deslumbrarem com os ambientes melancólicos da Grã-Bretanha.
O grande destaque, no entanto, é a atuação monstruosa de Gary Oldman. Embora esteja embaixo de muita maquiagem (que por sinal é excelente), o ator trabalha a caracterização de Winston Churchill de uma forma incrível! Os trejeitos, o sotaque, o comportamento, o modo de andar e falar estão impecáveis. Oldman faz o personagem ser verossímil mesmo não tendo um desenvolvimento prévio sobre sua forte personalidade.
Entretanto, nem tudo são flores. "O destino de uma nação" possui um roteiro confuso. Ainda que tenha alguns bons diálogos e discursos emblemáticos pontuais, o texto que precede as principais decisões do personagem é frágil. Falta uma inspiração melhor do roteiro para construir uma ideologia coerente e convincente. Pelo menos, houve coesão na introdução do clímax, em que vemos a veia populista de Churchill aflorar na narrativa de maneira notável.
O curioso é que "O destino de uma nação" foi lançado alguns meses depois de "Dunkirk", de Christopher Nolan. Ambas as produções estão no mesmo cenário. Enquanto uma apresenta os bastidores das decisões políticas da Grã-Bretanha na Segunda Guerra Mundial, a outra está na frente de batalha mostrando o drama dos soldados britânicos encurralados na França a espera de resgate. O legal é que um filme complementa o outro mesmo sendo de gêneros diferentes.
O Touro Ferdinando
3.7 440 Assista Agora“O Touro Ferdinando”, animação da Blue Sky dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha (“A Era do Gelo” e “Rio”), traz um carismático protagonista que detesta desavenças e adora cheirar flores e ser amável com o próximo. Ao fugir de uma fazenda especializada na criação de touros, Ferdinando encontra afeto na família de uma garotinha, humana com quem vive uma grande amizade. Depois de crescer e se tornar um touro imenso, sem querer, Ferdinando causa alguns problemas que o faz retornar para o local em que nasceu onde irá reviver imbróglios de seu passado.
O longa é baseado no conto “The Story of Ferdinand” publicado em 1936 pelo autor norte-americano Munro Leaf. Curiosamente, é a mesma fonte de inspiração do curta “Ferdinando, o Touro” premiado pelo Oscar que a Disney lançou em 1938.
O roteiro discute as famosas questões sobre valores familiares, a importância da amizade e faz uma crítica à intolerância, que irá confrontar o protagonista durante toda a trama. A narrativa trabalha bem esses assuntos no primeiro ato, que também é a parte mais criativa e divertida do filme, ao equilibrar boas piadas textuais com ótimo humor situacional.
A partir do segundo ato, o roteiro se mostra frágil no desenvolvimento de algumas situações e de personagens secundários. Com isso, a produção se arrasta em furos, na previsibilidade das ações e em gags exageradamente infantis, comicidade que poderá agradar a criançada, mas nem tanto aos adultos.
O visual caricaturado diverte, porém não impressiona já que sua estética carece de texturas que poderiam contribuir para a beleza do longa (tudo é muito liso e de aparência borrachuda). No fim, ainda que não tenha tanta profundidade dramática, “O Touro Ferdinando” consegue entreter e transmitir sua bela mensagem que inclui, também, uma apreciação a favor da defesa dos animais em touradas.
Viva: A Vida é Uma Festa
4.5 2,5K Assista AgoraA ideia de "Viva - A vida é uma festa", animação da Pixar assinada por Lee Unkrich ("Toy Story 3" e "Procurando Nemo"), não é novidade. Sua premissa é bem parecida com "Festa no Céu" (2014). No entanto, os longas do estúdio, famosos por discutirem valores familiares, ainda surpreendem por serem eficientes pelo equilíbrio narrativo e pelo desenvolvimento da emoção. Aqui, não é diferente.
Na história, o jovem Miguel padece com a reprovação constante de seus parentes por desejar ser músico. O motivo? Foi por causa da música, que fez sua família sofrer no passado devido ao desaparecimento do tataravô. Ao perceber que essa arte está em seu sangue, o garoto acredita que um famoso musicista do passado seja o responsável por fazê-lo gostar de música. É aí que sua épica jornada à procura do tataravô se inicia, quando a magia do Dia dos Mortos o transporta para o 'outro lado'.
A produção, visualmente deslumbrante, adentra no universo multicolorido da cultura mexicana para valorizar o folclore local e transmitir a importância do registro e da preservação de lembranças. Para isso, o roteiro coloca o protagonista no Dia dos Mortos, período em que os mexicanos festejam e homenageiam a memória dos antepassados ou daquelas pessoas queridas que já faleceram e que foram importantes em vida.
O que se destaca em "Viva - A vida é uma festa" é o trabalho de extrair a essência de assuntos complexos e adaptá-la em uma obra que transpira simplicidade e sensibilidade sem perder profundidade. Talvez, por isso, os filmes da Pixar agradam a pessoas de todas as idades. Como o filme entreg diversas camadas de reflexões, cada um absorve as lições à sua maneira, sejam elas mais diretas e metafóricas aos adultos ou subliminares e lúdicas para as crianças.
A atmosfera sempre angelical, o humor rasteiro, a boa caracterização latina (das ruas e casebres), o visual divertidamente caricato e a maneira singela como os personagens são desenvolvidos contagiam o público. Toda essa harmonia culmina, não só no debate saudável dos temas, mas em emoções genuínas. Tente não lacrimejar no arrepiante clímax!
A Guerra dos Sexos
3.7 316 Assista Agora“A Guerra dos Sexos”, dirigido pela dupla Jonathan Dayton e Valerie Faris ("Pequena Miss Sunshine"), e protagonizado por Emma Stone e Steve Carell, aproveita o ápice do ‘girl power’ para contar a história de um famoso jogo amistoso de tênis entre o ex-campeão Bobby Riggs e a campeã mundial Billie Jean King. O episódio esportivo foi um dos mais assistidos na televisão na década de 70. Essa dramatização surge, hoje, como uma crítica a desigualdade entre os sexos, em que, muitas vezes, o homem é mais valorizado financeiramente que a mulher ao executar o mesmo trabalho. Os detalhes históricos que antecedem o evento, assim como as articulações e a retratação dos bastidores, são interessantes. Entretanto, o roteiro gasta muito tempo em subtramas sobre a vida dos protagonistas e isso faz com que o longa se arraste em alguns momentos. Destaque para a atuação de Stone, a reconstituição de época e o clímax (a tal partida de tênis) bem coreografado.
A Origem do Dragão
3.0 67 Assista Agora"A Origem do Dragão" é mais um filme que retrata a vida do lendário Bruce Lee. Aqui, no entanto, discorre sobre um curioso episódio em sua carreira antes se tornar um astro em Hollywood.
Já estabelecido nos Estados Unidos e com uma academia para ensinar o Kung Fu em uma comunidade local na cidade de São Francisco, Lee recebe a visita do mestre chinês Wong Jack Man. O intuito de Man em ir à Califórnia é para conhecer a pessoa que estaria proliferando de forma errônea os conceitos da arte marcial. Esse encontro culmina em uma luta com poucas testemunhas que se tornou um dos confrontos mais emblemáticos na carreira de Lee.
Um dos problemas de "A Origem do Dragão" é que Bruce Lee (que está arrogante) é quase um coadjuvante e sua participação, assim como a presença 'zen' de Wong Jack Man, só tem relevância na trama para atender a um pedido de um pupilo. Esse aluno é o responsável por planejar a tal luta apenas para tentar libertar seu interesse amoroso da máfia chinesa, em Chinatown.
Por mais que o longa seja inspirado em fatos reais, o argumento para o tal embate soa deslocado na trama. Além disso, o roteiro sofre com a indefinição de foco e a narrativa dá mais ênfase nas subtramas que contornam a grande luta. As ações desses pequenos acontecimentos até contribuem para a contextualização da história, mas são praticamente irrelevantes para o que realmente interessa.
Apesar de tudo, "A Origem do Dragão" tem bom ritmo e executa bem o tal confronto em uma sequência com poucos cortes de câmera e com coreografia convincente. É a melhor parte do filme em que estilos diferentes de Kung Fu se colidem para ensinar a ambos os lutadores importantes lições. É o único momento em que a filosofia da arte marcial é discutida com alguma profundidade, mesmo que seja da maneira silenciosa e com entreolhares que dizem tudo. O terceiro ato, embora seja divertido em termos de brigas, não supera o sentimento de frustração de uma produção que não explora o potencial temático que tem.
O Estrangeiro
3.5 330 Assista AgoraEmbora tenha Jackie Chan como protagonista, "O estrangeiro" está longe de ter a irreverência costumeira do ator em filmes de ação. Aqui, Chan entrega uma performance dramática notável em um longa que possui bom elenco (há a boa presença de Pierce Brosnan) e boa direção de Martin Campbell, mas derrapa em um roteiro frágil que desperdiça premissas interessantes.
A trama começa de maneira intensa com um ataque terrorista na Inglaterra que mata a filha de Quan (Chan), dono de um típico restaurante chinês em Londres. Apesar da falta de informações e da dificuldade das autoridades em achar os culpados, Quan desconfia que um político (Liam Hennessy - interpretado por Brosnan) está relacionado ao atentado e o inferniza até que os nomes dos responsáveis pelo incidente sejam revelados.
O roteiro sugere duas linhas narrativas: a convencional busca por vingança e uma promissora (só que não) conspiração política. Entretanto, há uma fragilidade em aliar os enredos e isso gera furos, soluções repentinas (ou Deus ex machina) e situações mal desenvolvidas que investem em argumentos inconvincentes para dar seguimento na história.
Entendemos as motivações de Quan, principalmente por seu passado recente. No entanto, ele revela ser um 'super soldado'! Há pouquíssimas explicações sobre sua trajetória para ser o que é, o que prejudica seu desenvolvimento. Se desligarmos o cérebro, nem vamos importar tanto por Quan ser um mago da esperteza e um especialista em artes marciais (é o típico clichê de orientais no cinema ocidental).
Assim, também, é a situação de Liam, que infantilmente revela fazer parte de uma organização (em que todos sabem a procedência e 'ninguém faz nada') e acaba pagando um alto preço apenas por ter alguma associação com ela. Ele é um 'quase vilão' que opta por decisões inconsequêntes e não se esforça para tentar resolver o problema de forma racional.
O destaque de "O estrangeiro" é a competente atuação de Jackie Chan. Seu semblante frio e depressivo nos faz acreditar em seu drama criando consentimento e empatia do espectador para com seu personagem. Suas cenas de ação, embora merecesse uma edição melhor, são bem coreografadas e tem bom ritmo, ainda que não tenha o humor peculiar de seus filmes. Enfim, por Jackie Chan vale uma espiada.
Me Chame Pelo Seu Nome
4.1 2,6K Assista Agora“Me chame pelo seu nome” coloca o delicado tema sobre homossexualidade no verão de uma Itália dos anos 80 ao falar sobre as descobertas, o primeiro amor, as amizades e as preferências sexuais do único filho adolescente de uma família americana que mora na região. Tudo é filmado de forma lenta e sensível para que o espectador sinta, não apenas empatia com os personagens (em especial sob o ponto de vista de Elio), mas que tenha envolvimento com a ótima ambientação ao revisitar o calor e a rotina da época. Embora tenha uma trama previsível e algumas cenas que poderiam ser mais bem sugeridas (ainda que sejam metáforas importantes para desenvolver as personalidades, o romance e os rumos dramáticos dos protagonistas), o filme ganha sensualidade a partir de seu segundo ato e um belo e emocionante clímax em seu desfecho. Destaque para as atuações de Timothée Chalamet e Armie Hammer.
Lady Bird: A Hora de Voar
3.8 2,1K Assista Agora“Lady Bird - A Hora de Voar” apresenta a típica história de uma adolescente que está prestes a se tornar uma pessoa adulta. O filme dramatiza as peculiaridades dessa transição enfrentadas pela personalidade título, como a rebeldia, a vida sexual, a fase escolar e sua imaturidade (de achar que já pode ser responsável por tudo que decide ou acontece em sua vida). O roteiro ainda traz interessantes discussões familiares, em especial no convívio sufocante entre a protagonista e a mãe. Embora tenha um segundo ato um pouco arrastado, as situações retratadas são bem dirigidas e roteirizadas pela atriz Greta Gerwig (atuou em "Mulheres do Século XX"). Além disso, as tais confusões em que a protagonista se mete e as lições que ela absorve são de fácil identificação, o que colabora para o sucesso do longa. Destaque para a atuação de Saoirse Ronan ("Brooklyn").
Três Anúncios Para um Crime
4.2 2,0K Assista Agora“Três anúncios para um crime” é um longa que fala sobre injustiça, vingança, impunidade e, sobretudo, disserta sobre atitudes inconsequentes que acarretam em um efeito dominó de problemas em uma pequena cidade nos Estados Unidos. Inspirado em fatos reais, de uma mãe que coloca mensagens de indignação em outdoors contra a polícia local que não conseguiu apontar o responsável pela morte da filha, o filme possui um roteiro com excelentes diálogos e um humor mordaz rasteiro que nos remete ao estilo cinematográfico dos irmãos Cohen. Aliás, não só a veia tragicômica lembra os cineastas, a direção de Martin McDonagh ("Sete Psicopatas e um Shih Tzu") também parece se inspirar neles, principalmente pela maneira excêntrica ao desenvolver os personagens, pela violência e pelos movimentos, cortes e enquadramentos de câmera. Destaque para as atuações de Frances McDormand e do coadjuvante Sam Rockwell.
Uma Mulher Fantástica
4.1 422 Assista AgoraNão é de hoje que a homossexualidade é um tema polêmico. Na verdade, é um grande tabu a ser quebrado. Aos poucos, a sociedade se adapta com o assunto, mas ainda há muito preconceito com essas pessoas que querem ter direitos e serem respeitadas. É justamente isso que trata o bom longa chileno "Uma Mulher Fantástica".
A narrativa gira em torno de Marina (Daniela Vega), uma transexual que tem dificuldades em lidar com a morte do amante. Ela busca, apenas, o direito de chorar a morte do seu companheiro, mas é atrapalhada pela intolerância da família do falecido.
O roteiro não perde tempo com clichês sobre barreiras no relacionamento e logo mostra a estabilidade amorosa do casal. O que interessa, de fato, é a reviravolta na vida de Marina sobre uma realidade que ela acreditava ter superado. De um dia para o outro, ela vai do céu ao inferno: é amada sem discriminação por um homem que a via como uma 'mulher fantástica' e, depois, é odiada por sua condição de gênero.
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Eu, Tonya
4.1 1,4K Assista Agora"Eu, Tonya" é dirigido por Craig Gillespie e protagonizado por Margot Robbie, Allison Janney e Sebastian Stan. O filme é inspirado na vida e carreira de Tonya Harding, a primeira mulher americana na patinação artística a completar a manobra 'Axel triplo' em grandes competições.
O principal acontecimento do enredo é o ataque planejado pelo marido de Harding a sua colega Nancy Kerrigan, na tentativa de ser a número um na modalidade. Dificuldades, fama, glória e decadência, todos os clichês sobre feitos esportistas estão aqui. No entanto, o que faz de "Eu, Tonya" ser interessante é a vida conturbada da protagonista que foi criada por uma mãe ranzinza, boca suja e grosseira e, depois, se casou com um homem que a agredia.
Apesar de o tal plano ter sido narrado de uma maneira um pouco confusa, há vários pontos positivos na produção: o ótimo humor mordaz do roteiro que brinca com a inconsequência das ações dos personagens; a edição criativa (com suas idas e vindas no tempo); a quebra da quarta parede que contribui com a irreverência do filme e a boa fotografia que se destaca pelos vários 'mini planos sequências' sobretudo nas performances convincentes de Robbie na patinação.
A direção de Gillespie é assertiva ao optar pelo gênero da tragicomédia e pela forma com que conta a história. O formato por meio de flashbacks oriundos de pseudo entrevistas, além de manter a atmosfera descontraída, nos contagia para sabermos os novos fatos que estão por vir. Destaque para as atuações poderosas de Margot Robbie e de Allison Janney.
Extraordinário
4.3 2,1K Assista Agora"Extraordinário" é, de fato, extraordinário! O filme, inspirado em romance escrito por R.J. Palacio, em 2012, é moralista sem ser apelativo, é melodramático sem ser exagerado e é emocionante sem ser piegas.
A narrativa fala do garoto August Pullman ou Auggie, que possui o rosto deformado por dezenas de cirurgias ao ter nascido com uma desordem craniofacial congênita. Aos 10 anos de idade, ele é uma criança inteligente e saudável que encara a vida escolar pela primeira vez, onde sofre preconceitos e, o termo que está na moda, bullying.
"Extraordinário" é um estudo das relações humanas focado na amizade e na família. Há a inevitável presença do bullying, que acaba se tornando pano de fundo à medida que a trama se aprofunda nos laços que o garoto faz com as pessoas ao seu redor.
A estrutura e a linguagem do filme são simples e o roteiro de Steve Conrad provoca o espectador de maneira sensível sem ser cruel, mas sempre com impacto. O triunfo narrativo não fica apenas focalizado na dramaticidade do garoto perante a intolerância e na sua visão lúdica e bem humorada do mundo (há uma bela homenagem a "Star Wars"). A empatia pela situação de Auggie vem das pessoas que o cercam.
Todas as subtramas, separadas por capítulos, surgem em momentos pontuais e convergem para a construção da 'lição de vida'. É fácil nos identificarmos com a carência da compreensiva irmã de Auggie; com o arrependimento do amigo ao 'dizer bobagens' pelas costas, pela luta da mãe que dedica sua vida para cuidar de Auggie e, até mesmo, com o comportamento da cachorrinha de estimação que só está ali para valorizar o conceito de amor e de amizade.
Tudo se interliga ao garoto de forma sensível e edificante e faz com que ele ganhe forças para encarar o mundo sem esconder seu rosto em um capacete de astronauta e sem ocultar sua personalidade. O respeito não se conquista pela aparência, mas com o coração, e essa vitória é representada por uma cena à beira de um lago genuinamente comovente que transmite o alívio de Auggie ao atingir um grande objetivo.
"Extraordinário" é um pouco previsível, é verdade, mas isso não tira o mérito de ser redondinho e emocionalmente inspirador. As lágrimas e os bons arrepios, aqui, se devem a uma direção delicada de Stephen Chbosky ("As Vantagens de Ser Invisível") e, sobretudo, das boas atuações do elenco, em especial de Jacob Tremblay, que apareceu no elogiado "O Quarto de Jack". Dê um Oscar a esse garoto!
Bingo - O Rei das Manhãs
4.1 1,1K Assista AgoraO Brasil sabe fazer cinema. O problema da maioria das produções é que elas se alienam ao formato televisivo que está entranhado em nossa cultura. Isso gera uma acomodação que faz travar o crescimento da Sétima Arte por aqui.
Claro, houveram grandes avanços, principalmente após o período da Retomada, mas ainda somos um país das novelas e dos produtos para a TV. Os momentos de sucessos críticos e financeiros (ou apenas financeiro) do cinema tupiniquim, sem considerar a novela editada para o cinema "Os Dez Mandamentos", se resumem na 'fome' do sertão, na 'cosmética' da favela, nas comédias pastelonas e na corrupção policial.
"Bingo: O Rei das Manhãs" é uma prova de que temos um grande potencial cinematográfico a ser explorado. Em meio a discussão iniciada acima, o curioso é que o filme se baseia em um produto da televisão para ter algum êxito no cinema.
"Bingo" é inspirado na vida de Arlindo Barreto, figura que interpretou a versão brasileira do palhaço Bozo, criado pelo americano Alan W. Livingston, em 1946, e sucesso em mais de 40 países. Aqui, Bozo teve um programa infantil de grande audiência nas manhãs no SBT que durou de 1982 a 1992.
A narrativa é como se fosse uma decolagem de um avião: começa baixo, sem muita pretensão e com alguma ironia; no entanto, à medida que alça voos mais altos, a história ganha uma profundidade interessante e uma dramaticidade ímpar, especialmente a partir do segundo ato. O preço da fama, drogas, corporativismo e relação paternal são assuntos comuns, mas bem trabalhados aqui.
A segurança da direção do estreante Daniel Rezende e o talento de Vladimir Brichta impressionam. Rezende, inclusive, é montador e já foi indicado ao Oscar de Melhor Edição por "Cidade de Deus", de Fernando Meirelles, em 2002. "Bingo" é um respiro de criatividade, nostalgia, estética e ousadia técnica, principalmente pela belíssima fotografia.
Liga da Justiça
3.3 2,5K Assista AgoraA DC Comics sofreu com críticas e reclamações de fãs que clamavam ver nas telonas a reunião dos super-heróis mais famosos de seus quadrinhos. A pressão aumentava à medida que a rival (Marvel) lucrava rios de dinheiro com filmes divertidos, bem realizados e que faziam conexões que resultaram em um universo compartilhado. A parceria com o estúdio Warner (detentor dos direitos dos heróis para o cinema), que só tinha olhos para a trilogia fechada de Batman de Christopher Nolan, fez o sonho virar realidade, porém, de forma tardia.
O cineasta Zack Snyder foi escalado pela Warner/DC Comics para iniciar uma série de longas sobre os icônicos heróis da editora. O diferencial para essa criação de universo era investir na pegada realista e sombria, peculiar dos quadrinhos, algo completamente oposto da Marvel/Disney no cinema. O resultado me agradou muito quando surgiu "O Homem de Aço" (2013), mas não agradou uma pequena parte da crítica que estava acostumada com os produtos bem humorados e simpáticos da concorrência. Nessa altura do campeonato, o placar era de 7 a 1 para a Marvel e uma vantagem de 5 anos na produção ininterrupta de longas de super-heróis: "Homem de Ferro" (2008), "O Incrível Hulk" (2008), "Homem de Ferro 2" (2010), "Thor" (2011), "Capitão América - O Primeiro Vingador" (2011), "Os Vingadores" (2012) e "Homem de Ferro 3" (2013) x "O Homem de Aço".
De 2013 em diante, houve um hiato de 3 anos sem produtos da Warner/DC Comics e isso fez a Marvel ampliar ainda mais o placar: 12 a 1. Após a terceira parte de "Homem de Ferro", vieram "Thor - Mundo Sombrio" (2013), "Capitão América - Soldado Invernal" (2014), "Guardiões da Galáxia" (2014), "Vingadores - Era de Ultron" (2015) e "Homem-Formiga" (2015).
O ditado 'a pressa é a inimiga da perfeição' retrata bem o que foi "Batman vs Superman: A Origem da Justiça" (2016). A vagarosidade da Warner/DC Comics em prosseguir com seu universo cinematográfico fez a produção de "BvS" ser acelerada. Isso rendeu uma série de problemas, tanto no quesito técnico como em divergências criativas. Paralelamente, a Marvel estava a todo vapor e já havia feito dois "Vingadores", aventuras similares ao "Liga da Justiça", que estava por vir. Além disso, o diretor por trás do projeto DC Comics nos cinemas, Zack Snyder, começou a ser contestado por: a) não entender a essência que os fãs ou os críticos mais fervorosos desejavam ver; b) não conseguir trabalhar na duração (150 minutos) e no tom ideal cobiçados pelos produtores.
O resultado de "BvS" foi bom nas bilheterias (US$ 872 milhões), mas estava longe da meta bilionária estipulada pelos produtores. E quem pagou o pato foi Zack Snyder com sua substância realista e tenebrosa que contornou a atmosfera na briga entre Batman e Superman. No mesmo ano, uma guinada expressiva aconteceu em outro filme da Warner/DC Comics.
Após o insucesso crítico de "BvS" (a versão estendida é bem melhor que a versão de cinema), "Esquadrão Suicida", dirigido por David Ayer, passou por processos de reedição e refilmagens de última hora para ficar menos nebuloso e mais irônico. Foi uma idéia adotada pelos produtores para se aproximar da leveza dos produtos da concorrência. Isso comprometeu o resultado final do longa tornando-o desorganizado e de execução ruim, o que culminou no segundo fracasso crítico. No entanto, os US$ 745 milhões na bilheteria mundial de um filme sobre os personagens da prateleira debaixo da DC agradaram aos produtores.
Em meio a um turbilhão de apreciações negativas, muitos diziam que o futuro do projeto cinematográfico da Warner/DC Comics dependia do sucesso de "Mulher-Maravilha" (2017). Finalmente, um resultado mais que positivo! O filme dirigido por Patty Jenkins agradou a maioria dos espectadores. A atmosfera mais leve e sua energia emblemática deram um novo fôlego para a construção do tão esperado "Liga da Justiça" que é bom, porém repleto de problemas.
"Liga da Justiça" começa após a trama de "BvS". Na eminência de uma ameaça global, Bruce Wayne vai atrás dos meta-humanos no intuito de formar uma equipe capaz de derrotar o Lobo da Estepe, um alienígena com pretensões apocalípticas que está à procura das três caixas maternas escondidas na Terra (uma está com as Amazonas, a outra com os Atlantis e a última com os humanos). As tais caixas são computadores vivos criados com a tecnologia dos Novos Deuses, grupo celestial da Quarta Dimensão, e possuem poderes infinitos que podem satisfazer qualquer necessidade de quem as usa. A união das três caixas as torna a arma mais poderosa do universo.
Zack Snyder, novamente na direção e também ajudando no roteiro, já não estava com a mão pesada de "BvS" e parecia ter colocado o trem de volta aos trilhos com um pouco mais de leveza. Mas... eis que surge uma nova reviravolta na produção. Faltando pouco mais de 3 meses para o lançamento do longa, Snyder se afasta do cargo devido a uma tragédia familiar (suicídio da filha). E a correria, novamente, entrou em cena, o que obrigou os produtores a contratarem outro diretor. Quem? O 'marvete' Joss Whedon, que assinou a direção dos dois primeiros e bem sucedidos "Vingadores".
O sentimento de que haveria uma volta por cima acabou ficando na incerteza de dias melhores. Com o nome forte de fora do projeto, era o momento exato de outros mandatários mudarem a cara de "Liga da Justiça" para algo que muitos na Warner queriam: a adequação do filme para atender as exigências do mercado e para se aproximar da concorrência. O ditado citado no quarto parágrafo desse texto também pode ser enquadrado aqui devido à falta de tempo para dar um acabamento melhor ao longa.
Whedon fez algo parecido ao que havia acontecido com "Esquadrão Suicida", e isso é notório: introduziu piadas, infantilizou a essência da narrativa colocando mais cores e humanismo, escreveu novas cenas e fez diversos cortes na história (e, também na duração!). Curiosamente, quando as novas cenas foram gravadas, Henry Cavill, que interpreta o Superman, já estava com o visual diferente. O ator estava com um bigode que não podia ser tirado em função de força contratual com o estúdio Paramount, a qual estava com Cavill filmando "Missão: Impossível 6". A solução foi raspar digitalmente o bigode na pós-produção.
Felizmente, o resultado foi o oposto com "Esquadrão Suicida". Entretanto, ainda há diversas linhas tortas, como os vários momentos de humor que ficaram deslocados, o tom maniqueísta trabalhado de forma convencional, a falta de um senso de ameaça (o prenúncio é global e ninguém se preocupa com isso) além do fraco desenvolvimento do vilão. Lobo da Estepe é caricato e artificial ao extremo. Seus motivos para ser temido são os mais rasos possíveis. Além disso, o personagem tem uma apresentação confusa, é totalmente feito em CGI ruim (efeitos visuais) e sua falta de naturalidade não o faz ser amedrontador.
Outra carência importante em "Liga da Justiça" é a emoção. Há momentos que deveriam nos deixar arrepiados e contagiados, mas faltou o empurrãozinho da trilha sonora para que isso acontecesse. A trilha, de Danny Elfman, não é ruim e está em harmonia com a maioria das situações do filme ao reciclar acordes de Hans Zimmer, responsável pela trilha de "O Homem de Aço" e "BvS", e de resgatar a música tema de "Mulher-Maravilha", de Junkie XL. No entanto, é uma pena que Elfman execute apenas as primeiras notas musicais dos clássicos temas de Batman (que é dele) e Superman (de John Willians) e não dá sequência nas canções quando deveria. Isso fez o longa perder a oportunidade de ser emblemático. Porra, Danny!
Por outro lado, há vários elogios a tecer sobre "Liga da Justiça". Snyder demonstra, novamente, que tem uma concepção estética interessante, domínio de câmera e coerência textual ao conectar ideias convincentes que dão andamento na história (salvo algumas soluções repentinas que ficaram com a sensação de que sofreram cortes de Whedon). Há, também, um equilíbrio na apresentação e na interação dos protagonistas. Todos possuem tempos de tela pontuais e boa química em cena. Além disso, o roteiro é sucinto ao abordar a origem daqueles personagens que ainda não tiveram espaço no universo cinematográfico, como Flash, Aquaman e Cyborg. Este último, interpretado por Ray Fisher, que é meio homem e meio máquina, merecia uma abordagem mais aprofundada, já que ele não sabe do que é capaz com o poder que tem e é o herói chave para a grande reviravolta da trama.
O Flash, por sua vez, foi o único herói que ficou um tanto quanto esquisito. Embora seja o alívio cômico por causa de sua ingenuidade e inexperiência, características bem encenadas pelo ator Ezra Miller, seu jeito de correr ficou estranho e pouco natural. Ele deixa um rastro de raios e tudo fica meio embaçado e visualmente confuso quando está em câmera lenta (deveria ser o contrário disso). É inevitável a comparação, mas a solução visual para as cenas de ação do Mercúrio, de os "X-Men", é mais clean e espetacular.
Como a atmosfera está mais amena, Ben Affleck faz um Batman mais camarada, menos carrancudo e até tem certa ironia em algumas falas. Mesmo assim, nunca deixa de ser egocêntrico. Gal Gadot, sempre carismática, repete a imponência de Diana Prince assim como Henry Cavill, que só aparece no final do segundo ato, demonstra boa presença de tela ao se impor como um Superman ainda mais poderoso.
E o Aquaman? Jason Momoa está estiloso e 'bad boy' como o Rei dos Mares. Ele tem bons diálogos, mas é apresentado de maneira rasa. Talvez seja proposital para nos deixar ansiosos com seu filme solo em 2018. Momoa, inclusive, revelou um easter-egg bacana dito por Snyder a respeito de uma cena de "O Homem de Aço". Quando Clark apareceu flutuando desacordado no oceano após salvar pessoas em uma plataforma de petróleo em chamas, foi o Aquaman quem o salvou.
Enfim, "Liga da Justiça" tem bom ritmo, é mais leve, objetivo, bem-humorado, a química entre os heróis funciona, tem cenas de ação legais (mas nada memorável) e algumas referências aos filmes anteriores e aos quadrinhos que vão divertir o público. Atente para uma cena entre os créditos finais e outra após os créditos, que é mais importante e deixa uma ponta para continuação. Ouvi um comentário de uma pessoa, da qual não lembro o nome, que se encaixou com perfeição sobre o que é "Liga da Justiça": 'não é o filme que merecíamos, mas era o que precisávamos'. Que venham os próximos!
A Vilã
3.6 224 Assista Agora"A vilã" é um respiro do gênero ação fora de Hollywood. São poucos os longas que se preocupam em apresentar tais cenas com engenhosidade. Há a utilização da técnica ‘POV’ (Ponto de Vista), movimentos ágeis de câmera e vários (falsos) planos sequências que espetacularizam a pancadaria. É uma mistura da inteligência de "Nikita", da esperteza de "Hardcore: Missão Extrema" com a sanguinolência de "Oldboy". Entretanto, é uma pena que essa produção sul coreana não tenha tanta qualidade ao dialogar com o gênero drama. O enredo, que parece intrigante, é frágil e o roteiro perde o foco no desenvolvimento dos personagens após o bom primeiro ato. Isso faz com que as reviravoltas se tornem confusas e a dramaticidade seja pouco convincente.
Medo Profundo
3.3 539 Assista AgoraFilmes sobre ameaça de tubarão - ou derivados disso - já foram amplamente produzidos pelo cinema. No entanto, poucos conseguiram a façanha de serem realmente bons, proeza conquistada por "47 metros para baixo". Embora tenha uma premissa convencional (duas irmãs ficam presas em uma gaiola subaquática no fundo do mar), o longa se sobressai ao trabalhar os clichês do gênero com criatividade desenvolvendo as circunstâncias sem nenhuma pressa. Inclusive, o ritmo compassado, aliado com as situações vividas pelas protagonistas (contagem regressiva para a falta de ar, ambiente hostil e a ameaça quase invisível de tubarões), valoriza o ótimo terror psicológico construído pelo diretor Johannes Roberts. Claro, não faltam jump scares eficientes e diversos momentos 'tudo que está ruim pode piorar'.
Stratton - Forças Especiais
2.4 21"Stratton - Forças especiais" é um longa de ação que aparenta ter alguma qualidade. As presenças do diretor Simon West, que conhece do assunto, e do elenco acima da média (Connie Nielsen e Dominic Cooper, por exemplo) chamam a atenção. Entretanto, a sensação de coisa boa fica apenas na aparência. O roteiro possui um mote clichê (espionagem e terrorismo) e é mal escrito. Não há uma situação bem desenvolvida e todas apresentam soluções previsíveis e repentinas que subestimam a inteligência do espectador. Além disso, não há criatividade nas cenas de ação, que parecem forçadas, e o ritmo 'gato-e-rato' surge sem emoção. Sem falar da fraca edição que extermina com a sensação de verossimilhança. Decepcionante!
Blade Runner 2049
4.0 1,7K Assista Agora"Blade Runner - O Caçador de Andróides", de 1982, dirigido por Ridley Scott, marcou uma geração, tanto no conceito antropológico como cinematográfico. O curioso é que o filme foi fracasso de bilheteria (estreou na mesma semana de "E.T.", de Steven Spielberg) e obteve status de cult graças ao home vídeo, que aproximou o longa das pessoas e fez a obra ganhar a devida importância.
A produção de "Blade Runner" foi uma das mais conturbadas e repleta de intromissões de produtores. Isso, querendo ou não, também fez alavancar o interesse do público por causa de várias edições do filme que foram relançadas no decorrer dos anos. A última delas foi em 2007, em que Scott lançou a versão 'The Final Cut', sugerindo que o protagonista Rick Deckard fosse um replicante.
Quando surgiu a notícia de um novo "Blade Runner", os fãs ficaram apreensivos, principalmente por estar na moda a produção de reboots e refilmagens. Alterar a história original, baseada no romance "Andróides sonham com ovelhas?", de Phillip K. Dick, seria a mesma coisa que mexer em um vespeiro. A boa notícia é que o novo "Blade Runner" é, de fato, uma continuação e o mesmo não transgride em nada as riquezas temáticas do clássico, que seguem intactas.
Outra notícia que agradou ao público foi o fato de Ridley Scott, que dirigiu o original, não ser o diretor "Blade Runner 2049". Recentemente, ele decepcionou boa parte da crítica ao retomar o universo Alien que criou com "Prometheus" e "Alien Covenant". Aqui, o cineasta assina como produtor executivo. E nada melhor que passar o bastão da direção para uma figura em ascensão e com requisito para comandar a sequência do clássico: o canadense Denis Villeneuve, que fez os elogiados "A chegada" (2016), "Sicário - Terra de Ninguém" (2015), "Os suspeitos" (2013), "O homem duplicado" (2013) e "Incêndios" (2010).
O estilo mais lento de Villeneuve em contar boas histórias foi o encaixe perfeito. O grande acerto foi, acima de tudo, capturar a essência do longa de 1982 com excelência. Daí em diante, tudo que foi feito seguia o 'padrão Blade Runner', como a atmosfera noir fria e sombria ambientada em um futuro distópico. Assim também são os cenários, os figurinos, o tom contemplativo e toda a futurologia que obedece a concepção original. Alguns detalhes tecnológicos foram melhorados, o que significa uma evolução por se tratar do hiato de 35 anos após os eventos do clássico.
Assim como no antecessor, há um ritmo mais vagaroso, um protagonista introspectivo em busca de algo mais, uma trilha sonora semelhante (está mais para uma homenagem de Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch ao ótimo Vangelis, responsável pela trilha original) e um mote que prolonga a discussão feita em 1982, de o replicante ser mais humano (ou tentar ser mais humano) que o próprio ser humano. Claro, por se tratar de uma continuação, nota-se, também, uma evolução narrativa e a apresentação de novas características do bom roteiro de Hampton Fancher e Michael Green.
Aqui, a discussão sobre humanidade é mais abrangente e trabalhada de forma mais aguda, pouco importa se você é ou não humano para possuir ou compartilhar tal conceito. Observe a relevância da personagem da atriz Ana de Armas que interpreta Joi, um programa de computador criado com a intenção de proporcionar humanidade ao protagonista (qualquer semelhança com "Ela", de Spike Jonze, é pura coincidência). Tudo isso fará o espectador conectar as histórias de ambos os longas e refletir sobre o rumo dos acontecimentos, especialmente após o plot twist do segundo ato.
Falando sobre a narrativa, é difícil escrever uma sinopse de "Blade Runner 2049" sem contar spoilers, pois o que for escrito poderá impactar diretamente no entendimento ao clássico. Uma das únicas diferenças aqui é que a premissa foge da polêmica ideia de que Deckard seja um andróide. Se no anterior a narrativa se desenrola a partir do olhar de um ser humano, aqui o ponto de vista é de um replicante. Na trama, acompanhamos o oficial K (em ótima atuação de Ryan Gosling) que descobre um segredo que pode deixar toda a humanidade ameaçada. Tal sigilo está ligado ao ex-agente Rick Deckard (em boa aparição de Harrison Ford), desaparecido há 30 anos.
O filme é um deleite visual. A edição com cortes sutis e a fotografia hipnótica de Roger Deakins, que valoriza o feixe de luz nos ambientes escuros, proporcionam tempo ao espectador para apreciar a plasticidade das cenas e visualizar todos os detalhes da mise en scene. Além disso, a cinematografia é tão minuciosa que se torna uma importante ferramenta da narrativa para contar a história ao espectador mesmo quando o silêncio impera em determinadas sequências. Isso tudo contribui para a direção sensível de Villeneuve que faz um dos melhores trabalhos técnicos de 2017.
"Blade Runner 2049" não tem a pretensão de ser melhor que o clássico. O filme tem lá o sua singularidade, porém sofre com o desgaste do tema amplamente trabalhado nos últimos 30 anos e faz com que sua narrativa não seja tão impactante como no longa icônico de 1982. Isso, no entanto, não diminui a virtude da produção que imprime qualidade em todos os aspectos sem desrespeitar o legado do original.
Kingsman: O Círculo Dourado
3.5 885 Assista AgoraMaior e melhor. Essa é uma 'regra' básica se tratando de continuações, principalmente aquelas produzidas por Hollywood. No entanto, nem todas as sequências obedecem essa cartilha e se tornam maiores, mas, muitas vezes, piores. O fato de aumentar a história é uma forma natural de dar seguimento à narrativa e de engrandecer o espetáculo, afinal de contas, o espectador espera ver , em uma escala mais perigosa, aquilo que consagrou a produção original. Além disso, o público também espera uma renovação do 'fator surpresa' em um segundo filme para seguir contemplando determinados universos.
O maior exemplo disso é "O exterminador do futuro 2 - O julgamento final" (1991). O filme de James Cameron anabolizou o fator ameaça, engrandeceu as cenas de ação, ampliou a qualidade dos efeitos visuais e é considerado por muitos um longa superior ao antecessor. Qual foi o mérito disso? O cuidado técnico e narrativo em esticar uma história inserindo mais 'fatores surpresas' e mantendo a coerência em tudo para conquistar o espectador. Claro, uma boa dose de criatividade também é importante para que o 'mais do mesmo' tenha um ar de originalidade.
"Kingsman - Serviço secreto", baseado na história em quadrinhos de Mark Millar, surpreendeu a todos em 2014 ao homenagear longas de espionagem de maneira absurdamente divertida. A criatividade foi peça fundamental na direção de Matthew Vaughn. Ele estilizou a violência, trabalhou a galhofa de forma bem humorada sem perder a elegância e espetacularizou as sequências de ação com muita câmera lenta, tecnologia e movimentos de câmera engenhosos. "Kingsman - Serviço secreto" é um filme ousadamente 'cool' e, certamente, estará em muitos top 10 dos melhores exemplares do gênero dos últimos anos.
Com o sucesso do longa, Matthew Vaughn, que dirige, roteiriza e produz, procurou manter o padrão visual e seguir a tradicional cartilha, mas esbarrou na ambição e na pressa (para faturar alguns trocados a mais), suas principais inimigas para a imperfeição de "Kingsman - O círculo dourado". Tudo aqui é maior: a ameaça, as cenas de ação, o elenco é mais inchado (há uma participação hilária de Elton John), há mais efeitos visuais (de boa qualidade, diga-se de passagem), a dificuldade de resolver os problemas e... as derrapadas do roteiro.
Na trama, após as bases da Kingsman serem destruídas, Eggsy e Merlin viajam aos Estados Unidos em busca de ajuda e descobrem a existência da Statesman, a versão americana da organização de espionagem. Ambas as entidades tem um único objetivo, capturar a vilã Poppy, a maior traficante de drogas da atualidade que pretende forçar o mundo a legalizar suas drogas.
Embora tenha uma premissa divertida, o longa é extremamente mal escrito. A maioria dos argumentos para se criar coerência narrativa é frágil. Isso gera uma série de furos e faz com que o exagero não fique tão plausível dentro da proposta do filme. Além disso, o humor surge deslocado em alguns momentos e as tentativas de inserir 'fatores surpresas' mais atrapalham do que surpreendem. Por exemplo, a descoberta de outra super organização secreta ou a aparição de novas engenhocas tecnológicas, 'ok' como elementos inesperados, mas a forma como Harry 'retorna dos mortos' é difícil de engolir e se torna inverossímil.
Vaughn parece estar no piloto automático e nos entrega um produto menos contagiante e repleto de auto-sátiras e situações pouco inspiradas. As cenas de ação não empolgam como deveriam, a não ser duas delas que merecem destaque, a perseguição na abertura do filme e a pancadaria final filmada em um plano sequência clichê, porém sensacional.
Quando o deboche em excesso se sobressai à caricatura ele vira um problema de equilíbrio. Isso define os deméritos de "Kingsman - O círculo dourado" que é uma aventura mediana de sessão da tarde e completamente esquecível.
A Última Fronteira
3.1 53 Assista AgoraÉ difícil encontrar filmes que retratam, de maneira crua, os dramas vividos por pessoas nas áreas de conflitos entre guerrilheiros nos países africanos. Em “A última fronteira”, dirigido por Sean Penn e inspirado em fatos reais, dois médicos voluntários (com boas atuações de Charlize Theron e Javier Bardem) vivem um romance na África ao mesmo tempo em que precisam salvar a vida de inocentes que são vitimas da guerra.
A crueza, a tristeza e o realismo em retratar a miséria e a violência são perturbadores, méritos da eficiência técnica da fotografia e da maquiagem.
Isso tudo favorece a construção de cenas extremamente tensas, impactantes e bem produzidas.
Por outro lado, é uma pena que o roteiro não consiga ter a mesma efetividade. A narrativa, contada em flashbacks, poderia ser mais enxuta e com temas mais equilibrados. As tragédias, mesmo sendo panos de fundo, são mais interessantes que o relacionamento pouco empolgante entre os médicos.
A química entre os atores funciona, mas falta mais essência amorosa para que a empatia entre público e protagonistas seja melhor e mais intensa. Quando o surpreendente terceiro ato termina, a emoção já não é tão genuína como deveria ser.
No fim, o foco da comoção, de fato, acaba sendo o terrível cenário de guerra que afronta os países da África e que deixará o espectador impressionado pelo realismo.
Atômica
3.6 1,1K Assista AgoraInspirado na HQ The Coldest City, de Antony Johnston, “Atômica” é um eficiente thriller de espionagem ambientado em Berlim, em plena Guerra Fria. A trama, repleta de flashbacks, acompanha uma agente britânica (a ótima e imponente Charlize Theron) que deve investigar o assassinato de um oficial e recuperar uma lista perdida de agentes duplos.
A direção é de David Leitch, um dos co-diretores de “De volta ao jogo”. Inclusive, é deste longa que o cineasta se inspira para proporcionar boas e violentas cenas de ação (há um longo plano sequência que é sensacional).
Muita perseguição e lutas são coreografadas e editadas de maneira brilhante. Outro destaque é a excelente seleção de hits oitentistas da trilha sonora que tem encaixe pontual na narrativa.
A fotografia, de tons acinzentados quase monocromáticos, cria uma atmosfera noir interessante. Além disso, luzes neons nas cores azul e vermelho embelezam o filme em cenas de sensualidade da protagonista e, também, fazem referência aos países envolvidos na Guerra Fria.
Um dos poucos pontos de irregularidade na produção é o roteiro, que possui excesso de diálogos entre uma ação e outra. Isso acaba quebrando o empolgante ritmo ‘gato-e-rato’ em alguns momentos. No geral, é um excelente exemplar do gênero.